Capítulo 32: O Mar Profundo Não Guarda Tesouros
— Chefe, você tá há quase dez anos como capitão do Cangyuan, como é que vai simplesmente entregar o posto assim?!
— Foi você quem salvou minha vida, chefe! Se querem te tirar, eu, Liu San, sou o primeiro a não aceitar!
— Isso mesmo!
— Que tal jogarmos esse sujeito no mar assim que zarparmos? No oceano, morrer um ou outro é a coisa mais comum que tem!
A bordo, a tripulação estava em polvorosa. Em poucos instantes, Li Fan já havia se tornado o inimigo número um de todos.
O homem de pele bronzeada levantou as mãos para acalmar os tripulantes:
— Tranquilizem-se, todos! Sei que vocês confiam muito em mim, Zhang Haobo… mas o Cangyuan é, no fim das contas, propriedade do Supervisor Zhao. Nós todos apenas trabalhamos para ele. Se o Supervisor quer trocar o comandante, o que posso fazer?
Se não tivesse dito nada, teria sido melhor. Assim que essas palavras saíram da boca de Zhang Haobo, a indignação dos tripulantes aumentou ainda mais.
Os olhos de todos se avermelharam de raiva, mirando Li Fan com olhares de puro ódio.
Li Fan, por dentro, apenas riu friamente.
Esses joguinhos de Zhang Haobo não lhe passavam despercebidos.
Elogiava Li Fan em público, mas com a clara intenção de semear desconfiança entre os tripulantes.
Fingia defendê-lo, mas na verdade atiçava o ressentimento coletivo.
Fingia que estava de mãos atadas, mas tudo o que queria era que a tripulação se unisse contra Li Fan.
“Obediência externa, traição interna… Agitar a bandeira para se opor à própria bandeira, é?”
Tudo truque velho. Coisa que Li Fan já conhecia de sobra.
Sem demonstrar qualquer receio, Li Fan deu um passo à frente, levantou a cabeça e declarou em alto e bom som:
— Senhores não confiam em mim… mas será que não confiam sequer no julgamento do Supervisor Zhao? Além disso, a viagem já está prestes a começar. Por que não esperam para ver minhas habilidades com seus próprios olhos? Garanto que não os decepcionarei!
Sua voz firme e poderosa abafou por completo o burburinho da multidão.
Os tripulantes, diante de sua postura imponente, ficaram momentaneamente intimidados. Ninguém ousou retrucar.
Li Fan também não lhes deu a chance. Após dizer suas palavras, despediu-se brevemente e entrou sozinho na cabine do navio.
Restaram os marinheiros, trocando olhares perplexos… e Zhang Haobo, com a expressão cada vez mais sombria.
Aos poucos, começaram os cochichos entre a tripulação.
— Será que aquele cara tem mesmo algum trunfo?
— Talvez… vai saber. Aqueles olhos do Supervisor Zhao são famosos, dizem que ele nunca erra.
— Também achei que ele não parece alguém comum, não…
“Que história é essa de achar tesouro toda vez que sai pro mar? Eu não acredito nisso nem morto!”
“Isso aí é tudo armação! Ele está claramente usando conexões para roubar minha posição de capitão da frota! Acham que eu não sei?”
“De qualquer forma, ele já jogou a isca, quero ver como ele vai resolver isso!”
Zhang Haobo amaldiçoava em silêncio, cada vez mais irritado com seus subordinados, que haviam sido completamente enredados pelas poucas palavras ditas por Li Fan.
— Içar âncoras! Vamos zarpar! — gritou, com raiva.
O Cangyuan começou a se mover mesmo sem vento, deslizando para fora do porto rumo ao mar aberto.
Mais de uma centena de navios da Ilha Liuli também se dispersaram, partindo para as áreas marítimas previamente designadas.
O Cangyuan não utilizava velas nem remos. Era impulsionado por uma formação mágica em miniatura, alimentada por pedras espirituais.
Havia ainda um Condutor Espiritual a bordo, quando detectava a presença dos peixes Liuli na região, emitia um sinal para orientar a direção.
No entanto, o alcance desse dispositivo era limitado.
Por isso, era essencial que marinheiros experientes localizassem previamente as áreas de atividade dos cardumes.
Em anos normais, os peixes Liuli seguiam padrões previsíveis de migração, o que facilitava a pesca.
Mas depois de uma Catástrofe dos Ventos, os cardumes migravam de forma caótica, e toda experiência anterior se tornava inútil.
Restava apenas contar com a sorte.
E, ao que tudo indicava, a sorte não estava do lado do Cangyuan.
Já havia se passado mais de meio mês e, além de alguns peixes comuns e minerais marinhos triviais, não haviam obtido nada de valor.
Não só os tripulantes estavam de rostos fechados, como até Zhang Haobo começava a se inquietar.
Afinal, o último colocado dessa expedição sofreria punições.
Comparado aos trabalhos na ilha, ser tripulante era menos arriscado e muito mais lucrativo.
Ninguém queria perder essa oportunidade à toa.
“A regra é voltar dentro de um mês. Com essa mixaria que pegamos, é bem possível que sejamos os piores da frota… Só posso torcer pra que algo mude nos próximos dias. Mestre Imortal, nos abençoe…”
Zhang Haobo fitava o mar profundo e calmo, sem esperanças.
Foi quando ouviu passos se aproximando por trás.
Virando-se, viu Li Fan caminhando em sua direção.
— Ora, resolveu sair da cabine? Se não fosse por você ainda vir buscar comida, eu já teria achado que tinha morrido lá dentro!
Desde o início da viagem, Li Fan não havia interagido com ninguém, permanecendo recluso em seu quarto.
De mau humor, Zhang Haobo sequer disfarçou o desdém.
Li Fan, porém, ignorou os insultos e permaneceu olhando fixamente para o mar distante, o semblante carregado.
Ficou ali parado, em silêncio.
Zhang Haobo achou estranha aquela postura. Sentiu um arrepio e acabou olhando na mesma direção… mas não viu nada. O mar estava absolutamente normal.
Mesmo assim, o rosto de Li Fan parecia ainda mais sério.
Mas continuava calado.
O tempo foi passando, até que Zhang Haobo não aguentou mais e perguntou:
— Tá olhando o quê?
Li Fan se sobressaltou, virou-se com o rosto cheio de frustração e lançou um olhar fulminante para ele.
— Que tipo de palhaçada é essa? — resmungou Zhang Haobo, tentando se impor, ainda que com certa insegurança.
— Quero um barco pequeno — disse Li Fan, ignorando-o. Sua voz era profunda. — Vi um tesouro.
— O quê…? — Zhang Haobo reagiu um pouco confuso a princípio. — O QUÊ?! — exclamou Zhang Haobo, de repente despertando. — Você tá falando sério?!
— Rápido, me preparem uma embarcação menor. Estou vendo joias reluzentes nas profundezas. Elas estão me esperando para serem resgatadas.
Zhang Haobo hesitou por um instante… mas então Li Fan acrescentou:
— A luz do tesouro está começando a enfraquecer. Estou prestes a perder sua localização.
Na mesma hora, Zhang Haobo estremeceu.
— Rápido! Preparem o barco!
O Cangyuan contava com algumas embarcações auxiliares, usadas para navegar por canais estreitos ou explorar zonas perigosas.
Logo uma delas foi baixada ao mar, e Li Fan partiu sozinho.
Somente depois que ele se afastou, Zhang Haobo percebeu o que acabara de fazer.
“O que deu em mim pra acreditar nisso?! Tesouro enterrado no fundo do mar? Que absurdo!”
Ia protestar, mas foi interrompido pela voz distante de Li Fan:
— Não me sigam. Esperem meu sinal!
— Por quê?! — gritou Zhang Haobo, irritado.
— Você fala demais! Vai atrapalhar minha visão! — Li Fan respondeu.
Zhang Haobo teve um espasmo no canto da boca, mas ao lembrar do olhar feroz que Li Fan lhe lançara momentos antes, vacilou. Talvez… talvez não fosse mentira.
O tempo passou. Já haviam se passado duas horas desde que Li Fan partira sozinho.
— Será que ele fugiu? — um tripulante perguntou, ansioso, olhando para o horizonte.
— Que bobagem você está dizendo? O mar é vasto, e ele está sozinho, sem comida seca, ele vai fugir pra onde?! — Zhang Haobo resmungou, mas antes que continuasse, algo chamou sua atenção: um clarão vermelho surgiu no céu à distância.
— Rápido! Levem o navio até lá! — ordenou imediatamente.
O Cangyuan acelerou ao máximo e logo alcançou o ponto indicado pelo sinal.
Lá estava Li Fan, exausto, em pé sobre a pequena embarcação.
— O tesouro está aqui! — declarou com firmeza.
Todos se entreolharam, céticos.
Por fim, Zhang Haobo cerrou os dentes e ordenou:
— Mergulhem! Lancem as redes!
No meio das dúvidas e da desconfiança… uma, duas caixas…
Um total de dezesseis caixas cheias de ouro, prata e joias foram retiradas das profundezas do mar.
Regras dos Comentários:
Para receber notificações por e-mail quando seu comentário for respondido, ative o sininho ao lado do botão de Publicar Comentário.