Capítulo 6: Sem Piedade, Sem Desculpas, Nova Rival? Ou…
Ela se ajeitou, ofegante, limpando o canto da boca com o dorso da mão, enquanto eu respirava fundo e ajustava minha postura também. Por um segundo, pensei: “Não vou usar a adaga de novo… posso acabar machucando ela de verdade.” Mas então veio a dúvida: E se eu apenas pensar que não posso cortá-la? Não… melhor não arriscar.
Sem perder tempo, avancei.
Ela abriu o leque restante com um movimento rápido e elegante, lançando uma rajada de pétalas perfumadas pra cima de mim. O aroma adocicado tentou me distrair, mas eu já conhecia esse truque. Desviei num giro lateral e, num piscar de olhos, ativei o teleporte pelo espaço negro.
Reapareci bem mais próximo dela.
Num reflexo, golpeei seu peito — e no impulso, acabei tocando diretamente nos seios dela. Merda. O impacto a jogou alguns passos para trás. Ela cambaleou, respirou fundo e se levantou com certa dificuldade, mas sem reclamar, sem sequer me encarar com vergonha.
Eu, por outro lado, nem pensei muito nisso.
Naquele momento, não me importava se ela era garota, nobre, linda ou o que fosse. O que me importava era a luta. A adrenalina fervia nas veias. Eu estava animado. Eu queria vencer.
Avancei de novo, sem hesitar.
Dessa vez, ela tentou bloquear, mas fui mais rápido. Acertei um golpe limpo na barriga — ela arqueou o corpo. Em seguida, um soco direto no queixo. O estalo foi seco. Ela cuspiu sangue e caiu de joelhos no chão, as mãos trêmulas apoiadas na terra da arena.
Foi só aí que me liguei no que estava fazendo.
Eu me contive. Dei um passo para trás. Mas o estrago já estava feito — sangue escorria do nariz dela, da boca… e mesmo assim, ela não desviava o olhar de mim.
Mas então, a tensão foi cortada.
Uma voz masculina soou pela arena, nítida e arrogante:
— Bater em uma dama desse jeito… não é nenhum tipo de cavalheirismo.
Aparecendo entre as arquibancadas, ele entrou com a calma de quem já tinha vencido antes mesmo de lutar. Um jovem de cabelos negros, lisos e bem penteados num coque alto, óculos bem encaixados no rosto e um casaco jogado sobre os ombros, como se vestir as mangas fosse indigno dele. Usava o uniforme da academia de maneira impecável. Abaixo do olho esquerdo, estava o selo: Rank A 2 — o segundo mais forte do quarto ano.
Dava pra sentir a pressão só de olhar pra ele. Era como se o ar ao redor ficasse mais pesado.
Ele caminhou como quem pisa em um palco, mas não me olhou nem por um segundo. Seus olhos estavam nela.
— Natan’Zar — disse ele com um tom educado, porém sem humildade —, me permita lutar contra ele, se não for incômodo.
Natan’Zar, que assistia tudo como um espectador de teatro sangrento, deu um sorriso inclinado, com aquele olhar de quem achava tudo uma piada.
— Se ele aceitar… por mim está tudo bem — respondeu, dando de ombros.
O tal Rico Zyx subiu na arena. Ignorou minha presença por completo. Foi direto até onde Mina estava caída.
— Muito prezar, garota do Clã Misticia — disse ele, estendendo a mão como um cavalheiro barato —. Permita-me ajudá-la. Venha comigo, por enquanto.
Mas Mina…
Ela não aceitou.
Sem cerimônia, deu um tapa na mão estendida dele. O gesto foi rápido, direto. Com a outra mão, limpou o sangue do rosto. E, sem dizer uma palavra, virou as costas.
Não olhou pra Rico. Não respondeu à gentileza.
Ela me encarou.
A raiva queimava nos olhos dela. Não era de humilhação. Era algo mais pessoal. Mais profundo. Algo que só ela e eu entendíamos naquele instante.
E então ela saiu da arena. Sozinha. Os passos firmes, ainda que manchados de sangue.
Rico ficou parado. Frustrado. Humilhado. A mão ainda estendida no vazio.
A luta tinha acabado, mas uma nova tensão estava apenas começando.
Ele sorriu. Um sorriso estranho, torto, como se estivesse se divertindo com uma piada que só ele entendia. Com calma exagerada, tirou o casaco dos ombros e jogou para fora da arena, como se aquilo fosse um espetáculo particular — e só então, finalmente, me olhou nos olhos.
Estalou os dedos.
Na mesma hora, meu corpo reagiu. Foi como se algo dentro de mim tivesse sido ativado à força. Os músculos se contraíram, meu coração acelerou num ritmo absurdo e meu corpo entrou em postura de combate sozinho. Aquilo não era normal.
— Ora, ora… parece que você quer mesmo me enfrentar, né? — disse Rico, com um tom debochado, quase cantando as palavras.
O olhar dele era puro desprezo, como se estivesse me avaliando igual um inseto preso num pote de vidro.
Olhei para cima por reflexo, meus olhos buscando algo além da tensão. Lá estavam eles — Shin, Holi e Levi, me observando da arquibancada. Levi estava com os braços cruzados, o olhar sério. Shin tentava parecer tranquilo, mas dava pra ver a tensão nos olhos. Já Holi… estava visivelmente nervosa, quase se encolhendo na cadeira.
Eles murmuravam entre si:
— O Ken vai ficar bem, Levi? — perguntou Shin, em voz baixa.
Levi respondeu, sem hesitar:
— Não… ele vai perder feio. Rico Zyx é completamente insano por lutas. E é forte pra caramba. O Ken não tem chance contra ele.
Eu não ouvi isso… mas mesmo sem escutar, de algum jeito, eu já sabia.
Mas não importa. Mesmo sem querer lutar, fugir nunca foi uma opção.
O sorriso do Rico se alargou — e então ele sumiu.
Sumiu.
O cara simplesmente desapareceu da minha visão, e antes que eu pudesse entender o que estava acontecendo, ele já estava na minha frente. Por puro reflexo — ou talvez desespero — criei um portal escuro entre nós, que bloqueou o soco dele no último segundo.
Mas o desgraçado não parou.
Com um chute brutal, ele acertou minha costela. O impacto foi tão forte que me jogou longe, o ar saiu dos meus pulmões como se tivessem arrancado à força. Eu quase voei… mas me mantive de pé, rangendo os dentes.
Nem deu tempo de respirar. Rico já estava em cima de mim de novo, os punhos vindo como martelos. Tentei levantar mais portais, mas ele atravessava eles como se não fossem nada. Mesmo que o primeiro soco não me acertasse, o segundo me pegava em cheio. E o terceiro. E o quarto.
Ele estava me espancando.
Era isso. Eu estava apanhando feito um boneco de treino. Meu sangue manchava o chão, escorria pela boca, pelo nariz. A dor era tanta que meu corpo parecia em chamas — mas eu me recusava a cair. Eu me recusava a ajoelhar.
— Tsc… durão na queda, hein, garoto do Clã da Escuridão — murmurou Rico, rindo. — Esse seu olho… é bem bonito de olhar durante uma luta.
Ele falava como se fosse um passeio, como se estivesse se divertindo com minha agonia. E talvez estivesse mesmo.
Respirei fundo, sentindo a dor latejar dentro de mim. Algumas costelas com certeza estavam quebradas. Mas ainda assim, ajeitei minha postura. Não ia dar esse gosto pra ele.
— Ainda quer lutar? — continuou ele, com aquele olhar cínico. — Pobrezinho… você ainda não percebeu, né?
E ele veio de novo.
Aquela aura dele era sufocante. Tensa. Pesada como se a própria arena estivesse sendo esmagada por sua presença. Mas pra mim? Pra mim ele era só um arrogante filho da puta que precisava de uma lição.
Limpei o sangue com o dorso da mão e avancei.
No último instante, antes de ele me acertar, ativei meu teleporte e reapareci atrás dele. Sem pensar, dei um soco com toda minha força bem nas costas dele.
Ele cambaleou. Mas foi só isso.
O filho da puta virou… sorrindo. Como se eu tivesse elogiado ele.
— Até que você é bem forte… — ele disse, me pegando pelo braço com força. — Mas nem precisei usar meu código genético pra te derrubar.
E então…
Um soco direto no meu queixo. De baixo pra cima.
Minha visão escureceu por um segundo. Senti meu corpo ser arremessado pra trás. A arena girou. O chão parecia distante.
E eu estava prestes a desmaiar.
Eu já tinha perdido. Isso era óbvio. Qualquer um podia ver.
Mas Rico… ele não ia parar.
Lá estava ele, caminhando lentamente na minha direção, os olhos ainda brilhando com aquela vontade doentia de continuar. Ele não queria vencer. Ele queria quebrar. Queria me destruir.
E o maldito Observador de Lutas, o Natan’zar, só ficou ali. Parado. Como se aquilo tudo fosse parte do show.
Rico ergueu o punho de novo. Mais um golpe. Mais dor. E dessa vez, talvez fosse o fim.
Foi então que, do nada — num estalo de vento e presença — Levi apareceu.
Literalmente apareceu entre nós dois.
Sem hesitar.
Sem aviso.
Ficou de frente pra Rico, o olhar sério e o corpo relaxado… mas com uma ameaça tão intensa que até o ar ficou pesado.
— Se você mover mais um músculo… eu te quebro. — disse ele, com a calma de quem já fez isso antes.
Rico congelou. E por um segundo, pela primeira vez, ele pareceu hesitar.
Mas Levi não foi o único.
Outra presença invadiu a arena.
Uma que, se eu estivesse consciente, jamais teria acreditado estar vendo ali.
Solara.
Caminhando com a elegância natural de quem carrega uma espada com mais autoridade que muitos reis. Sua mão estava sobre o cabo da lâmina, mas ela nem precisou sacá-la. A voz dela, fria e firme, ecoou pela arena como se cortasse o ar.
— Acho que já deu, Rico. Isso não é treino. Você não está agindo como um veterano. Está agindo como um covarde.
Rico encarou ela. Sorriu de leve, quase com desdém.
— Tks. — foi tudo que disse.
Virou as costas, pegou o casaco que havia jogado no começo e saiu andando, como se nada tivesse acontecido.
Solara também se virou, sem dizer mais nada. Só caminhou até a saída como uma sombra elegante e silenciosa.
Levi ficou ali, parado. Observando tudo. Os olhos voltaram até mim.
Eu ainda estava de pé.
Inconsciente.
Mas de pé.
Talvez fosse orgulho. Talvez fosse só o corpo se recusando a cair… mesmo quando a mente já tinha se apagado.
— Ei, Natan’zar — chamou Levi, ainda sério. — Você é o observador de lutas, não é? Por que não impediu isso?
Natan’zar já caminhava pra fora da arena, e virou um pouco o rosto ao ouvir.
— Levi, certo? Você deve saber da minha habilidade genética, não? — respondeu com um sorriso misterioso. — Eu tinha tudo sob controle.
Levi estreitou os olhos. O jeito extravagante do Observador parecia só fachada. Por trás daquele brilho nos olhos, havia algo mais… algo perigoso.
E então, o mundo ficou escuro pra mim.
Quando acordei, o teto branco da enfermaria me encarava. O silêncio era reconfortante, quase irreal. Por um segundo, achei que estava sonhando.
Virei o rosto, e ali estava ela.
Holi.
Sentada ao lado da cama, um livro entre as mãos, lendo com calma. Mas assim que notou meu movimento, os olhos dela se arregalaram e o sorriso veio sem freio.
— Que bom que você acordou! — disse ela, quase pulando da cadeira. — Você dormiu por um dia inteiro!
— Um… dia inteiro? — murmurei, a voz rouca, o corpo ainda doendo em cada canto. — Eu nem sabia que isso era possível…
— Fico feliz que esteja se recuperando bem — disse ela, sorrindo de leve. — O Shin e o Levi vieram te visitar algumas horas atrás… ficaram um bom tempo aqui.
— Sério? — forcei um sorriso fraco. — Eu… levei uma surra feia, hein?
— Bem… ele é o segundo mais forte do quarto ano, né? — respondeu ela, meio tímida, olhando pro lado. — Então, meio que era esperado…
Ela se levantou devagar, arrumando o livro.
— Mas, desculpa, Ken. Eu tenho que resolver umas coisas agora…
Ela já estava quase saindo, a mão na maçaneta, quando parou e virou o rosto por cima do ombro.
— Ah, antes que eu esqueça… aquela garota do Clã Misticia, a Mei, veio te visitar. Ela foi a primeira a aparecer aqui, logo depois que te trouxeram. E… até o professor Ren Tianyū passou por aqui.
Meu corpo, ainda cansado, não conseguiu esconder a surpresa.
— O professor veio? — murmurei. — E… a Mei?
Holi assentiu, com um leve sorriso enigmático.
— Pois é. — disse apenas isso.
Ela abriu a porta. Mas não saiu de imediato. Ficou ali parada… alguns segundos. Silenciosa. Como se quisesse dizer algo… mas desistisse.
E então, partiu.
A porta se fechou devagar.
Fiquei olhando pro teto, a mente girando devagar.
O que será que aquela garota quer comigo…?
Suspirei, ainda confuso, e acabei voltando a dormir — com uma pontada de dor no corpo… e outra, bem mais estranha, no peito.
Voltei pras aulas como se nada tivesse acontecido.
Ou pelo menos… eu achei que tinha voltado.
Dois dias depois daquele caos todo, lá estava ela — Mina Mei — parada bem na minha frente. O rosto ainda um pouco inchado, resquício da surra que ela mesma pediu. Literalmente.
Ela parecia… irritada.
— Você nem veio me pedir desculpas — rosnou, apontando o próprio rosto. — Por isso aqui!
Fiquei encarando ela por uns segundos, tentando entender se aquilo era sério. Tipo… era pra eu me sentir mal?
O quê? Foi mal por ter socado sua cara? Foi você que me chamou pra lutar!
Claro, pensei isso. Mas não falei. Só suspirei e tentei soar o mais decente possível.
— Foi mal por ter feito isso contigo. Eu sei que…
Mas ela se aproximou de repente.
E, cara…
Ela era realmente bonita. De perto, o rosto levemente machucado dava até um charme estranho. Tentei não demonstrar nada, mas senti meu rosto esquentar um pouco.
Mina inclinou a cabeça, me analisando como se estivesse olhando pra uma criatura rara.
— Você é o primeiro garoto que aceita lutar comigo… e me dá socos. Socos de verdade. Sem piedade. — O tom dela era confuso. — Você tem algum tipo de problema?
Aquilo podia facilmente ser um insulto, mas… não soou como um.
— Não tenho nenhum problema — respondi, coçando a nuca. — E… bem, era uma luta justa, né?
Ela ficou em silêncio por um segundo. Depois deu um leve sorriso.
— Justa, hein? Hmm… você tem razão.
Não sei por quê, mas senti que dar razão pra ela fez algum botão esquisito se ativar. O olhar dela ficou mais intenso. Quase brilhante.
Ela estendeu a mão, com uma expressão que misturava confiança e realeza exagerada.
— Eu aceito você como meu subordinado. Ou como chamam mesmo? Colega? É, isso.
Fiquei encarando a mão dela, meio confuso.
— Acho que o nome disso é “amigo”… — murmurei.
Sério… que garota estranha.
— Uhum — respondeu ela, abaixando a mão. — Como você deve saber, eu sou do Clã Misticia. Uma nobre vinda lá de cima. Então é natural que eu…
— Foi mal, tô atrasado pra aula de combate com o professor Ative — cortei ela sem cerimônia. — A gente se fala mais tarde, beleza?
Nem olhei pra trás quando comecei a andar. Mas dava pra sentir a raiva subindo nela mesmo sem ver o rosto. A aura dela parecia ferver.
— Ken Orquídea… — chamou, com uma voz carregada de determinação teatral. — Você será meu rival e meu amigo, entendeu?! Além disso… você já me tocou durante a luta. Se aproveitou! Então é sua obrigação ficar por perto! Hmph!
Parei no meio do caminho, respirando fundo.
Sério? O que essa garota tá falando?
Me virei devagar, já com a paciência acabando.
— Escuta aqui, garota. Não é porque você é da nobreza, ou seja lá o que for, que pode sair dizendo essas coisas em público! Sorte sua que não tem ninguém por perto. E olha… não é porque você é “bonitinha” que eu encostei em você com segundas intenções, tá ouvindo?! A gente tava lutando, foi sem querer! Não viaja!
Silêncio.
Ela ficou vermelha. E não era de vergonha. Era raiva mesmo.
Mas no fundo… bem no fundo… eu senti que ela estava se divertindo.
Que garota completamente fora da curva.
E foi assim… o início da minha estranha — e barulhenta — amizade com Mina Mei.
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