A noite caiu sobre Estier, trazendo uma brisa fresca que atravessava as janelas da casa. As velas sobre a mesa tremulavam suavemente, lançando sombras dançantes pelas paredes de pedra. O grupo estava reunido na sala, sentados em torno da mesa de madeira que agora, depois da faxina, parecia bem mais apresentável.

    Kaizhat esticou os braços e soltou um suspiro.

    — Foi um dia e tanto, hein? Nunca pensei que limpar uma casa fosse tão cansativo.

    Fred, jogado no sofá, concordou com um gemido.

    — Eu ainda prefiro isso ao treinamento.

    Star riu.

    — Aposto que amanhã você vai dizer o contrário.

    Fred se remexeu.

    — Bom, depende do que Xavier vai aprontar dessa vez.

    O silêncio tomou conta do ambiente por um momento. Todos estavam refletindo sobre o que viria a seguir. Eles sabiam que, a cada dia, as coisas ficariam mais difíceis.

    Kaizhat olhou para seus amigos e resolveu perguntar algo que estava em sua mente há um tempo.

    — E aí… como vocês estão se sentindo com tudo isso? Digo, já faz um tempo que estamos aqui, mas ainda parece surreal pra mim.

    Os outros se entreolharam.

    Choi Miu ajeitou os óculos e foi o primeiro a falar.

    — Bem… no começo foi um choque. Mas eu encarei como um desafio. Um lugar novo, com regras novas, onde o conhecimento pode ser a chave para sobreviver. Ainda não sei tudo sobre este mundo, mas estou aprendendo rápido.

    Fred assentiu.

    — Eu soube desde o primeiro dia que ia ser complicado. Mas, pra ser sincero, não achei que seria tão difícil. Esse negócio de magia, níveis de poder… a gente está em desvantagem contra muitas pessoas daqui.

    Kaizhat se identificou com aquilo.

    — Eu também sinto isso. Davidson, Xiao Mijin… eles são muito fortes. Às vezes parece que a gente está só… sobrevivendo.

    Frida, que estava sentada no canto, de braços cruzados, finalmente falou.

    — Eu não ligo pra quem é mais forte. Eu só quero melhorar o suficiente para não depender de ninguém.

    Os outros ficaram em silêncio.

    — Você quer lutar sozinha? — Star perguntou.

    — Quero ser forte o bastante para não precisar de ajuda. — Frida respondeu, direta.

    Choi Miu olhou para ela com uma expressão pensativa.

    — Entendo o seu ponto. Mas, neste mundo, lutar sozinho pode ser um problema.

    Frida não respondeu, apenas desviou o olhar.

    Kaizhat decidiu quebrar o clima pesado.

    — E quanto a você, Star?

    Star sorriu.

    — Bom, eu acho que é uma aventura. Claro, é perigoso e tem momentos assustadores, mas nunca pensei que teria a chance de viver algo assim. Ainda mais num lugar com magia!

    Ela bateu levemente na mesa.

    — Mas tem algo que me preocupa…

    Todos olharam para ela.

    — Eu sinto falta de casa.

    Um silêncio se instalou.

    Kaizhat olhou para a vela acesa na mesa.

    — …Eu também.

    Fred respirou fundo.

    — Todo dia.

    Choi Miu ajeitou os óculos novamente.

    — Isso é natural. Fomos arrancados dos nossos lares sem aviso. Não sabemos se um dia voltaremos.

    Frida continuou em silêncio, mas seu olhar perdido dizia que ela também pensava no assunto.

    Kaizhat apertou os punhos sobre a mesa.

    — Mas… já que estamos aqui, não podemos nos dar ao luxo de desistir.

    Star assentiu com um sorriso determinado.

    — Exato! Eu não sei se algum dia voltaremos, mas enquanto estivermos aqui, vamos aprender, crescer e lutar.

    Fred deu um leve soco na mesa.

    — É isso aí! Nada de desânimo, senão amanhã Xavier vai pisar na gente sem dó.

    Choi Miu soltou uma risada curta.

    — Como se ele já não fizesse isso de qualquer maneira.

    Os outros riram.

    A conversa seguiu, cada um compartilhando pequenas dificuldades e descobertas que fizeram em Estier. Star falou sobre a complexidade das runas mágicas. Choi Miu mencionou como estudava a estrutura dos feitiços. Fred explicou como era difícil controlar sua força em batalha.

    Quando a noite já estava avançada, Kaizhat se recostou na cadeira, olhando para todos.

    Eles não eram os mais fortes. Eles não eram os escolhidos. Mas estavam juntos.

    E isso significava que eles ainda tinham uma chance.

    O sol mal havia surgido no horizonte quando o aroma de pão recém-assado e chá quente tomou conta da casa. O grupo já estava reunido na mesa para o café da manhã, aproveitando um raro momento de tranquilidade antes do início do treinamento.

    Kaizhat, com uma fatia de pão na mão, olhava para os outros com expectativa.

    — E aí, o que vocês acham que vai ser o treinamento de hoje?

    Fred deu de ombros, mastigando um pedaço de carne seca.

    — Se for igual ao último, eu já vou deixar a alma preparada pra sair do corpo.

    — Duvido que Xavier vá repetir o mesmo treino. — disse Choi Miu, mexendo no chá. — Ele parece do tipo que gosta de inovar.

    Frida, como sempre, estava mais focada na comida do que na conversa. Star, no entanto, parecia animada.

    — E se for algo relacionado à magia? Faz sentido, né? Treinamento físico já tivemos bastante.

    Kaizhat engoliu em seco. A ideia de treinar magia o deixava nervoso. Ele ainda não sabia qual era a sua afinidade, e isso o fazia se sentir atrasado em comparação aos outros.

    — Se for magia… vai ser complicado pra quem ainda não despertou o próprio poder. — ele comentou.

    Fred bateu no ombro dele.

    — Relaxa! Se não tiver magia, pelo menos tem a gente pra te ajudar a segurar a bronca.

    Kaizhat forçou um sorriso.

    Era fácil para Fred dizer isso, já que ele tinha um talento natural para reforço mágico de defesa. Mas Kaizhat sabia que, eventualmente, precisaria encontrar sua própria força.

    Enquanto os cadetes tomavam café, no castelo, Xavier se preparava para o treinamento do dia. Ele estava na sala de estratégias, uma grande câmara de pedra iluminada por tochas e janelas arqueadas. À sua frente, dois de seus Tenentes estavam posicionados, ouvindo atentamente.

    A primeira era Velka Frostbane, uma mulher de cabelos longos e prateados, olhos frios como o gelo que dominava, e uma postura impecável. Sua especialidade era magia de gelo, capaz de congelar um lago inteiro em segundos.

    O segundo era Kael Dravenn, um homem robusto de pele morena, cabelo escuro e olhar calculista. Ele dominava a magia da pedra, mas sua maior habilidade era o Passo da Miragem, uma técnica que lhe permitia se mover com extrema velocidade, enganando a visão dos inimigos.

    Xavier cruzou os braços e olhou para os dois com um sorriso satisfeito.

    — O treino físico de ontem foi um sucesso. Todos foram até o limite… e alguns até além dele.

    Velka manteve a expressão neutra.

    — E o que planeja para hoje, comandante?

    Xavier virou-se para um grande mapa na parede, onde os nomes dos recrutas estavam anotados em diferentes divisões.

    — Hoje, vamos testar a magia deles.

    Kael arqueou uma sobrancelha.

    — Nem todos já despertaram sua afinidade. Alguns ainda estão no escuro.

    — Justamente por isso. — Xavier respondeu. — Está na hora de forçarmos o despertar.

    Velka entrelaçou os dedos sobre a mesa.

    — Como pretende fazer isso?

    Xavier virou-se para os dois.

    — Vocês dois vão ajudar. Velka, você lidará com aqueles que já despertaram a magia. Quero que teste os limites deles.

    Ela assentiu sem hesitação.

    — E eu? — perguntou Kael.

    — Você vai focar nos que ainda não descobriram seus poderes. Vamos ver se conseguimos tirá-los desse estado de incerteza.

    Kael sorriu de lado.

    — Hm. Isso vai ser interessante.

    Xavier cruzou os braços novamente.

    — Quero que todos sintam a pressão da magia hoje. Não importa se são fracos ou fortes, todos precisam saber que a magia é a espinha dorsal deste mundo.

    Velka e Kael trocaram olhares.

    — Entendido. — responderam em uníssono.

    Xavier sorriu satisfeito.

    — Ótimo. Então vamos dar início ao espetáculo.

    No campo de treinamento, o clima estava diferente do usual. O chão de terra batida havia sido limpo e, ao redor, estacas de madeira marcavam áreas específicas. Alguns soldados observavam à distância, como se esperassem algo grandioso.

    O grupo de Kaizhat chegou e logo percebeu a presença de Xavier ao lado de duas figuras imponentes. Ele não precisou perguntar para saber que aqueles eram Tenentes de alto escalão.

    Davidson já estava ali, conversando com seu grupo. Ele parecia entusiasmado.

    — Estão vendo esses dois? São monstros! A mulher pode congelar um rio inteiro!

    Xiao Mijin, sempre observadora, olhou para Velka.

    — Isso significa que hoje vai ser diferente.

    Xavier deu um passo à frente e chamou a atenção de todos.

    — Bom dia, recrutas! Como podem ver, temos convidados especiais hoje. Estes são meus Tenentes, Velka Frostbane e Kael Dravenn.

    Houve um murmúrio entre os cadetes. Os nomes deles já eram conhecidos.

    — O treino de hoje será magia. Para aqueles que já despertaram seus poderes, Velka irá testá-los. Para aqueles que ainda não descobriram suas afinidades… Kael será seu professor.

    Kaizhat sentiu um frio na barriga.

    — Agora, dividam-se!

    O campo foi dividido rapidamente. Fred, Choi Miu, Star e Frida foram para o grupo de Velka. Kaizhat, ao lado de alguns outros cadetes que ainda não despertaram magia, ficou com Kael.

    Kael olhou para eles com um sorriso desafiador.

    — Sejam bem-vindos à pior parte do treinamento.

    Kaizhat engoliu em seco.

    O verdadeiro desafio estava apenas começando.

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