Capítulo Extra: Prológo - Uma escuridão no começo do túnel.
POV: HELENA IVYRA
Após concluir a rotina matinal de café da manhã, peguei a pasta verde-escura sobre a mesa de cabeceira ao lado da cama. Ao abri-la, encontrei um cabeçalho destacando as informações-chave do relatório. Sentei-me e dei início à revisão dos dados…
Arquivo Confidencial: H-1206-I
Classificação: Sigilo Básico – Acesso restrito às patentes: Leitor Iniciante e Leitor Fanático.
Instituição Responsável: SLI – Sociedade dos Leitores Livres – Seção de Registro de Incidentes.
Data da Transcrição: 06/05/2025
Relator: Ivyra, H. | Codinome: Clover
Assunto: Registro de Encantamentos Mágicos e Contexto Histórico Moderno
“…Com o advento da tecnologia no início do século VI d.L. (depois do livro), o uso de aparelhos tecnológicos para o consumo de conteúdo midiático com fins de entretenimento tornou-se uma tendência predominante entre todas as faixas etárias ao redor do mundo. Diversas nações se viram diante de um dilema: modernizar seus sistemas de desenvolvimento mágico — agora utilizando aparelhos conhecidos como e-readers, cada vez mais populares — ou investir numa cultura escolar sólida, voltada ao desenvolvimento de jovens leitores, facilitando o acesso aos livros e, consequentemente, aumentando seu respectivo poder militar…”
Flip.
“…Países como a CFN (Confederação dos Estados Nortenhos), a República do Sol Originário e o Império Central do Mundo formaram grandes iniciativas financeiras para desenvolver o mercado emergente de produtos e-ink e e-readers, fomentando o crescimento e a consolidação de uma cultura de leitura digital facilitada. Jovens passaram a substituir os livros físicos e o modo tradicional de consumo de mídia pelos modernos métodos de leitura digital. Os famosos Kindles tornaram-se acessíveis e populares, consolidando o novo paradigma literário do século VI d.L…”
Flip.
“…Analogamente, as iniciativas financeiras internacionais avançaram e abriram espaço para um mercado tecnológico totalmente novo: o surgimento de meios de consumo de literatura visual, popularmente conhecidos como redes sociais. Essa nova forma de vivenciar narrativas e consumir leitura jamais havia sido vista. Em vez de longos livros cheios de jargões e elementos técnicos, surgiam métodos que permitiam o aumento dos QPs de forma rápida e constante — sem o uso direto de livros, apenas por meio da leitura e do consumo de vídeos, textos, mensagens ou artigos curtos…”
Flip.
“…Os novos meios permitem o consumo de leitura em uma velocidade jamais registrada, o que levou diversos estudiosos e intelectuais a discutir se tal volume de absorção literária poderia sobrecarregar os corpos e mentes com energia mágica (QP), causando efeitos físicos catastróficos e sequelas mentais irreversíveis. Apesar dessa preocupação, os novos empresários do setor tecnológico, em aliança com governos, aproveitaram a onda de mudança e criaram legislações que intensificaram os investimentos nessas iniciativas. Alegando atuar em nome da população, prometeram acesso universal a esses novos métodos de fortalecimento mágico, transformando-os em uma cultura de massa — na qual todos ansiavam por consumir as novas tendências. Posteriormente, esse consumo tornou-se nocivo, incessante…”
— Talvez tenha sido nesse momento que Chatness decidiu que era a hora certa de iniciar o desenvolvimento do TT — ponderei, ao terminar de ler as primeiras páginas. O relatório era extenso e dividido em vários grupos, separados por pequenos marcadores de cores e títulos distintos.
Ao ver um com as cores verde e amarela, intitulado O Humor Tupiniquim, franzi levemente o cenho.
— Creio que deveria pensar em um nome menos cômico… — murmurei em pensamento, cogitando se meu capitão — ou os futuros leitores deste relatório — se incomodariam com o tom irônico do título.
— Independentemente disso, preciso terminar essa revisão rápido. Ainda tenho que tomar café e ir para o QG depois — concluí, abrindo a seção verde e amarela e iniciando a leitura.
“Após o início da onda de investimentos em tecnologias literárias, diversos países enfrentaram dificuldades para acompanhar o crescimento acelerado do acesso à informação e à disseminação desses gadgets. Por exemplo, nos territórios sul-americanos, o Brasil sofreu um forte dilema: abandonar as metodologias literárias clássicas — que formaram toda a rica e vasta cultura literária tupiniquim, com seus poderosos dominadores autores — ou adotar os novos métodos literários modernos…”
Flip.
“…Apesar disso, os governantes brasileiros optaram por mergulhar de cabeça nas novas tendências, contrariando o que se esperava ao se considerar a infraestrutura educacional e científica do país, até então toda voltada ao método clássico de ensino. Esse sistema era composto por escolas públicas nos níveis: pré-inicial, inicial e média — podendo ser administradas em esferas provinciais, estaduais ou nacionais — e por instituições de ensino avançado, sob gestão estadual ou nacional. A distância entre a estrutura educacional tradicional e a implementação abrupta das novas tecnologias gerou inúmeros problemas no desenvolvimento intelectual e mágico do Brasil. Junto a essas decisões, houve cortes constantes de investimentos na educação, além da aprovação de legislações que taxavam os custos dos novos gadgets. Também foram sancionadas leis que tornaram o acesso a livros mais difícil. Todas essas eventualidades culminaram em um alto índice de analfabetismo e numa crise intelectual sem precedentes, levando a média de QP brasileira a cair para 100 QPs — a mais baixa de todo o continente americano¹.”
“…¹: A média de QP de um país, conhecida como Medidor de Leitura Anual (MLA), é calculada pela média de livros lidos por ano multiplicada por 50 anos. O Brasil possui atualmente uma média de 100 QPs; Portugal, 200 QPs; o Canadá, 600 QPs; entre outros…”
Flip.
“Com o surgimento dos elixires que visavam aumentar a quantidade de energia mágica e a velocidade de sua regeneração, no final da década de 2010, diversos problemas começaram a surgir, como crises de dependência e dificuldades na regulamentação desse tipo de droga. Contudo, com a criação do conglomerado farmacêutico internacional chamado Guarda-Sol, esses problemas tornaram-se menos recorrentes, pois a empresa operava com um código político de regulamentação rigoroso e defendia com veemência o uso responsável desses elixires. Tamanha era sua influência nesse âmbito que, com o lançamento de seu próprio elixir — o TempusTic, ou TT — em 2020, surgiu uma enorme tendência nos círculos da literatura moderna. Afinal, acreditava-se tratar-se do milagre da era contemporânea, pois aumentava a quantidade de energia mágica em mais de três vezes, assim como a quantidade de encantamentos que o usuário era capaz de realizar, em proporções inéditas para a época…”
“… Infelizmente, o milagre moderno não se concretizou. Quando consumido em massa, o elixir TT causou um efeito dominó: com sua natureza viciante e benefícios milagrosos, milhares de pessoas passaram a consumi-lo em grandes quantidades, iniciando um vício que, ao contrário dos Kindles, era global — e o pior de tudo, mortal para seus usuários. Assim teve início a pandemia global do TT-20.”
— Humpf… Já faz cinco anos desde o começo da pandemia. Quem diria que passaria tão rápido. — Suspirei ao fechar o relatório, coloquei-o na pasta, corri para a cozinha para fazer um café e, depois de alguns minutos, parti em direção ao QG. Era hora de escavar algumas memórias sobre o surgimento do Grito.
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