Capítulo 26 – JK
Área dominada pelo JK – 2 dias após a explosão
Granja das Hortênsias – Atual base do JK
Leonardo reuniu todos os membros do seu grupo. A intenção era clara: estabelecer as novas regras que governariam a base a partir daquele momento.
Ao seu lado, Donizetti e Thiago se mantinham firmes, empunhando pistolas Glock automáticas. As armas não estavam ali apenas por segurança — faziam questão de exibi-las, intimidando qualquer um que ousasse questionar a nova ordem.
Os sobreviventes reunidos trocavam olhares tensos, atentos ao que estava por vir. O silêncio pesava, apenas quebrado pelo vento que varria a base improvisada.
Leonardo respirou fundo, encheu os pulmões e iniciou seu primeiro discurso como líder.
— A todos que estão aqui presentes… — Sua voz ecoou, firme e carregada de arrogância. — Seja homem ou mulher, eu dou os parabéns pra vocês, seus cuzões! Tá ligado, família? Nós sobrevivemos àquela explosão do caralho que veio lá da puta que pariu e, principalmente, passamos por aqueles zumbis psicopatas ambulantes.
Ele fez uma pausa, analisando as expressões ao seu redor. Alguns assentiram, outros apenas mantinham o olhar fixo nele, esperando o desfecho.
— Mas deixando os agradecimentos de lado e indo direto ao que interessa… — Leonardo estalou os dedos, apontando para Donizetti. — Toda comunidade precisa do quê, Doni?
Donizetti ergueu o queixo, um sorriso cínico no canto da boca.
— Toda comunidade precisa de regra, cuzão.
Leonardo abriu um sorriso maldoso.
— Exatamente! Como ele falou, porra! E aqui, nós vamos seguir algumas regrinhas do morro, tá ligado?
Ele começou a caminhar lentamente entre o grupo, deixando a tensão crescer a cada palavra.
— A fita é essa, família: se alguém roubar outro membro da comunidade, vai pra resumo. Se constatar que roubou mesmo… perde a mão. Aqui é todo mundo se ajudando, caralho!
Alguns murmúrios começaram a surgir, mas ninguém ousou questionar.
— Agora, se estuprar ou matar alguém da comunidade… — Ele fez uma pausa dramática, deixando a expectativa pesar. — É a mesma fita. Vai pra resumo. A pena? Tortura e morte, cuzão!
Thiago interrompeu, cruzando os braços e inclinando levemente a cabeça.
— E tem mais, família! — Sua voz saiu arrastada, carregada de malícia. — É nóis quem manda agora, tá ligado? Quer entrar na comunidade? Só se for chamado por alguém daqui. Se ver um otário transitando no nosso território sem permissão…
Ele deu de ombros, soltando um sorriso de canto.
— Se achar que vale a pena, pode matar ou escravizar, fraga?
O silêncio caiu sobre o grupo, pesado como um caixão fechado.
Leonardo cruzou os braços, satisfeito.
Donizetti ergueu a mão acima da cabeça, apontando a arma para o céu e deixando o cano bem visível. Sua voz soou como um trovão abafado, carregada de desprezo:
— E quem for contra ou quiser vir com essa patifaria de humanidade, cuzão, vai entrar no chumbo! Isso se não acabar escravizado também, tá ligado, família? Agora, se tiver algum otário aqui que discorda, levanta a mão!
O silêncio foi imediato, pesado como uma lâmina encostada na garganta. O único som audível era o vento cortando entre as construções da granja e o distante coaxar de sapos em alguma poça suja. Ninguém ousou se manifestar. Não era só medo — havia uma aceitação latente, um desejo sombrio de pertencer a algo maior, mesmo que isso significasse abandonar qualquer resquício de moralidade.
Foi então que, do meio da multidão, uma mulher avançou com passos firmes. Seu corpo era de uma beleza chamativa, mas o rosto… O rosto trazia algo perturbador. Não era feiura comum, era um tipo de expressão vazia, marcada por um sorriso sutil e cruel. Os olhos dela pareciam fendas escuras que devoravam tudo ao redor.
— Olha aqui, Léo… — sua voz cortou o silêncio, carregada de malícia. — Vai ter alguma regra protegendo os escravos ou a gente pode fazer o que bem entender com eles?
Leonardo a observou com interesse, como um predador analisando outro da mesma espécie. Sua boca se curvou em um sorriso vagaroso.
— Gostei da pergunta. Qual é o seu nome?
Ela não hesitou.
— Ivana.
A multidão se agitou discretamente. Alguns a conheciam de antes, outros apenas sentiram a energia cruel que irradiava dela. Ivana não era alguém que hesitava diante do horror. Pelo contrário… parecia ansiar por ele.
Leonardo deu um passo à frente, olhando diretamente nos olhos dela.
— Se não desrespeitarem as leis da comunidade, podem fazer o que quiserem. Torturar, arrancar membro… foda-se. Só não quero ninguém me dando dor de cabeça.
O brilho perverso nos olhos de Ivana foi resposta suficiente. Alguns membros do grupo trocaram olhares discretos, tentando avaliar até onde aquela mulher poderia ir. Outros simplesmente sorriram, satisfeitos com a liberdade recém-adquirida.
Thiago então tomou a frente, batendo palmas secamente para chamar a atenção.
— Agora vamos organizar essa porra. Quero três filas: uma pro grupo de busca e coleta fora da granja, outra pra limpeza e manutenção, e a última pra cozinha. Cada grupo vai ter um responsável — e, claro, somos nós três.
Ele apontou para Donizetti:
— Doni vai cuidar do estoque e da cozinha.
Depois, bateu no próprio peito:
— Eu fico com a manutenção.
Por fim, indicou Leonardo:
— E o Léo vai liderar a busca e coleta. Tudo certo, família?
A movimentação foi imediata. Sem questionamentos, os grupos se formaram. A hierarquia estava clara e inquestionável.
Leonardo então deu o último anúncio, sua voz cortando o ar como uma lâmina afiada:
— Ainda hoje, eu e meu grupo vamos sair pra mapear a área. Quero saber exatamente quais são os riscos lá fora.
A reação veio em murmúrios de aprovação, acompanhados de acenos de cabeça e olhares determinados.
O que antes era um amontoado de sobreviventes agora se tornava algo mais estruturado, mais organizado… e muito, muito mais perigoso.
A Fortaleza Antero já não era o único assentamento sobrevivente da cidade.
E essa nova comunidade… não teria piedade.
Algumas horas depois, Donizetti ordena que todos saiam para fazer um levantamento nas casas ao redor, a fim de verificar o estoque de alimentos na granja. O balanço não foi bom: tinham o suficiente para apenas mais uma semana.
Ele observa a pilha de suprimentos, o peso da realidade caindo sobre seus ombros.
— A gente tá fodido… — ele murmurou, o tom de preocupação óbvio em sua voz. — Pelo visto, vamos ter que sair em busca de comida bem antes do que eu tinha planejado.
Seus olhos se fixam em um garoto moreno e baixinho que estava mais distante, e Donizetti o chama:
— Aê, baixinho, qual o seu nome?
O menino se aproxima e responde sem hesitar:
— O meu? Marcos. O que ocê tá precisando?
Donizetti não perde tempo e manda o garoto chamar Leonardo para avisá-lo sobre a falta de alimentos na despensa da granja.
Alguns minutos depois, Marcos retorna com uma expressão confusa.
— Não encontrei ele não, Doni.
Donizetti suspira, pensando rápido.
— Pelo visto, ele já deve ter saído pro reconhecimento da área… — ele comenta para si mesmo, mais para aliviar a tensão do que por qualquer outra coisa.
O garoto Marcos, com o olhar faminto, vê um pacote de biscoitos sobre a mesa e, com a voz cheia de ansiedade, pergunta:
— Doni, posso pegar esse biscoito aqui? Tô morrendo de fome.
Donizetti acena com a cabeça em concordância.
— Vai lá.
Enquanto o garoto pega o pacote, Donizetti vê Thiago caminhando entre as casas, passando de um lado para o outro. Ele o chama com urgência:
— Aê tio, nóis tá é fodido, mano.
Thiago, com o andar tranquilo de quem já estava acostumado com a tensão, para e cruza os braços, respirando fundo antes de responder.
— Qual foi, irmão?
Donizetti, com um ar grave, diz:
— Parça, a despensa não vai durar mais do que uma semana…
Thiago franze a testa, absorvendo as palavras com a calma de quem sabia que, nesse apocalipse, os problemas nunca se resolviam facilmente.
— Aí deu ruim. Nóis vai ter que passar essa fita pro Léo, parça. A responsa da coleta é dele, e ele vai ter que se virar com isso.
Nesse momento, Donizetti avista Leonardo voltando com seu grupo de reconhecimento. Ele grita para chamar sua atenção.
— Aê, Léo, cola aqui, mano!
Leonardo, que já estava a uma distância razoável, responde sem parar o passo.
— Marca um T aí que eu já tô chegando…
Ele se despede rapidamente do grupo e caminha até onde Donizetti e Thiago estavam. Quando chega, olha para os dois com expressão impassível e pergunta:
— Fala com nóis, viado. Qual é a fita?
Donizetti, com a cabeça baixa e o peso da situação nos ombros, responde com um tom mais grave, como se já soubesse o que estava por vir:
— Parça, nóis tá quase sem suprimentos!
Leonardo, com a expressão de quem não acreditava no que estava ouvindo, responde, a frustração evidente em sua voz.
— Então fodeu, parça… Hoje, quase não conseguimos rodar por aí sem esbarrar nos zumbis, e você tá me dizendo que já estamos sem recursos?
O silêncio que se seguiu foi pesado, o medo de uma nova crise pairando no ar. O grupo sabia que as coisas iam piorar, mas agora, o tempo não era mais apenas um luxo; era um inimigo invisível, esperando para engolir cada um deles.
O que era uma base segura agora estava se tornando um território instável, onde cada segundo contava.
Ivana, que estava ouvindo a conversa de longe, decide se aproximar. Ela entra no meio da discussão, com uma postura confiante, e lança sua proposta.
— Desculpa interromper, mas eu estava ouvindo a conversa e queria saber como vocês pretendem lidar com essa situação?
Leonardo a encara por um momento, desconfiado, e pergunta com sarcasmo:
— Ôxe, quem é essa louca?
Ivana não se intimida e responde com um sorriso sutil:
— Ah, eu sou a Ivana. Tava a fim de dar uma força pra vocês.
Donizetti, ainda cauteloso, observa a jovem e, com uma expressão séria, pergunta:
— E ocê tem alguma ideia de como a gente pode arranjar mais suprimentos?
Com um sorriso malicioso no rosto, Ivana responde sem hesitar:
— Tem uma maneira de aliviar esse peso das costas de vocês e, ainda por cima, fazer com que o pessoal se esforce mais lá fora, se necessário.
Leonardo, agora mais interessado, cruza os braços e pergunta, desafiador:
— Beleza. Se a sua ideia for boa e valer a pena, te dou um cargo de liderança aqui com a gente. Mas, se for ruim, nós três vamos te foder bem gostoso, hein?
Ivana sente que tem algo forte nas mãos. Ela estava confiante de que a ideia que tinha na cabeça seria bem recebida.
Com um olhar firme, ela responde:
— Vocês vão ser justos comigo?
Donizetti, sem hesitar, afirma:
— Claro, pode deixar, vai ser justo.
Ivana sorri e começa a expor seu plano com entusiasmo.
— Olha, ao invés de separar um grupo só para cuidar da comida e da despensa, eu sugiro que vocês digam que quem quiser comer vai ter que se arriscar lá fora. Quem não tiver coragem de sair pra buscar comida vai passar fome aqui dentro. Assim, mesmo com a situação tensa, todo mundo vai se dedicar mais para trazer suprimentos. E mais, se alguém quiser ficar morando aqui, vai ter que entregar 10% de tudo o que trouxerem de fora pra vocês. O que acham?
Os três líderes ficam boquiabertos, surpresos com a ousadia e a inteligência da proposta. Nenhum deles esperava algo tão pragmático, algo que realmente poderia funcionar. Mas, como nenhum dos três queria perder a chance de se aproveitar da situação, eles trocam um olhar entre si, decidindo o que fazer.
Apesar da proposta de Ivana ser brilhante, eles não conseguem evitar o impulso de jogar com ela. Sem dar pistas do que realmente pensam, respondem de maneira irônica:
— Ah, a ideia é uma merda.
Com risos maliciosos, os três se aproximam rapidamente de Ivana. Sem aviso, agarram os braços dela e a arrastam em direção a uma das casas vazias. Ivana, embora tenha percebido que a situação estava se desenrolando de maneira nada boa, observou que apenas Leonardo estava armado. Ela se manteve calma, mas já sabia que precisaria usar de todo seu jogo de cintura para sair daquela situação com algo a mais. Ela se recusava a ser apenas uma vítima na história.
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