Capítulo 5: Os combates
O Campo Laranja.
O nome não era apenas decorativo. O solo era de uma terra batida de tom ocre, vibrante, que levantava uma poeira fina a cada passo. Era um espaço amplo, aberto, onde o céu ensolarado cobria tudo como uma cortina pesada e quente. A brisa não refrescava; ela apenas arrastava a poeira, fazendo-a dançar ao redor das nossas pernas.
Os quarenta alunos da sala formavam uma meia-lua imperfeita. No centro, como o eixo daquele pequeno universo, estava o professor Ren Tianyū. Imponente, com as mãos nos bolsos e os olhos vermelhos varrendo cada rosto, ele parecia um general avaliando seus recrutas antes do abate.
Mas algo me fez desviar o olhar. Uma sensação de ser observado por algo… maior.
Ergui a cabeça levemente em direção à Mansão Azul, que ficava próximo dali. No segundo andar, em um corredor aberto, duas silhuetas se destacavam contra a sombra.
Paradas. Observando.
Vestiam mantos brancos que pareciam não acumular poeira, bordados com linhas douradas que brilhavam sob o sol. Eram elegantes, misteriosos e exalavam uma aura quase sagrada.
Rankeadores.
Meu coração deu um salto violento contra as costelas.
Eles não deviam estar aqui.
Aparições assim… eram eventos raros. Aconteciam uma vez por ano, nas grandes capitais, em cerimônias solenes para reavaliar, subir ou rebaixar Ranks.
Mas ali estavam eles. Em um dia comum, em uma aula de calouros. Assistindo em silêncio absoluto, como deuses entediados olhando para formigas.
Ren deu um passo à frente, e sua voz cortou minha distração como uma lâmina.
— Os que levantaram a mão, deem um passo à frente.
Fui o primeiro. Foi quase instintivo, um reflexo condicionado.
Shin veio logo atrás, com aquele meio sorriso confiante, seguido pela garota do Clã Misticia. Ela andava com uma leveza sobrenatural, seus pés mal pareciam tocar a poeira, e seus olhos continuavam distantes, focados em algum ponto que só ela enxergava.
E então… as novas figuras se revelaram.
Holy Resca.
Eu não a tinha notado antes, e me perguntei como isso era possível. Porque ela não simplesmente andava; ela dominava o espaço ao seu redor.
Tinha uma aura de nobreza quieta, mas havia algo afiado nela. Quase cruel. Como se tivesse nascido para ser adorada… e temida na mesma medida.
Sua pele era branca como porcelana viva, contrastando com os cabelos cor-de-rosa longos, que caíam em ondas de uma perfeição descuidada. Mas eram os olhos — verde-esmeralda, vívidos demais, tóxicos demais — que prendiam a atenção. Ela parou junto a nós, em silêncio. Uma fachada de seriedade perfeita. Mas algo nessa época me dizia que por trás daquela boneca de porcelana ela era completamente diferente.
Logo depois, veio Lyshera Noctialis.
Ela era o oposto de Holy.
Jovem, sim, mas com algo antigo no olhar. Seus olhos eram de um dourado turvo, felino, com a íris trêmula em tons de âmbar sujo que brilhavam nas bordas. Parecia um animal encurralado, sempre à beira de um ataque ou de uma fuga.
A pele dela tinha uma palidez doentia, levemente acinzentada, pontilhada de manchas rosadas como se o vento frio tivesse a açoitado por tempo demais. Seus lábios, quase infantis, mal conseguiam esconder um dente canino proeminente, afiado. O cabelo curto e desalinhado, de um branco sujo pigmentado pela sombra, e o uniforme completamente bagunçado gritavam caos.
E por último, Vastelion Viar.
A ordem em pessoa. Um jovem de cabelos dourados escondidos sob uma touca estilosa, com olhos que espelhavam o ouro dos cabelos. Seu uniforme estava impecável, sem um único vinco, ostentando o porte orgulhoso de um membro do Clã da Luz. Ele caminhou até nós com a confiança de quem sabe que o mundo lhe deve algo.
Ren se virou lentamente. Seus olhos de brasa me encontraram no meio do grupo.
— Você. Do Clã da Escuridão, com o olho rosa… venha até aqui. Você será o primeiro a demonstrar.
Por um segundo, o tempo pareceu virar melado. Lento e pegajoso.
Ele está falando de mim?
Claro que estava. Quem mais tinha um olho rosa ali?
Suspirei fundo, sentindo o peso de dezenas de olhares perfurando minhas costas. Dei alguns passos à frente, parando diante de Ren.
Mas então…
A temperatura caiu.
Não foi o vento. Foi uma presença.
Todos, instintivamente, viraram a cabeça para a entrada do campo.
Uma figura solitária caminhava em nossa direção. Cada passo seu parecia deslocar o ar, criando um vácuo silencioso. O mundo parecia ceder espaço para sua existência.
Era um homem alto, de postura rígida, militar, mas estranhamente contida. Cabelos escuros, curtos e bagunçados com uma elegância calculada.
Ele vestia um manto negro longo, decorado com detalhes prateados que lembravam garras ou penas afiadas. A cada movimento, o forro da capa revelava um vermelho sangue profundo.
Mas o que roubava a cena era a máscara.
Metálica. Assimétrica. Cobrindo a maior parte do rosto.
Não parecia estar ali para esconder sua identidade, mas para conter algo. Como se o rosto por baixo fosse perigoso demais para ser exposto à luz do dia.
De uma das frestas da máscara, um único olho surgia. Esbranquiçado. Quase translúcido. Mas penetrante como uma agulha. Um olho que via além da carne, além do tempo, além da mentira.
E em sua mão esquerda…
Uma vela.
Branca. Acesa.
A chama tremulava, firme e imóvel, ignorando completamente a brisa do campo aberto.
Ren nem precisou levantar a voz para explicar.
— Ele é um Observador de Lutas. Sem a presença dele, o uso de habilidades ofensivas ou duelos é estritamente proibido na academia.
O homem parou a alguns metros de nós. Quando falou, sua voz soou como metal raspando em gelo.
— Meu nome é Cael Velantir. Espero que vocês sejam uma boa turma.
Ele fez uma leve reverência. Mecânica. Formal. E então congelou, permanecendo imóvel como uma estátua gótica trazida à vida.
Voltei o olhar para Ren. Ele já estava me encarando, sério, os braços cruzados.
Não havia mais volta. Era agora.
Respirei fundo, enchendo os pulmões com o ar poeirento.
Foquei.
Fechei os olhos por um instante.
Senti aquela sensação familiar… aquela pressão no centro do peito, como uma represa prestes a estourar.
Lembrei das palavras do homem na neve.
Concentração. Emoção. Exaustão…
A equação necessária para ativar o impossível.
Abri os olhos. E estendi a mão para o vazio.
O ar diante de mim tremeu. E então, rasgou.
Como um tecido podre sendo puxado, uma fenda negra se abriu na realidade.
Sem som. Sem luz. Apenas… um vazio absoluto. Uma mordida no próprio espaço.
Meu Código Genético: Armazenamento Dimensional. Era oque eu acreditava ser na época.
Meti a mão na escuridão fria da fenda. Meus dedos se fecharam em torno do cabo familiar.
Puxei.
Minha adaga surgiu, banhada pela luz do sol, mas ainda envolta numa aura sutil, quase viva.
O fio largo, forjado em um metal desconhecido com detalhes escuros e tons de vermelho-sangue, parecia vibrar. A arma parecia respirar, feliz por ter sido libertada da escuridão.
Era pesada, mas na minha mão, parecia uma extensão do meu braço. Como tocar uma memória que nunca foi esquecida.
Eu não notei no momento, focado demais no meu teste…
Mas lá do alto, na varanda do segundo andar…
Os dois Rankeadores, antes impassíveis, deram um passo à frente.
E agora, ambos encaravam fixamente lá embaixo.
Eles não olhavam para mim.
Eles olhavam para a adaga.
Assim que puxei a adaga daquele rasgo no espaço, eu o vi.
O sorriso.
Ren sorriu. Não era um sorriso caloroso de professor. Era um curvar de lábios indecifrável — uma mistura perigosa de interesse genuíno, deboche e a curiosidade de um predador que acabou de encontrar uma presa que não esperava.
— Entendi… — A voz dele era calma, analítica. — Você pode invocar uma lâmina desse espaço negro? Ou pode guardar coisas nele também? Hm… era de se esperar de alguém com sangue do Clã da Escuridão.
Ele cruzou os braços sobre o peito largo, os olhos vermelhos dissecando cada detalhe da minha arma, ignorando completamente o fato de eu estar armado.
— Me diga seu nome.
— Ken Orquídea.
Ren levantou uma sobrancelha. Houve uma fração de segundo de surpresa genuína em seu rosto, mas ele a mascarou rapidamente com um leve balançar de cabeça.
— Ora… não é da família Achlys? Que pena… — Ele fez uma pausa, como se reajustasse suas expectativas. — Enfim. Venha. Me ataque.
Pisguei, confuso.
Como é?
Atacar ele?
Isso só podia ser loucura. Ele era um Rank 470. Eu era… nada.
Enquanto eu hesitava, a mente de Ren trabalhava em outra velocidade.
Esse moleque… Orquídea? Uma família menor? Não é da linhagem pura dos Achlys? — pensou ele, os olhos semicerrados. — E ainda assim… essa presença. Essa firmeza no olhar. E o mais impressionante: já consegue manipular o Código Genético dessa forma, tão jovem? Interessante… muito interessante.
— O que está esperando? — Ren provocou, descruzando os braços e deixando-os soltos ao lado do corpo, totalmente aberto. — Venha. Me ataque, Ken.
Engoli em seco. Não pensei duas vezes. O instinto assumiu.
Me movi.
Foi uma explosão de velocidade. Fui direto, rápido, minha adaga rasgando o ar com precisão, visando o tronco dele. Um golpe limpo.
Mas no instante seguinte… a realidade desmoronou.
Ren nem pareceu se mexer.
Não houve som de impacto. Não houve luta.
Com apenas dois dedos da mão direita, ele interceptou a lâmina da minha adaga. Ele a parou no ar com a mesma facilidade com que alguém afasta uma folha caindo ao vento. A força do meu golpe foi absorvida pelo vazio.
E antes que meu cérebro pudesse processar o que estava acontecendo, a palma esquerda dele já estava lá.
Parada a milímetros do meu pescoço.
O vento deslocado pelo golpe dele atingiu minha pele, arrepiando os pelos da nuca.
Eu congelei. Meus pulmões travaram.
Eu sabia. Meu corpo sabia.
Se ele quisesse, se ele tivesse avançado mais um centímetro… minha traqueia estaria esmagada.
Eu teria morrido.
Ele suspirou, recolhendo a mão com aquele ar entediado de quem nem precisou aquecer os músculos. Soltou minha lâmina, que vibrou com a liberação da tensão.
— Você é forte, moleque. — Ele me encarou de cima. — E é impressionante que tenha a coragem insana de vir direto para cima de mim com intenção de matar.
Por algum motivo, aquilo me fez sorrir de canto, mesmo com o coração quase saindo pela boca.
Coragem.
Era exatamente o que meu mestre dizia que eu tinha de sobra… e que isso me mataria um dia.
Dei um passo para trás e guardei a adaga de volta na fenda negra. Ela sumiu com um som sutil, como um suspiro sendo engolido pela noite.
Instintivamente, olhei para cima, para o corredor do segundo andar da Mansão Azul.
Vazio.
Os Rankeadores… tinham sumido.
Sem alarde. Sem som. Sem deixar rastro. Simplesmente desapareceram, como fantasmas que viram o que queriam ver.
Logo depois, o som de passos no cascalho quebrou o silêncio.
Shin deu um passo à frente, ajeitando o uniforme e cruzando os braços como se fosse apenas mais um dia normal de terça-feira.
— Professor… — A voz dele era tranquila. — Por acaso tem alguma arma que possa me emprestar? Ou algo do tipo?
Ren inclinou um pouco a cabeça, olhando para o garoto de olhos roxos.
— Hm…? Bem…
Antes que Ren pudesse responder, uma sombra se moveu na periferia da minha visão.
Cael Velantir.
Sem dizer uma única palavra, o homem da máscara caminhou devagar, o manto negro ondulando como fumaça sólida. Com um movimento fluido do pulso, ele arremessou algo.
Clang.
Uma faca de metal simples caiu no chão, exatamente entre Shin e Ren.
Fria. Comum. Nada especial à primeira vista. Uma lâmina descartável.
Shin a pegou do chão. Ele a girou nos dedos, testando o peso, e deu um leve sorriso satisfeito.
— É… vai servir.
E então… a atmosfera ao redor dele mudou.
A faca começou a escurecer.
Não era como se uma sombra caísse sobre ela… era como se o metal estivesse sendo engolido por um buraco de densidade absurda.
Uma substância negra, viscosa como piche fervente, brotou das mãos de Shin e cobriu a arma. A faca cresceu. Alongou-se. O metal gemeu sob a transformação, até se converter em uma espada longa, pulsando em um negro espesso, quase líquido.
Era Matéria Escura.
— Nada mal… — Ren comentou, os olhos semicerrados, avaliando a técnica. — Para outro membro do Clã da Escuridão também. Qual seu nome?
— Shin Heada.
Ren estalou a língua no céu da boca, sem esconder o desapontamento.
— Hm. Outro de família distante, né… — Ele balançou a cabeça. — Certo. Venha.
Shin não esperou um segundo convite. Ele avançou, a espada negra deixando um rastro visual no ar.
Mas o que se seguiu… foi humilhante.
Não foi uma luta. Foi uma lição.
Ren não precisou nem suar. Ele nem tirou a mão esquerda do bolso.
Quando a espada negra desceu, Ren apenas girou o corpo. Desviou por um fio de cabelo.
Shin tentou corrigir o movimento, mas Ren já estava dentro da guarda dele.
Com um movimento casual de punho, curto e seco, Ren atingiu o estômago de Shin.
O ar saiu dos pulmões do garoto com um som horrível.
Shin foi enviado ao chão, rolando na poeira como uma boneca de pano, a espada negra se desfazendo em fumaça antes mesmo de ele parar de rolar.
Foi como ver um adulto afastando uma criança birrenta.
Ren olhou para baixo, limpando uma poeira imaginária da camisa.
— Próximo.
Vindo com orgulho, e muita vaidade, lá vinha ele.
Vastelion Viar.
Ele caminhou até o centro com o queixo erguido, como se o chão devesse agradecer por ser pisado por ele. Olhou para Shin, que ainda se recuperava no chão, e depois para mim.
— Pobres membros do Clã da Escuridão… — Ele disse com uma soberba que chegava a ser quase palpável. O sorriso no rosto era irônico, superior. — É meio humilhante para vocês, não é mesmo? Serem jogados no chão como lixo.
Ren apenas o observou, o rosto impassível.
Então, na palma da mão de Vastelion, o ar brilhou. Gotas de luz líquida começaram a se condensar e cair, chiando ao tocar o solo de terra batida. A terra derretia instantaneamente. As gotas ficaram mais finas, esticando-se até formarem fios de luz incandescente, vibrando com energia pura.
— Qual é o seu nome? — Ren perguntou, entediado. — Vejo que é do Clã da Luz.
— Vastelion Viar — respondeu, estufando o peito e olhando Ren nos olhos.
Ren apenas fez um sinal sossegado com a mão.
— Venha.
Vastelion não hesitou. Ele avançou, não com velocidade física, mas com controle. Com um movimento teatral dos braços, ele mandou as linhas de luz na direção do professor. Elas se curvaram no ar como chicotes vivos, cercando Ren, prontas para constringir e cortar sua carne.
Mas Ren… ele apenas sorriu.
— Que… patético.
Ren levantou a perna devagar.
E girou.
Foi um movimento simples, um chute baixo giratório. Mas, no momento do impacto, uma onda de chamas azuis explodiu de sua perna.
O fogo dele não apenas queimou; ele devorou a luz.
As chamas correram pelas linhas de Vastelion como pólvora, subindo em uma fração de segundo até a fonte. Vastelion arregalou os olhos, mas foi tarde demais. A força do impacto térmico e a pressão do ar o jogaram para trás violentamente.
Quando Ren colocou o pé novamente no chão, as chamas se apagaram instantaneamente.
Vastelion caiu sentado, ofegante, o rosto pálido de susto. Ele olhou para as próprias mãos, tremendo.
— Os estereótipos de membros do Clã da Luz serem arrogantes não combinam com a postura do atual chefe do seu clã — disse Ren, olhando-o de cima. — É isso que um orgulhoso membro de um clã renomado faz? Ataca sem estratégia? Subestima o oponente?
Vastelion cerrou os punhos, a vergonha misturada com raiva em seus olhos dourados.
Ren, no entanto, suavizou a expressão. O sorriso sádico deu lugar a algo mais calmo. Ele estendeu a mão para o garoto.
Vastelion hesitou, mas aceitou a ajuda e foi puxado de volta para cima.
— Você não é ruim, garoto — Ren murmurou, baixo o suficiente para apenas nós ouvirmos. — Mas você quer atenção demais. Aprenda a brilhar sem cegar a si mesmo.
Vastelion engoliu em seco, assentiu e recuou, a arrogância momentaneamente quebrada.
No fim, só restavam as três garotas.
Holy Resca. Lyshera Noctialis. E a garota do Clã Misticia.
Ren suspirou, passando a mão pelos cabelos bagunçados. Ele se virou para Cael, o Observador.
— Seria covardia eu testá-las agora. Estou sem paciência para me conter.
Cael não disse uma palavra. Mas sua vela…
A chama, que antes era estável, tremeu.
Depois cresceu.
Cresceu muito.
Uma coluna de fogo branco se esticou para o alto, ignorando a física, como um farol chamando algo. Ou alguém.
O campo inteiro pareceu prender a respiração. O ar ficou pesado, denso, carregado de estática.
Era como se algo estivesse prestes a descer dos céus.
E desceu.
De longe, vi algo rasgando o céu azul como um raio de luz invertido — rápido, mas sem violência.
A coisa… não. A pessoa.
Ela pousou com uma leveza absurda. Não houve estrondo, nem poeira levantada. Foi como se o chão tivesse sido feito de plumas para recebê-la.
Era uma mulher.
Seus cabelos azul-claros caíam como ondas calmas, lisos e longos, dançando no ar junto com o adorno preso na parte de trás — penas coloridas e fitas que balançavam como se tivessem vida própria.
Ela se virou, e seus olhos dourados me atravessaram. Por um segundo, senti que ela via muito mais do que aparência ou expressão. Ela enxergava por dentro.
A pele bronzeada brilhava sob o sol, e seu traje era… estranho para os padrões da academia. Exótico. Fascinante. Um top assimétrico com cortes ousados e detalhes metálicos que tilintavam levemente, combinando com uma saia longa e fluída, presa por argolas douradas que refletiam a luz a cada passo.
Ela estava sorrindo. Um sorriso confiante, relaxado, quase travesso.
Mas o que mais me chamou a atenção foi aquilo gravado na lateral do pescoço dela, brilhando suavemente.
Rank: 30.000.
Mas que…?
Trinta mil. Ela estava na elite de Alfheim.
Cael deu um passo à frente e falou casualmente, como se ela não fosse um monstro de alto nível disfarçado:
— Vamos trocar. Te chamei para observar e também testar as três garotas. Eu vou sair por enquanto.
A mulher assentiu devagar, com aquele sorriso enigmático, e levantou a mão num sinal de paz, fazendo dois dedos em “V”.
— Sayra K’alani. Observadora de lutas. Muito prazer, calouros.
Apesar do jeito despreocupado e da voz melodiosa… ela era intimidadora. Tinha algo nela que gritava perigo em silêncio, como uma tempestade tropical esperando para estourar.
Ren também se virou para ela, relaxando a postura.
— Quero que assuma por aqui, Sayra.
— Beleza, mestre — ela respondeu, piscando um olho, como se aquilo fosse rotina.
Logo, Sayra estava frente a frente com a garota do Clã Misticia.
A atmosfera mudou. Não era mais a pressão esmagadora de Ren, mas uma tensão floral, sutil e penetrante.
Todos nós sabíamos o que vinha: apresentação e demonstração.
A garota do Clã Misticia deu um passo à frente. O quimono claro dela balançou sem vento. Ela respirou fundo, e sua voz saiu firme, mas serena como a superfície de um lago:
— Meu nome é Mina Mei.
Com um movimento fluido e gracioso, ela puxou dois leques da cintura.
Tlac.
Ela os abriu com um estalo seco.
No mesmo instante, o cheiro doce invadiu o campo.
Pétalas de lírios brancos começaram a cair ao redor dela.
Não eram ilusões baratas. Eram pétalas reais, materializando-se do nada, flutuando com graça, guiadas por uma brisa que só existia ao redor dela.
A sala ficou em silêncio absoluto.
Até Ren, sempre tão seguro e indiferente, arregalou levemente os olhos vermelhos.
Sayra ergueu as sobrancelhas, o sorriso travesso congelando por um instante.
Algo ali não estava normal.
Alguns alunos mais informados começaram a trocar olhares aterrorizados e murmúrios urgentes.
Eu, pra ser sincero, não entendi de imediato. Nunca me liguei muito nesses nomes da alta nobreza dos Top 10… política nunca foi meu forte.
Mas aí Ren falou, e sua voz carregava um tom que eu nunca tinha ouvido antes:
— Garota… — Ele deu um passo à frente, ignorando o protocolo. — Você está me dizendo que tem o sobrenome Mei?
Ele olhou para as pétalas de lírio no chão, e depois para ela.
— Você é parente da Rank 4… Una Mei?
O nome caiu como uma bomba atômica no campo.
Rank 4. Uma das deusas desse mundo.
— Isso é alguma brincadeira? — Ren continuou, os olhos fixos nela. — Uma piada de mau gosto?
Ele não parecia irritado. Era outra coisa.
Era surpresa misturada com uma dúvida genuína.
Filha da Rank 4?
Eu olhei para Mina. Ela continuava impassível, cercada por lírios, como se ser parente de uma lenda fosse apenas um detalhe trivial de sua terça-feira.
Sério isso…?

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