Capítulo 11 - Vingança de prato quente
Sally Dakis e Kenji Hayashi percorriam pelo corredor bem iluminado. As janelas, sem vidraças, no formato de meia-lua se alinhavam em fileiras de ambos lados, permitindo que a luz morna do fim da tarde pairasse o tapete vermelho que se estendia por todo o piso rochoso.
Kenji estava deprimido por conta da frustração que sentia. Enquanto descansava as mãos nos bolsos, soltou um bufo e olhou para a cidade através das janelas, acompanhando Sally.
— Por que precisa de sorte para ter A Vontade? Não existe nenhum treinamento mágico ou algo do tipo? — ele indagou.
— Se você não nasceu com a capacidade de usar A Vontade, então desista. Não há nenhum outro meio de conseguir.
— Então como eu posso aprender magia?
Assim que ele disse “magia”, Sally o lançou um olhar irritado.
— Muitos não sabem a diferença entre magia, mana e feitiço. Apenas desconsidere magia. Finja que não existe. Não mexa com algo que até demônios temem.
Kenji a respondeu com uma carranca ao aviso dela. E ela continuou dizendo: — Leva cerca de uma década para dominar o básico da mana e assim ter a capacidade de executar feitiços simples. É por isso que na Sociedade dos Magos, se tem contato com a mana logo após o nascimento.
— Eu não ligo. Se é tão difícil assim aprender a usar mana, então eu vou me garantir usando somente o meu Dom.
— Você é irritante, sabia? — Sally resmungou e, abruptamente, ambos interromperam seus passos simultaneamente.
Seus olhares espantados cruzaram com os do Rei, Elizabeth e os conselheiros. Eles estavam na curva do corredor que levava para o interior do castelo.
A princesa trancou a garganta em tensão, o Rei encheu-se de um aborrecimento exalando na forma de uma carranca torta, e os conselheiros, aristos, puseram as mãos debaixo das mangas dos mantos.
— Peguem os invasores! — berrou o Rei, apontando para o espaço entre Kenji e Sally.
Com o avanço dos conselheiros pela ordem do Rei, Sally pensou rápido; abriu a palma da mão e bateu na janela. O impacto foi forte o suficiente para estilhaçar toda a lateral da mesma. Um conselheiro caiu após ser atingido por dois pedaços de pedras, e deixou cair sua adaga que quicou na direção de Kenji. O restante deles recuaram por conta dos estilhaços que ao acertarem a pele sob o tecido azulado, a perfuraram.
Elizabeth agarrou o pulso do Rei, seus dedos delegados mal envolveram a carne suada. O puxou para a direção contrária de toda a confusão, exclamando: — Vamos sair daqui!
Sally, vendo a fuga deles através das frestas dos mantos, agiu depressa; deu um tapa desleixado no peito de Kenji, uma forma de dizer indiretamente que confiava nele.
— Cuide desses idiotas. Eu vou atrás da família real.
Ela atirou-se como uma bala em direção aos conselheiros, agachou habilmente e saltou sobre eles. Pasmos com a agilidade e velocidade impressionante, optaram por enfrentar o garoto ao invés de persegui-la e arriscar suas vidas protegendo o Rei.
Mas eles também o temiam, e não era pela estatura e força física de Kenji. Havia uma incerteza sobre ele — será que possuía um Dom ou tinha algum conhecimento de mana? Essa dúvida os obrigou a permanecerem sempre em alerta.
Kenji caminhou até a adaga caída e a pegou pelo gume, e garantiu sua proteção ao assimilar as propriedades de seu corpo ao aço.
Impulsionado pelo medo e dúvida, um dos conselheiros decidiu descobrir por conta própria do que ele era capaz. Escondeu sua adaga sob a manga do manto e se aproximou de Kenji com passos velozes.
E Kenji permitiu ser atingido na clavícula, para então, com um movimento rápido e certeiro na ponta do queixo, nocauteá-lo. Em seguida, inclinou a cabeça para examinar a região onde havia sido atingido. Sua camisa rasgou, deixando à mostra um pequeno arranhão, semelhante a um risco feito em um aço maciço.
— Se vocês se renderem, será bem melhor para ambos os lados, não acham? — sugeriu ele, genuinamente desejando evitar um confronto.
O Rei caiu de exaustão, fadigado, respirando como um touro doente contra a parede áspera. Os lábios inchados escorregaram até finalmente alcançarem o chão. Elizabeth não ousou olhar para trás e seguiu correndo, levantando a barra do vestido esverdeado para ter maior mobilidade, mas para o seu azar, o salto-alto quebrou. Seu corpo tenso e delicado caiu com um tombo abafado.
Sally alcançou ambos e, ciente de que os Crowwell eram quatro, permaneceu atenta, indagando a si mesma sobre onde estavam os outros dois. Era pai, filho primogênito, filha do meio e caçula. A rainha havia morrido por causas misteriosas há dois anos.
Sally pressionou o pescoço do Rei com os dedos médio e indicador, e assim retirou sua consciência. Entretanto, talvez nem precisasse utilizar esta técnica, pois provavelmente, ele desmaiaria pela fadiga.
Rastejando instintivamente, Elizabeth se sentiu uma presa. À medida que as lágrimas desciam por sua bochecha, lembrou-se das várias histórias que sua mãe lhe contava, histórias incríveis sobre os Caçadores. E em todos os relatos, eles eram glorificados: “As Bestas que matam bestas”, “Os Pilares da Paz”, “Anjos de Carne”, “Aqueles acima do Zodíaco”.
Um pensamento de que um dia seria perseguida, ou estivesse tão à mercê de um caçador, nunca cruzou a mente dela.
Não houve tempo para súplicas. Sally abaixou-se ao seu lado e, com a mesma frieza com que lidou com o Rei, a apagou.
— Vocês vão ficar bem. — Levantou-se, recuou um passo e deu uma rápida análise nos corpos sem consciência. O fato de que tentaram roubar a mana e os feitiços dos Elfos Pálidos, a decepcionou. Era como se fosse a última coisa que ela esperaria deles.
“A Trindade retirou tudo de vocês. Os proibiu de terem um exército, grimórios e até mesmo de terem uma linha de defesa. Como que conseguiram um Prisma de Onírico?”, refletiu consigo, e continuou: “Tem um grimório poderoso por aqui… Onde será que vocês o esconderam? E como o conseguiram?”
“Isso me cheira a algo podre”, ao sair de seus pensamentos, olhou para o fim do corredor extenso adornado por várias portas ao lado esquerdo. E avistou Cedric e Caspian. O príncipe caçula, ofegante, apoiou o braço na parede. No entanto, com uma leve cotovelada de Cedric em sua costela, ele foi obrigado a mais uma vez se preparar para lutar.
E seu irmão mais velho puxou a espada prateada da bainha.
Sally analisou atentamente o estado deles com base em seu conhecimento; estava ciente de que Caspian possuía um Dom, mas pelo seu estado deplorável, não estava em condições para lutar. Quem lutou contra ele? Ela não sabia, mas suspeitava que fosse um caçador, embora ainda hesitasse na possibilidade dessa ideia, pois um caçador jamais perderia para ele. A espada nas mãos de Cedric tinha um design élfico, contudo, parecia ser falsa. Afiada como uma, quebradiça como bronze.
Cautelosamente, eles encurtaram a distância até ficarem separados por exatos 5 metros.
Sally tinha como primeira e única opção, desarmar Cedric, quebrando sua espada com um único ataque embutido com aura. Caspian não oferecia perigo.
No instante em que ela se moveu para atacar, a própria recuou rapidamente. Todo o raciocínio e foco foram rasgados pelo que estava diante de seus olhos!
— O que faz aqui, Jax? — exclamou quase incrédula, como se o odiasse.
Ele a ignorou.
Os príncipes deram um rápido giro em direção a Jax, a quem juraram ter matado. Tomados pela indignação e medo, encurralados, optaram por se guardarem recostados um nas costas do outro. Caspian voltado para Sally, e Cedric para Jax.
O único indício de que foi apunhalado pela espada de Cedric, era a roupa preta rasgada e manchada de sangue, pois o seu peito estava sã. Debaixo do sorriso de deboche, havia uma raiva avassaladora. Ser ferido covardemente não fazia parte de seus planos, por isso ele não deixaria barato pelo que lhe fizeram.
— Eu altero as condições. — Jax juntou suas mãos, as palmas viradas para cima, como se estivesse entregando algo valioso a alguém.
Assim que ouviu as palavras dele, Sally não pensou duas vezes e se jogou de bruços no chão. Ela anulou qualquer possibilidade de seus olhos absorverem uma única partícula de luz, envolvendo seu rosto com os braços.
A ação repentina dela deixou Caspian confuso, até um pouco assustado. Ele virou-se rapidamente para ficar ao lado de seu irmão, que apontava medrosamente sua espada para Jax.
“FEIXE DE LUZ ÂMBAR DE MIL JARDAS”
Um intenso clarão âmbar explodiu acima das cabeças dos príncipes! Cegou e os deixou completamente desorientados! A explosão de luz foi tão absurda que Kenji tropeçou e caiu no chão, sobre os conselheiros inconscientes e repletos de hematomas.
No momento de mais fragilidade dos príncipes, Jax se aproveitou para quebrar o braço direito de Cedric e deslocar seu ombro, logo após, o seu estômago, fígado e nariz foram maltratados por diversos socos.
Caspian foi o próximo! Um chute impiedoso quebrou suas costelas e o arremessou contra a porta, que rompeu com o impacto.
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