Capítulo 38 - Investigações de Noah (IV).
POV: NOAH WILLIAMS.
Segui sozinho pela estrada de terra, o volante firme nas mãos e os olhos atentos ao caminho à frente.
O ar estava pesado, como se a própria mata ao redor me observasse.
Não era a primeira vez que eu percorria um trecho esquecido como aquele, mas havia algo naquela estrada que me incomodava.
Além da clara falta de qualquer sinal de humanidade naquela área, sem contar é claro, as poucas construções abandonadas que apareciam uma vez ou outra.
Talvez tenha sido o silêncio, talvez, tenham sido os relatos de desaparecimentos que eu li nos últimos dias.
Foram reportados alguns casos nos anos anteriores de jovens desaparecendo por essa região.
Todos sem deixar rastros. Um dos relatórios, apenas citava que uma testemunha havia ouvido vozes na madrugada, como barulhos abafados que ninguém queria comentar em público. E depois, dois adolescentes nunca mais foram vistos.
Segundo as informações que recebi, aquela via lateral ligava à cidade vizinha através de uma das saídas do vale. Era uma rota discreta e ideal para quem não queria ser visto.
Os números de apreensões do outro lado, contudo, eram altos demais para coincidência.
Tudo indicava que se tratava de uma das rotas preferidas para o tráfico de drogas na região.
Nada que me surpreendesse. O que me intrigava era a omissão deliberada das autoridades locais.
Miguel havia sido claro: havia motivos suficientes para crer que os policiais recebiam propina.
“Elas fechavam os olhos para os carros que passavam por aqui, não havia nenhuma patrulha…”
A corrupção era um inimigo tão traiçoeiro quanto qualquer criminoso armado, e por isso mesmo eu não podia esperar apoio dali.
Eu estava sozinho. O que, com certeza, não era reconfortante.
O carro sacolejou quando passei por mais um buraco. As fábricas abandonadas se erguiam como esqueletos de concreto, provavelmente serviram como válvulas de escape da lavagem de dinheiro que os regionais faziam.
Logo depois, algumas casas velhas surgiram, estavam caindo aos pedaços, engolidas pelo mato. Aquela vía, era extensa mata à dentro, creio que passei por vários quilômetros de estrada de terra até chegar no alvo da investigação de hoje.
Continuei até avistar a ponte mencionada no relatório. Ela era o ponto de referência que eu procurava.
Um fio de água barrenta corria sob sua estrutura de ferro enferrujado, que rangia a cada brisa.
Respirei fundo, diminuí a velocidade e cruzei. Logo após a ponte, à direita, um pequeno loteamento surgiu, encostado na encosta de uma montanha que havia sido parcialmente terraplanada.
Estacionei o carro no acostamento de terra batida, escondido no meio de árvores, para que quem viesse não tivesse visão da estrada.
Após conferir que estava com todos os itens necessários. Conferi minhas roupas, que eram em tons de verde para me misturar melhor com o ambiente. Desci e fui em direção da pequena praça que havia no lote ao lado.
O cheiro de umidade misturado a tabaco queimado veio imediatamente.
No chão, espalhados pelo lugar, estavam cacos de vidro de garrafas de cerveja, maços de cigarro amassados e bitucas ainda recentes. Não era apenas um ponto de passagem, aparentemente, os jovens se reuniam ali.
Faziam festas improvisadas e desafios idiotas.
Ignorei meu julgamento e dei uma volta ao redor, atento a cada detalhe. Observei a pequena montanha à frente, terraplanada em um dos lados e o outro, com sinais de trabalho ainda inacabado.
Há menos de setenta e duas horas atrás, registrou um pico energético
— Ruptura Semântica, seja meus olhos nesta expansão — proclamei, ao mesmo tempo que fechei meus olhos.
Foi então que senti o arrepio familiar percorrer meu corpo, uma pulsação energética leve, quase imperceptível, mas presente.
Fechei os olhos por um instante, que permitiu que meus sentidos se ajustassem.
O rastro me guiava para o canto do loteamento, onde a mata começava a engolir a clareira.
Segui a trilha invisível até uma vala escondida entre moitas altas. Era bem ao canto, quase escondido propositalmente.
O que encontrei fez meu estômago se contrair.
Havia roupas femininas espalhadas, algumas rasgadas, outras encharcadas de álcool, como se tivessem sido usadas em rituais de humilhação.
Garrafas quebradas cercavam a cena, e formavam um mosaico perverso no chão. Entre elas, camisinhas usadas e pacotes de entorpecentes amassados.
Olhei ao redor…
— Que merda aconteceu aqui…
Botei a mão na bolsa com equipamentos que trouxe comigo, peguei uma máscara e um de luvas para, precisava analisar o que era aquele absurdo ali.
Aquela vala não parecia ser um ponto de encontro juvenil. Remetia a um palco de algo muito pior…
Ajoelhei-me devagar, a mão afastando pedaços de vidro enquanto analisava cada detalhe. Além das roupas, havia mais maços de cigarro, diversas garrafas quebradas. E…
Abraçadeiras de nylon… Ou como era popularmente conhecida, os enforca-gato.
Um tipo de restrição muito usado por sequestradores ou criminosos para prender as pessoas.
Tentei ignorar os pensamentos ruins e principalmente, desligar minha imaginação.
Eu sabia, que se quisesse entender o que aquele lugar significava. Eu precisava focar no objetivo.
“Siga o rastro, foque apenas nisso”
Foi então que meu olhar, então, se prendeu a algo incomum.
Entre os cacos, repousava uma lata de cerveja que destoava das demais. Apesar de estar amassada, ela ainda continha uma espuma arroxeada, o que indicava que ainda havia gás em seu conteúdo, mas o que não fazia sentido.
Dentro dela, um líquido roxo brilhante pulsava sob a luz fraca do entardecer.
Focando minha energia, tentei sentir se havia algum tipo de rastro mágico naquela lata. E não apenas tinha…
Aquilo era uma fonte vibrante, carregada, diferente de qualquer substância comum. Parecia uma bateria.
Peguei a lata com cuidado, usando luvas, e a coloquei dentro de um saco de evidências. Isso não podia ser deixado ali.
Precisava ser enviado imediatamente para análise na SLI.
Enquanto guardava o pacote, uma sensação incômoda percorreu minha mente.
O que quer que fosse aquele líquido, não era apenas uma bebida comum. Ele emanava uma presença, quase viva, que me deixava em alerta.
Levantei-me e continuei a examinar o perímetro. Havia marcas de pneus recentes na terra, rastros que desciam da estrada até a clareira e retornavam em direção à ponte.
O fluxo parecia constante. Alguém usava aquele loteamento com frequência.
Anotei mentalmente os detalhes, cada indício. O quebra-cabeça começava a tomar forma, ainda que lentamente.
Roupas femininas, drogas, sinais de violência, energia desconhecida. Não eram peças fáceis de juntar, mesmo assim eu sabia que nenhuma pista era irrelevante.
Encostei-me por um instante na árvore mais próxima, permitindo que o silêncio da mata me envolvesse. Ali, entre o som distante de insetos e o farfalhar das folhas.
“As pistas estão aparecendo pouco a pouco.”
Algo está acontecendo nessa cidade…
E eu vou entender o que é.
— Sem mais baixas.
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