Capítulo 313: No meio da cirurgia

A ponta metálica da agulha de radiofrequência aquecia com a energia emitida, elevando a temperatura até realizar a coagulação térmica no ponto cirúrgico.

Naquele exato momento, o gânglio semilunar do nervo trigêmeo de Xie Yiman estava sendo destruído pela ponta da agulha aquecida a 80 °C. Ela sentia como se estivesse sendo queimada viva, que seu cérebro parecia estar prestes a explodir, e incontáveis insetos a devoravam por dentro, enquanto tudo em seu corpo fervia em dor.

As pessoas ao redor a observavam. Gu Jun olhou para o cronômetro do coagulador térmico de radiofrequência e ainda restavam 40 segundos da primeira sessão de coagulação.

Raramente 90 segundos pareciam tão longos. A paciente mal conseguia suportar, seus gritos de dor também os atormentavam.

Nesse momento, Deng Ximei exclamou alto: “Tem algo estranho!” Antes mesmo que sua voz se calasse, a pedra de monitoramento de racionalidade no pulso de Xie Yiman começou a emitir um leve brilho avermelhado. Contudo, Sike Xian e os outros nada sentiram. Não se parecia com o impacto mental da doença do pesadelo, era apenas uma erosão mental voltada contra a própria paciente.

Os olhos de Gu Jun se estreitaram. Então veio. Veio mesmo. Ótimo. Isso ao menos indicava que a cirurgia estava surtindo efeito!

Os integrantes do centro de comando tinham o mesmo pensamento. Uma espécie de excitação peculiar também se espalhava pela sala de cirurgia.

O que mais temiam não era a presença de uma crise, mas a ausência de qualquer reação.

Contudo, ainda não estava claro se aquele efeito era bom ou ruim…

“Desenhem o selo ancião!” a voz de Gu Jun soou firme. Do outro lado, Wu Shiyu imediatamente conduziu uma equipe de especialistas em selo ancião, aplicando-o sobre a paciente deitada na mesa cirúrgica.

O grito de dor de Xie Yiman tornou-se ainda mais agudo e sinistro. A erosão mental cessou, mas sua pressão arterial e frequência cardíaca dispararam, o que tio Dan alertou às pressas.

“Yiman, aguente firme, faltam apenas dez segundos…” Gu Jun agarrou a mão trêmula da paciente, o cenho contraído, os olhos no visor do termocoagulador. Enquanto os números no cronômetro caíam, os sinais vitais subiam vertiginosamente. Sike Xian então ordenou: “Prepare o anestésico. 4 ml de propofol e 4 ml de sufentanil.”

Embora o plano cirúrgico final tivesse sido definido por Gu Jun, Sike Xian era o cirurgião-chefe.

Durante o processo cirúrgico, as situações mudam de incontáveis maneiras, exigindo que o cirurgião-chefe julgue e lide com elas no local. Por isso, as decisões de rotina ainda cabiam a Sike Xian, isso já havia sido combinado antes da cirurgia.

“Mais cinco segundos… quatro…” Gu Jun ainda relutava em usar qualquer anestésico ou sedativo, mas o estado de Xie Yiman já era extremamente perigoso.

Quando todos prenderam a respiração e a enfermeira estava prestes a injetar o anestésico em Xie Yiman, o termocoagulador emitiu um som de “bi-bi”. A primeira sessão de coagulação havia terminado.

“Espere.” Sike Xian interrompeu a enfermeira. “Espere mais um pouco.”

Se aplicassem o anestésico agora, as respostas da paciente às perguntas se tornariam vagas, e seria difícil avaliar o efeito da cirurgia.

Eles observaram os indicadores no monitor. Felizmente, não continuaram subindo. Aos poucos começaram a retornar à faixa normal.

“Ah…” Xie Yiman conseguiu respirar novamente, lágrimas jorrando de seus olhos. “Doutor Gu, eu não quero mais. Está doendo demais…”

“Continue!” Gu Jun tocou de leve a mão dela. “A dor quer dizer que está dando resultado. Quando concluirmos a ablação, essa coceira vai desaparecer.”

Quando a paciente se acalmou um pouco, Sike Xian e Zhang Jinsong aproximaram-se para examinar o lado direito de seu rosto, perguntando sobre a sensação de dormência. Essa cirurgia visava evitar danos ao nervo oftálmico, a primeira ramificação do trigêmeo. O efeito esperado era precisamente causar dormência facial.

Xie Yiman não conseguia responder com clareza. Parecia sentir um certo formigamento. A dor diminuíra, mas a coceira permanecia.

“Eu consigo sentir muitos insetos, eles estão subindo…”, disse Xie Yiman entre soluços. “Doutor Gu, eles vão cobrir meu corpo todo.”

O inchaço do lado direito do rosto dela havia aumentado um pouco, embora o eritema permanecesse estável por ora.

Será que a cirurgia poderia ter estimulado a expansão da área afetada por sua dermatose? Sike Xian e os outros não tinham resposta. Sabiam apenas que, dentro daquelas áreas avermelhadas, não existiam insetos reais.

Eram parasitas imaginários, entidades cuja natureza ainda lhes era quase desconhecida.

“Eles só estão tentando assustar você.” Gu Jun falou calmamente. Suspeitava que aquelas criaturas se alimentassem do terror e do desespero do hospedeiro. “Se fossem realmente tão poderosas, você já teria morrido.”

Mas, agora, argumentos racionais eram inúteis. O melhor era oferecer esperança, dar-lhe um motivo para sobreviver. Gu Jun sabia o quanto ela valorizava sua carreira de atriz e o sonho de atuar nos filmes da Phecda. “Yiman,” disse ele, “eu sempre quis dirigir um filme. Quando eu tiver tempo, farei um amador. Posso convidar você para atuar nele?”

Os demais ouviram e entenderam que Gu Jun apenas queria confortá-la. Seu gosto por cinema não era segredo, ainda que fosse alguém acostumado a empunhar um bisturi.

“E eu posso fazer uma participação especial?” perguntou Wu Shiyu. “Quero sentir o gostinho de atuar.”

“Claro, não vai faltar papel pra você.” Gu Jun assentiu. O tom entusiasmado fazia parecer que o filme começaria a ser rodado no dia seguinte.

Ele próprio sabia que aquele “quando chegar a hora” podia nunca vir.

Se algum dia tivesse tempo livre o bastante para se dedicar a um filme amador, o mundo já estaria em um estado maravilhoso demais.

Mas aquela conversa entre os dois, quase como um número ensaiado de palco, deu grande ânimo a Xie Yiman. Ela parecia ser capaz de vislumbrar aquele futuro. “Sim, claro que sim…” murmurou.

Passado esse breve intervalo, a ablação foi retomada.

A dor colossal voltou a engoli-la, golpeando sua vontade e drenando-lhe as forças mentais.

Mas ela se agarrou à imagem que Gu Jun lhe pintara, às palavras de incentivo que ecoavam ao redor, e reuniu toda a sua resistência. Talvez fosse porque a dor atingira o limite, talvez porque se comovia com o cuidado deles ou talvez porque, se fosse mesmo morrer, ainda assim, não queria morrer…

“Ah…” Xie Yiman cerrou os dentes, os olhos injetados de sangue. Doía, coçava, que viesse tudo de uma vez. Venha!

“Aguente firme.” Gu Jun apertou com força a mão dela. Naquele instante, desejava poder dividir um pouco daquela dor.

Porque não queria mais ver uma pessoa, uma pessoa viva, morrer diante de seus olhos.

Ele salvaria essa paciente de qualquer modo.

AA tensão na sala de cirurgia parecia congelar o ar. A segunda sessão de ablação chegou ao fim, e logo a terceira também. A agulha foi retirada, o sangramento contido, e uma compressa fria aplicada. Metade do rosto de Xie Yiman estava completamente inchada. A dor e a sensibilidade na região haviam desaparecido. Restava apenas a dormência e a coceira. Seus dentes pareciam de pedra. No sentido técnico, a cirurgia ablativa fora um sucesso.

A coceira naquele lado do rosto parecia um pouco menor, mas era difícil ter certeza, ainda coçava demais…

“Façam também o lado esquerdo.” Gu Jun assentiu, sinalizando a Sike Xian e à equipe de enfermagem que prosseguisse com o procedimento. Eles ajustaram a posição cirúrgica de Xie Yiman, preparando-se para ablação também o lado esquerdo de seu rosto. Era arriscado fazer tudo de uma vez, mas o caso dela não podia esperar.

Depois de repetir o mesmo procedimento no outro lado, Gu Jun se preparou para apertar novamente o botão de início do termocoagulador.

“Capitão Gu, espere, acho que vi uma pessoa…”  Xie Yiman gritou, tensa. A força de vontade que acabara de reunir vacilou outra vez. “É… é uma mulher. Aquela mulher de pele descascando. Eu já a vi… ela está na minha cabeça. Ela está me olhando…”

Gu Jun parou imediatamente e lançou um olhar ao redor. Tio Dan, Deng Ximei e os outros também olharam, mas a pedra de monitoramento de racionalidade não mostrou reação.

Tian Yiqing estava ali? Conectada ao espaço mental de Xie Yiman?

Nesse momento, Cai Zixuan foi o primeiro a notar a mudança. Sem querer que a paciente ouvisse, falou apressado, em voz baixa, para Gu Jun: “O eritema está se espalhando!”