Capítulo 3: O festival
13 anos depois…
— AAAAAHHH. — Acordei gritando e ofegante na minha cama, com o coração disparado como se tivesse acabado de escapar de um pesadelo. Minha mão tremia ao tocar meu peito, tentando acalmar a agitação.
Nesse momento, tio Jack entrou no meu quarto, com uma expressão de preocupação.
— Jovem Mestre Saito, o que foi? Você teve um pesadelo?
— Sim… — Sentei-me, colocando a mão na cabeça, ainda um pouco tonto. Era estranho e perturbador; apesar de o sonho ter parecido terrível, minha mente só guardava borrões indistintos.
— Deve ter sido terrível pra você acordar assim.
— Não consigo me lembrar de nada, só de alguns borrões.
— Já tá tarde. Vamos!
Me levantei, ainda um pouco confuso pelo pesadelo. Espreguicei-me, troquei de roupas e senti a maciez do tecido refinado contra minha pele. Meu pai, sendo uma figura importante, nos proporcionava uma vida confortável, refletida na qualidade das minhas roupas.
Ao sair do meu quarto, caminhei ao lado do tio Jack pelos extensos corredores da minha casa, tentando afastar os resquícios do sonho perturbador.
— Tio Jack, já vamos começar o treino?
— Não, primeiro preciso falar com seu pai.
Suspirei e abaixei a cabeça, um pouco desanimado.
Toc, toc!
Tio Jack bateu na porta.
— Pode entrar! — Uma voz grossa ecoou de dentro do escritório.
Tio Jack e eu entramos juntos. Meu pai estava de costas, lendo alguns arquivos perto de uma estante. Sua postura rígida refletia a frieza que o definia. Ele sempre usava aquela máscara preta que cobria metade do rosto, e eu nunca perguntei o porquê.
O escritório era modesto, com paredes cobertas por prateleiras repletas de livros antigos e mapas. A mesa, organizada de maneira meticulosa, estava cheia de papéis e instrumentos de escrita. A luz era fraca, vinda de um candelabro no canto, e alguns raios de sol penetravam pelas janelas altas, criando um contraste entre a iluminação suave e as sombras, em sintonia com a personalidade séria e reservada do meu pai.
— O que foi? — perguntou meu pai, sem desviar a atenção dos arquivos.
— Chefe, nessa semana o jovem mestre melhorou muito em pouco tempo.
— Bom. Já terminou todas as lições de hoje?
— Ainda faltam algumas…
— Então o que tá fazendo aqui, perdendo tempo?! — Meu pai finalmente se virou e me encarou. Engoli em seco, sentindo a pressão daquele olhar intenso sobre mim, sem saber como responder.
Baixei a cabeça e cerrei os punhos, sentindo a frustração e a raiva se acumularem em mim. Sem dizer nada, saí correndo da sala, deixando meus pensamentos e emoções em conflito.
✧༺⚔༻✧
Ponto de vista do Jack.
Estava parado observando o jovem mestre sair correndo, e em seguida, me virei para Elion.
— Chefe, custa elogiar uma única vez? Você deveria ser mais atencioso com o jovem mestre. Afinal, ele é seu filho!
Elion desviou o olhar por um momento, como se estivesse imerso em uma reflexão profunda.
O que será que deu nele? Desde a morte de Kathleen, parece que sua obsessão por caçar aqueles monstros só aumenta.
Elion caminhou até sua mesa e se sentou.
— Quando eu tinha 10 anos, a mesma idade dele, já ajudava os aldeões enfrentando lobos selvagens. Você tá sendo gentil até demais, deixando ele ir para a capital sozinho!
— Chefe, nesta casa só tem eu, você, uma senhora empregada, e um velho professor que aparece duas vezes na semana. Além disso, não se esqueça de que esta casa fica em um local privado, onde ninguém pode entrar sem permissão, por ordem do rei. Não tem nenhuma criança da idade dele pra brincar ou fazer coisas de criança. Ele fica o dia todo treinando e estudando.
Elion fixou seu olhar em mim, permanecendo em silêncio por alguns instantes.
— Ele tem que ficar forte mais rápido. Você sabe que isso é necessário.
Às vezes isso realmente me incomodava. Eu sabia que o jovem mestre precisava se esforçar para melhorar o quanto antes, mas não era assim que um pai deveria tratar seu filho.
Me virei um pouco irritado, ficando alguns segundos em silêncio antes de falar.
— Não se esqueça da promessa que fez a Kathleen.
Após isso, deixei a sala, permitindo que Elion refletisse sozinho sobre as palavras que tinha acabado de ouvir e sobre a promessa que tinha feito a Kathleen.
Espero que um dia, ele volte a ser como era.
Enquanto caminhava pelo corredor da casa, passei por paredes de tijolos adornadas com tapeçarias antigas e móveis de madeira escura. O chão rangia suavemente sob meus passos.
O antigo dono desta casa realmente tinha bom gosto. Os móveis são de alta qualidade, algo esperado, já que ele era um lorde. Parece que ele comprou algumas terras em Lunaris e foi pra lá, deixando a casa praticamente abandonada. Como era um velho amigo de Gredory, ele a disponibilizou pra Elion.
Ao descer a escada do salão principal, avistei pela porta aberta o jovem mestre sentado sozinho na escadaria do lado de fora. Os degraus eram desgastados pelo tempo e cobertos por folhas caídas. O garoto parecia perdido em pensamentos, com o olhar fixo no chão.
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Ponto de vista do Saito.
Eu ainda estava chateado com meu pai, o peso das palavras dele pairando sobre mim. Meus dedos brincavam distraídos com uma folha seca ao meu lado, até que senti uma mão sobre minha cabeça. Com um sorriso gentil, tio Jack sentou-se ao meu lado. Um calor reconfortante se espalhou pelo meu corpo, e meus olhos, antes presos ao chão, se levantaram lentamente. A presença dele trouxe uma sensação de segurança que eu nem sabia que precisava.
— Tudo bem, não precisa ficar triste. Apesar dele parecer uma pessoa ruim, no fundo, ele gosta muito de você.
— Não parece — respondi, irritado — ele nunca sai daquele escritório pra ver meu treinamento! Vive viajando e, quando passa por mim, faz aquela cara de pena. Nem me deixa ir para a floresta! Parece que nunca confia em mim.
— Você sabe que a floresta tá cheia de animais selvagens que podem te machucar.
— Eu já sou bastante forte. Posso derrotar todos!
Tio Jack envolveu meu pescoço com o braço esquerdo em um gesto caloroso, puxando-me para perto enquanto soltava uma risada contagiante. Instintivamente, meu olhar desviou para a mão dele.
— Tio Jack, me conta a verdade: como você perdeu esses dois dedos?
— Ah, isso? — Ele olhou para a sua mão esquerda, coberta pela luva, e esboçou um sorriso de canto. — Já te contei várias vezes. Para me casar, tive que passar por uma prova de coragem feita pelo pai dela: cortar dois dedos.
É óbvio que essa história é uma mentira. Não sei por que ele insiste em não me contar a verdade.
Ele se levantou e deu uma olhada ao redor, como se seus olhos buscassem algo.
— Venha, vou te mostrar uma técnica com a espada que seu pai me ensinou.
— Não quero mais saber daquele velho!
— Apenas venha ver.
Mesmo estando em negação, fiquei curioso e acabei seguindo tio Jack, que parecia determinado a ir em direção a uma árvore próxima.
Ele se aproximou da árvore e sacou sua espada. Era um grande carvalho, suas folhas farfalhando levemente com a brisa fresca. O chão ao redor estava coberto de folhas secas, e a luz do sol filtrava pelas copas, criando um jogo de sombras ao nosso redor.
Ele assumiu uma posição de combate que eu nunca tinha visto antes, com a perna direita à frente e o braço direito segurando a espada que passava por baixo do braço esquerdo, com a ponta para trás. O ambiente parecia prender a respiração, como se toda a natureza ao nosso redor estivesse esperando para ver o que viria a seguir.
Seu olhar se tornou sério, e sua expressão transmitia uma concentração profunda, como se ele estivesse se desligando do mundo ao redor. Eu podia ver a determinação em cada músculo do seu corpo, pronto para liberar toda sua força a qualquer momento. Depois de assumir essa posição, tio Jack fechou os olhos e começou a respirar calmamente.
Fiquei olhando fixamente para ele, sem entender o que estava prestes a fazer.
— Tio Jack, o que voc… — Antes que eu pudesse perguntar, uma forte brisa soprou, derrubando várias folhas.
Nesse momento, percebi que ele estava concentrando força no braço que segurava a espada e nas pernas. De repente, ele iniciou uma onda de ataques ao seu redor, tão rápidos que eu mal conseguia acompanhar.
A lâmina da espada brilhava sob o sol, enquanto girava a espada com movimentos graciosos. Fiquei impressionado com a habilidade, mas também preocupado com minha própria segurança. Afastei-me alguns passos, mantendo os olhos fixos nele, enquanto a tempestade de ataques continuava.
Após terminar o ataque, ele se virou para mim e me encarou com um sorriso ofegante, os olhos brilhando com excitação e satisfação. Fiquei boquiaberto, com os olhos arregalados e o coração acelerado, impressionado com a habilidade que tinha acabado de testemunhar.
— Então, o que achou?
— Foi incrível! Eu quero aprender!
— Você ainda não percebeu? — Ele riu, com um brilho divertido nos olhos.
Confuso, olhei ao redor, tentando captar o que ele queria dizer.
— Preste atenção no chão, ao meu redor.
Ao observar os pés dele, notei que algumas folhas estavam cortadas ao meio, totalizando seis delas.
— Tio Jack, não acredito! Você cortou seis folhas antes delas caírem no chão!
— Meu recorde é sete.
Ainda impressionado com a habilidade dele, tentei segurar minha empolgação.
— Mas meu recorde não chega nem perto do seu pai, que já cortou catorze folhas. Quando ele me mostrou isso pela primeira vez, fiquei paralisado por alguns segundos, sem saber o que dizer. Ele se movimenta com tanta velocidade que é capaz de criar uma corrente de ar ao seu redor.
— Você pode me ensinar durante o treino de hoje?
Tio Jack guardou sua espada na bainha presa à cintura e se aproximou de mim com passos lentos.
— Hoje não vai ter treino.
Meu rosto se contraiu em um reflexo de desapontamento. Eu realmente esperava treinar depois do que acabei de ver.
— Por quê?
— É que na capital tão preparando o festival, e eu tenho que ajudar em algumas coisas.
Inicialmente desanimado com a notícia, minha expressão mudou para uma de surpresa quando ele jogou uma bolsa com moedas em minha direção.
— Pra que esse dinheiro?
Tio Jack coçou o queixo e desviou o olhar para o horizonte.
— Se você terminar seus estudos rápido, terá o resto da tarde livre. Então, quem sabe, pode fazer alguma coisa pra se divertir?!
Ao fixar o olhar na bolsa de moedas, percebi que poderia usar esse dinheiro para aproveitar o festival. Uma onda de entusiasmo tomou conta de mim, e, com um sorriso animado, olhei para ele.
— Tio Jack, vou fazer meus deveres agora mesmo.
Não esperei por uma resposta e saí correndo, acenando para ele enquanto me afastava. Tio Jack ficou sorrindo e acenando de volta.
Após terminar todos os meus estudos tediosos de gramática e matemática, abri a janela e, com um salto ousado, desci segurando firmemente nos tijolos e pousei graciosamente no chão. Olhei ao redor e corri em direção à capital, animado com a ideia de assistir ao festival e aproveitar o dinheiro que tio Jack havia me dado.
Minha casa ficava um pouco afastada da capital de Bartton, em uma área tranquila cercada por florestas densas. Como minha animação era tanta, corri com entusiasmo e percorri o caminho em poucos minutos.
Após atravessar uma grande ponte de pedras que se estende sobre o rio que deságua no mar, finalmente cheguei à capital. Fiquei extremamente surpreso com a quantidade de pessoas e com toda a decoração em comemoração ao festival. Era a minha primeira vez nesse evento. Rostos sorridentes estavam por toda parte, com crianças brincando e vendedores chamando a atenção dos passantes.
Era impossível não se sentir envolvido pela energia vibrante e pelo entusiasmo que permeava o ar. As construções eram altas e feitas de pedra clara, com janelas adornadas por flores coloridas. Bandeiras e fitas de várias cores estavam penduradas entre as casas, e o som dos músicos tocando suas melodias enchia o ar, misturado ao burburinho animado das pessoas.
De acordo com a história, esse festival servia para fortalecer a união entre os dois reinos do sul. Há muito tempo, o rei de Oastein mantinha um tratado com o norte, recebendo suprimentos e dinheiro em troca de apoio militar. No entanto, quando esses suprimentos foram subitamente interrompidos, Oastein enfrentou uma crise.
Vendo-se em uma posição vulnerável, o rei de Oastein, conhecido por sua tirania, voltou sua atenção para o reino de Bartton. Atraído pela abundância de animais e terras férteis, ele decidiu conquistá-lo. Isso deu início a uma série de batalhas sangrentas.
Para sustentar seu exército e os recursos necessários para a guerra, o rei aumentava constantemente as taxas e recrutava todos os que fossem capazes de lutar. Sua opressão se tornou insuportável, levando o povo de Oastein a se rebelar. Após muita luta, eles finalmente conseguiram destronar o tirano.
Com um novo rei no poder, decidiram criar esse festival que ocorre a cada cinco anos, como um símbolo de união entre os dois reinos. Durante os dias do evento, pessoas de ambos os lados compartilhavam tradições, músicas e comidas, promovendo a paz e estreitando laços de amizade.
Como os reinos eram separados pelo mar, nesses dias todos os transportes de barco eram gratuitos. Por isso, acreditava que muito contrabando ocorresse também, aproveitando a falta de supervisão por conta da grande quantidade de barcos.
Não entendia por que continuavam com isso, já que os reinos mantinham um bom relacionamento há muitos anos. Mas, para ser sincero, não sabia muito sobre política.
Caminhei pelas ruas movimentadas do festival com os olhos brilhando de curiosidade, encantado com as inúmeras novidades ao meu redor. Vi artistas de rua fazendo malabarismos com fogo, suas roupas coloridas brilhando sob a luz das tochas. Um mágico, vestindo um manto cheio de estrelas, fazia truques incríveis com cartas, arrancando risadas e expressões de espanto de crianças e adultos que se aglomeravam ao seu redor.
De repente, meus olhos se fixaram em uma cena que chamou minha atenção: uma criança estava saboreando algo grande e redondo espetado em um palito. Fiquei curioso e decidi me aproximar para ver do que se tratava.
— Olá, como é o nome disso? — perguntei ao vendedor.
— Isso é algodão doce. Vai querer comprar um?
— Sim!
Fiquei hipnotizado pela magia do algodão doce se formando diante dos meus olhos, enquanto o habilidoso vendedor girava a roda com maestria, transformando açúcar cristal em fios doces e coloridos.
— Aqui está. É 1 cruzeiro.
Rapidamente, peguei minha bolsa de moedas e retirei uma delas com agilidade. Com um sorriso no rosto, estendi a moeda ao vendedor, finalmente adquirindo o tão esperado espeto de algodão doce.
— Obrigado, volte sempre.
Dei uma mordida e senti o doce derreter na minha boca, revelando um sabor delicioso. Animado, decidi visitar várias barracas para experimentar mais comidas.
Enquanto caminhava segurando um espetinho de carne, fiquei fascinado com tudo o que estava ao meu redor. Distraído, acabei esbarrando em alguém que usava um capuz verde. A figura misteriosa se moveu com agilidade, quase como se estivesse flutuando, e, por um breve instante, senti que havia algo estranho, quase ameaçador, em sua presença.
— Ei… — Porém, quando me virei para reclamar, percebi que a pessoa já havia desaparecido em meio à multidão.
Que estranho, parecia que tinha visto uma grande barba, mas como era da minha altura, tinha que ser uma criança. Deve ter sido apenas minha imaginação.
Ignorei e continuei caminhando pelo festival.
Pouco tempo depois, avistei quatro crianças brincando, chutando uma bola. Me aproximei delas.
— Olá, posso brincar com vocês?
As crianças pararam por um momento, olhando para mim desconfiadas.
— Não! Sai daqui. Você tá nos atrapalhando!
Olhei para baixo e vi minha bolsa de moedas. Então, tive uma ideia.
— Esperem! Se me deixarem brincar com vocês, posso dar algumas moedas. — Estendi os dois braços, segurando a bolsa aberta cheia de moedas. As crianças ficaram surpresas com a quantidade de dinheiro e se reuniram para sussurrar entre si.
— Tá bem, vamos deixar você jogar bola com a gente.
— Quantos cruzeiros vocês querem?
— Faz assim, pra não perder tempo: vai pegar a bola que caiu ali no buraco. Aí, você deixa a bolsa de dinheiro pra gente contar as moedas mais rápido.
— Certo!
Entreguei a bolsa de moedas e saí correndo com bastante animação para pegar a bola que havia caído no buraco. Eu confiava plenamente nas crianças. No fundo, talvez eu só quisesse me sentir parte de algo, mesmo que fosse apenas um jogo simples. Porém, quando voltei, não havia mais ninguém. As crianças tinham ido embora levando todo o meu dinheiro.
Ainda atordoado com toda a agitação do festival e por ter baixado a guarda, percebi que fui ingênuo demais. Irritado e frustrado, joguei a bola no chão e comecei a procurá-las.
Caminhei apressadamente entre as pessoas, meu olhar frenético vasculhando cada canto, mas sem sucesso. Perguntei a várias pessoas, até que uma delas me contou ter visto algumas crianças correndo, segurando algo que parecia ser uma bolsa. A mulher apontou na direção que elas seguiram e, sem hesitar, corri para lá, o som da festa ficando para trás.
Após muito procurar, acabei encontrando as crianças no lugar mais pobre da cidade, em um beco escuro e estreito, iluminado apenas por alguns raios de sol que atravessavam as frestas das construções. O cheiro de lixo acumulado e umidade tomava conta do lugar, e o som distante da festa na capital contrastava com o silêncio tenso do beco.
Abaixadas, as crianças dividiam meu dinheiro entre elas. Me aproximei, sentindo uma mistura de raiva e tristeza.
— Ei, esse dinheiro é meu! Devolvam agora!
O menino mais alto se levantou e deu alguns passos, aproximando-se ainda mais de mim.
— Se quer, vem pegar! — Ele ficou me encarando com um sorriso confiante.
Bastante irritado, avancei em direção ao maior que estava na minha frente. Quando ele tentou revidar com um soco, me esquivei habilidosamente e acertei um gancho de direita em seu queixo, derrubando-o no chão. Os outros três garotos ficaram claramente surpresos com a minha reação.
O outro garoto, que segurava o dinheiro, correu desajeitadamente na minha direção. Reagi rápido, desviando e esticando a perna à sua frente. Ele tropeçou e caiu no chão com um baque, derrubando a bolsa. Me abaixei e recuperei meu dinheiro. Em seguida, abri a bolsa e contei rapidamente as moedas.
— Tá tudo aqui. — Levantei-me, ainda encarando os outros garotos. — Quem é o próximo? — Com um sorriso desafiador no rosto, olhava fixamente para os dois garotos que permaneciam parados.
Eles se entreolharam, hesitando por um momento, com expressões que oscilavam entre medo e raiva, mas nenhum deles teve coragem de dar um passo à frente.
Logo percebi que eles me encaravam com um sorriso estranho.
— Eu vou ser o próximo! — disse uma voz que veio de trás de mim.
Não tive tempo de reagir, pois assim que me virei, recebi um chute na barriga que me fez cambalear para trás e cair.
O primeiro garoto que acertei havia chamado seu irmão, um homem que parecia ter mais de 20 anos.
— A gente encontrou uma bolsa de dinheiro, mas ele quer roubar de nós — disse o irmão menor, olhando para mim com um sorriso.
— O dinheiro é meu! Vocês que roubaram de mim! — Levantei-me com a mão sobre a barriga, sentindo dor.
Assim que o irmão mais velho viu a bolsa cheia de moedas na minha mão, começou a apertar os punhos.
— Essas roupas… você é da nobreza, não é? Vocês já têm muito dinheiro e ainda quer roubar o nosso?
No momento em que ele ia dar um soco no meu rosto, consegui me defender com os braços. No entanto, por ser muito forte, a força do impacto fez meus braços serem empurrados para cima, deixando-me vulnerável. Ele aproveitou a abertura e acertou uma joelhada na minha barriga, me derrubando no chão. Caído, comecei a vomitar, enquanto meus olhos não paravam de lacrimejar. Em seguida, ele me segurou pelos cabelos e me encarou fixamente.
— Seu riquinho de merda, aqui não é o seu lugar!
Ele cuspiu no meu rosto. Sem hesitar, desferiu um soco violento no meu rosto, que me lançou contra um monte de lixo. A dor era insuportável, e meu corpo se recusava a reagir. Caído e incapaz de me mover, vi, impotente, enquanto eles se afastavam com meu dinheiro, sem sequer olhar para trás.
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Ponto de vista do Jack.
Estava carregando uma caixa cheia de peixes para ajudar Selena. Nos dias do festival, ela aproveita para assar alguns deles. Como seu preparo era muito bom, ela conseguia juntar uma boa quantia de dinheiro.
Ainda bem que ela é uma mulher forte. Após a morte de Roderick, teve forças pra continuar e cuidar sozinha de seu filho.
Se eu não estivesse tão ocupado, teria trazido Claris também. Nissa tava com um paciente e por isso, não conseguiu vir. Ela até brigou comigo por não estar dando tanta atenção a Claris, mesmo eu dizendo que tinha trabalho…
Por que as mulheres são tão complicadas?
Coloquei a caixa no chão, sentindo minhas costas exaustas, e me espreguicei lentamente para aliviar a tensão acumulada.
Prometi que traria Claris na próxima vez, e desta vez farei o possível pra cumprir minha palavra. Sim, é assim que um pai deve cuidar de sua filha.
Cocei a nuca, deixando escapar um longo suspiro.
Falando nisso, será que o jovem mestre tá gostando do festival?
Enquanto observava entre as pessoas, procurando pelo jovem mestre, notei, um pouco próximo de mim, um homem vestido com um manto e capuz preto, cuja postura parecia um tanto suspeita. Decidi me aproximar, tentando não chamar atenção. Logo depois, outros dois homens, vestidos de forma idêntica, aproximaram-se dele, trocando olhares rápidos e discretos, como se estivessem planejando algo.
— Chefe, será que ele tá mesmo aqui? — perguntou um deles.
O líder ergueu os olhos e examinou atentamente os arredores.
— Ele deve ter passado por aqui. Se separem e procurem entre a multidão.
— Entendido — responderam os dois.
Ah não… não acredito que é mais problema! E eu achando que teria um pouco de paz. Será que devo ir atrás deles ou avisar os guardas?
Espera, essa voz… acho que já a ouvi em algum lugar antes…
Decidi me aproximar um pouco, na tentativa de ver o rosto daquele que eles chamaram de chefe, mas ele saiu antes que eu pudesse observar melhor. Foi então que, ao olhar ao redor, avistei o jovem mestre entre as pessoas. Resolvi ir até ele primeiro.
— JOVEM MESTRE SAITO! O QUE TÁ ACHANDO DO FESTIVAL? TÁ SE DIVERTINDO?
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Ponto de vista do Saito.
Andava entre as pessoas no meio do festival, com a mão sobre o machucado no meu rosto, enquanto as lágrimas escorriam silenciosamente. Apesar de todo o barulho ao meu redor, era como se eu não ouvisse nada, até que senti uma mão repousar sobre o meu ombro. Virei um pouco o rosto e vi que era tio Jack. Ele imediatamente percebeu meu estado.
— O que aconteceu? Alguém bateu em você?
Sem responder, corri em direção à saída da cidade com o peito apertado e os olhos marejados. Uma mistura de vergonha, raiva e tristeza me consumia, enquanto as lembranças do que aconteceu me invadiam a mente.
No dia seguinte, estava em casa, ainda me sentindo péssimo com o que aconteceu no festival. A traição vinda de crianças me pegou de um jeito inesperado.
Será que confiar em alguém sempre termina assim, deixando a pessoa mal?
Durante o treinamento de espadas, minha mente vagueava, e eu mal conseguia defender os ataques do tio Jack.
— Vamos dar uma pausa — disse ele, enquanto guardava as espadas de madeira e se posicionava ao meu lado.
— O que tá acontecendo? Você está muito distraído.
— Eles me enganaram. Mesmo tendo confiado neles, roubaram todo meu dinheiro!
— Jovem Mestre, você é muito inteligente para sua idade, mas nosso treinamento é apenas para nos defendermos quando necessário. Não precisamos sair brigando com as pessoas. Era pra você ter vindo falar comigo.
— A partir de agora, não vou confiar em mais ninguém!
— Ué? Não confia em mim?
— Você é diferente…
Tio Jack colocou a mão no meu ombro e olhou em meus olhos, transmitindo confiança.
— Nem todos são iguais, meu jovem. Tem pessoas más que se passam por gentis apenas pra enganar e roubar, mas também existem pessoas bastante confiáveis e gentis neste mundo, assim como sua mãe foi.
Senti meus ombros relaxarem enquanto seus olhos encontravam os meus, e um calor reconfortante me invadiu, dissipando parte da dor que eu sentia.
Com cuidado, segurei meu colar e deslizei os dedos até o pingente que guardava a foto da minha mãe em preto e branco.
— Tio Jack, você pode me contar mais sobre a mamãe?
Ele suspirou profundamente e, após um momento de reflexão, olhou para o céu antes de começar a falar. Seus olhos pareciam distantes, como se ele estivesse revivendo lembranças do passado.
— A senhorita Kathleen era uma pessoa bastante gentil. Mesmo tendo que enfrentar vários problemas, ela sempre tinha aquele lindo sorriso no rosto. Seu pai a conheceu em uma missão. Ela vivia em um pequeno vilarejo ajudando os aldeões.
Ele olhou para mim com um leve sorriso.
— Digamos que foi amor à primeira vista. Após isso, ele começou a visitar o vilarejo com frequência, e aos poucos, eles se aproximaram. Depois de um tempo, ela decidiu se mudar pra viver junto com ele. Um ano depois, ela teve você. — Tio Jack desviou o olhar para o chão, com uma expressão levemente melancólica. — Infelizmente, ela tinha uma doença que debilitava o corpo e acabou morrendo alguns dias depois.
Ouvir a história mexeu profundamente comigo.
— E foi por minha causa que ela morreu…
— Não, meu jovem. Sua mãe te amava de verdade e estava muito feliz por ter você na vida dela. Ela já lutava há muito tempo contra essa doença, e isso não tinha nada a ver com você.
Ainda me sentia triste, mas as palavras de tio Jack me ajudaram a superar aquele momento difícil.
Aprendi que a vida pode ser cheia de desafios, mas que também há pessoas boas e confiáveis no mundo.
— Então, bora treinar pra deixar sua mãe orgulhosa? — Ele fez um cafuné em mim antes de se afastar e jogar a espada de madeira.
Suas palavras pareciam acender algo dentro de mim, uma sensação de esperança e determinação que eu não sentia há muito tempo. Sorri, sentindo um novo ânimo crescer.
— Claro, tio Jack! Vamos lá!
Peguei a espada de madeira e me posicionei para o treino.
Tio Jack sempre tinha um jeito de me animar e me fazer sentir melhor.
Comecei a treinar com bastante foco, determinado a melhorar. De repente, tio Jack se esquivou com agilidade e me desequilibrou. Antes de cair, consegui agarrar a roupa dele, o puxando junto comigo. No final, nós dois acabamos no chão.
— HAHAHAHA… — ambos rimos bastante.
Uma obra de: Matheus Andrade.
Mapa do Mundo.
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A escala não é exata, já que fui eu quem fez e não sou bom nisso kkk. É apenas para termos uma ideia de onde estamos. Ele vai se revelando ao decorrer da história.
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