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    O reflexo imediato de Lavignia foi se jogar sobre o corpo inerte de Lilian caído no chão. Seus dedos se encontraram com o ferimento, deixando seu braço completamente manchado de sangue. Aos poucos, lágrimas se formavam nos olhos da garota, percebendo o quão inerte e mole sua amiga estava.

    — Lily! Lily! Por favor, acorda! Você vai ficar bem!

    À medida que o desespero tomava conta de Lavignia, Heferus pegou uma parte da sua túnica e limpou o sangue do seu cajado, como se fosse um pequeno inconveniente. Era uma lição adequada para uma garotinha que não sabia o seu lugar.

    — Isso era realmente necessário, mestre? — perguntou Hinoka, um tanto cética.

    — Foi apenas um inconveniente. Além disso, já acelerou o processo de sulfurização dela. Faça o seu trabalho e mate a outra garota também.

    Um sorriso perverso se manifestou no rosto da mulher. Finalmente, aquela garota petulante e irritante teria o que merecia. Calmamente, se posicionou atrás de Lavignia, cuja atenção estava completamente no cadáver de Lily. Suas lágrimas desciam como uma cachoeira, se misturando ao sangue em seu rosto. Seus braços a seguravam com firmeza, como se tentasse espremer qualquer sinal de vida dali.

    Heferus deu um passo adiante e bateu a ponta do seu cajado no solo, formando um som oco que ecoou por toda aquela região.

    — MEUS FILHOS! — bradou ele. — ESTA NOITE, DUAS NOVAS IRMÃS SE JUNTAM A NOSSA FAMÍLIA! COM ELAS, FINALMENTE ESTAREMOS PRONTOS PARA TRAZER O HORROR AO MUNDO MECÂNICO E CIVILIZADO! MOSTRAREMOS A ELES QUAL É A VONTADE DA MÃE NATUREZA DO PIOR JEITO POSSÍVEL!

    Quando suas mãos estavam prestes a quebrar o pescoço de Lavignia, uma sensação de perigo imediato a atingiu. Não sabia o que era, apenas que tinha necessidade de agir. Suas pernas se moveram rapidamente na direção do seu mestre, permitindo-a puxá-lo para trás e tomar sua frente.

    — O que você está fazendo, Hinoka? — perguntou Heferus, em um misto de confusão e indignação.

    Ela só teve tempo de erguer a mão direita, antes de uma lança feita puramente de gelo cristalino atravessar sua mão e pescoço, arremessando seu corpo para trás. Ao ver sua serva sendo devastada daquela forma, o druida imediatamente fez um gesto com suas mãos, comandando os sulfurizados a entrarem em posições de batalha.

    — Merda…merda! — esbravejou Heferus, tateando o chão em busca do seu cajado.

    Então, o som de um brado ecoou em toda área de domínio da árvore colonizadora.

    — HEFERUS! EU VIM PELA SUA CABEÇA!

    Aquela voz familiar o atingiu junto com uma vertigem. Aquela sensação de desastre iminente quando tudo parecia estar dando certo fizeram suas mãos suarem frio. Quando finalmente se apoiou sobre os joelhos, olhou para quem tinha ousado desafiá-lo.

    — O quê…? — sussurrou o druida, confuso com o que via.

    Em frente ao seu exército de sulfurizados, um homem residia de pé. Porém, ele era tão pálido e exibia as mesmas características das suas criaturas. Seus olhos pálidos confirmavam isso. Quando percebeu a enorme cicatriz em seu peito, tudo pareceu fazer sentido.

    — Eu te conheço! Você é o homem que minha querida Hinoka ofereceu o coração como forma de agradecimento. Se você está aqui, de pé na minha frente, significa que aquela bruxa repugnante teve sucesso em clonar meus métodos.

    Huan Shen cerrou os punhos.

    — Mesmo que a bruxa não tivesse se intrometido, eu teria voltado como espírito e iria te torturar até o fim dos tempos, desgraçado!

    O druida ergueu uma das sobrancelhas.

    — Parece que ela ainda criou um modelo defeituoso, afinal. Você ainda tem motivação e isso é uma falha.

    Um sorriso perverso se esboçou no rosto do emissário.

    — Não foi isso que seus projetos perfeitos acharam quando arranquei suas cabeças!

    Foi quando Heferus percebeu que não tinha sido a bruxa que se livrou deles, mas sim a criatura na sua frente.

    — Quando eu terminar de lidar com ela, irei te mostrar um propósito superior. MEUS FILHOS! ACABEM COM ESSA ABERRAÇÃO E TRAGAM-ME SEUS RESTOS!

    Antes que pudesse dar o primeiro passo, os sulfurizados tomaram uma instância de batalha e começaram a rodeá-lo. Todos aqueles eram similares aos primeiros modelos que enfrentou: velozes, fortes e incapazes de sentir dor. Destinados a seguir suas diretrizes até o final da sua existência.

    “Não sei se consigo enfrentar todos esses…”

    Quando o primeiro sulfurizado avançou na sua direção, a diferença do antes e depois era evidente. Antes, seus movimentos pareciam borrões, mas agora não pareciam ser mais rápidos do que um lutador inexperiente. Protuberâncias congeladas começaram a se formar na sua mão esquerda, enquanto o mesmo usou aquele cotovelo para acertar um golpe direto no pescoço do seu alvo. Quando seu corpo recuou, sua mão perfurou o abdômen da criatura, junto com seus órgãos internos.

    Ao puxá-la, uma quantidade enorme de sangue negro começou a vazar. Mas antes que uma gota atingisse o solo, o frio emitido por Huan Shen congelou a corrente de sangue, formando uma espécie de lâmina completamente irregular. Sem perder tempo, ele a puxou do corpo do sulfurizado e com um movimento limpo, cortou sua cabeça fora.

    Tudo isso em um intervalo de dois segundos.

    Aproveitando o momentum do corte, seus pés cravaram no solo e seu corpo o impulsionou na direção do próximo sulfurizado, que imediatamente reagiu erguendo os braços.

    Não foi uma ideia sensata. A lâmina de sangue negro cortou ambos os braços. Quando seu movimento atingiu o ponto mais baixo, Huan Shen trocou a forma como empunhava a arma, erguendo a lâmina entre os pés da criatura e cortando-a ao meio.

    “Isso foi ótimo, mas não vai durar.”

    Ao olhar para suas mãos, percebeu que não tinha sobrado nada além dos cacos da sua arma improvisada. E os sulfurizados já tinham começado a atacar. Os primeiros golpes eram fáceis de aparar. Dois socos em direções opostas, chutes altos mirando em sua cabeça, tentativas de agarrá-lo e essas coisas básicas. Mas o que eram três se tornaram sete, que se tornaram dez.

    Ainda que seus poderes fossem fortes, não eram capazes de segurar tantos ataques simultâneos. Seus braços se ergueram mais uma vez, projetando uma barreira congelada, mas as criaturas poderiam incendiar seus corpos, destruindo completamente sua defesa. Até que, ao aparar um chute, um punho acertou-o diretamente na mandíbula, afetando seu equilíbrio. Ele tentou revidar com um outro soco, mas uma das criaturas agarrou sua perna e o derrubou no chão.

    “Merda!”

    Usando suas forças elevadas e números avassaladores, seguraram o emissário pelos braços e o arrastaram, completamente contido. Huan Shen tinha perdido mais uma vez. Naquele momento, a novidade seria se ele fosse capaz de vencer.

    Heferus se aproximou, apoiado em cajado, do emissário rendido. Hinoka o acompanhava um pouco atrás, fechando os ferimentos causados pela sua lança. Ao chegar perto o bastante, apoiou-se em um dos joelhos, ficando no mesmo nível de Huan Shen.

    — Eu dei o dom das chamas para meus filhos, mas por algum motivo, você porta a geada do inverno em seus dedos. Não apenas isso, utiliza com uma maestria inexplicável. Eu retiro o que disse. Você não é um fracasso, mas sim um indicativo do quão poderosas minhas criaturas podem se tornar.

    — Por que os matou? — perguntou Huan Shen, sem nem prestar atenção nas palavras do druida.

    Por alguns segundos, o druida ficou confuso com a afirmação, até lembrar que as quatro pessoas capturadas mais cedo estavam relacionadas a ele.

    — Ah, aqueles dois? Não gosto de pessoas inferiores que acham que podem me responder de qualquer jeito. E além disso, meu urso estava com fome a um tempo. Só juntei o útil ao agradável.

    Aquelas palavras chocaram o emissário. Não por serem poderosas ou particularmente chocantes em si, mas sim pelo que elas representavam. Então, um sorriso se formou em seu rosto.

    — Eu acho que finalmente entendi você, Heferus. E olha que essa é a segunda vez que nos falamos.

    — Oh! — Heferus parecia devidamente impressionado. — Você finalmente notou o quão engenhoso e determinado eu sou?

    — Muito pelo contrário. Você viveu a vida toda isolado na floresta que acredita fielmente que suas três dúzias de soldadinhos vão derrubar a civilização. Você é um velho delusional com um plano muito ruim. Se eu consegui lidar com sua equipe de elite, imagina o que os magos mais poderosos não vão fazer contigo. Sério que nem chegou a cogitar nisso?

    O semblante do druida se fechou. Por incrível que pareça, seu rosto indicava que ele acreditava fielmente que a sociedade era a mesma de cinquenta anos atrás.

    — Palavras atrevidas para um homem que está prestes a me servir como um manequim.

    — Druida… — respondeu Huan Shen, sussurrando. — Você realmente acha que eu estou nessa posição atoa? Não se engane! Eu posso estar possesso de ódio, mas cada uma das minhas ações são friamente calculadas. Não devia ter abaixado a guarda, velhote!

    De repente, um uivo percorreu a Selva de Concreto. E ela vinha da árvore Colonizadora. A noite estava prestes a mudar.

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