Capítulo 12 — Tabuleiro dos Nove
À minha frente, o tabuleiro formado, aguardava a última peça ser posta, o peão do centro E7. E assim, mesmo com uma pitada de desentendimento, fiz. Coloquei-o em cima do tabuleiro formado pela tinta, enquanto o amontoado de tinta, aguardava em silêncio todas as peças no tabuleiro.
‘Eu preciso simplesmente jogar uma partida com essa coisa e ganhar?’
A ideia, à primeira vista, era absurda e sem sentido, afinal, não tive nenhum indício sobre o que realmente estava acontecendo. Esse lugar, por si só, era estranho, desde que transmigrei, nada parecia correto, sempre ruminando em um barco de incertezas onde a cada passo, mais longe eu me sentia das respostas que tanto procurava.
‘Primeira provação… o que isso deveria significar? Estou em algo cíclico? Ou já passei para outra provação? Não… Nisso àquela tela iria aparecer novamente, então não devo ter finalizado, ainda.’
Essa dúvida, me corroía por dentro, junto a um impulso tremendo do desejo de roer minhas unhas, engoli em seco e tentei afastar meus pensamentos, para que conseguisse finalmente analisar a situação.
Assim, fiz, após colocar a última peça no tabuleiro, comecei a encarar meu ‘adversário’, enquanto ele começava a se preparar para executar finalmente a abertura do jogo.
O primeiro movimento que fez, foi um tanto quanto estranho, às vezes que joguei xadrez ainda no colegial, me recordava de sempre iniciarem com peão E4, tomando o controle inicialmente do centro do tabuleiro. Mas pelo contrário, não o fez.
Seu movimento foi cavaleiro F3.
‘Hum… Ele está reivindicando certos espaços do tabuleiro… D4, E5 e G5 estão no alcance dele… O que eu faço? Talvez a resposta seja reivindicar um pouco do espaço do tabuleiro também, então eu posso seguir assim?’
Movi com um certo receio o cavaleiro de G8, a palma da minha mão estava fria e por algum motivo, sentia a peça um tanto quanto quente, contrastando o que sentia. E o deixei em F6, dessa forma, mesmo que parecendo que copiei seu movimento, meu foco estava em outro espaço.
Dessa forma, comecei a ter um controle do espaço do centro do tabuleiro, podendo alcançar D5, E4 e G4. Além de evitar um possível ataque de mate em H5. Movi meu tronco para trás e percebi que agora, tinha um apoio nas costas e que eu estava sentado em algo.
Parecia uma cadeira, ou um trono, não sabia identificar, mas a última coisa que entendi era que a criatura de tinta, também havia replicado para si.
Seu movimento seguinte foi peão C4.
‘Ele está abrindo espaço para começar a jogar com a dama dele… Mais rápido do que eu esperava, esse é um estilo meio estranho, mas com a dama em jogo ele consegue me ameaçar muito mais, seria isso que ele procura?’
Movi meu peão em G6, abrindo espaço para desenvolver o meu bispo em seguida. Era um movimento defensivo, mas que também preparava um contra-ataque poderoso pela grande diagonal.
Assim que meu peão pousou no tabuleiro, a sensação de calor na minha mão aumentou, e o trono que eu estava sentado pareceu se tornar um pouco mais sólido, mais ‘real’.
A criatura de tinta continuou, sem esbanjar nenhuma reação, seguindo sua abertura com cavaleiro C3, reagi instintivamente com bispo G7.
‘Assim eu meio que protejo meu cavaleiro e caso deixo descoberto, posso trocar bispo por cavalo naquela posição, duplicando peões na casa… Só que, eu não sei se a melhor ideia seria trocar as peças.’
Ele respondeu com peão D4, tomando praticamente o centro do tabuleiro para si, um pouco ambicioso, mas talvez fosse o correto a se fazer. Entretanto, eu precisava tomar uma contra-medida urgente.
Minhas opções eram arriscadas, mas também abriam um leque de infinidades, nesse momento poderia abrir o Armagedom com peão D5.
Com isso, ele poderia tomar com cavaleiro de C3 para D5, ou peão de C4 para D5, onde na primeira opção eu faria uma troca de cavaleiros, movendo o meu cavaleiro de F6 para D5, duplicando seus peões no centro e responderia com dama D5, tomando controle do centro.
Claro, também havia outras opções, mas decidi jogar seguro fazendo o roque menor, trazendo minha torre para F8. O ser de tinta pareceu hesitar, enquanto pensava em seu próximo movimento.
‘Estou jogando bem seguro… Formei uma defesa sólida, mas o lado esquerdo ainda não consegui desenvolver nada… À primeira vista, parece que ele está vencendo.’
Finalmente tomando a decisão, respondeu com bispo em F4 dominando ainda mais o centro do tabuleiro, por algum motivo, me sentia ainda mais desconfortável com a partida, embora não esboçasse isso.
Mas, agora que eu estava com o meu rei seguro, finalmente reagi e parti ao ataque, movi meu peão para D5, libertando finalmente minha rainha e o meu bispo para o jogo.
‘Ele percebeu isso?’
Reagindo a minha jogada, moveu sua dama para B3, defendendo ainda mais seu peão e ameaçando tomar o controle de D5.
‘Agora ele pode ter o controle total do meio… Mas eu posso fazer ele perder tempo, não é? Essa dama ter vindo cedo para o jogo, pode complicar o seu desenvolvimento futuro das peças, me dando uma certa vantagem, já que meu rei está já bem protegido…’
Decidido para ver o desenrolar disso, segui com peão C4, tomando o peão dele que imediatamente reagiu com dama em C4.
‘Hum… esse bispo dele, vai ser um problema se eu não fizer nada…’
Isso definitivamente era notório, com o bispo em F4, ele poderia tomar peão C7, forçando eu mover minha dama para tomar o bispo dele ou perder meu cavaleiro, só que nisso, se eu tomo o bispo dele, ele reage com a dama fazendo perder minha dama de graça.
Sabendo disso, movi peão C6, abrindo a coluna para o bispo passar direto, defendendo de um possível ataque da dama dele, pois, caso tentasse tomar, o peão de B7 tomaria a dama em C6 e se pegasse o cavaleiro em B8 com o bispo, tomaria de volta com a torre em B8.
Frustrando meus planos, brancas moveram peão E4, buscando ainda mais controle tático do meio do campo e liberando o bispo dele para jogo. Com isso, agora tanto o roque maior, quanto o menor viraram opções dele.
‘O que eu faço para reagir? Acho que apenas desenvolver minhas peças é o suficiente agora… Vou colocar o segundo cavaleiro para jogo.’
Movimentei cavaleiro de B8 para D7, cobrindo meu bispo de suas opções e a dama, mas ameaçando tomar o controle do centro no momento certo. Ao contrário do que pensei, ele não liberou seu bispo para o jogo e nem executou o roque.
Pelo contrário, seu lance foi torre D1, solidificando ainda mais suas defesas do peão de D4, mas parecia que ele por algum motivo não estava preocupado em defender o rei dele. Isso por si só, era algo totalmente estranho, mas também lógico.
Nisso, pensei em ganhar mais tempo de jogo, para posicionar minhas peças movendo meu cavalo para B6 e ameaçando a dama dele.
‘Acho que encontrei a resposta que eu estava procurando…’
Reagindo à minha jogada, a criatura de tinta moveu dama para C5, saindo do alcance do cavaleiro, mas também não poderia atacar nenhuma outra casa, pois seria tomado pelo peão de A7 para B6 ou dama E7.
‘Certo, é hora de quebrar a formação dele, destruindo principalmente a base, essa é a resposta para punir o erro dele.’
Movi bispo de C8 para G4, ameaçando o cavalo de F3.
Agora todas as minhas peças finalmente estavam no jogo, torre, dama e a outra torre estavam conectadas, tecendo uma forte linha defensiva.
‘Mas ele pode reagir com o bispo dele…’
Era inegável, se ele jogasse bispo E2, quebraria minha artimanha e desenvolveria a peça dele, além de abrir a possibilidade para o roque menor e mais seguro… Mas não foi isso o que ele fez, por algum motivo, ele me deu mais tempo para desenvolver o meu jogo, movendo seu bispo para G5, ameaçando o cavalo de F6. Um erro. Um erro sutil, mas fatal.
Claro que, meu bispo em G7, entraria para o jogo assim, tomando essa troca de materiais e abrindo um novo leque de possibilidades para furar sua defesa.
‘Espera… Talvez isso possa funcionar…‘
Para o punir, eu precisava de um lance que jogaria tudo o que ele semeou por fora e o meu cavaleiro em B6, tinha essa exata missão, o movi para A4, ameaçando a dama dele em C5 e o cavaleiro dele em C3.
‘Isso pode parecer que eu entreguei o meu cavaleiro… Mas na realidade é um lance demoníaco.’
Afinal, se ele tomasse o meu cavaleiro com o cavaleiro de C3, eu poderia contra-atacar com cavaleiro E4, tomando o peão e formando um garfo na dama C5 e no bispo G5 e isso seria extremamente vantajoso para mim.
Já que, ele tirando a dama da reta, faria tomar o bispo em G5, claro que, ele poderia tentar contra-atacar tomando de volta com o cavaleiro dele que está em F3, mas nisso, ele deixaria descoberto a torre em D1 para o bispo que estava em G4.
Se ele resolvesse mover a dama para desesperadamente forçar a tomada do peão de E7, eu poderia mover dama de D8 para A5, fazendo xeque.
‘O jogo está chegando em seu ápice…’
Eu não estava nervoso, pois era bem simples na real, ele não poderia comer minha torre em momento algum em F8, pois logo a torre que ficou parada desde o início em A8 tomaria de volta ou o próprio bispo de G7.
Bom, mesmo se ele tentasse bloquear com cavaleiro saindo de A4 para C3, não faria muita diferença, onde meu cavaleiro de E4 voltaria para o jogo, tomando em C3, uma possível resposta seria ele tomar com peão B2 para C3 e duplicar peões nessa fileira, impedindo que eu tomasse a torre em D1 com o cavaleiro de C3.
Embora não adiantasse muito, já que eu retomaria o xeque com dama de A5 para tomar o peão em C3.
No fim, a solução que a criatura encontrou foi peão B4, bloqueando a minha dama e protegido pela dama protegida dele em E7.
‘O que ele vai tentar fazer? Ele não consegue tomar a minha torre nem mesmo se quisesse, sem perder a dama no processo. Ele deu o cavaleiro dele de graça em A4 para a minha dama de A5.’
E assim fiz, tomei o cavaleiro dele em A4, ainda deixando a torre de D1 na mira da dama. Sem muito o que fazer, ele tentou tirar a dama da coluna atual, movendo-a para dama C7 perdendo mais tempo, mas cobrindo a dama e não deixando mais o xeque provável.
‘Esse é o começo do fim da partida, independente do que ele fizer, o mate irá ser executado…’
Para causar ainda mais desespero àquela criatura, eu movi o cavaleiro de E4.
Recomendo verem com um tabuleiro, mas caso contrário amanhã terá uma referência visual da partida!
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