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    — Desculpe por te fazer esperar — disse Hera quando já estava pronta para partir.

    Hera também usava hoje seu grande chapéu pontudo. Eugene chegou a se perguntar se o estilo de trezentos anos atrás havia voltado à moda, mas descobriu que o gosto de Hera é que era um pouco peculiar. Ela era a única na torre que insistia em vestir-se com aquele tipo tão estereotipado de roupa de maga.

    — Parece que meu irmão também não apareceu hoje — comentou Eugene.

    — Bem… às vezes é assim mesmo — respondeu Hera com um sorriso amargo, colocando seu grande chapéu de maga.

    Durante a primeira semana após a chegada de Eugene à torre, Eward também havia visitado a biblioteca, mas apenas naquela semana. Depois disso, Eugene raramente o via por lá, e era ainda mais raro encontrá-lo nos corredores.

    Dizia-se que Eward já estava assim fazia alguns anos.

    Por mais que Lovellian fosse próximo de Gilead, as habilidades de Eward estavam muito aquém do necessário para que Lovellian o aceitasse como discípulo. Claro, isso era para manter a imparcialidade, mas também porque Lovellian não podia manchar sua reputação como Mestre da Torre.

    Por isso, Lovellian providenciou um mago de alto escalão, que estava sem muitos compromissos, para se tornar o instrutor de Eward. Não só permitiu que Eward entrasse na torre, como também lhe arranjou um mestre habilidoso, indo muito além do que se esperaria de uma amizade com Gilead.

    Mas Eward continuava sendo um problema. Depois de vir para a Torre Vermelha da Magia, ele se esforçou por cerca de meio ano, mas a partir de certo ponto parou de frequentar a biblioteca ou os laboratórios, e passou a perambular em seu quarto ou fora da torre.

    “Desgraçado patético.”

    Eugene sabia o motivo disso. Três anos atrás, Eward havia feito o teste de admissão para as Torres da Magia por sugestão de Lovellian.

    O resultado não foi bom. Apesar de ter conseguido uma nota razoável na parte teórica, seus resultados na parte prática foram tão desastrosos que não havia desculpas possíveis. Isso fez a situação ficar constrangedora, não só para Lovellian, mas também para todos os magos que haviam ensinado Eward.

    “Se não é bom o bastante, devia se esforçar mais. Até quando ele vai continuar brincando de ser mago enquanto vive às custas da família? E além de tudo, virou fonte de energia vital pra uma súcubo.”

    Se tivesse presenciado pessoalmente a cena de Eward sendo drenado por uma súcubo, Eugene o teria espancado sem se importar com o fato de que ele era seu irmão mais velho ou herdeiro do clã Lionheart.

    Talvez Eward estivesse se contendo por causa de Eugene, já que havia permanecido quieto dentro da torre na última noite de lua cheia. Mas ele não conseguiria manter isso por muito tempo.

    Alguns dias atrás, Eugene havia esbarrado com Eward em um dos muitos corredores da torre. Embora sua pele pálida e o cabelo ressecado parecessem mais revigorados, ele roía as unhas constantemente e seus olhos estavam turvos. Esses eram sinais de abstinência. Era óbvio que Eward provavelmente procuraria sua súcubo na próxima lua cheia.

    Enquanto desciam ao subsolo pelo elevador, com Eugene fornecendo mana suficiente para mover o elevador para os dois, Hera comentou:

    — Imagino que você vá tentar usar a fórmula mágica dos Círculos, certo?

    — Isso mesmo — Eugene confirmou.

    Um dos motivos pelos quais a Sábia Sienna era tão reverenciada em Aroth era o fato de ter sistematizado uma classificação para os diferentes níveis de aptidão mágica.

    Trezentos anos atrás, a linha entre um bom mago e um grande mago ainda era muito vaga.

    Feitiços poderosos e impressionantes obviamente exigiam uma grande quantidade de mana, então um bom mago deveria ser alguém que soubesse manipular livremente enormes quantidades de mana. Mas a forma como esses feitiços eram lançados também precisava ser apropriada, ou seja, difícil e complexa.

    Em outras palavras, um bom mago era alguém que conseguia controlar muita mana e lançar muitos tipos de feitiços. Isso não estava errado. Mas para ser chamado de Arquimago, era óbvio que não bastava conhecer muitos tipos de magia; era necessário ser proficiente em feitiços tão complexos que nenhum outro mago fosse capaz de imitá-los.

    Foi então que, há trezentos anos, Sienna criou divisões claras entre os diferentes estágios de aptidão mágica. Estritamente falando, ela havia desenvolvido esse sistema para uso próprio, mas, depois de se tornar Mestra da Torre Verde, inúmeros magos de Aroth passaram a adotar seu sistema.

    Esse sistema era baseado na magia dos Círculos.

    Nele, a mana dentro do corpo era guiada em um fluxo circular, e esse fluxo servia para extrair a mana interior na hora de lançar um feitiço. À medida que a quantidade de mana que o mago podia controlar aumentava, o Círculo de mana se tornava mais espesso e forte.

    Quando a quantidade de mana controlada ultrapassava o que um único Círculo conseguia suportar, mais Círculos se formavam, e esses podiam até se sobrepor. Além disso, sempre que o número de Círculos aumentava, a quantidade de mana que podia ser incorporada a um feitiço se multiplicava exponencialmente, assim, mesmo um feitiço simples podia ter diferentes níveis de poder dependendo do número de Círculos usados para lançá-lo.

    Trezentos anos se passaram desde então, e hoje em dia a maioria dos magos era apresentada à magia por meio da fórmula dos Círculos. Os únicos que não começavam por esse sistema eram os que se especializavam em magia espiritual e magia negra, pois essas duas utilizavam sistemas mágicos diferentes.

    — Bem, não é como se houvesse outra escolha. Embora existam outras fórmulas mágicas além da fórmula dos Círculos, ao longo desses últimos trezentos anos, os Círculos provaram ser o sistema mágico mais eficaz e lógico — disse Hera com uma expressão orgulhosa no rosto.

    Lovellian não era o único que se declarava seguidor de Sienna. Todos os magos que usavam os Círculos como fórmula mágica fundamental afirmavam ter Sienna como mestra.

    A Torre Vermelha da Magia e a Torre Verde da Magia, em especial, tinham muito orgulho dessa herança.

    — …Estou pensando em tentar mudar um pouco as coisas — disse Eugene, sendo o primeiro a sair do elevador quando chegaram ao laboratório do subsolo. — Embora eu ainda não tenha certeza se vai funcionar.

    — Você vai fazer mudanças? Isso não é… não parece uma boa ideia — comentou Hera, preocupada, ao seguir Eugene para fora. — A adaptação dos Círculos é um tema de pesquisa que todos os magos tentam investigar pelo menos uma vez. No entanto, Sir Eugene, você ainda nem deu seus primeiros passos na magia… Não seria melhor começar com o método ortodoxo e só depois estudar como adaptar os Círculos, quando já tiver atingido certo nível?

    Apesar de todas essas objeções, não era porque ela achava que ele era uma criança presunçosa. Hera estava, de fato, preocupada com Eugene. Fórmulas mágicas eram tão difíceis de adaptar quanto de criar. Se ele esgotasse sua mana durante a tentativa, a fórmula mágica poderia colapsar dentro dele.

    Isso poderia resultar na perda da capacidade de usar mana pelo resto da vida ou até na morte. Mesmo que as consequências não fossem tão graves, ele ainda assim ficaria de cama por vários dias.

    Eugene tentou tranquilizá-la:

    — Bom, não é como se eu fosse desmontar tudo e refazer do zero. Prometo que não vai ser tão perigoso assim.

    — Se não for incômodo, posso saber o que exatamente você está planejando fazer? — insistiu Hera.

    — Estou planejando combinar os Círculos com a fórmula de mana da família Lionheart — Eugene respondeu sem rodeios.

    Diante dessas palavras, Hera ficou piscando, atônita, por alguns segundos.

    “…Será que tem algo de errado com a idade real dele?” Hera não conseguiu evitar esse pensamento.

    Ela já sabia que Eugene era tão precoce que era difícil acreditar que tivesse apenas dezessete anos. No entanto, ao ouvir o que ele acabara de dizer, Hera sentiu um certo estranhamento ao lembrar da idade dele.

    — …Sir Eugene. O sistema de mana usado nas artes marciais e o sistema de mana usado na magia são caminhos diferentes. Embora eu não conheça muito bem a fórmula de mana do clã Lionheart, ela ao menos incorpora conceitos relacionados a operações mágicas ou encantamentos? — questionou Hera pacientemente.

    — Não, não incorpora — Eugene admitiu.

    Hera começou a explicar:

    — Se for assim, então é impossível usar o sistema de mana do clã Lionheart para lançar magia. Embora você consiga extrair mana para o feitiço, a menos que molde essa mana conforme os princípios da magia e a dispare com um encantamento, você não conseguirá produzir nenhum fenômeno mágico.

    — Por isso quero testar a combinação dos dois sistemas — Eugene insistiu, mesmo escutando com atenção os conselhos de Hera.

    Eugene não tinha certeza de que aquilo realmente funcionaria como o planejado. Na verdade, já tinha se perguntado várias vezes se aquilo poderia mesmo dar certo. Mas havia algo dentro dele dizendo que era possível. Para verificar esse pressentimento, ele leu primeiro todos os textos introdutórios sobre magia que estavam armazenados na biblioteca.

    — Não vai ser tão perigoso assim — repetiu Eugene.

    Hera finalmente cedeu:

    — …Hah… por ora, vá em frente e tente. No entanto, se o fluxo de mana parecer perigoso, estarei pronta para intervir imediatamente. Se você se machucar, Sir Eugene, não serei só eu a me meter em apuros; o Mestre da Torre também ficará em uma posição delicada.

    — Sim, senhora.

    Eugene assentiu e parou diante de uma porta. Havia vários laboratórios lá no fundo do subsolo da torre. Escolhendo o mesmo laboratório que vinha usando ao longo do último mês, Eugene abriu a porta.

    O interior do laboratório era extremamente espaçoso. Graças à magia avançada de distorção espacial, aquele subsolo podia conter dezenas de laboratórios daquele tamanho. Embora tivesse ficado bastante surpreso em seu primeiro dia ali, Eugene agora conseguia ficar calmamente parado no centro do laboratório.

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