Capítulo 59: A Torre Vermelha da Magia (1/9)
As súcubos eram uma espécie de Demônio da Noite1 tão famosa que quase ninguém era alheio a elas. Naturalmente, Eugene também estava bem familiarizado com súcubos. Em sua vida passada, quando ele e seus companheiros viajavam por Helmuth, aqueles malditos Demônios da Noite invadiam seus sonhos sempre que estavam cansados e exaustos, só pra causar todo tipo de problema.
— Isso aqui nem é Helmuth, então por que diabos tem súcubo aqui? — Eugene exigiu.
— P-p-por favor, se acalme. — Ao ver Eugene explodir de raiva, o guia se desesperou e ergueu as mãos como se erguesse uma barreira frágil. — Pode não ser Helmuth, mas ainda temos a Torre Negra da Magia, lembra? Além dos magos negros humanos, também há vários demonídeos morando lá.
— Então quer dizer que aquele desgraçado, o Eward… não, quero dizer, meu irmão mais velho, tá se envolvendo com uma súcubo da Torre Negra da Magia?
Mesmo tendo acabado de dizer aquilo, Eugene ainda não conseguia acreditar nas próprias palavras. Aquele cara era um descendente de Vermouth, o filho mais velho da família principal… mas estava brincando com demonídeos, e logo uma súcubo?
— …Bem… Estritamente falando, ao invés de brincar com ela… ele está apenas sendo ‘entretenido’ por ela…
— E qual é a diferença?
— Como acontece em qualquer cidade, até Aroth tem uma rua onde ocorrem encontros ilegais e onde ‘esse tipo’ de estabelecimento funciona abertamente. Pra falar com franqueza, é um lugar deixado de lado propositalmente como uma espécie de mal necessário…
— E o que tem isso?
— Embora essa rua seja mais famosa pelo mercado negro, também há algumas lojas obscuras que contrataram súcubos como anfitriãs. Ouvi dizer que o Senhor Eward frequenta esse tipo de lugar com certa regularidade…
— Aquele maluco desgraçado — o tom de Eugene ficou ainda mais severo.
Como o guia tinha mencionado a Torre Negra da Magia, Eugene havia suspeitado que Eward pudesse ter algum tipo de relação com um mago negro ao qual a súcubo fosse contratada. Mas depois de ouvir toda a história do guia, Eugene só passou a desprezar Eward ainda mais.
Só de pensar que um descendente de Vermouth tinha se enredado nas garras de uma súcubo e oferecia livremente sua força vital como alimento… Só isso já seria vergonhoso o bastante, mas ela não era apenas uma súcubo, era uma anfitriã de bordel.
Mesmo chamá-la de anfitriã já era usar um termo absurdamente educado, pois era evidente que as súcubos que trabalhavam nesse tipo de loja eram o mais baixo escalão entre os próprios súcubos. Em termos humanos, não passavam de prostitutas de esquina.
— Aquele desgraçado idiota. O que esse moleque imbecil acha que está fazendo?
Diante dessas palavras ácidas, o guia ficou extremamente desconcertado mais uma vez, porque a forma como Eugene falava parecia exatamente a de um adulto repreendendo uma criança tola.
Eugene se virou para o guia:
— Isso já foi confirmado?
O guia se encolheu:
— Não, bom, não exatamente… são só rumores mesmo…
— Você sabe onde fica essa rua?
— Chama-se Rua Bolero. Essas lojas não abrem todos os dias, então a rua só mostra sua verdadeira face corrompida uma vez por mês, na noite de lua cheia.
— Entendi — Eugene rosnou a resposta entre os dentes.
Ele não tinha a menor intenção de se aproximar de Eward ao chegar em Aroth. Pretendia manter uma distância razoável e basicamente ignorar o meio-irmão enquanto cuidava dos próprios assuntos.
Mas agora que ouvira essa notícia, sentia uma fúria ardente crescendo dentro de si. A raiva de Eugene não vinha de algum apego ao nome da família Lionheart. Ele simplesmente não podia aceitar que um descendente de Vermouth estivesse oferecendo sua força vital a um demônio de quinta.
“Como ele se atreve a se rebaixar a escória como essa?”
Eugene obviamente odiava os Reis Demônios, mas também desprezava os demonídeos. E se tivesse que ranquear quais ele mais odiava entre eles, as súcubos estariam no topo da lista. Havia uma razão simples para isso: quando foram atacados pela primeira vez por súcubos no Reino Demoníaco, ele havia passado por uma humilhação indescritível.
“Seja súcubo, íncubo ou qualquer tipo de Demônio da Noite, todos precisam ser exterminados.”
Ele nem queria lembrar das memórias constrangedoras daquela época. De qualquer forma, Eugene havia massacrado incontáveis súcubos e íncubos em sua vida passada como forma de vingança pela vergonha que sofreu.
Hesitante, o guia perguntou:
— …Senhor Eugene, poderia manter em segredo o fato de que compartilhei essa história…?
— Não se preocupe. Não ouviu eu jurar pelo meu nome? Não vou contar pra ninguém… muito menos pra aquele maldito irmão mais velho.
Eles estavam se aproximando da Torre Vermelha da Magia. Distraído pela voz ansiosa do guia, Eugene assentiu de forma vaga para tranquilizá-lo e voltou a ranger os dentes.
“Se fosse por mim, eu agarrava ele pela gola e socava a verdade da cara dele.”
Mas por ora, ele só tinha rumores, e bem incertos, no mínimo. Se desse uma surra em Eward com base apenas nessas histórias soltas, Eugene é que estaria errado. Então precisava segurar a vontade de violência até conseguir uma prova concreta.
— …Você disse que essa rua abre na noite de lua cheia e se chama Rua Bolero, certo?
— Sim…
— Certo, entendi.
A carruagem aérea pousou em frente à Torre Vermelha. Eugene foi o primeiro a abrir a porta com força.
Virando-se, ele disse:
— Ah, não precisa descer comigo, já que vamos nos separar aqui mesmo. Se cuida, e vamos tomar alguma coisa se nos encontrarmos por aí qualquer dia.
Surpreso, o guia perguntou:
— Q-quer aceitar meu cartão? Meu nome é…
— Nada disso, não precisa. Tenho boa memória. Com certeza vou te reconhecer se nos encontrarmos de novo, então cada um segue seu caminho, e na próxima vez eu faço questão de cumprimentar.
Acenando em despedida, Eugene desceu da carruagem. As intenções do guia eram óbvias. Ele queria, de alguma forma, estabelecer uma conexão com Eugene. Porque, assim, talvez conseguisse a chance de ter seu nome ouvido por Lovellian, o mestre da Torre Vermelha.
Mas isso não era problema de Eugene.
— Por acaso é o senhor Eugene Lionheart?
Uma mulher parada em frente à entrada da alta torre escarlate se aproximou de Eugene. Usando um chapéu pontudo de aba larga sobre as vestes magenta, ela passava uma imagem bastante impressionante.
“Nem trezentos anos atrás alguém se vestia de forma tão estereotipada como um mago…”
Mas as modas iam e vinham. Aquilo era um exemplo de estilo retrô? Após lançar um olhar ao chapéu pontudo, Eugene assentiu.
— Sim, sou eu.
— Meu nome é Hera, sou maga da Torre Vermelha da Magia — Hera tirou o chapéu e fez uma reverência ao se apresentar. — O Mestre da Torre está esperando no andar de cima. Ele planejava vir pessoalmente recebê-lo, mas surgiu um pequeno problema que o está ocupando.
— Que tipo de problema? — Eugene perguntou.
Diante da pergunta, Hera demonstrou um olhar desconcertado. Incapaz de responder de imediato, hesitou por um instante antes de olhar para a torre.
Tching!
Um pulso de mana emanou da torre e fez a mana atmosférica tremer. O som agudo fez os ombros de Hera se encolherem. Eugene também franziu levemente a testa ao olhar para cima.
— …Hm… parece que houve algum tipo de acidente? — Eugene comentou.
— …Na verdade, isso é até comum — admitiu Hera, derrotada. Tossindo baixinho, ela colocou o chapéu de volta. — Na Torre Vermelha da Magia… bom… temos muitos magos que estudam magia de invocação. E entre os vários tipos de magia, a invocação… hum… tem a maior taxa de falha.
— Se vai dizer isso pra ele, deveria dar uma explicação decente — interrompeu uma voz de repente. — Não é só que a taxa de falha é alta; é que eles estão tentando falhar de propósito. Estão tentando invocar algo totalmente diferente sobrecarregando o círculo de invocação com mana!
O dono da voz irritada era Lovellian. Ele abriu uma das janelas da torre e saiu voando.
Fwoosh!
Assim que a janela se abriu, fumaça negra começou a sair em grandes quantidades.
— Mas isso aqui já passou dos limites. Parece que temos alguns gênios extraordinários entre nós. Como, me digam como diabos vocês conseguiram invocar uma Fera Sombria com um círculo feito pra invocar um Tubarão de Lava?
Flutuando no ar, Lovellian acenou com a mão. A Fera Sombria, que já havia se fundido com a escuridão do céu noturno, foi capturada pela mana que ele emitiu.
— O espírito experimental de vocês é impressionantemente alarmante. O que achavam que iam conseguir invocando uma fera demoníaca que nem conseguem controlar? O que acham que teria acontecido se a Fera Sombria tivesse escapado por causa do erro de vocês? Felizmente, nunca saberemos ao certo, mas mais de cem pessoas poderiam ter morrido antes de ser contida!
— N-Nós sentimos muito…
Os jovens magos que saíram da torre atrás de Lovellian mantinham as cabeças abaixadas, pedindo desculpas. Mas a fúria de Lovellian não era tão fácil de acalmar.
“Eles devem estar malucos”, Eugene pensou, incrédulo.
A Fera Sombria era uma criatura demoníaca que espreitava nas noites de Helmuth. Como a maioria das bestas demoníacas, as Feras Sombrias não possuíam plena consciência. Eram guiadas unicamente por seu instinto destrutivo. Se aquela Fera Sombria tivesse escapado para o céu noturno, teria começado a caçar os habitantes da capital imediatamente.
Os magos tentaram se justificar:
— Não queríamos invocar uma fera demoníaca… n-nós só…
— De agora em diante, vocês podem ser os novos Mestres da Torre Vermelha — declarou Lovellian, de repente.
— Hã? — os magos arregalaram os olhos em choque.
— Nem eu conseguiria invocar uma Fera Sombria com um círculo feito pra um Tubarão de Lava. Isso simplesmente nunca aconteceria. Então, isso não quer dizer que vocês conseguiram realizar uma façanha que nem eu seria capaz? Já que são magos melhores do que eu, deviam assumir o posto de Mestres da Torre no meu lugar.
— M-Mestre da Torre…!
— Acham mesmo que eu tenho olhos de vidro? O círculo de vocês estava errado desde o início! Mesmo que cometam um erro, ao menos acertem o básico. Essa fera só poderia ser invocada se a base do círculo estivesse toda ferrada! — Lovellian rugiu ainda mais alto. — Façam as malas e saiam imediatamente!
Os magos continuaram a se curvar pedindo desculpas enquanto lágrimas caíam de seus olhos. Mas Lovellian não mudou de ideia. Desviando o olhar dos jovens magos, ele se voltou para Eugene.
— …Ahem.
- Uma categoria de demônios com poder sobre sonhos. Além das súcubos, isso inclui íncubos, pesadelos e bruxas da noite.[↩]
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