O vento frio da manhã soprava levemente, carregando consigo o cheiro úmido da neblina que começava a se dissipar. Acima da escada de madeira, apoiada na grade do segundo andar, Frida observava Kaizhat e Fred conversando. Seu rosto não demonstrava nenhuma emoção visível, mas sua postura rígida e seu olhar fixo indicavam que ela prestava atenção a cada palavra trocada entre os dois.

    Quando a conversa chegou ao fim e os dois ficaram em silêncio, Frida se virou e voltou para seu quarto.

    Horas depois, o sol já iluminava as ruas de pedra do reino, e a casa estava começando a ganhar vida. O cheiro de madeira antiga misturado ao ar fresco da manhã preenchia cada canto da residência.

    Kaizhat desceu as escadas, encontrando Star, Choi Miu e Frida já reunidos na sala. Fred surgiu logo em seguida, espreguiçando-se.

    — Então, qual é o plano pra hoje? — perguntou Fred, coçando a cabeça.

    Choi Miu ajeitou seus óculos.

    — Precisamos conhecer melhor a cidade. Saber onde comprar suprimentos, roupas, armas… e claro, entender melhor como esse mundo funciona.

    Frida cruzou os braços.

    — Então estamos todos de acordo.

    Kaizhat olhou para Star, que sorriu animada.

    — Isso vai ser divertido! Quero ver como são as roupas daqui!

    Ele assentiu, tentando compartilhar do entusiasmo dela. Embora estivesse curioso para explorar o reino, ainda sentia um aperto no peito por estar tão longe de casa.

    Mas não havia escolha. Esse era seu novo mundo agora.

    Antes de saírem, decidiram tomar café da manhã. O grupo se dirigiu até a pequena cozinha da casa, onde encontraram uma despensa com alguns suprimentos básicos.

    Diferente do que estavam acostumados, não havia pães fofos, cereais ou café. Em vez disso, encontraram um tipo de pão rústico e denso, com uma crosta grossa e um cheiro levemente amadeirado. Ao lado, potes de mel escuro e um creme amarelado que lembrava manteiga, mas com um aroma mais forte.

    Sobre a mesa, havia uma espécie de mingau feito com grãos moídos, misturado com algo que se assemelhava a leite, mas com um tom levemente azulado.

    Fred pegou um pedaço do pão e mordeu, mastigando devagar antes de soltar um comentário:

    — Bom… já comi coisa pior.

    Star experimentou o mel, seus olhos brilhando com a doçura intensa do sabor.

    — Isso é muito bom!

    Kaizhat pegou uma colher do mingau e levou à boca, estranhando a textura mais densa do que o esperado. O gosto era neutro, mas deixava um leve toque adocicado no final.

    — É diferente… mas acho que dá pra acostumar.

    Choi Miu analisava a comida de forma crítica, provando cada item com cuidado.

    — A alimentação daqui parece ter um foco maior em grãos e derivados. A falta de temperos fortes indica que a culinária deles é mais simples e rústica.

    Fred revirou os olhos.

    — Você sempre analisa tudo desse jeito?

    Choi Miu deu de ombros.

    — Apenas estou tentando entender melhor onde estamos.

    Enquanto todos comiam, Frida permaneceu em silêncio, mastigando devagar, sem expressar nenhuma opinião sobre a comida.

    Após terminarem o café, eles se levantaram e começaram a se preparar para sair.

    O dia estava apenas começando, e Estier ainda tinha muito para revelar a eles.

    Após o café da manhã e uma breve discussão sobre a melhor maneira de explorar a cidade, Choi Miu tomou a frente e propôs uma abordagem estratégica.

    — Vamos nos dividir. Assim, cobrimos mais área e conseguimos mais informações.

    Kaizhat olhou para os outros, sentindo que a decisão havia sido tomada sem que ele sequer tivesse dado uma opinião.

    — Eu vou sozinho. — disse Choi Miu, ajustando os óculos. — Prefiro analisar o ambiente sem distrações.

    — Certo. — Fred cruzou os braços. — Então eu vou com Frida.

    Frida apenas assentiu, sem parecer se importar.

    Antes que Kaizhat pudesse abrir a boca, Star já estava segurando seu braço com entusiasmo.

    — Isso significa que nós dois vamos juntos!

    Kaizhat piscou algumas vezes, surpreso com a empolgação dela.

    — E-Espera, por quê eu?

    — Porque eu quero te ajudar a melhorar sua aparência! — disse ela, sorrindo travessa. — Vamos direto para a loja de roupas!

    E antes que ele pudesse protestar, ela já o puxava pelas ruas de pedra da cidade.

    O reino tinha uma arquitetura rústica, com construções de pedra e madeira, pequenas vielas movimentadas por mercadores e o cheiro de pão recém-assado se misturando ao ar fresco da manhã. Kaizhat tentava absorver tudo aquilo, mas não teve muito tempo para se concentrar, pois Star parecia ter um único objetivo: levá-lo para a loja de roupas.

    Quando entraram, foram recebidos por uma vendedora idosa, que lhes lançou um sorriso gentil. O ambiente era amplo, com araras cheias de túnicas, capas, trajes reforçados para batalha e até algumas roupas casuais que pareciam mais modernas do que Kaizhat esperava de um mundo medieval.

    — Perfeito! — Star soltou Kaizhat e foi direto para as araras. — Temos tantas opções!

    Kaizhat suspirou, olhando para as roupas com pouco interesse.

    — Não sei se eu realmente preciso de roupas novas agora…

    — Claro que precisa! Você foi convocado para um novo mundo eprecisa se adaptar! Você não pode mais andar por aí com essas roupas comuns, Kaizhat! — Star respondeu com um tom de voz animado, pegando várias opções de roupas e jogando em direção ao garoto, como se fosse algo completamente normal.

    Kaizhat ficou parado, com uma expressão entre confusa e um pouco incomodada. Cada vez que uma peça de roupa era jogada em sua direção, ele a segurava sem saber o que fazer. Sua cabeça girava de um lado para o outro, observando Star se empolgar com as combinações, completamente alheia ao fato de que ele estava perdendo o controle da situação.

    — Isso aqui vai ficar ótimo em você! — Star disse, segurando uma túnica de cor vibrante que parecia mais adequada para uma festa do que para um treinamento militar. — E você vai ficar muito mais charmoso!

    Kaizhat não sabia como reagir. A peça de roupa estava em suas mãos, e ele observava, perplexo, enquanto Star passava por ele e pegava mais e mais peças de roupas. Ela parecia estar em um frenesi de moda, e a pobre túnica que ele estava segurando parecia estar cada vez mais fora de lugar.

    — S-Star, sério… isso está ficando… — ele começou, mas antes que pudesse terminar a frase, Star já tinha o empurrado para dentro de um provador improvisado.

    — Fique aí e experimente tudo! — ela disse com um sorriso travesso. — Eu vou achar mais algumas coisas.

    Kaizhat ficou sozinho no pequeno espaço, respirando fundo enquanto olhava as várias roupas espalhadas ao seu redor. Ele não estava acostumado a se preocupar tanto com a aparência. Em seu antigo mundo, vestia o que fosse mais prático e confortável, nada mais. Mas aqui, tudo parecia diferente. Ele sentiu uma pressão crescente, não só de Star, mas de todo o ambiente novo em que estava inserido.

    Ainda refletindo, ele pegou a primeira roupa que Star havia escolhido e colocou, observando-se no espelho improvisado. A túnica era mais colorida do que qualquer coisa que tivesse usado antes, e as mangas eram largas, com desenhos intrincados em fios dourados. Não parecia muito prático para lutar ou viajar, mas ele não podia negar que se sentia… diferente.

    A porta do provador se abriu de repente, e Star entrou com um sorriso largo no rosto.

    — Uau! — ela exclamou, colocando as mãos nos quadris. — Você está incrível!

    Kaizhat, visivelmente desconfortável, olhou para o reflexo no espelho e forçou um sorriso.

    — Não sei, Star… é um pouco… chamativo demais, não acha?

    Star deu um risinho, aproximando-se dele.

    — Deixe de ser tímido! Você tem que se destacar. Você é um herói em potencial, mesmo que ainda não tenha descoberto sua magia. E, para ser sincera, eu estou adorando esse visual. — Ela se afastou e fez um gesto amplo, como se o observasse como uma obra de arte.

    Kaizhat suspirou e retirou a túnica, trocando por outra peça que ela havia escolhido. Ele começou a se acostumar com a ideia, se perdendo um pouco nas escolhas de Star. Ela estava empolgada e parecia acreditar que sua missão era transformá-lo em alguém novo. E, de certa forma, ele podia ver que isso era algo importante para ela também. Ele não sabia o motivo, mas as interações de Star com ele sempre tinham um tom de brincadeira, mas também de algo mais profundo, talvez até uma tentativa de trazer uma sensação de normalidade para um mundo tão caótico.

    Enquanto ele tentava se acostumar com a ideia de ser “mais bonito” para esse novo mundo, Star continuava a mexer nas araras e selecionar roupas que ele nunca pensaria em usar. Algumas mais coloridas, outras com detalhes mais chamativos, mas todas com um padrão de que ele parecia ter de se destacar de alguma maneira.

    O que Kaizhat não sabia é que, embora Star estivesse brincando com ele, também estava tentando fazer com que ele se sentisse parte desse novo mundo. Ela via o que Kaizhat não via — a luta silenciosa que ele estava travando dentro de si mesmo. E, talvez, ao fazer aquilo, ela estivesse dizendo sem palavras: “Não importa onde você estava antes, você agora faz parte disso. E você vai ficar bem.”

    Kaizhat pegou mais uma peça de roupa e se preparou para experimentar, pensando sobre o que Star dissera. Será que ela estava certa? Será que ele realmente se destacaria um dia, ou essa aventura seria apenas um prelúdio de frustração e desespero?

    Mas, por agora, ele apenas suspirou, aceitando a situação. Ele iria se adaptar, mesmo que de uma forma que ainda não compreendia completamente. E, quem sabe, com o tempo, ele poderia encontrar um lugar para si mesmo nesse novo mundo.

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