Índice de Capítulo

    Assim como na mansão de Sienna, a taxa para entrar na Praça Meriden era exorbitantemente cara. Por isso, não havia uma multidão lotando a praça. Embora isso se devesse em parte ao preço extorsivo da entrada, também era porque a estátua era visível à distância, mesmo sem entrar.

    Eugene sentou-se em um banco e ficou observando a entrada da praça. Ele ergueu o olhar para uma torre do relógio ao longe. Era meio-dia.

    “Está na hora dele chegar”, pensou Eugene.

    Eles haviam combinado de se encontrar ao meio-dia. Não tinha como ele não entrar só por não conseguir pagar a entrada, certo? Será que a estrada estava bloqueada por causa do excesso de gente?

    “Pelo visto, não é isso”, Eugene concluiu ao perceber algo.

    Ele acabara de notar uma figura imensa se destacando no meio da multidão. Apesar do tamanho, não havia necessidade de a figura empurrar ninguém para abrir caminho. As pessoas à frente se afastavam sozinhas, intimidadas pela imponência dele. Graças a isso, o gigante conseguiu entrar na praça sem demora.

    Eugene se levantou do banco. O gigante se aproximava lentamente.

    — É quase difícil de acreditar que é realmente ele — Eugene murmurou, genuinamente surpreso.

    A figura imensa era Gargith Lionheart. Era a primeira vez que se viam desde a Cerimônia de Continuação da Linhagem, quatro anos atrás, mas o crescimento desse cara era inacreditável.

    — Eugene? — chamou Gargith.

    — É você mesmo, Gargith? — perguntou Eugene, olhando para cima.

    Parecia que Gargith agora tinha mais de dois metros de altura. Embora ele já tivesse um corpo grande quando se encontraram pela última vez, agora Gargith era alto o suficiente para se impor completamente sobre Eugene. O botão esticado sobre os músculos peitorais inchados tremia de maneira perigosa.

    — Isso mesmo — confirmou Gargith. — Sou eu, Gargith Lionheart. Já esqueceu meu nome?

    — Não… não é que eu tenha esquecido, mas… você… você tem mesmo dezoito anos? — Eugene sentiu que precisava perguntar.

    Embora o porte de Gargith já fosse impressionante por si só, o mais surpreendente era aquela barba desgrenhada. Era mesmo possível cultivar uma barba daquelas com só dezoito anos? Eugene passou a mão nas próprias bochechas, ainda lisas e macias.

    — Já ouvi muitas pessoas dizendo que pareço mais velho do que realmente sou — admitiu Gargith.

    — Você não parece tão velho assim, mas… por que sua barba tá tão desgrenhada? Você devia aparar um pouco. Tá parecendo largado — aconselhou Eugene.

    — Não tá largado. É viril.

    — Mesmo sem barba, você já parece bem viril.

    — Valeu pelo elogio — disse Gargith com um sorriso.

    Ele estendeu uma das mãos enormes, oferecendo um aperto de mão. Quando Eugene aceitou, Gargith apertou sua mão e começou a sacudi-la vigorosamente para cima e para baixo, como se estivesse esperando por esse momento fazia muito tempo.

    — Apesar de não ser tanto quanto eu, você também cresceu bastante — observou Gargith.

    — …Você é que cresceu absurdamente — retrucou Eugene.

    — Mas é um pouco decepcionante…

    — O quê?

    — Só pelo aperto da sua mão, deu pra sentir o quanto você treinou o corpo nesses quatro anos… Mas ainda não é suficiente.

    — Tá, mas por ora, que tal soltar minha mão?

    Sacudindo os punhos ainda entrelaçados, Eugene conseguiu se soltar.

    Mas Gargith não parou de falar:

    — Apesar de seu físico estar muito melhor comparado a quatro anos atrás, ainda não é bom o bastante. Você tem negligenciado o treinamento?

    — O que você quer dizer com isso? — exigiu Eugene.

    — Eu só durmo quatro horas por dia — gabou-se Gargith com orgulho.

    O que esse desgraçado tava falando agora? Eugene estreitou os olhos, já tendo esquecido da conversa que tiveram quatro anos atrás.

    Gargith estufou o peito e continuou:

    — Tirando o tempo que passo dormindo, todo o resto é dedicado ao treinamento. Meus próprios talheres têm o peso aumentado com magia, assim como todo o resto que uso, até minhas roupas foram encantadas para ficarem mais pesadas.

    — Ah… é mesmo? — reagiu Eugene sem entusiasmo.

    — O mesmo vale pra minha cueca.

    — Que impressionante da sua parte.

    — Este corpo foi moldado com disciplina constante e esforço. Claro, só aumentar o peso que você carrega não garante que os músculos cresçam. É preciso treino adequado, descanso correto e também isto aqui — Gargith enfiou a mão no bolso interno do casaco. — O agente revolucionário de crescimento muscular da nossa família.

    Ele puxou o que parecia ser uma pequena poção. Depois de encarar o frasco com olhos orgulhosos, Gargith o ofereceu a Eugene:

    — Trouxe uma dose pra você.

    Eugene recusou na hora:

    — Não quero.

    — Por quê? O emagrecimento e crescimento muscular do Lorde Gerhard foram todos graças à ajuda da nossa família. Você já sabia disso, não sabia?

    — Agora que tocou no assunto, por favor, pare de tentar mandar essas drogas esquisitas pro meu pai.

    — Por isso eu queria entregar pessoalmente. Não importa se tomar antes da refeição, então fica com ele.

    — Já disse que não vou tomar isso.

    — Parece que você não está entendendo… Ouvi dizer que você chegou à Terceira Estrela da Fórmula da Chama Branca. Embora seja um feito impressionante, além de treinar sua mana, você não pode negligenciar o treino do corpo.

    — Vou levar seu conselho em consideração, então guarde essas drogas suspeitas pra você.

    Eugene acabou conseguindo recusar a poção.

    Sem vontade de continuar ouvindo Gargith tagarelar sobre músculos, Eugene foi direto:

    — Então por que você quis marcar esse encontro? Não me diga que veio até Aroth só pra tentar me empurrar essa droga.

    Ele havia recebido uma carta de Gargith alguns dias antes. Nela, Gargith dizia que viria a Aroth por motivos específicos e sugeria que se encontrassem depois de tanto tempo.

    — Eu também tenho outra coisa para fazer — confirmou Gargith.

    — O quê? — perguntou Eugene.

    — Lembra do que te falei há um tempo? O agente revolucionário de crescimento muscular da nossa família foi criado por um alquimista famoso de Aroth — Gargith disse, guardando a poção de volta no bolso interno com pesar. — Mas agora que meu corpo cresceu, a fórmula atual não atende mais às minhas necessidades. Quando informei isso ao alquimista, ele disse que ajustaria a mistura para se adequar ao meu corpo.

    — Então você veio se encontrar com esse alquimista? — confirmou Eugene.

    — Essa é minha tarefa principal, mas tenho outras coisas também.

    — Parece que tá cheio de compromissos.

    — É que Aroth fica muito longe. Já que vim até aqui, é melhor garantir que o tempo gasto na viagem valha a pena.

    Cada passo de Gargith parecia fazer o chão tremer levemente. Quando ele se aproximou, Eugene deu um passo para trás.

    — Por que está se afastando de mim? — perguntou Gargith.

    — Você tá fedendo — reclamou Eugene.

    — Isso não é fedor. É o cheiro de um homem.

    — Usa um perfume, então.

    — Por que tá falando a mesma coisa que a Dezra…?

    Eugene mudou de assunto:

    — Enfim, que outras tarefas você tem?

    — Hm — Gargith não respondeu de imediato e olhou ao redor.

    As outras pessoas na praça estavam olhando na direção deles. Apesar de não usar roupas formais da Família Lionheart, Gargith era tão enorme que chamava atenção por onde passava.

    Gargith abaixou a voz e perguntou:

    — …Você sabe algo sobre a Rua Bolero?

    — Já ouvi falar — respondeu Eugene.

    Era o lugar onde aquele bastardo mimado, Eward, costumava ir pra se divertir.

    — E já ouviu dizer que há uma casa de leilões lá? — continuou Gargith.

    Eugene hesitou:

    — Mais ou menos. Tá querendo comprar algo de lá?

    — Ouvi rumores de que os testículos de um gigante serão exibidos no próximo leilão.

    — Test… o quê?

    — Os testículos de um gigante.

    — Por que caralhos você quer comprar uma coisa dessas?

    — Você não sabia? Os testículos de gigante têm um grande valor mágico.

    — Você não é do tipo que compraria isso por causa de magia, né?

    — Exato. Pretendo entregar esses testículos ao alquimista.

    Se estavam falando de gigantes, Eugene também os conhecia bem. Eram tão raros quanto elfos, mas com uma natureza completamente oposta. Trezentos anos atrás, toda a raça havia jurado lealdade ao Rei Demônio da Destruição.

    Embora a jornada deles não tenha chegado até o Rei Demônio da Destruição… enquanto vagavam por Helmuth, Hamel e seu grupo entraram em confronto com os gigantes algumas vezes. Eles eram capazes de resistir a qualquer tipo de magia apenas com os corpos nus e podiam até derrubar montanhas com um simples grito.

    — Vamos juntos — sugeriu Gargith.

    — Ir onde? — perguntou Eugene.

    — Tô falando da casa de leilões. Apesar de eu ter trazido bastante dinheiro, talvez não seja o suficiente pra vencer o lance.

    — Então você quer que eu te empreste dinheiro?

    — Juro pelo meu nome que vou pagar com juros.

    — Não quero.

    — Tô até disposto a me ajoelhar e implorar.

    O corpo de Gargith começou a se abaixar. Eugene empalideceu e rapidamente o segurou pelos ombros.

    — Tá bom, entendi, então não faz algo tão chamativo. Além do mais, que história é essa de um brutamontes que nem você se ajoelhar tão fácil — exigiu Eugene, nervoso.

    — Valeu — disse Gargith com naturalidade.

    — Tá me agradecendo por quê? Por ter aceitado te emprestar dinheiro?

    — Tô agradecendo por me chamar de brutamontes. Isso não foi um elogio?

    De qualquer ângulo que se olhasse, Gargith realmente parecia um descendente de Molon.

    — Além dos testículos de gigante, ouvi dizer que outros itens vão aparecer também — comentou Gargith.

    — Ah, é mesmo — respondeu Eugene, sem interesse.

    — Você não tá nem um pouco curioso? Mas também, com a Wynnyd em mãos, deve ser difícil se interessar por armas comuns.

    — Fora a Casa de Leilões, tem outro lugar na Rua Bolero que me interessa — disse Eugene, caminhando à frente de Gargith.

    Não era porque achava que continuar a conversa seria inútil; era só que o cheiro corporal de Gargith era forte demais.

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