POV: MIGUEL CASTRO.

    Havia uma grande nuvem ainda se dispersando nos momentos após o fim do combate. 

    As duas permaneciam no chão, exaustas e respirando com dificuldade. O sparring havia terminado, e mesmo cansadas, senti que suas cabeças estavam a mil, pensando em coisas que poderiam ter feito diferente. Era teimosia por ter perdido. Mas também… foco.

    Elas levavam aquilo a sério. Muito mais do que eu esperava.

    Cruzei os braços, observando-as em silêncio por alguns segundos.

    Helena passou a mão pela testa, limpando o suor, e tentava se levantar. Renata já estava sentada, encostando as mãos no chão atrás de si, como se buscasse apoio.

    – Vamos fazer algumas revisões – anunciei, com firmeza na voz. — Vamos encerrar a sessão em dupla por aqui.

    Renata ergueu os olhos na minha direção, surpresa. Helena também franziu a testa, como se não estivesse satisfeita com o encerramento tão abrupto.

    – Já? – questionou-me Helena, com a respiração ainda pesada.

    – Sim – confirmei, me aproximando delas. – Lutar em duplas, é apenas a primeira parte do treinamento, é apenas cinquenta por cento do problema. 

    Ambas me encararam com atenção agora. Aproveitei o momento para sentar no chão também, de frente para elas. Era hora de conversar.

    – Vocês têm um grande potencial – comecei, encarando as duas. – Especialmente juntas. A sincronia entre os encantamentos é impressionante. Quando Helena avança, Renata a cobre, E quando o oposto ocorre, ambas alternam seus papeis, isto é, existe estratégia, existe cooperação… e isso é raro. 

    Renata baixou o olhar por um instante, pensativa. Helena apenas ouvia, atenta.

    – O estilo da Renata é tático – continuei. – Ela não luta com força bruta, nem se arrisca à toa. Possui uma boa noção de quando golpear e avançar. Você tenta dificultar meu trabalho. Me obriga a errar, a me expor. E, ao mesmo tempo, cobre a retaguarda da parceira. Isso é excelente.

    Renata ergueu o rosto um pouco mais. Havia algo de orgulho em seus olhos, mesmo que tentasse disfarçar.

    – Mas… – acrescentei, em tom mais sério – Você depende demais da presença da Helena. Durante nosso combate, percebi que ambas mantêm boa coordenação quando se juntam, e pioram se estão separadas, precisam aprender a lidar melhor em situações de combate um-contra-um. 

    Renata assentiu, sem responder. Ela sabia que eu estava certo.

    Virei o olhar para Helena agora.

    – Já você, Helena… – disse, com um leve sorriso. – Você é como um canhão de vidro, como dizia um antigo amigo meu, possui muita força energética, mistura explosão com golpes fortes e bem intencionados. Só que você confia demais na intensidade. 

    Helena inclinou a cabeça levemente, confusa.

    – Seu combate é explosivo. Você começa forte, rápida, agressiva. E, por um tempo, funciona. Quase me igualou, inclusive. Mas sua estamina é baixa. Quando começou a faltar energia, sua defesa caiu, sua precisão falhou. E foi aí que perdeu.

    Ela apertou os punhos, encarando o chão. A verdade dói. Mas é necessária.

    – Entendam uma coisa – falei, olhando para as duas agora. — O que vocês têm é raro. Uma dupla que se entende, que se apoia, que luta como uma só. Mas se quiserem crescer de verdade, precisam ser fortes individualmente também. A sinergia entre vocês é incrível, mas a confiança excessiva na outra é uma fraqueza disfarçada.

    Ambas permaneceram em silêncio. Não era um silêncio vazio, era daqueles cheios de reflexões.

    – O trabalho em equipe não pode ser uma muleta – acrescentei. – Precisa ser uma arma. E isso significa que, se uma cair, a outra precisa continuar lutando com o mesmo nível.

    Permanecemos em silêncio por alguns instantes. O vento soprava leve, carregando a poeira do chão. A luz do meio da tarde queimava fortemente no céu.

    “Nem mesmo no sul, fugimos desse calor… Foda”

    – Eu vou dividir o treinamento de vocês – declarei, por fim. – A partir de agora, pelo menos uma parte de cada sessão será feita individualmente. 

    Assim que disse isso, levantei-me, e observei ao redor, a arena estava mais livre do efeito de nuvens da Renata. 

    – Vocês precisam aprender a lidar sozinhos com pressão – continuei. – Helena, você deve aprender a lidar melhor com sua explosão energética, tente prestar mais atenção na defesa do seu oponente, analise-o comportamento dele, e direcione sua energia para ataques que sejam efetivos.

    Logo que conclui, percebo a postura de Helena. Prestando atenção firmemente com seus olhos em mim. Parecia que ela seria uma boa aluna, ouvia quando necessário e pelo visto, era motivada.

    Virando-me para Renata, que ainda estava levemente cabisbaixa, creio que pelo cansaço. Ponderei sobre alguns momentos antes, e dei meu feedback.

    – Renata, o caso com você é diferente, você não tem problemas com energia, e sim, em como usar ela de forma apropriada, antes de continuar, queria confirmar algo… – comentei, pretendia tirar uma dúvida que tinha, quando recebi o perfil de ambas.

    – Vocês duas são autistas, correto? 

    Ambas balançaram a cabeça, assentindo positivamente.

    – Certo, Renata, não sei ao certo o que você fez para reter tantos QPs assim, mas sua memória provavelmente deve ser eidética. Use isso ao seu favor – instrui, trazendo minha mão à cabeça. 

    – Os encantamentos possuem grande conexão com o cérebro, pensamos em nossa energia como um combustível, tome cuidado para não gastar demais numa fogueira que não precisa ser grande demais – continuei. – Temos que saber o quanto de energia gastamos, e onde iremos gastar, você tem uma grande reserva, se aprender a usar ele, pode fazer estragos.

    Olhando para ambas, percebo que elas parecem se ponderar sobre as informações que contei a elas. Preciso tomar cuidado para não sobrecarregá-las com conteúdo ou ensinamentos.

    “Um passo de cada vez, Miguel. Um passo de cada vez…”

    Helena que estava distraída há um momento, se vira na minha direção e me pergunta algo inesperado:

    – Senhor Miguel, como você acha que eu poderia melhorar meu uso de encantamento? Sinto que não estou explorando todo o potencial dele.

    – Esse é o próximo ponto que pretendia abordar com vocês, a utilidade de seus encantamentos – respondi, lembrando de momentos chaves através do combate. – Vamos por partes, todos temos vários encantamentos através da vida, mas apenas alguns são úteis o suficiente ou tem contato suficiente para entrarem em nossa pool, inclusive, são familiares com esse termo? 

    Ambas assentiram praticamente uníssono: – Sim, senhor. 

    – Ótimo, nossa pool geralmente é composta de três a cinco encantamentos que passamos nossa maior parte do tempo, praticando, dominando e melhorando nossa conexão com eles. – comentei, mostrando o número três com a mão esquerda. – Aqui, entramos na lógica do JAT versus o spike…

    Levantando-me rapidamente, dei um sinal com a mão, instruindo-as que se levantassem também.

    Algo que fizeram no momento seguinte. Logo, ficavam alguns metros à minha frente.

    Antes de aprofundar nisso, queria tirar uma dúvida importante para as próximas etapas do treino.

    “E de certa forma crucial para o treinamento delas…”

    Convocando em minha mão esquerda, meu marca-páginas de assinatura. Elemento principal que indicava minhas marcas e seus símbolos. E que se materializa toda vez que um mago ativa todas as suas marcas ao mesmo tempo…

    O meu brilhava em luz clara de um tom azulado, como o de qualquer dominador secundário. E possuía cinco símbolos distintos entre si, cada um, originado de uma literária diferente. Todos pertencentes ao mesmo estilo de interpretação. Sensciente.

    – Antes de explicar o que é JAT e Spike, preciso saber quais encantamentos vocês possuem… – pontuei, já sabendo o que perguntar a seguir. – Peço que me mostrem seus Marcas-Páginas assinatura, por favor…


    Apoie-me

    Regras dos Comentários:

    • ‣ Seja respeitoso e gentil com os outros leitores.
    • ‣ Evite spoilers do capítulo ou da história.
    • ‣ Comentários ofensivos serão removidos.
    AVALIE ESTE CONTEÚDO
    Avaliação: 100% (1 votos)

    Nota