Capítulo 10 - A Vontade
Poucos segundos após chegarem ao castelo de Garhata, mais especificamente no cume da maior torre, onde era possível ver perfeitamente a borda da floresta das árvores colossais, Sally se esforçava para estancar o sangramento nasal de Kenji. Ela apertava moderadamente a cartilagem de suas narinas enquanto mantinha um braço atrás de suas costas para que permanecesse sentado.
Como em um despertar de um pesadelo, Kenji acordou! E Sally permaneceu ao seu lado, seus rostos apenas alguns centímetros de distância.
— Você ouviu aquilo? — ele perguntou.
— Apenas você gemendo como uma porca doente no meu ouvido. E limpe o seu rosto. — Ela levantou-se e deixou que a leve brisa limpasse seus pulmões, depois, olhou para trás.
Um enorme prisma pentagonal, fragmentado em pedaços maiores e menores, flutuava alguns metros acima do chão. A estrutura translúcida, tingida de violeta, parecia ter sido alvo de um forte impacto. No entanto, um grande pedaço na parte inferior permanecia intacto. O prisma era imenso, grande o suficiente para caber seis elefantes alinhados um sobre o outro.
Depois de limpar todas as áreas sensoriais que estavam sangrando, Kenji se colocou de pé e perguntou: — O que é essa coisa? — Entretanto, algo subitamente roubou a atenção de seus olhos e jogou sua curiosidade para um canto vazio de sua mente. — Ainda bem que você tirou aquela trança ridícula. Assim fica bem mais elegante.
Quando Sally o ouviu comparar a trança única com o seu atual coque despojado, houve uma rápida contração em sua têmpora enquanto se virava, com as sobrancelhas levemente franzidas.
— Cale essa boca, você só fala merda. A trança é, sim, mais elegante.
— Não é. Principalmente com um terno! Um coque é mais social e minimalista. — Ergueu um dedo em esclarecimento.
Sally tentou argumentar, mas logo percebeu que apenas estava perdendo tempo com uma discussão tão medíocre.
— Eu não vou… discutir com você! — Endireitou as costas, em seguida, exclamou: — Temos que ir até a sala do trono. A família real está tentando roubar a mana e feitiço dos Elfos Pálidos. Ou seja, todo o conhecimento deles.
— Com aquela coisa ali? — Kenji apontou para o prisma.
— Exato.
— E teremos que lutar?! Sou muito bom nisso! — Flexionou os bíceps, admirando os mesmos com um sorriso orgulhoso.
Imediatamente, Sally desviou o olhar enquanto escondia parte de seu rosto com a mão. Seus lábios viraram uma linha fina.
“Que vergonhoso… Com certeza nunca teve amigos.”
Sua mão desceu até sua gravata para a ajeitar na tentativa de recuperar a postura. E para tentar esquecer o que viu, trouxe o assunto principal de volta.
— Se eles tentarem algo, vamos usar, sim, a força.
No momento em que Sally se moveu em direção às escadas, claramente preocupada com toda a situação sobre os Elfos Pálidos e o prisma, Kenji se recordou de algo; uma dúvida que deveria ter perguntado a ela desde vagavam pela floresta.
— Ei, Sally. Como você sobreviveu à nevasca? Você pode usar magia?
A pergunta repentina pegou Sally desprevenida, mas ela optou por respondê-lo sem delongas. Afinal, todos merecem no mínimo um pouco de conhecimento, não é mesmo?
— Vamos por partes — ela começou, e antes que continuasse, entrelaçou os dedos e os estalou. — Todos nós possuímos vontade, mas apenas poucos nascem com a capacidade de trazê-la à realidade. Tive vontade de não querer sentir frio, então eu não senti frio. É claro que há limitações e poréns.
À medida que ela explicava, os olhos de Kenji se iluminavam. Ouvir estas informações o encheu de um entusiasmo silencioso.
— A Vontade também possui um segundo estado. Trata-se do usuário transfigurar A Vontade para um estado físico, chamado Mugen. A quantidade de coisas que se pode fazer com ele é inacreditável. Daí vem o seu significado, ilimitado.
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O combate entre Jax Bennett e Caspian Crowwell prosseguia enquanto os nobres, aristocratas e o alto clero fugiam pela entrada principal.
Uma aura semelhante a muco emanava dos corpos de ambos — A Vontade materializada.
Apesar de ter levado um soco no rosto, era inquestionável que Jax estava empolgado e confiante o suficiente para não manter nenhuma postura de ataque ou defesa, mas permanecia em uma posição provocadora, como se estivesse zombando indiretamente do príncipe, que ofegava, pois seu corpo estava à beira de alcançar o limite.
— Você é um fracasso! — Jax exclamou, havia uma decepção subjacente à provocação. O fato de Caspian já estar exausto o desanimou.
De repente, a distância de 5 metros os separando deixou de existir! Caspian se espantou com a velocidade surpreendente dele.
“Rápido demais!”, gritou em sua própria mente e jogou seu torso para trás. Ele reagiu a tempo para retroceder o espaço e impedir que o soco de Jax o atingisse. E contra-atacou com um chute no pescoço dele!
Caspian estava ciente; ficar tão próximo do caçador era perigoso. Então optou por recuar ao máximo após atingi-lo com o tornozelo, deu passos firmes para trás, mantendo a calma acima de tudo.
Depois de ajeitar o gorro, Jax pôs a mão no pescoço onde havia sido atingido. Ele ponderou, e soltou uma gargalhada assim que um pensamento cruzou sua mente.
— Quando eu vi você, achei que fosse uma garota! — afirmou, se recuperando da euforia aos poucos. — Gostei do cabelo, princesa.
Ele não queria ouvir a resposta do príncipe, e então, bateu palmas, ao separá-las, pequenos raios conectavam ambas as mãos como se fossem duas bobinas de Tesla. A sua aura tomou uma forma elemental: eletricidade.
No entanto, não foi o suficiente para abalar Caspian. Calmo como a água parada, ele se posicionou defensivamente, semelhante a uma postura defensiva de karatê. Sua aura deixou a forma de muco e fluiu como um rio sereno.
Embora desconfiasse de algo, Jax não demonstrou cautela. O fato de Caspian ter, propositalmente, alterado as propriedades de sua aura para água assim que assumiu ele um estado elétrico, o fez se questionar:
“Será que esse otário sabe que as qualidades do elemento são atribuídas à aura? Será que… Não. Isso é impossível, ninguém nessa era nunca conseguiu. Mas nada disso importa agora! A vantagem é minha!”
Caspian sentiu um calafrio torcer suas costelas. Subconscientemente, entrelaçou os dedos!
“PRISÃO TRIDIMENSIONAL.”
Jax desapareceu de seu campo de visão! Tão veloz que, se ele não tivesse prendido seu corpo em um cilindro oco retrocedendo o espaço velozmente, o caçador acertaria um soco carregado de eletricidade em sua aura.
Jax recuou com uma carranca, e pensou:
“Por mais que eu seja mais rápido que a velocidade que o espaço retrocede, não consigo ultrapassar a barreira dele. É grossa como uma parede de concreto.”
Era como se ele estivesse tentando acertar o fundo de uma piscina com a bala de um revólver.
A visão de Caspian estava turva, seus joelhos poderiam a qualquer momento derrubar seu corpo pela trepidação dada à fadiga. Entretanto, ele ainda estava disposto a tentar uma última coisa. O motivo de ter se colocado na desvantagem, era porque precisava provocar Jax e mantê-lo o mais próximo possível.
“Eu vou quebrar o Dom desse desgraçado e estilhaçar esse rostinho bonito!!”, afirmou Jax, eufórico, com um sorriso malicioso marcando seu rosto.
Caspian usou suas últimas forças para realizar um combate corpo a corpo, mas comprimiu sua aura antes que ambos avançassem no mesmo instante. O espaço retrocedia numa velocidade absurda, protegendo sua aura e corpo. Os ataques de Jax eram quase que repelidos!
“Ele comprimiu sua aura!?”, Jax recuou rapidamente, fechou o punho, concentrou metade de sua aura no mesmo e, sem hesitar, encurtou a distância entre eles em um segundo.
Ele havia subestimado Caspian, o permitindo que desativasse a técnica de seu Dom enquanto regredia o estado de sua aura aguada para muco.
O príncipe desviou a direção do punho de Jax com as costas de sua mão, e com a livre, usou para desferir um soco preciso, reforçado pelo seu Dom — distorcer o espaço para alterar sua velocidade.
Foram praticamente o peso de vinte socos em um no peito de Jax que foi arremessado em direção ao trono. Como um tiro de canhão, seu corpo colidiu com os dois últimos degraus antes de se chocar com o próprio trono de ouro.
A poeira cinzenta dos estilhaços dos degraus se espalhou lentamente, envolvendo o seu corpo, que jazia sobre os destroços do trono. Foram alguns segundos tensos e silenciosos até a poeira finalmente descer.
Como se o ataque do príncipe não fosse nada, Jax se levantou lentamente. O gorro preto caído, revelando fios de seu cabelo marrom-dourado caindo sobre sua feição inexpressiva. Seus olhos fitaram Caspian, de joelhos próximo aos escombros do portão.
Caspian acreditou que poderia vencê-lo com um golpe certeiro, mas ele estava redondamente enganado. Se aproveitar da ignorância de Jax não foi o suficiente para alcançar a vitória.
Ao se erguer enquanto devolvia o gorro à sua cabeça, Jax estalou suavemente o pescoço e disse: — Nunca pensei que poderia lutar contra alguém tão chato. Eu prometi a uma pessoa que nunca mataria sem um bom motivo. Mas vocês tentaram roubar a magia dos Elfos Pálidos. Ela e os administradores do Pilar do Leste vão entender. Matar você não vai fazer mal. — Em seguida, apontou o dedo indicador para Caspian, sinalizando uma arma prestes a puxar um gatilho.
O príncipe permaneceu em silêncio e curvou a cabeça em vergonha pela sua derrota.
Uma faísca de eletricidade se acendeu na ponta do dedo de Jax, mas ele interrompeu o sinal de mão quando sentiu uma pressão em suas costas, rapidamente atravessando o peito. Um som úmido e viscoso ecoou por toda a sala do trono.
Olhou para baixo e viu — sem esboçar reação nenhuma — uma espada prateada empalando seu peito. O sangue tingia sua roupa preta, tornando vinho por onde escorria.
Ao remover a espada do peito de Jax, a figura chutou a dobra de seu joelho, o derrubando escada abaixo. Seu corpo rolou violentamente pelos degraus, para enfim ser interrompido pelo chão com um impacto seco.
— Levante-se e limpe seu traje real, irmão. Nosso pai nos espera para executar o feitiço — exclamou Cedric.
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