Capítulo 0 Prólogo
Um sonho… Apenas isso. Um sonho. Ou, pelo menos, era o que eu queria acreditar. Depois de tudo o que vivi nesse mundo podre, onde confiar em alguém é como dançar com lâminas, sonhar parecia… quase proibido.
Estava ali, sentado numa velha cadeira de madeira, rangendo sob meu peso, com o corpo inclinado pra frente e os cotovelos apoiados nos joelhos. A cabeça, baixa. O olhar, perdido no chão. Ao redor, uma chuva silenciosa de livros jogados, alguns abertos, outros empilhados de qualquer jeito, como se o tempo tivesse se esquecido deles. Estava em uma biblioteca. Não uma comum, mas uma que parecia se estender para sempre — um mar de prateleiras e corredores que sumiam na escuridão do horizonte, além do alcance de qualquer olhar.
Era sufocante. Silenciosa demais. Infinita demais.
Levantei a cabeça devagar, sentindo o peso do mundo nas costas. E foi então que a vi.
Ela estava ali. Sentada como se o trono invisível em que repousava fosse feito para os deuses. Pernas cruzadas, postura impecável. Os cabelos castanhos caíam como cascatas, longos demais para serem naturais — cobriam suas costas por completo e flutuavam ao redor dela, como se o próprio ar a venerasse. Mas o que mais me gelava a espinha eram seus olhos.
Aqueles malditos olhos.
Sem pupilas. Sem cor. Apenas dois globos brilhantes, brancos, como se alguém tivesse arrancado o sentido da humanidade dali. Ela sorriu, e aquele sorriso… era pior do que um grito. Havia algo cruel por trás dele. Uma diversão sádica. Uma verdade incômoda.
E então, com uma voz que ressoava como se estivesse sendo sussurrada diretamente dentro da minha mente, ela falou:
— Ken Orquídea… — o som do meu nome em sua boca me deu calafrios — Você já se arrependeu de algo que fez até agora? Desde o dia em que sua mãe adotiva foi sequestrada, você sequer se deu ao trabalho de procurá-la… Mas pra alguém que mata por prazer, talvez isso não signifique nada, não é mesmo?
Minha garganta secou. Eu queria dizer algo. Responder. Atacar. Qualquer coisa. Mas não havia forças. Só silêncio. E a verdade… aquela maldita verdade cravada em cada palavra.
Talvez eu esteja amaldiçoado. Preso em algo que vai além da compreensão humana. Desde aquele dia, carrego isso comigo. No meu olho direito… o símbolo da minha ruína. O Olho do Pecado. Luxúria.
Mas não como nos livros. Não no sentido carnal, barato. Minha luxúria é por algo mais torcido. Mais sujo. Eu sinto prazer no conhecimento. Em ver os segredos se desfazendo. Em assistir o sofrimento humano — e saber que estou acima disso. É nojento. E, ao mesmo tempo… viciante.
Me diz, alguém bom também pode sofrer assim? Alguém que só queria proteger os amigos? Eu os deixei pra trás. Enterrei quem fui. E agora… sou outra coisa. Algo que se alimenta de um prazer que me faz querer vomitar.
Mas para entender como cheguei aqui… preciso voltar. Voltar cinco anos.
Esse mundo… ele é dividido em camadas. Um sistema onde você não nasce com valor — ele é imposto. Tatuado na sua pele. Um número. Simples, direto. Um número que decide tudo: seu poder, sua força, sua influência, até o quanto sua vida vale.
Quanto menor o número, maior seu valor.
Quanto maior… bem, isso é sua sentença.
Uma condenação silenciosa, cruel e definitiva. Um sistema inquebrável. Pelo menos… é o que dizem.
10 camadas no total, conhecidas como as Camadas Neutras. São os domínios da humanidade, onde nossas leis ainda funcionam — mais ou menos.
1ª Camada – Asgard: o topo. Terra dos ricos, dos deuses modernos, dos que regem tudo de cima pra baixo. É lá que ficam os três palácios: Jade, Esmeralda e Rubi, responsáveis pelo executivo, judiciário e legislativo. Se você tem um rank abaixo de mil, esse é o seu lar. Um paraíso inalcançável pra quase todos.
Alguns Rankeadores também vivem lá.
Rankeadores.
São os seres que nos dão o Ranks, missão números, sempre de mantos brancos, olhos dourados com íris em formato de estrela de sete pontas — parecem saídos de alguma história divina.
2ª Camada – Vanaheim: onde moram os abaixo dos dez mil. E onde fica os 4 clãs principais, cada um com seu palácio, Obsidiana, Safira, Pérola e Turquesa.
3ª – Alfheim: cem mil pra baixo. Um lugar que brilha com a elite da elite das elites médias.
4ª – Midgard: duzentos e cinquenta mil pra baixo. A famosa “camada dos esforçados”.
5ª – Jotunheim: quinhentos mil pra baixo. É… Aonde a maioria das pessoas estão
6ª – Svartalfheim: um milhão pra baixo. Bonita de ver, com suas florestas que mais parecem pinturas vivas, mas não se engane… é só beleza de longe.
7ª – Nidavellir: dez milhões pra baixo. A multidão vive aqui.
8ª – Helheim: cinquenta milhões pra baixo. A decadência começa a gritar.
9ª – Niflheim: cem milhões pra baixo. O limbo da maioria.
10ª – Muspelheim: o fundo do fundo. A última camada antes do inferno começar. Aqui vivem os que passaram dos cem milhões, mas também é onde ficam as bases pra explorar… as Camadas Negativas.
Essas sim são o verdadeiro pesadelo.
Terras instáveis, mutáveis, absurdas. O oposto de tudo que conhecemos.
Lá vivem os chamados “demônios”. Mas pode ser chamado de qualquer outra coisa. Criaturas grotescas, sem empatia, sem racionalidade.
Seres movidos apenas pela fome, pelo instinto, pela destruição.
Ah, e se você tem um rank acima de 500 mil?
Esquece. É proibido entrar nessas camadas negativas. Lei direta do próprio Rei dos Reis — Sol’zher Asgard, o soberano de todas as camadas. E não é só por birra. É pra evitar perdas. Porque uma vez lá dentro, para um amador, você não sai igual… se sair e sorte.
No topo da elite, temos os famosos Top 10. Os dez mais poderosos de todas as camadas neutras.
Você provavelmente imagina gente com poderes divinos, habilidades fora da realidade… e é exatamente isso. Eles são monstros entre monstros.
E por que eu chamo tudo isso de “camadas neutras”?
Porque existem teorias, mitos… e uma igreja que insiste em afirmar que acima de Asgard existem as Camadas Positivas.
Lugares sagrados onde os chamados Arquitetos — os deuses criadores — ainda vivem.
Ninguém nunca viu um. Mas a igreja diz que não só viu… como tem provas.
Mas e eu? Acredito? A mulher que está na minha frente na biblioteca, afirma ser, a Arquiteta do conhecimento, que foi morta por um ser chamado Deus irregular
Mas sinceramente? Nada disso importa pra mim agora.
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