Capítulo 913: A Última Vez

— Como você está aguentando? — Nick perguntou.

Diante de Nick estava uma mulher idosa.

Ela tinha cabelos brancos, e várias rugas cobriam seu rosto.

As mais pronunciadas eram as acima dos olhos, formadas por expressões frequentes de preocupação ou incômodo.

No entanto, também havia muitas ao lado da boca, causadas por sorrisos constantes.

Todo corpo contava uma história, e o dela contava uma história de muitos altos e baixos.

— Fiz o que podia fazer — ela disse. — Fiz as pazes com a vida.

— Quando era jovem, só me importava em ficar mais forte, mas não acho que eu era feliz.

— Foi então que você apareceu. Você me abriu os olhos e me deu um novo propósito.

— Finalmente me senti realizada. Senti que estava fazendo algo que importava.

— Fiz tudo que podia fazer.

Naturalmente, a mulher diante de Nick era Aria.

Nick já tinha por volta de 800 anos agora, e logo se tornaria um Adversário Intermediário.

Ele sabia que ainda viveria por muito tempo.

Sobreviveria ao reinício da era e criaria uma nova civilização subterrânea ao longo de milhares de anos.

Se Nick morresse na batalha final, provavelmente menos de 25% de sua expectativa de vida teria se passado.

Comparado à vida que ele ainda teria, ele ainda era jovem.

Mas o mesmo não valia para Aria.

Protetores só podiam viver cerca de 1.000 anos, e Aria já era uma Heroína quando Nick nasceu.

Ela estava velha.

Seu Sincronizador Zephyx mal conseguia acompanhar seu gasto de Zephyx.

Se usasse sequer uma de suas habilidades, levaria dias para recuperar o Zephyx.

Um Protetor normal recuperaria isso em menos de um segundo.

O momento em que o gasto de Zephyx dela ultrapassasse sua geração de Zephyx seria o momento em que saberiam quando ela morreria.

Enquanto Nick a observava, sentia uma dor aguda em seu íntimo.

Aria havia sido seu primeiro e único amor.

Ele ainda a amava.

Mas não deu certo.

Aos olhos de Nick, Aria era tão radiante, esperançosa, competente, determinada, altruísta e forte.

Por séculos, ela liderou os Extratores na cidade subterrânea.

Todos a respeitavam, e ninguém questionava sua autoridade.

Ela havia sido tão boa líder militar quanto se poderia ser.

— Sinto pena de você — Aria disse com um sorriso caloroso.

Nick não respondeu.

— Não sei se eu conseguiria fazer o que você está fazendo — ela disse. — Não sei como você vai sobreviver ao reinício da era como humano, mas tenho certeza de que você tem um jeito.

— Infelizmente, você não pode levar ninguém com você.

— Vai ficar isolado e sozinho.

— Vai testemunhar todos que conhece morrerem.

— Para se proteger da dor, você isola seus sentimentos.

— Está vivendo num mundo de cinza e preto.

Aria olhou para o chão com amargura. — Eu não consigo fazer isso.

— Eu preciso de pessoas.

— Talvez eu não tenha ninguém que realmente me ame, mas minha vida está cheia de companheirismo.

Nick não disse nada.

Aria também ficou em silêncio por um tempo.

— Fiz muitas coisas terríveis — Aria disse após um tempo. — Causei tanto sofrimento e morte para proteger os segredos da cidade.

— Cada vez que preciso tomar uma decisão difícil, sinto a dor.

— E, embora ela enfraqueça com o tempo, nunca vai embora.

— Não sei o que acontece depois da morte, mas aceitarei o que quer que me aguarde.

Nick não respondeu.

Ele queria dar a Aria a chance de aliviar sua mente.

Depois de um tempo, Aria olhou para Nick como se estivesse em transe.

Nick pôde ver o amor, a dor, o arrependimento e a aceitação nos olhos dela.

Por meio minuto, os dois apenas se olharam.

— Você ainda parece o mesmo — Aria disse.

— Quando olho para você, vejo o Intermediador que mudou a Cidade Carmesim.

— Quando olho para você, lembro da luz que você me deu.

Ela sorriu com tristeza.

— Enquanto isso, eu me tornei velha. Já não sou mais quem eu era — disse ela.

— E ainda assim — Nick disse — você se tornou mais bela do que jamais foi.

Aria olhou para Nick em choque.

Ela podia ouvir emoções reais na voz dele.

— Você está errada — Nick disse. — Você disse que não há ninguém que realmente te ama.

Nick respirou fundo.

— Eu nunca parei de te amar.

— Ainda te amo até hoje.

Aria olhou para Nick, surpresa.

Então, lágrimas escorreram de seus olhos.

— Por quê? — ela perguntou. — Por que está dizendo isso agora?

— Porque você merece saber a verdade — Nick disse.

— Eu nunca parei de te amar.

— Você é a pessoa em quem eu mais penso.

Aria soluçou.

— Olhe para você — ela disse com um sorriso triste. — Fez uma velha chorar.

As entranhas de Nick tremiam.

Havia tanta dor e arrependimento.

No momento seguinte, Nick se aproximou lentamente de Aria…

E a abraçou.

Os olhos de Aria se arregalaram quando Nick a envolveu com força.

Então, mais lágrimas caíram de seus olhos.

— Me desculpe, Aria — Nick disse. — Me desculpe por não ter sido bom o suficiente.

— Não diga isso — ela respondeu. — Você é a esperança da humanidade. Eu jamais me perdoaria se você desperdiçasse seu tempo comigo.

Nick não respondeu.

Infelizmente, apesar da dor que sentia, ele sabia que jamais poderia dar a Aria o que ela merecia.

Sua missão era mais importante do que qualquer um dos dois.

— Ainda assim, me desculpe — Nick disse enquanto a segurava.

Aria soltou uma risada fraca. — Então, sinta-se desculpado.

Nick apenas assentiu.

Os dois permaneceram abraçados por vários minutos.

— Nick — Aria falou. — Esse é o momento mais feliz da minha vida.

— Obrigada.

Nick a segurou com força.

— Se eu pudesse morrer em seus braços agora, esse seria o melhor fim que eu poderia desejar.

— Infelizmente, não podemos escolher o momento de nossas mortes.

Nick permaneceu em silêncio.

— Eu posso fazer com que isso aconteça, se quiser — ele disse.

Aria se afastou lentamente e empurrou Nick.

— Não — ela disse. — Eu não gostaria que você passasse por isso. Escolhi não me tornar um Escudo para que você não tivesse que fazer isso.

— Você tem coisas mais importantes a fazer do que passar tempo comigo.

Nick não respondeu.

Infelizmente, ela tinha razão.

O Campeão podia invocar a Boca a qualquer momento.

Ele não tinha tempo, e o momento da morte de Aria não era certo.

Ela poderia viver até mais dez anos, e Nick não podia passar esse tempo ali.

— Me desculpe — Nick disse.

— Vá, está tudo bem — Aria disse, sem mais lágrimas. — Salve a humanidade.

Nick respirou fundo e assentiu.

— Adeus, Aria — ele disse.

— Adeus, Nick — ela respondeu.

— Eu te amo — Nick disse.

Algumas lágrimas voltaram aos olhos de Aria.

— Eu também te amo.

Nick respirou fundo mais uma vez.

Então, desapareceu.

Alguns segundos depois, Aria caiu de joelhos e começou a chorar descontroladamente.

Nick não assistiu.

Essa foi a última vez que se viram.