Capítulo 100 - Visitantes indesejados
“Você viu isso, senhor pessimista? A flor não murchou, afinal.” Solus comentou alegremente.
“Você está certa! Ainda pode explodir na nossa cara! Yay!” Lith respondeu imitando o tom dela.
Paranoico demais para tocar o lótus vermelho com as próprias mãos, ele o levantou com magia espiritual antes de tentar, sem sucesso, armazená-lo na dimensão de bolso.
“Que diabos?” Examinando-o de perto com a Visão da Vida, Lith percebeu que, ao longo de um enorme fluxo de mana, o lótus vermelho também tinha uma pequena partícula de força vital.
Nem ele nem Solus tinham ideia de como ele poderia ter sobrevivido após uma exposição tão longa a uma Abominação.
“Isso é ótimo. Não podemos escondê-la, apenas carregá-la em uma bolsa normal, com o risco de ser destruída ou pior ainda, descoberta quando voltarmos. Se essa flor for algum tipo de tesouro inestimável, ela pode nos causar muitos problemas.”
Lith suspirou. A ideia de ser forçado a largar seu primeiro saque era bastante deprimente.
“Deixe-me adivinhar, estamos acima de uma veia de mana, certo?”
“Exatamente.” Solus respondeu. “Minha hipótese é que a Abominação conseguiu se estabilizar graças ao efeito combinado da energia mundial abundante e daquela flor estranha.”
“Concordo. As únicas perguntas que permanecem são as seguintes. Ele matou tudo porque precisava se alimentar ou era apenas uma maneira de controlar o ambiente ao redor? E por último, mas não menos importante, monstros vegetais realmente existem?”
“Somente a Abominação poderia responder à primeira pergunta, e nenhum de nós acreditaria em suas palavras de qualquer maneira.” Solus deu de ombros.
“Quanto ao segundo, meu palpite é que sim. Plantas também são seres vivos. Vendo quanto mana aquela florzinha tem, não vejo por que elas não poderiam evoluir também.”
“Contanto que essa coisa não se transforme em um bebê Abominação e coma meu rosto, está tudo bem para mim.” Ele respondeu, mantendo o lótus vermelho flutuando e longe dele.
Lith ficou tentado a fazer Solus voltar à sua forma de protótipo de torre. Graças ao Revigoração, seu corpo estava em ótima forma, mas ele se sentia mentalmente cansado. As lutas de vida e morte eram mais do que apenas sobre resistência.
Lidar com tantos feitiços ao mesmo tempo, manter a calma enquanto lutava constantemente contra o medo da morte, tornava uma única luta real cem vezes mais irritante do que estudar a noite toda.
Mas ele não sabia quanto tempo lhe restava, até que alguém da academia notasse o ponto careca na floresta e enviasse uma equipe de reconhecimento.
Lith colocou sua mão livre no chão, usando magia da terra para procurar os restos mortais das vítimas da Abominação. Poucos metros abaixo, ele encontrou um cemitério de ossos, onde vários esqueletos estavam amontoados.
Lith levou apenas aqueles pertencentes a bestas mágicas, ignorando restos humanos e animais.
“De acordo com a Professora Wanemyre, eles podem ser usados para forjar armas e armaduras de durabilidade superior, que também podem ser infundidas com encantamentos muito mais fortes do que o normal. Com todas essas coisas eu poderia equipar um batalhão.”
“Como diabos alguém forja algo a partir de ossos? Não faz sentido.” Solus objetou. “Eu entendo que eles podem ser duros, mas eles devem sempre ser baseados em carbono.”
“Não sei.” Lith deu de ombros. “Me dê uma folga, ainda estou no primeiro ano de especialização.”
Depois de guardar tudo na dimensão de bolso, seus olhos caíram em seu equipamento surrado. O traje de caça estava cheio de buracos do tamanho de um polegar, enquanto suas braçadeiras de metal estavam danificadas a ponto de serem inúteis.
Por sorte, ele tinha um traje sobrando. Infelizmente, também era a última.
Depois de trocar de roupa rapidamente, Lith voou vários quilômetros antes de parar para decidir o que fazer com o lótus vermelho. Ele não podia colocá-lo no espaço de armazenamento, nem podia levá-lo consigo, por dois bons motivos.
A primeira era que ele não confiava que algo vivo estivesse tão perto de seus órgãos vitais. A segunda era que, mesmo que fosse realmente inofensivo, o lótus vermelho não sobreviveria caso ele tivesse que liberar novamente a aura negra ou qualquer tipo de magia de si mesmo.
Não importa o quão precioso pudesse ser, nada era mais importante do que sua própria vida. Do jeito que estava, o lótus vermelho era um fardo ainda pior do que qualquer companheiro que ele já teve.
O único ponto de referência que ele conhecia era a academia, então ele decidiu enterrá-lo perto da entrada, esperando que ao retornar ele tivesse inventado uma maneira de contrabandeá-lo para dentro sem ser notado.
No entanto, o plano tinha uma falha enorme. Colocar uma flor perto de terra fértil era potencialmente uma receita para o desastre. E se a Abominação ainda estivesse viva e pronta para renascer assim que tivesse nutrientes suficientes?
Lith conjurou todos os feitiços de escuridão que conseguiu usar de uma vez, antes de deixar o lótus vermelho entrar no pequeno buraco que ele havia cavado.
Antes mesmo que o lótus vermelho pudesse tocar o chão, ele começou a criar raízes que se aprofundaram, enquanto a própria terra se movia para cima, estranhamente lembrando Lith da “Criação de Adão” de Michelangelo.
Assim que se tocaram, as raízes ficaram mais grossas, rapidamente se transformando em videiras que se enrolaram ao redor do lótus, reunindo o que parecia ser um corpo humanoide. Lith ativou os feitiços, conjurando energia escura o suficiente para transformar todo o pedaço de terra em um deserto, mas não os disparou.
A Abominação nunca teve um corpo humanoide, também em vez de morrer, a vegetação próxima prosperou. Incontáveis botões de flores floresceram de uma vez, folhas amarelas ficaram verdes novamente.
Lith fortaleceu os feitiços e lançou novos, sem se importar com a beleza ao seu redor.
Quando a coisa parou de crescer, Lith se viu olhando para a mulher mais linda que já tinha visto. Seus grandes olhos vermelhos brilhavam na luz da manhã como rubis magistralmente lapidados. Tudo em seu rosto era perfeito, desde as feições delicadas até seus lábios carnudos.
Ela tinha cabelos grossos e despenteados, vermelhos como folhas de bordo durante o outono, o que lhe dava um charme selvagem e desenfreado. Além disso, o fato de ela estar completamente nua, não deixando nada para a imaginação sobre suas curvas suaves e cheias, não a machucava.
A única coisa que traía sua natureza não humana era a pele verde-clara.
— Só me dê uma boa razão. — Os punhos de Lith agora estavam pretos devido à enorme quantidade de energia escura que continham. O ar ao redor dele estava tão cheio de magia mortal que a criatura em seu estado debilitado mal conseguia respirar.
— Eu sou uma dríade. — Ela disse como se isso explicasse tudo, com uma voz tão clara quanto uma fonte na montanha.
— Eu não me importo. — Lith fez a energia escura avançar, não lhe deixando uma saída.
— Eu sou uma das protetoras desta floresta. O monstro que você matou roubou e corrompeu meus poderes para prolongar sua existência. — Ela estava começando a ficar assustada, essa não era a reação usual que ela normalmente evocava em humanos machos.
— Ainda não há um motivo.
— Eu posso recompensá-lo. — Ela mordeu o lábio inferior, jogando sua última carta.
— E em que bolso exatamente você guardaria algo de valor nessa roupa festiva? — A massa escura só precisava de um último empurrão para destruí-la.
— Em nome da Grande Mãe, que tipo de homem trata dessa maneira uma donzela que ele acabou de salvar?
Seu salvador parecia impossível de agradar e completamente imune ao seu charme.
Infelizmente para a dríade, o núcleo de Lith havia se estabilizado o suficiente para superar até mesmo sua paixão por Nalear. Naquele momento, seu coração estava frio como gelo.
— Alguém que não pensa com a cabeça de baixo, e não confia em alguém que acabou de conhecer só porque ela tem um rosto bonito. Agora me dê uma boa razão. Não vou perguntar três vezes.
— Porque podemos ajudar você. — Disse uma terceira voz.
Outra dríade emergia lentamente de um carvalho próximo, com as mãos erguidas em sinal de rendição. Antes de largar o lótus vermelho, Lith havia ativado a Visão da Vida, caso outra criatura que trocasse de corpo aparecesse da flor.
Portanto, ele não perdeu a chegada da segunda dríade, o que lhe permitiu atacá-la com os feitiços armazenados em suas mãos.
A nova dríade tinha cabelos lisos, loiros como trigo, e usava o que parecia um vestido branco de algodão leve, deixando apenas seus delicados ombros e braços expostos. Sua figura era mais esbelta do que a das outras dríades, mas não menos atraente.
— Se alguma coisa acontecer comigo, a cabeça de folha entra em hibernação. — A vontade de Lith era a única coisa bloqueando a barragem de energia escura, como um interruptor de segurança.
A dríade loira tirou vários tesouros naturais da árvore.
Alguns Lith tinha visto nos livros, outros eram completamente novos. Mas cada um deles, não importa se fruta, flor ou raiz, estava cheio de energia mágica.
Vendo que ele ainda não estava se movendo, a dríade Loira levou a mão esquerda ao peito. Um pequeno lótus amarelo saiu, e através da Visão de Vida ele pôde ver que ela tinha acabado de perder uma grande parte de seu poder mágico.
— Isto é parte do meu coração. — Ela entregou a ele. — Enquanto você o tiver, minha vida estará em suas mãos.
“É verdade.” Solus confirmou. “Há uma conexão clara entre elas. É como se ela tivesse passado seu núcleo de mana para você.”
Lith capturou o lótus amarelo com magia espiritual, enviando sua vontade através dele. Obedecendo à sua ordem silenciosa, a dríade loira se ajoelhou. A sensação que ele teve foi fortalecedora e repulsiva ao mesmo tempo.
Ter esse grau de controle sobre outro ser senciente era claramente errado.
— Como você pode me ajudar? — Ele sentiu apenas verdade nas palavras dela.
— Podemos encontrar uma maneira de curar sua alma.
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