Finalmente. O dia zero.

    Acordei antes mesmo do sol nascer — ou melhor, antes que o sistema de iluminação artificial da academia simulasse a alvorada. Não consegui dormir direito. A ansiedade fazia minha cabeça funcionar como uma máquina quebrada, cuspindo pensamentos, estratégias e cenários de derrota em loop.

    Vesti meu uniforme. O tecido parecia mais pesado hoje.
    Ajustei a lente de contato no olho direito. O mundo ficou roxo dos dois lados. Parecia… falso.

    Segui até a Mansão Roxa. O campus estava mergulhado numa neblina matinal fria.
    Bati na porta da oficina e, como sempre, a tranca se abriu sozinha.
    Maria Donroxye já estava me esperando. Ela estava sentada numa cadeira reclinável, cercada por projetos holográficos, com uma xícara fumegante nas mãos e aquele sorriso calmo de quem leu o roteiro do dia.

    — Ora, ora… — disse ela, cruzando as pernas e olhando direto nos meus olhos. Ou melhor, na mentira que eu usava neles. — Por que tentou esconder o seu olho rosa, Ken? Essa lente… não combina com a sua aura. Já faz uma semana que não vem falar comigo, né?

    Eu encostei na parede, meio sem graça, fugindo do olhar clínico dela. Cocei a nuca.

    — Foi o Marion que sugeriu… e eu só aceitei. Ele disse que chamava atenção demais.

    — O Marion, hein? — Ela estreitou os olhos verdes, como se o nome tivesse um gosto amargo. — Hm… aquele homem gosta de controlar as peças do tabuleiro. Bom, de qualquer forma, você veio buscar o que me pediu.

    Ela se levantou devagar, o vestido farfalhando, e foi até uma mesa de trabalho. Pegou uma caixa fina de madeira laqueada e a abriu como se guardasse algo sagrado.
    Lá dentro, repousava sobre veludo negro uma adaga.
    Não era a minha Lâmina Voraz. Era uma arma secundária.
    Lâmina fina, aço prateado fosco, ligeiramente curvada como uma presa de serpente. O brilho metálico era discreto, mas exalava letalidade.

    — Aço temperado em sangue de Wyvern da Camada -12. — explicou ela, entregando-a com delicadeza. — Leve, rápida e resistente. Vai ser boa para você não depender apenas do seu “trunfo”.

    Sem perder tempo, abri um portal negro ao meu lado e guardei a arma ali.
    — Obrigado, Maria.

    Quando me virei para sair da sala, parei.
    Senti uma presença. Ou melhor, a tentativa de esconder uma.

    No canto mais escuro da oficina, atrás de uma pilha de caixas de suprimentos, havia uma figura encolhida, abraçando os joelhos.
    Mina.
    Tentando desaparecer na sombra, o que era irônico para alguém do Clã Misticia.

    Maria suspirou, balançando a cabeça com aquele tom maternal de quem lida com crianças teimosas.

    — Pode sair, Mina. Ele já viu. Você não pode continuar se escondendo assim para sempre.

    A garota se levantou devagar. O rosto dela estava num tom de vermelho que competia com os leques dela. Seus olhos escuros evitavam os meus a todo custo, fixos na ponta dos sapatos.

    — Eu… — gaguejou ela, a voz falhando. — Eu vou falar com ele depois do exame… eu vou. É uma promessa.

    Ela apertou o tecido do vestido.

    — Mas… — sussurrou, num biquinho teimoso. — Espero que ele peça desculpas primeiro.

    Maria apenas sorriu e voltou a se sentar, tomando um gole de chá, como se tudo estivesse exatamente no lugar certo. Eu saí sem dizer nada, mas com um peso a menos no peito. Ela não me odiava. Só estava sendo… a Mina.


    Caminhei até o refeitório do prédio central.
    Um café da manhã reforçado estava sendo distribuído. O cheiro de café forte, pão quente e ovos mexidos cortava um pouco da tensão elétrica que pairava no ar. O salão estava cheio, mas silencioso. Ninguém ria alto hoje.

    No canto, avistei Shin e Holi.
    Quando levantei a mão, Shin sorriu de canto, a elegância de sempre, e acenou de volta. Holi, mais empolgada (ou nervosa), levantou os dois braços, radiante.

    Sentei-me com eles.

    — Fiquei sabendo que você andou treinando com as Três Glaciais, né? — comentou Shin, encostado na parede, o pão ainda pela metade na mão. — Não conheço elas pessoalmente, mas se têm um apelido desses no Quarto Ano, devem ser monstros. Você está inteiro?

    Antes que eu pudesse responder, Holi se inclinou sobre a mesa, os olhos verdes brilhando de ansiedade.

    — Você tá bem? Tá legal? Eu tô feliz! Vamos dar o nosso melhor hoje, tá? Não vamos morrer, prometo!

    — Pode deixar. — respondi com um sorriso sincero. Um dos poucos da semana.

    Shin cruzou os braços, o olhar ficando sério.

    — Daqui a pouco é a prova teórica… mas, sinceramente, o que eu quero mesmo é meter a cara na prática. Quero ver o nível real dessa academia.

    — Tô com você nessa. — falei.

    Trocamos olhares firmes. O clima estava diferente.
    Era como se o mundo estivesse girando mais rápido. Como uma engrenagem gigante e enferrujada prestes a engolir a gente.


    Longe dali.
    Portão Principal da Academia Fjorheim.

    O vento da manhã parou.
    Três figuras se aproximavam com passos pesados, ignorando a guarita de segurança.

    À frente, Acara Achlys.
    Envolta por uma aura quase teatral, ela sorria. Não um sorriso de alegria, mas o sorriso de uma rainha que volta para inspecionar seu jardim e decide quais flores vai arrancar. O quimono escuro dela absorvia a luz do sol.

    Atrás dela, dois indivíduos caminhavam em silêncio absoluto.

    À direita, um homem alto, imponente como uma torre de cerco.
    Noha.
    Ele carregava quatro espadas nas costas, dispostas cruzadas como um jogo da velha mortal. Cabelos pretos, densos e revoltos como fumaça sólida. Um dos olhos estava coberto por uma faixa preta grossa. O outro… era um roxo penetrante, frio e absoluto, que não piscava.

    À esquerda, um garoto de baixa estatura.
    Eriel.
    Mas não havia nada de infantil nele. Garras metálicas longas e curvas substituíam seus dedos, brilhando com óleo e malícia. Seus cabelos pretos caíam sobre uma faixa que cobria ambos os olhos. Ele se movia pelo cheiro, pelo som, pelo medo. A presença dele era sufocante, como estar trancado num caixão.

    Acara parou diante do arco do portão e suspirou, olhando para a estrutura com uma nostalgia forçada e venenosa.

    — Essa academia continua a mesma, né…? Cheira a esperança e hormônios. — disse ela, com voz arrastada. — Enfim, vamos. Noha, Eriel, comigo. Comportem-se.

    Noha moveu o pescoço lentamente, estalando as vértebras. O olho roxo dele fixou-se na estrutura da academia como se procurasse pontos fracos.

    — Vamos esperar até o fim do exame… — A voz dele era um trovão baixo. — Quero ver como essa nova geração luta. Quero ver se vale a pena sacar minhas espadas.

    Eriel, o garoto cego das garras, falou com voz seca, pragmática e irritante:

    — Não temos tempo pra brincar de plateia. Nosso alvo é o moleque do Clã da Escuridão. Pegamos ele, quebramos as pernas se preciso, e saímos. Simples. Eficiente.

    O sorriso de Acara se apagou.
    Foi instantâneo. A temperatura ao redor deles caiu.
    Ela se virou devagar. O olhar roxo dela cravou-se em Eriel com uma intensidade física, como uma mão apertando a garganta dele.

    — Me lembra… — sussurrou ela. — Quem é a Chefe aqui mesmo?

    Eriel tremeu. Ele baixou a cabeça cega, recolhendo as garras.
    — Você, senhora.

    Ela voltou a sorrir, mas seus olhos continuavam dois poços de escuridão.

    — Eu quero assistir aos combates. Ver como esses fedelhos se viram… é o mínimo de entretenimento que mereço, já que me tiraram da minha caçada nas Camadas Negativas.

    E então, os três entraram na academia.
    Silenciosos. Invisíveis para os guardas comuns.
    Mas o peso que traziam com eles… a gravidade da presença de um Rank 30 e seus executores… não passaria despercebida por muito tempo.


    8:00 AM. Prédio Central.

    A prova teórica começou.

    Os alunos foram espalhados por dezenas de salas diferentes no Prédio Central.
    Era a minha primeira vez pisando de verdade aqui dentro… e, sinceramente, dava para entender o motivo de tantos boatos e reverência.

    O lugar era faraônico.
    Pé direito triplo, colunas de mármore, e as paredes… pareciam ter sido polidas com luz líquida. Cada detalhe gritava riqueza, tradição e poder acumulado. Era um contraste absurdo com a cabana de madeira onde cresci.

    Na minha sala, nenhuma cara conhecida.
    Shin foi para a sala 4B. Holi para a 2C. Eu estava na 1A.
    Só rostos estranhos, suando frio, roendo unhas, com olhares nervosos. A tensão no ar era tão espessa que dava para cortar com a minha nova adaga.

    A porta se abriu.
    O responsável por aplicar a prova entrou.

    O som veio primeiro. Clink. Clink.
    Lâminas batendo umas nas outras.

    Professor Geovan.
    Cabelos em dreads grossos como cordas, e nas pontas… lâminas afiadas que tilintavam a cada passo. Ele caminhou até a mesa principal, girando nos calcanhares com aquele sorriso enigmático.

    — Todos sentados. — disse ele, a voz suave, mas preenchendo a sala. — Provas diferentes para cada fileira, então nada de esperteza ou olhos longos. Se eu ouvir um sussurro, a lâmina canta.

    As provas foram entregues. O som de papel sendo virado foi ensurdecedor no silêncio.

    Li a primeira questão.
    Política. Economia de Mana. História das Guerras Rúnicas.
    Não eram impossíveis, graças às noites em claro com o Levi, mas exigiam um nível de preparo absurdo. Aparentemente, a academia queria criar generais, não apenas soldados.

    Respirei fundo e comecei a escrever.
    Minha mão corria pelo papel, mas minha mente… minha mente estava longe.
    Eu só queria terminar logo.
    O que me interessava vinha depois.

    A Prática.
    O sangue. A arena.

    E ali, no silêncio acadêmico, eu não sabia…
    Mas a verdadeira prova não estava no papel.
    O inferno estava se aproximando pelos portões da frente. E uma vez que eu entrasse nele…

    …não haveria mais volta.

    Enquanto isso, nas salas superiores da Diretoria, a atmosfera era outra. Mais fria. Mais letal.

    Hizu Jorney, o Vice-Diretor da Fjorheim, estava sozinho em seu escritório, soterrado até o pescoço em documentos oficiais e relatórios de orçamento. O som da pena riscando o papel era o único ruído no ambiente, um ritmo constante e quase hipnótico.

    Até que a porta se abriu.
    Sem uma batida. Sem aviso. Como sempre.

    Cael, o Observador de Lutas, entrou como um vulto. Sua presença sempre vinha acompanhada daquele silêncio estranho e da vela acesa, que ele segurava como se fosse um talismã contra a própria escuridão que o envolvia.

    A voz dele, abafada pela máscara metálica, soou sombria:

    — Preciso sair por um tempo.

    Hizu nem levantou os olhos do relatório, apenas franziu a testa, a mão parando no meio de uma assinatura.

    — Você e essa mania irritante de não bater na porta… — suspirou Hizu. — O que houve agora, Cael? Demônios fugindo?

    — Algo estranho na Camada 10. — O tom de voz de Cael era seco, sem emoção, como se relatasse o clima. — Muitos soldados dos Três Palácios… mortos. Decapitados. Outros desapareceram sem rastro.

    Isso fez Hizu largar a caneta. Ele ergueu os olhos azuis por trás dos óculos, surpreso.

    — Um demônio vindo da Camada -1? Capaz de matar esquadrões? Com esse nível de força…? É raro, mas… não impossível. Está bem. Vá investigar.

    Cael estreitou o único olho visível, que brilhava à luz trêmula da vela.

    — Temos… visitas também. — Ele se virou devagar para a porta aberta, como se já esperasse o que viria a seguir. — E elas não bateram na porta.

    Quase como em um teatro bem ensaiado, o corredor se iluminou com uma presença negra.

    E entraram três figuras.

    À frente, Acara Achlys.
    Os olhos roxos faiscavam com um brilho perigoso, o sorriso dela afiado como navalha. Ela andava pelo escritório do vice-diretor como se fosse dona do prédio — e talvez, na cabeça dela, fosse mesmo.

    Atrás, Noha, imenso, com as quatro espadas cruzadas nas costas raspando o batente da porta. Os passos pesados dele soavam como trovões abafados no carpete.
    E por último, Eriel, o garoto pequeno com garras metálicas nos dedos, que parecia mais uma lâmina viva e cega do que uma criança.

    Hizu se levantou na hora, a cadeira arrastando para trás.

    — Senhorita Acara?! — Ele ajeitou os óculos, tentando recompor a autoridade. — O que a traz aqui sem aviso prévio? O Diretor Johan não está…

    — Ah, eu sei que o velho Johan não está. — Ela sorriu, como quem fala com uma criança lenta. — E você, Hizu… não precisa desse tom tão formal. Vim buscar alguém. E, como sou uma cidadã exemplar, quero fazer a parte burocrática primeiro.

    Hizu piscou, confuso.
    — Buscar…? Quem?

    Acara se aproximou um passo, apoiando as mãos na mesa dele. Seus olhos ganharam um brilho misterioso, quase divertido.

    Ken Orquídea. Ele é do Clã da Escuridão… e tem um olho rosa.

    O nome soou como um estalo de chicote dentro da sala.
    Hizu congelou. Cael parou na porta.
    O segredo estava fora da caixa.


    Finalmente.
    Acabou.
    A maldita prova teórica tinha chegado ao fim.

    O som de carteiras arrastando, folhas sendo recolhidas e alunos bocejando invadiu o Prédio Central. Todo mundo parecia exausto, drenado mentalmente. Um verdadeiro mar de gente saía das salas como se estivesse escapando de um incêndio químico.
    E eu fui junto, me esgueirando entre os ombros e cotovelos, focado no que realmente importava agora: a Fase 2.

    Lá no centro do saguão, havia várias mesas organizadas com monitores entregando fichários. Era ali que o destino era selado. Era ali que você descobria contra quem iria lutar na prova prática.
    O momento da verdade.

    No meio daquela muvuca toda, senti uma mão me segurar pelo braço com firmeza. Quase uma garra.

    Quando me virei, Rina estava me encarando.
    Aquele olhar de “eu odeio multidões e vou matar o próximo que esbarrar em mim”.

    — Vamos logo. — rosnou ela.

    Assim que pegamos nossos papéis na fila, ela veio andando ao meu lado, resmungando baixo sobre o barulho, a confusão e o cheiro de suor adolescente, mas logo foi me explicando a mecânica.

    — Olha, a coisa é simples, Ken. — começou ela, abrindo o papel dela. — Cada papel tem uma letra, que indica a classe do aluno, e um número, que mostra sua posição no ranking atual. Tipo… eu sou A-11. Você deve ter algo tipo D-qualquer-coisa.

    D-79. — respondi, lendo o meu.

    Ela assentiu.
    — Pois é. Agora você vai pegar um segundo papel na próxima mesa. Nele vai ter a classe e o número do seu oponente sorteado. E, detalhe importante: as lutas são pré-definidas pelo algoritmo da academia. Você enfrenta quem sair no seu papel e ponto final. Não pode trocar. Não pode chorar. Nem desistir antes. É lutar ou… ser desclassificado com nota zero.

    Chegamos à mesa de sorteio. Um garoto — parecia mais um calouro perdido do que um monitor — estava entregando os papéis selados. Ele sorria como se estivesse distribuindo doces, e não sentenças de dor.

    — Próximo! Boa sorte! — disse ele, animado.

    Peguei o papel das mãos dele. Rasguei o selo.
    E quando olhei…

    C – 1.

    Demorou uns dois segundos para a ficha cair. O cérebro travou.

    C – 1.
    O Rank 1 do Segundo Ano.
    O melhor veterano intermediário da academia.

    — As lutas já foram decididas com base nas análises de compatibilidade e potencial — explicou o garoto, alheio ao meu pânico interno. — Ah, e isso aqui… — ele me entregou uma pequena esfera vermelha de metal. — É um dispositivo de chamada. Vai apitar e vibrar quando for sua vez de lutar. Sua Arena é a Número 4. Enquanto espera, pode assistir às outras batalhas da arquibancada.

    — Beleza… — murmurei, a voz sainda oca.

    Rina se aproximou, espiando meu papel por cima do ombro. Depois mostrou o dela: B-44.

    — Um mediano do Terceiro Ano. Que tédio. — Ela revirou os olhos. Mas quando olhou para o meu de novo, soltou uma risadinha curta e seca. — Que sorte a sua, calouro…

    — Sorte? — perguntei, incrédulo. — Peguei o Top 1 do ano acima!

    — É. Sorte ou azar, depende do ponto de vista. Você vai enfrentar a Sahira D’Alani.

    O nome fez meu estômago gelar, mas não por medo imediato.
    Foi pela estranheza.
    D’Alani.
    O mesmo sobrenome da Sayra K’Alani, a Observadora doida. Só o primeiro nome mudava. Parentes? Clã?

    — Ela é forte? — perguntei, engolindo em seco.

    Rina cruzou os braços, a expressão ficando séria.

    — Se ela lutar a sério… nem eu sou páreo garantido. — Ela fez uma pausa, respirando fundo. — Lutei contra ela ano passado num treino livre. Eu era veterana, ela novata. Mesmo assim, ela me pressionou do começo ao fim sem nem suar. Ela é estranha, Ken. Livre demais. Parece que está dançando num festival quando luta… e o pior: ela não quer vencer de forma convencional. Nunca. Ela quer fazer arte.

    Antes que eu pudesse reagir ou perguntar mais, senti algo diferente no ar.
    Não era uma pressão assassina.
    Era uma presença.
    Suave. Quente. Calma.
    Quase… confortante, como o cheiro de incenso num templo antigo.

    Me virei instintivamente.

    E lá estava ela.

    — Então é você… meu oponente?

    A voz era melodia pura.

    — Estou muito feliz por te encontrar aqui, D-79.
    — Ela fez uma reverência graciosa, as pulseiras tilintando.
    — Prazer. Sou Sahira D’Alani.

    A semelhança com Sayra era clara — a pele, o formato do rosto — mas ao mesmo tempo, Sahira era única.

    Sua pele era bronzeada, reluzente como cobre polido ao sol.
    Os cabelos longos, ondulados e intensamente vermelhos — não ruivos, mas vermelhos como sangue arterial — pareciam descer como chamas vivas até seus pés descalços.
    Os olhos… eram âmbar. Profundos, vibrantes e sem pupilas visíveis. Pareciam olhar direto para a alma… mesmo que, por um instante, eu tivesse a estranha sensação de que ela não enxergava o mundo físico com eles.

    Sua roupa era cerimonial, rica em detalhes artesanais dourados, pedras coloridas e tecidos leves que deixavam a barriga e os braços à mostra, com padrões tribais que remetiam ao fogo e à dança sagrada.
    Estava descalça no chão frio do saguão, com tornozelos adornados por correntes finas e sinos de prata que tilintavam a cada respiração.

    Mesmo ali, bem na minha frente, ela não me olhava “diretamente”. Seu rosto estava voltado para mim, mas seus olhos pareciam… vagos. Perdidos em alguma outra dimensão, vendo coisas que eu não podia ver.

    E mesmo assim, eu sentia algo nela.
    Algo profundo. Antigo.
    Algo que não devia estar ali em um exame escolar comum.

    Ela sorriu. E o sorriso dela não era de quem ia lutar. Era de quem ia rezar.

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