Minutos depois da luz incandescente, depois que a fumaça abaixou e a lua voltou a banhar o deserto com a sua luz pálida, Jax Bennett voltou para o local da explosão. Sua mente bagunçada e visão turva pela raiva excessiva os impediram de raciocinar o porquê não estava achando o corpo de Dharma. Ele foi reduzido a pó!? Conseguiu fugir?! Estava inconsciente e soterrado? 

    A dor latejante em sua cabeça o obrigou a cair de joelhos. Tentou esmurrar a areia em puro reflexo, mas lembrou que perdeu o braço.

    — PORRA!!

    Chutou, berrou, puxou o próprio cabelo, rosnou, grunhiu, mordeu os lábios, socou o próprio rosto! Depender do feitiço da Sacerdotisa para gerar uma explosão forte o suficiente para alcançar a vitória era agonizante!

    Naquele momento, ele não tinha aura o 

    suficiente para sequer se curar, a não ser para alterar as condições de seu Dom a um nível inofensivo.

    Em outras palavras, o peso da derrota pesou nos ombros de Jax. 

    ——————————∞——————————

    A visão fraca, passos tortos e desesperados. Toda a extensão da garganta ardia em chamas carmesim. O sangue escapou pela boca, escorrendo para o queixo e gotejando pelo mesmo. Dharma agarrou a maçaneta da enorme porta dupla da mansão com um ódio inexplicavelmente manso.

    Por mais que quisesse chorar, rasgar a própria pele e arrancar o seu fôlego de vida com as próprias mãos, sua empatia profunda e calorosa os impediram.

    “Não posso me acovardar agora”, pensou, subindo as escadas com a ajuda de seu braço trêmulo e ferido, queimado até a carne viva.

    Mas comparado ao seu outro braço, este estava ileso. Cerca de 30% de seu corpo sofreu queimaduras de grau 4. Todas as camadas da pele, os músculos, os tendões, os ligamentos e os ossos foram marcados impiedosamente pelo arremedo de uma fissão nuclear. A cada passo manco, a carne derretida se esticava e o osso do joelho junto aos músculos saiam para fora. 

    O frescor do ar frio da mansão era insubstancial. Toda dor e ardência persistiam como vermes famintos roendo a carne podre de um cadáver.

    Dharma apoiou-se na parede próxima ao quarto de Lenora com um gemido árduo e triste. No momento, era Sophie quem guardava a entrada do quarto. Ela engoliu seco, pasma com a situação dele. Não havia palavras para descrever o que ela sentiu. Era nojo… pena? De qualquer forma, uma dúvida permaneceu cravada em sua mente como um prego preso na madeira. Como ele ainda estava vivo?

    — S…Se…Senhor…?

    — Vá embora, Sophie. Diga às suas amigas que vocês estão dispensadas. Podem voltar para Vistéria. — Caminhou até a porta e a abriu, mas antes de entrar, ordenou: — Suma dessa mansão, agora.

    Sophie, ainda confusa e hesitante, recuou dois passos. Uma ânsia apertou seu estômago ao ver o estado de Dharma de perto. Ela recuou mais alguns passos e correu.

    Como sempre, o quarto estava em completa escuridão, e Lenora se encontrava em um sono profundo.

    Dharma soltou um suspiro trêmulo ao tocar com a ponta dos dedos o pescoço dela, mal sentindo o pulso. A fitou por um instante, depois agarrou o lençol e o amarrou em volta de si próprio para esconder parte de seus ferimentos. Pegou Lenora no colo e seguiu para fora do quarto, para longe da mansão.

    No processo, por conta do balanço dos passos enquanto descia as escadas, ela acordou. Sua consciência fraca impossibilitou que abrisse totalmente os olhos ou raciocinar o que estava de fato acontecendo. Era um sonho? Pensou.

    À medida que Dharma atravessava o deserto negro em direção a um monte, o horizonte era pintado por leve brilho com tons dourados.

    “Ainda tenho mais alguns minutos…”, ele seguiu firme, subindo o monte com determinação.

    Seus braços tremiam, os pulmões falhavam constantemente e a visão embaçada apenas se estabilizava quando ele cessava seus passos para descansar por curtos segundos.

    Enfim, já no topo do monte, Dharma, com Lenora em seus braços, seguiu para a borda do mesmo. Sentou-se, deixando-a deitada entre suas pernas. Sua mão vagou pelas poucas gramas que haviam ali e, pela última vez, usou de sua Maldição para formar uma grande árvore espessa, como vários manguezais torcidos e trançados, mas agradável aos olhos.

    — Dharma?… 

    — Eu estou aqui. Por favor, abra seus olhos.

    No horizonte, o sol brilhava intensamente. A grande esfera de plasma amarela com tons laranjas expulsava as más nuvens para longe.

    — Me desculpe, Lenora. Eu deveria ter me esforçado mais. Deveria… deveria ser mais forte.

    — Não. Eu estou satisfeita, Dharma, desde que nos conhecemos. Fico feliz que… — ela hesitou —… que tenha me trazido até aqui para ver o pôr do sol.

    Um silêncio quase constrangedor rodeou o casal por alguns instantes. Dharma abraçou sua amada com mais força. As palavras dela tocaram em sua alma, trazendo um sossego pleno e alvo ao seu espírito. Ele chorou. Deixou as lágrimas umedecerem o cabelo dela.

    — Lenora… querida… olhe com mais atenção, este é o nascer de mais uma manhã. O lindo nascer do sol que você tanto desejava.

    — Nascer? Não… eu tenho quase certeza que é o pôr do sol.

    ——————————∞——————————

    Passos firmes e alegres. A bainha, punhos e gola do hanfu preto abanando com o vento fresco.

    As botas de pano com as solas de couro atravessando uma ponte preta eram adornadas por pingentes de estrelas.

    O tempo em que Jax Bennett, Sally Dakis e Jade Valderbilt passaram no sul da Nova Pangeia, foram duas semanas e meia. Desde então, se passaram mais quatro semanas.

    Percorrendo por uma gigantesca ponte que ligava uma torre de platina e ferro a uma espécie do que parecia ser uma estação de metrô, o sorriso confiante, embutido por uma ansiedade contagiante, transparecia pelo andar apressado.

    — Não fique tão ansioso, Hayashi — disse Blanc, caminhando logo atrás de Kenji.

    — Isso aqui é incrível!! Como o Mundo Interior pode ser tão tedioso? — Abriu os braços, rodopiando como um pião enquanto admirava a imensidão do país onde estava.

    Esta era BioMeck. Um país quase milenar onde a tecnologia evoluiu a níveis nunca antes vistos.

    — Confesso que você evoluiu muito mais rápido do que eu imaginava. Minha previsão era de cinco meses, mas você aprendeu tudo em somente um mês — Blanc disse com um leve sorriso imperceptível, seu olhar afiado fitando a nuca de Kenji.

    — Está orgulhosa de mim? — Virou o pescoço para encará-la, suas olheiras profundas acentuando seu olhar orgulhoso, um pedido silencioso para Blanc continuar o elogio.

    — Estou. Até demais. Por isso, prefiro que não me decepcione.

    Kenji alargou seu sorriso e virou-se por completo para ela. Ergueu o polegar, oferecendo um joinha. — Pode deixar comigo!

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