Capítulo 123 - Separação

No momento em que Lith colidiu com a fenda espacial, ele sabia que algo horrível aconteceria. Torcendo e virando seu corpo apesar da agonia ofuscante, Lith conseguiu usar magia de ar para evitar bater de cabeça contra ela.

Mas com a pequena margem que ele tinha, e a fraca energia que ele conseguiu reunir, evitar a fissura completamente era impossível. Seu braço esquerdo penetrou-a até a cabeça do úmero, dando-lhe a sensação de que alguém havia jogado uma pedra enorme de um penhasco, mas não antes de colar sua mão esquerda nela.

Era como se cada célula do seu braço tivesse sido colocada em um liquidificador cheio de gasolina e uma pederneira. Ela se estendia infinitamente no espaço deformado, aparecendo e desaparecendo várias vezes de diferentes rachaduras espaciais, antes de finalmente se fecharem sob o efeito do artefato de Linjos.

O resultado foi que tanto Lith quanto seu braço esquerdo estavam finalmente livres do torno dimensional. Mas enquanto ele ainda estava onde havia caído, o braço estava a cerca de vinte metros de distância, cortado de forma limpa do ombro com precisão sobre-humana.

O mundo de Lith ficou vermelho quando sua mente foi além da dor e do sangue jorrando do coto, percebendo o que tinha acontecido. Não importa quantas vezes ele tenha simulado mentalmente o evento no passado, o choque da amputação quase o dominou.

Quase.

Emitindo um rugido indignado em vez de um grito de dor, Lith usou a energia que lhe restava para estancar o sangramento, antes que seu corpo desabasse devido ao dano acumulado.

O grupo parou de andar desde que seu amigo foi derrubado por um escudo de torre, arrancado das mãos de seu dono pela mesma explosão que o transformou em uma bala mortal.

Enquanto os outros corriam para o lado dele, Phloria se virou, correu até o braço decepado e o guardou em seu amuleto dimensional o mais rápido que pôde.

“Segundo meu pai, recolocar um membro é muito mais fácil do que fazê-lo crescer novamente. O importante é preservá-lo nas melhores condições possíveis. Um item dimensional é a solução ideal, pois ele não apodrecerá ou se degradará enquanto estiver lá.”

Quando Quylla chegou até ele, ela pensou que já era tarde demais. Apesar de estar apenas parcialmente curado, o coto sangrava muito pouco, e ela não conseguia sentir o pulso.

Se Lith estivesse realmente morto, ela teria sido forçada a tentar uma manobra de ressuscitação¹, mesmo correndo o risco de comprometer ainda mais a integridade do corpo dele. Mas se houvesse ao menos uma centelha de vida, ela sabia, ou melhor, acreditava firmemente que ele teria sobrevivido.

— Maldita magia de diagnóstico! É muito lenta! — Ela xingou interiormente, tirando um pequeno espelho de seu amuleto dimensional e colocando-o na frente da boca e do nariz dele. O vidro embaçou, dando-lhe esperança.

— Yurial, cure-o. Você já deu a ele energia demais, não podemos permitir que ninguém morra. Friya, aumente sua força vital, eu o manterei estável.

A tarefa de Quylla era a mais difícil. Ela tinha que usar feitiços de diagnóstico para encontrar os órgãos mais danificados e, então, alternar a cura e a infusão de energia sem comprometer o trabalho dos outros.

Cura muito rápida o mataria, ele estava fraco demais para suportar mais esforço. Muita energia o mataria também. Se o coração de repente começasse a bater rápido, Lith sangraria pelas inúmeras feridas abertas ou morreria devido à falência de órgãos.

Mas se eles agissem com muita cautela, seu corpo simplesmente entraria em colapso. Era como um jogo de Jenga com pedaços de cristal quebrados. Um movimento errado significaria o fim, sem chance de recomeçar.

Primeiro, ela terminou de consertar o ombro decepado, então ela se harmonizou com os feitiços de seus amigos, consertando qualquer erro que eles cometeram no calor do momento. Diferentemente dela, eles não tinham experiência real como curandeiros.

E para piorar as coisas, o primeiro paciente deles sem a supervisão de nenhum Professor era um amigo próximo. Por dentro, todos os três só queriam fugir chorando daquele inferno.

Eles já estavam cansados da lição de magia dimensional e do pesadelo que nasceu dela. Eles estavam no limite o tempo todo, acreditando que cada segundo seria o último. E quando finalmente tudo parecia ter acabado, eles foram forçados a encarar a morte de frente.

Ainda era manhã, mas parecia que uma semana havia se passado. As únicas coisas que os mantinham juntos eram a raiva e a teimosia. Raiva vinda da frustração de serem constantemente varridos por forças além do seu controle, e a teimosia que os fazia não quererem ceder a qualquer custo.

Ao lado deles, uma silenciosa, mas inestimável quarta jogadora lutava com tudo o que tinha. Solus estava constantemente gastando suas próprias energias para manter a fusão de luz ativa, depois que Lith perdeu a consciência.

Quando as crianças começaram o tratamento, foi ela quem usou o Revigoramento para redirecionar os feitiços de cura para onde eram mais necessários, o que permitiu que tudo corresse bem.

Três jovens magos desesperados não seriam capazes de lidar sozinhos com tal situação.

Principalmente porque Quylla estava cansada e com pouca mana depois de ter fechado tantas rachaduras lutando ao lado de Lith, e Yurial já havia passado a Lith grande parte de sua força vital, o que já era um milagre para ele continuar de pé sem ajuda.

Quando terminaram, ele não cheirava mais a churrasco.

A maior parte da pele queimada foi substituída por uma nova, mas a impressão geral ainda era de uma lagosta cozida demais.

— Excelente trabalho, mas ele ainda está em condições críticas. Precisamos levá-lo ao hospital da academia o mais rápido possível. — Após evacuar o centro de treinamento, Linjos retornou para oferecer sua ajuda.

Quando ele se abaixou sobre Lith, tentando agarrá-lo, Quylla o recebeu com um soco perfeitamente direcionado no nariz, resultando em um som claro de algo quebrando e um sangramento nasal.

— Você é louco? — Ela gritou com ele, sem respeito algum por sua antiguidade ou status.

— Não podemos movê-lo. Ele pode entrar em choque com a amputação a qualquer momento. A magia da luz precisa de tempo para fazer efeito total. Você realmente estudou antes de se tornar um diretor ou você ganhou o título em um sorteio?

Linjos queria repreendê-la duramente, mas depois de perceber que o punho dela ainda estava erguido, na posição ideal para acertá-lo na virilha, ele deu um passo para trás.

— Jovem senhorita, vejo que você está muito chateada, então vou ignorar sua falta de disciplina, só dessa vez. — Sua voz agora estava nasal, até que um simples feitiço de cura parou o sangramento e endireitou seu nariz.

— Mas para sua informação, agora que todas as proteções estão ativadas novamente, podemos movê-lo com segurança com Passos de Dobra. Além de ser um excelente curandeiro, eu já alertei o departamento de luz. Onde, em nome dos deuses, está Manohar?

— Bem aqui. — Disse o deus da cura, dando-lhe um soco no nariz também.

— Por que você fez isso? — Linjos ficou pasmo.

— Porque ela está certa, você está errado e não me disse que o paciente é um dos meus! — Manohar formulou um feitiço rápido que fez Lith parecer humano novamente, até mesmo fazendo seu cabelo crescer para um comprimento médio.

— Agora é seguro movê-lo, seu curandeiro de meia tigela. — Ele disse lançando um olhar maldoso para o Diretor.

— Alguém pegou o braço dele ou ele está perdido?

— Sim, senhor. — Phloria mostrou-lhe seu amuleto dimensional.

— Ótimo! Trinta pontos para o varapau chato pelo raciocínio rápido. — Phloria não sabia se ria ou chorava com o comentário rude.

— Cinquenta pontos para cada um de vocês por salvar um colega, e outros cinquenta para a baixinha magricela pelo soco bem executado.

— Primeiro, esta não é sua aula. Segundo, conceder pontos por agredir um Diretor é algo que não pode fazer! — Linjos estava fumegando de raiva.

— Bem, você sempre soube que eu sou um inovador.

Manohar deu de ombros, abrindo uma escada para a Unidade de Terapia Intensiva e desaparecendo por ela com o grupo de Lith.

Linjos permaneceu ali, boquiaberto, com um comentário sarcástico ainda preso na garganta, enquanto o resto da equipe ria de suas despesas.

1. omo RCP[↩]