A mansão em que Jade Valderbilt se referiu ficava a 73km de Ravenwell, isolada em meio ao deserto negro. De fato, a arquitetura gótica acentuava o ambiente monótono, uma combinação ridiculamente perfeita. Embora estivesse afastada da cidade, o exterior da mansão se encontrava bem cuidada, sem danos visíveis da “pequena” guerra. Assim como a enorme varanda de mármore, intacta e varrida, adornada com espécies nunca antes vistas de samambaias, plantadas em vasos de prata. 

    Havia no total três entradas principais, todas situadas lado a lado. E tinha somente uma porta dos fundos, camuflada com a cor morta das paredes da mansão, mas era grande o suficiente para não passar despercebida, não foi difícil para Jax Bennett encontrar e entrar por ela.

    O interior da mansão era absurdamente silencioso, portanto, os passos de Jax geravam ecos constantes, pois ele não interrompeu seu curso para examinar a beleza tenebrosa dos móveis, das gárgulas sobre os pedestais próximos às escadas, e das enormes janelas adornadas por cortinas negras.

    Ele permaneceu indiferente, observando pelos cantos dos olhos, ocasionalmente, em busca de algo interessante, ou talvez, subconscientemente alerta para qualquer perigo que pudesse estar à espreita.

    Depois de subir as escadas, seus olhos ganharam um brilho malicioso acompanhado por um sorriso largo ao avistar uma fileira de pedestais contendo objetos precisos, protegidos por uma cápsula de vidro.

    “Que beleza!”

    Ele não perdeu tempo e se aproximou, levando a mão até a cápsula que guardava um colar de pérolas sobre uma pequena almofada vinho, apenas para ser interrompido por uma voz furiosa e aguda, escondendo o medo subjacente à falsa coragem.

    — Não toque aí!

    No mesmo instante, os olhos de Jax ganharam um leve aborrecimento. Os mesmos encararam a moça vestindo um uniforme clichê de empregada. Ela apontava para ele com um espanador de penas, bem, era a melhor coisa que tinha em mãos para se defender. 

    Seus olhares se cruzariam se não fosse pelo fato dos olhos de Jax estarem vagando pelo corpo dela. Internamente, ele estava decidindo o que faria. Uma decisão que para ele era fácil demais decidir, como escolher o que comeria no jantar. E obviamente, essa perversão não passou despercebida pela empregada.

    — Para trás, seu degenerado pervertido!

    A distância entre eles se encurtou mesmo quando a empregada tentou manter distância. As tábuas rangeram com o recuo tenso e instável, como se suas pernas estivessem implorando para fugir, e ela fugiria, se não fosse agarrada nos pulsos e jogada contra a parede.

    — Qual é o seu nome, gracinha? — Jax sussurrou.

    Os gemidos e súplicas escapando dos lábios rosados apenas serviram para intensificar o aperto de Jax, como se a relutância dela o excitasse.

    O único aviso de que seu pescoço fino e pálido seria violado, foi o seu pulso sendo torcido ao ponto de quase quebrar; uma mordida transbordando luxúria tingiu sua pele de vermelho sob a saliva e hematoma de um chupão maldoso. Mas não importava o quanto ela implorava, o quanto gemia de dor, o quanto choramingava — ele continuou.

    A mão rude, livre, escorreu pela cintura delicada, quadril e coxa, até o barrado do vestido. Levantou o mesmo, revelando parte de sua veste íntima.

    O corpo ofegante e trêmulo da empregada, já sem forças de tanto lutar, esmoreceu nas mãos de Jax.

    Sua visão começou a rodopiar como se tentasse expulsar o vômito de uma ressaca, e suas pálpebras caídas, quase mortas, foram guardadas pelo suor. O mesmo escorreu e umedeceu suas bochechas vermelhas pelo esforço excessivo, em seguida, limpas pela língua de Jax que deixou um rastro de saliva.

    Para ele, era necessário primeiro provar da pele, carne e dor, já que a situação não permitiu uma conversa que levasse a atos depravados. Seus dentes desejavam cravar naquela carne de cordeiro, devorar o sangue e retirar o bem mais preciso — o coração.

    Beijou o queixo da moça. Os lábios dele escorreram pelo pescoço suado, descendo até o seio coberto, os dentes cravando no mamilo através da roupa. A mão livre, a que não estava torcendo o seu pulso frágil com tanta crueldade, caiu lentamente, os dedos roçando o tecido de suas vestes, passando pela barriga tensa, quadril, região pubiana, até encontrar…

    — Solte ela, agora!

    A ordem abrupta interrompeu as ações de Jax que inclinou o pescoço para trás e encontrou o olhar de outras três empregadas, furiosas. Uma delas segurava um revólver. Ele não sabia, mas ela já havia apertado o gatilho e estourado sua cabeça com aquela bala de prata. O olhar com sede de vingança, e um ódio escancarado nas pupilas dilatadas, exalavam um profundo rancor pelo tipo de homem que Jax era.

    E Jax, sem dar a mínima para esta empregada e seu revólver, largou a moça desesperançosa no chão, como se fosse uma fruta que não agradou seu paladar. Imediatamente, uma das amigas dela correu para arrastá-la para longe dele.

    — Tudo bem, tudo bem. — Ergueu as mãos em rendição, claramente zombando. — Sabe, ne…

    — Calado, seu porco imundo! Eu vou matar você se não calar a droga dessa boca! — gritou a empregada armada enquanto seu dedo tremia de antecipação para apertar o gatilho.

    Jax soltou um longo assovio, surpreso pela agressividade dela.

    — Quem é você?! Não pense que vai sair daqui ileso! — ameaçou a empregada de joelhos, abraçando sua amiga inconsciente.

    — Beatrice, atira nele! — gritou desesperadamente a última empregada, de cachinhos dourados.

    — Fiquem quietas! Eu não quero manchar o tapete com o sangue desse canalha! — esclareceu Beatrice, sem tirar os olhos de seu alvo que sorria zombeteiramente. — Vamos levá-lo até a Sra. Lenora.

    E assim elas fizeram, conduziram Jax até os aposentos da Sra. Lenora. Apesar de ter uma arma apontada para sua cabeça, Jax poderia facilmente desarmar Beatrice em um piscar de olhos. No entanto, ele escolheu deixar ser levado, como se tudo não passasse de um mero jogo para entretê-lo.

    A empregada com o revólver em mãos, Beatrice, a mais velha entre as quatro, não vacilou sua mira nem por uma fração de segundos, porque ela queria — matar — o homem que violentou sua querida amiga. Sophie, a de cachinhos dourados, a seguia colada em suas costas, bisbilhotando o molestador como se tramasse esfaqueá-lo pelas costas. E Evie, que não estava as acompanhando, arrastava Grace, a molestada, em direção a um quarto seguro.

    Todo o curso até a provável chefe das empregadas foi longo e quase cansativo para Beatrice, pois ela nunca havia erguido a mira de uma arma por tanto tempo, e essa era a primeira vez que apontava para a cabeça de alguém. E Sophie ainda lançava pensamentos homicidas nas costas de Jax.

    — Abra a porta — ordenou Beatrice.

    Sem relutância, ele abaixou uma das mãos e levou até a maçaneta, sorrindo para a mesma por um instante antes de abri-la. 

    Todo o enorme quarto se encontrava coberto por uma penumbra, sendo as únicas fontes de luz, a lamparina de querosene sobre a cômoda ao lado da cama de casal, e a que vinha da recente porta aberta.

    Abruptamente, Jax Bennett arregalou os olhos ao avistar a mulher recostada na cabeceira da cama, com um diário descansado em seu colo. Uma carranca confusa rasgou seu sorriso presunçoso, sucumbindo todo seu humor. Neste momento, ele havia esquecido a presença de ambas empregadas, até que Beatrice o lembrou da situação que se encontrava, exclamando: — Senhora, este homem abusou da Grace! Por favor, me deixe matá-lo!

    As pálpebras cansadas de Lenora se abriram com esforço. Seu cabelo quebradiço, ressecado, sem um resquício de volume, se moveu à medida que ela virou com preguiça o rosto magro em direção à visita inesperada. Enfim, ao separar os lábios, inúmeras tosses violetas forçaram a inclinar seu corpo para frente, interrompendo as palavras que iriam sair de sua boca, o que fez com que Sophie corresse até a cômoda e abrisse a primeira gaveta, pegando e colocando ao lado da lamparina, respectivamente; três cartelas de remédio, uma garrafa de água e um copo de barro. 

    Embora Beatrice pudesse ouvir as tosses secas de sua senhora, seu semblante enraivecido não vacilou, nem mesmo o dedo no gatilho do revólver.

    Lenora jogou três comprimidos na boca, inclinando a cabeça para trás, em seguida, com a ajuda de Sophia, bebeu o copo de água e engoliu os remédios de uma vez. 

    Após uma série de suspiros ofegantes, Lenora a dispensou com um sorriso antes de levar sua atenção para Jax, que presenciou toda a cena sem dizer uma única palavra. Havia em seu olhar uma surpresa e confusão genuína.

    — Por que você é assim? — disse ele.

    Sua pergunta intensificou o ódio das duas empregadas que, apenas não surtaram e gritaram, porque Lenora ergueu sua mão exausta.

    — Por favor, se acalmem…

    — Perdão, Sra. Lenora — elas disseram simultaneamente.

    — Beatrice, por favor, abaixe o revólver.

    Beatrice hesitou, perturbada com a passividade e calma que Lenora estava agindo diante de uma situação tão grave.

    — Ele… ele molestou a Grace… — Abaixou o revólver.

    — Por favor, nos deixem a sós — disse Lenora.

    Depois de uma série de dúvidas percorrendo a mente das empregadas, elas cederam, mas é claro, não antes de ameaçarem Jax de morte com os cantos dos olhos, quase uma promessa que logo iriam cumprir.

    Após saírem sem fechar a porta, Lenora se posicionou para se sentar na borda da cama, os lençóis de seda envoltos aos seus tornozelos foram puxados no processo. Embora a iluminação fosse fraca e Jax estivesse um pouco distante, ele pôde ver sua camisola branca, amarfanhada, tingida de laranja pelo fogo da lamparina, revelando seu corpo magro, doente e pálido.

    Todo o ambiente ficou mergulhado em um silêncio desconfortável, sendo quebrado apenas pelo crepitar suave e quase inaudível da lamparina. A luz natural que atravessava a porta iluminava apenas uma pequena parcela do quarto, sendo assim, eles permaneceram cobertos pela escuridão.

    — Estou enojada pelo que fez a Grace, mas vou o dar a chance de você se redimir se me fizer um favor. — Lenora sugeriu, sem manter contato visual, como se estivesse tão fraca ao ponto de ter dificuldades para levantar os olhos, assim como seu corpo débil pela fadiga infindável.

    — Se olhe num espelho, mulher, você fede e parece um cadáver. Quem pensa que é para querer barganhar comigo? E eu não quero o perdão de ninguém — protestou Jax, retirando o gorro e penteado seu cabelo para trás com os dedos, antes de recolocá-lo na cabeça novamente, um claro sinal de estresse.

    — Por favor, aceite, porque quando buscar fazer o bem poderá ser tarde demais. — Duas tosses ligeiras e mal contidas pela palma da mão a interromperam por um momento, e então ela continuou: — Apenas me leve para ver o pôr do sol… 

    Jax se aproximou, e com um movimento rápido agarrou a lamparina, inclinou o torso, e deixou a fonte de luz tênue próxima ao rosto dela, para que pudesse ver sua feição com nitidez.

    — Escute bem, por que não coloca essas pernas para funcionar e faça você mesmo? Arrisque.

    Um minuto de silêncio surgiu com a sua pergunta. Com um suspiro fraco, ela respondeu: — Porque o câncer deixou meus ossos tão frágeis quanto a lasca de uma árvore.

    Jax, com um leve espanto, se afastou sutilmente, entendendo o porquê dela estar confinada neste quarto, mas não era como se ele se importasse. E ponderou por longos segundos, antes de devolver a lamparina para a cômoda.

    — Poderia pedir ajuda para suas empregadas — sugeriu, seu tom aborrecido, como se estivesse com raiva dela, como se achasse que ela tinha culpa por estar naquela situação.

    — Meu marido as puniria. Não quero que elas se prejudiquem por minha causa. Mas você pode ir embora assim que me deixar lá fora… Estará fazendo um favor incalculável para mim, garanto que vai se sentir bem fazendo o que é certo.

    — O que é certo? — Jax desdenhou abruptamente — Eu já faço o que é certo, realmente, é prazeroso fazer o que é certo. Afinal, eu respeito o meu bel-prazer.

    Lenora tentou rebater Jax, mas ele a cortou, erguendo o dedo indicador, e zombando: — Você é uma cadela, tem medo do que o maridinho pode fazer com as empregadas. Apenas dê uma simples ordem e saia dessa mansão horrível antes que ele volte.

    O semblante de Lenora caiu lentamente, e seus poucos fios de cabelo escorreram para frente de sua face entristecida. As pálpebras cansadas se fecharam, escondendo seus olhos sem vida.

    — Eu tenho pena de você. Eu tenho muita pena… de você…

    As tábuas rangeram com dois passos rápidos em sua direção. Uma mecha de seu cabelo frágil foi agarrada. Ela se viu obrigada a erguer a cabeça, seus olhos se abriram pela dor aguda, como se todo seu couro cabeludo estivesse sendo perfurado por mil agulhas frias.

    De repente, uma força invasora e estrondosa segurou o pulso de Jax. Ele largou Lenora no mesmo instante que avistou o dono do aperto que afundou o tecido de sua camisa em sua carne. Ou melhor dizendo; a dona.

    — Jade?! 

    — Sobre o que conversamos? — indagou ela, com uma carranca.

    — Não se intrometa. Essa vadia doente acha que é melhor do que eu!

    — E ela é, Jax, melhor do que você — Jade sibilou, depois, o arrastou para fora do quarto enquanto cantarolava amigavelmente para Lenora: — Adeus!

    Durante todo o trajeto do quarto até às escadas, Jade não vacilou seu aperto no pulso de Jax que, apesar de estar frustrado com a interrupção inesperada dela, não demonstrou relutância em nenhum momento. Eles desceram os degraus sem pressa, suas botas batendo simultaneamente contra a madeira acinzentada, causando um ritmo desorganizado e barulhento. 

    As empregadas Beatrice, Sophie e Evie, no alto das escadas, com as mãos cruzadas em frente ao corpo, fitavam Jax sendo puxado até a saída da mansão. Seus olhos, afiados como adagas, cortavam os ombros, nuca e costas dele, como se estivessem prestes a julgá-lo para o inferno.

    Ao saírem da mansão e se afastarem o suficiente para não serem mais vistos através das grandes janelas, Jade torceu o pulso de Jax ao arremessá-lo na areia. No entanto, ele não parecia intimidado ou com raiva dela, e logo se levantou usando o joelho como apoio conforme balançava o pulso dolorido.

    — Conhecia elas? — ele indagou, se virando para olhá-la nos olhos.

    — Não. Mas elas me contaram o que você fez com a amiga delas. Ainda bem que lembrei de vim conferir o que você estava fazendo. 

    — Ela que…

    — Jax. — O cortou severamente, não dando espaço para ele se defender com mentiras. — Eu lhe disse que não queria mais ver você tocando em um fio de cabelo sequer de uma mulher, não disse? 

    Soltando um bufo, Jax permitiu que seu corpo tombasse de costas no chão, seus membros esticados e lerdos. E olhando para o céu nublado, disse como se não tivesse escutado a repreensão de Jade: — Eu preciso passar uma noite inteira no bordel da Central do leste. Estou realmente precisando disso.

    — Jax — disse lamentando —, você… 

    Subitamente, ela desistiu de tentar colocar algum juízo na cabeça dele. E mudou de assunto, optando por focar na missão, mas somente por enquanto: — Vamos conferir as cidades do norte. Foi lá onde tudo começou, talvez deva ter alguma pista sobre quem está cometendo essa chacina.

    — Vamos? — repetiu confuso. — Por que não nos separamos? Você deveria proteger a cidade do sul, é a única que não foi tocada, ainda… 

    — Anda logo. Não confio mais em você — Jade afirmou, frustrada, e também entediada.

    Entretanto, Jax continuou deitado, aproveitando a bela vista. Ele permaneceu tão indiferente com a situação, que sequer piscou os olhos, era como se já tivesse ouvido a mesma coisa várias e várias vezes. E apenas ergueu o tronco preguiçosamente para se sentar.

    Jade cessou seus passos e moldou sua sombra, a alongando em uma grande circunferência. A sombra, se movendo como um lago de petróleo consciente, tomou as dunas próximas e o próprio Jax.

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