Capítulo 49 - Teste Beta (III).
POV: MIGUEL CASTRO.
Quando meus olhos se abriram, o mundo ainda estava embaralhado em sombras e poeira.
Minha visão estava embaçada devido a pancada, ao ponto de mal conseguir discernir com precisão meus arredores.
A única coisa que tinha certeza, era que eu precisava me levantar. E rápido.
Mas… o cheiro de fumaça, couro queimado e mofo penetraram meus pulmões, tornando cada respiração um esforço.
Consegui sentir um arranhão que sofri na cabeça, causado pela queda. Assim como o sangue escorrendo pelo meu rosto.
Limpei o sangue com a manga da camisa, o que a deixou totalmente manchada.
“Creio que sejam os ossos do ofício…”
Me apoiei no meu braço, e botei o máximo de força que consegui reunir.
— Ah! Droga… — disse, conforme tentava, sem sucesso, me levantar.
Após perceber que não tinha a força suficiente, respirei fundo e juntei minha energia como podia.
— Diamante de Minas, fortaleça-me! — proferi.
Logo que a camada de energia se formou, senti um leve alívio da pressão. E então, tive a força necessária para me levantar apropriadamente.
“Estou ficando velho pra esse tipo de coisa…”
Agora, de pé, consegui ter uma distinção de onde estava. Olhei ao redor…
Estava cercado por vários pedaços de concreto que caíram do andar de cima, onde o chão havia cedido.
A cabeça latejava incessantemente, cada pulsar como um tambor marcando o ritmo da dor, e o sangue ainda escorria em trilhas feitas pela minha testa.
Tentei mover-me devagar, a visão turva me obrigando a fitar os destroços à minha volta.
Noah não estava à vista, mas sentia a presença dele nas vibrações remanescentes da magia que havia canalizado.
Sentia que sua assinatura estava forte no andar de cima.
“Ele deve estar lutando contra um dos infectados…”
Voltando minha atenção para o ambiente, percebi que a linha de produção do primeiro andar, havia sido cortada ao meio pelos destroços, pois um pequeno monte se formou no centro.
A sensação térmica era confusa, pois lá fora, se ouvia o forte som da chuva, mas o calor ali dentro ainda se mantinha pela falta de aberturas.
O chão sob meus pés tremia levemente com os passos, como se a estrutura inteira estivesse viva, e aparentava através daquilo, mostrar sua reclamação do peso dos destroços e da violência que varreu o local.
Ainda sem saber onde o outro infectado estava, procurei pela minha arma… E senti sua assinatura chave, há alguns metros à frente.
Embaixo de um pedaço de tijolo caído. Percebi que o metal azul, marcado por minha energia.
Reluzia forte à pouca luz do ambiente. Peguei-a, conferi o pente e se as munições estavam certas.
Desativei a trava de segurança, e inseri energia nas balas para ativar os encantamentos convocados.
— Ó, vosso Tolo, expurgai através destas balas…
Senti a marca-literária do meu pulso esquerdo brilhar levemente com a conexão formada entre ela e o selo na arma, indicando que o encantamento estava ativo.
Segurei firme o Demônio Moretti, sentindo a arma pesar em minha mão, um conforto em meio ao caos.
Senti um estalo vindo da minha esquerda e com o canto da visão periférica, vejo um projétil vindo na minha direção.
Dando um passo para trás, girei o corpo na direção do ataque enquanto carregava uma esfera de energia.
Dessa forma, aproveitei o momento do giro para golpear o disparo com um cruzado direto, o que o rebateu para a parede.
Então ele surgiu no segundo seguinte, o homem de meia-idade, com um corpo enorme, olhos brancos como cinzas, parecia irradiar energia concentrada e todos os seus músculos estavam tensos com força.
Ele avançou com passos que pareciam terremotos, exalava força e velocidade sobrenaturais, e seu primeiro soco esmagou uma pilha de escombros como se fossem papel.
Instintivamente, reforcei o Diamante de Minas, sentindo o exoesqueleto de energia cristalina envolver meus músculos com maior intensidade.
A sensação era uma mistura de conforto e tensão: meus ossos e articulações agora absorviam parte da força dele, equilibrando a diferença entre nós dois.
Ele desferiu uma sequência de golpes que preferi apenas desviar. Precisava entender seu padrão de combate primeiro.
Seus socos revelavam certa marcialidade. Seria um estilo de boxe?
Talvez… Mas, apesar de algum intuito, faltavam precisão e ritmo.
No entanto, compensavam essa falta com puro poder destrutivo. Afinal, cada golpe que eu desviava, deixava uma cratera no chão ou um rombo das máquinas dos arredores.
Com Diamante de Minas, podia resistir, redirecionar e até transformar parte de sua energia em impulso para meus movimentos.
Só que não conseguia trocar golpes diretamente com ele, sem sair no prejuízo.
Meu corpo reagia quase sozinho, um reflexo de anos de treinamento e do cavalheirismo que eu havia incorporado.
Precisava equilibrar essa trocação de algum jeito…
“Então vamos testar…”
Aproveitei a distância que ainda nos separava.
— Cavalheirismo, seja meu escudeiro! — exclamei, enquanto convocava as marcas de anulação e redirecionamento.
Com elas, poderia lidar melhor com os ataques.
Depois de ativadas, encurtei a distância entre nós e, alternando entre golpes físicos e tentativas malsucedidas de coronhada, senti que a diferença física havia sido igualada.
Mas a estamina dele se provava o novo problema.
Como alguém mais velho que eu conseguia manter o combate com tamanha ferocidade por tanto tempo?
Havia algo a mais…
“Droga… Isso vai dar uma dor de cabeça depois.”
Conjurei um terceiro braço de Diamante e o usei para golpear o chão à nossa frente, criando uma abertura.
Dessa forma, guardei a arma no coldre do casaco e puxei um bracelete de prata.
“Rosa, é bom isso funcionar, desgraça…”
Coloquei o bracelete no pulso direito; ele se ajustou perfeitamente às marcas. Parecido com a pulseira de um relógio, era cinza-claro e exibia detalhes e runas azuladas.
Aproveitei o momento de contemplação e canalizei energia para o bracelete, ativando o encantamento selado dentro dele.
— Clarividência de Lispector!
Era como ler um conto antigo: a linguagem possuía regras próprias e um contexto incomum, mas os sentidos gramaticais permaneciam os mesmos.
Cada movimento e golpe carregavam uma narrativa que eu podia ler, interpretar e antecipar.
— Mão de Ferro… — murmurei, percebendo a mudança na cadência de sua força. — …do Regime de um Homem de Aço?
A cada investida, soco e chute, a energia vibrava de forma constante, como se o encantamento dele obedecesse a uma lógica própria, uma assinatura que reforçava resistência e potência ao mesmo tempo.
A estratégia tornou-se clara.
Suas pernas sustentavam toda a força que o corpo projetava para frente.
Se eu quebrasse sua base, desequilibraria a fundação de seu poder, e poderia nivelar o combate dessa forma.
Canalizei mais energia para o Demônio Moretti. Empunhando-a no braço esquerdo de Diamante, atirei em direção às pernas do infectado.
O homem cambaleava, seus músculos resistentes finalmente cedendo a pequenos danos, fissuras sutis que eu podia explorar.
Ele reagiu com um chute que rasgou o ar, e absorvi parte do impacto com o exoesqueleto, desviando o restante para o chão.
O som metálico ecoou pelo galpão, toda reverberação se misturava ao cheiro de ferro queimado e fumaça.
Mantive os olhos fixos, a respiração controlada e os sentidos afiados na leitura de sua energia.
Os ataques subsequentes eram analisados em frações de segundo; a brecha em sua concentração criava uma oportunidade para eu usar.
Avancei com cautela, alternando disparos nos joelhos do homem com esquivas cuidadosamente treinadas, aperfeiçoadas pela marca de cavalheirismo que eu carregava.
Ele ciente de meus movimentos, contra-atacava com força brutal, cada soco e chute carregados de potência sobrenatural.
Em um instante, ele direcionou um golpe direto ao meu torso, e eu senti o impacto percorrer meus músculos, vibrando através do exoesqueleto, mas sem quebrar meu equilíbrio.
O som quase metálico do impacto se perdia na barulheira do ambiente, enquanto meus sentidos permaneciam em alerta.
Minha mente se concentrava em analisar todos os detalhes, quase como se estivesse lendo uma narrativa que se desenrolava em tempo real.
O padrão de seus movimentos, a cadência de sua força, tudo era parte de uma história que eu precisava decifrar rapidamente.
A Clarividência de Lispector se manifestava como uma espécie de lente, que permitia meus olhos e mãos, interpretar a energia que pulsava em torno dele.
Ao contato, revelava sutis sinais de fadiga, desequilíbrio e pequenas falhas no encantamento que fortalecia seus golpes.
Todo golpe que eu conseguia conectar em suas pernas parecia drenar um pouco de sua vitalidade, tornando suas investidas subsequentes ligeiramente menos precisas, menos devastadoras.
O rugido que ele emitia, profundo e carregado de fúria, era um aviso de que ainda tinha força para continuar, mas os indícios de desgaste eram visíveis se você soubesse onde olhar.
Parecia se comportar com um animal teimoso, que não queria largar mão de sua caça.
Não havia espaço para hesitação; qualquer distração podia ser fatal.
Canalizei mais energia no Diamante de Minas, sentindo o exoesqueleto vibrar em resposta à pressão crescente.
Meus movimentos, precisavam se tornar um elo calculado entre minha força e a dele, uma extensão do meu corpo e da minha vontade.
O cansaço pressionava, só que a leitura precisa da energia dele me mantinha um passo à frente.
A respiração, controlada apesar do esforço, ajudava a sincronizar os disparos, esquivas e golpes.
Preparei-me para o momento decisivo.
Passei a arma da empunhadura do Minas para a minha própria.
O Demônio Moretti estava firme em minha mão direita agora, precisava calcular meus disparos com precisão, pois havia apenas mais algumas munições disponíveis.
Sabia que incapacitar sua locomoção seria a chave para abrir espaço, neutralizar sua força e finalizar o combate com eficácia.
A arma pulsava com energia concentrada, queimando levemente minha mão, enquanto minha mente se fixava naquele ponto crítico, e no instante exato que decidiria a batalha.
Então, sem aviso, veio o inesperado.
Um tropeço…
Sem questionar se era sorte ou coincidência, disparei duas vezes, com precisão, na coxa esquerda.
Após os tiros, o infectado soltou um grito de dor e caiu de joelhos, levando as mãos ao local onde a ferida se formava.
Aproximei-me com cautela, mantendo a arma empunhada.
Sua assinatura energética havia se estabilizado um pouco… mas eu não podia baixar a guarda ainda.
De súbito, o infectado se projetou para frente e vomitou uma explosão de gosma verde, viscosa e ardente.
Eu já esperava algo assim, tive um momento para reagir, só que o homem foi mais rápido.
A gosma verde atingiu meu braço esquerdo com brutalidade, queimando a pele e penetrando a barreira do Diamante de Minas, o que corroeu parte do exoesqueleto.
A dor irrompeu em ondas violentas, subiu pelo braço e incendiando os músculos, parecia criar impulso elétricos que inibiam o fluxo de energia que já corria em minhas veias.
Um grito escapou involuntariamente da minha garganta, mas não tinha muito tempo para lamentações ou hesitação.
Reagi instintivamente, recuando alguns passos, o coração disparado, respirava com dificuldade, enquanto meus olhos permaneciam fixos no inimigo que agora, mais do que nunca, representava uma ameaça real e imprevisível.
— Droga… — murmurei, sentindo cada músculo tenso, a pulsação latejando em minhas têmporas.
O calor da queimadura misturava-se às dores de cabeça, e meus nervos gritavam em alerta.
O homem recuperou a postura quase imediatamente, o sorriso torto em seu rosto branco revelando que o ataque surpresa só o tornará mais convencido.
A dor no braço esquerdo era intensa, porém, concentrei-me em canalizar o Diamante de Minas em torno do ferimento, reforçando a energia que ainda me permitia mover o braço.
Aproveitei, e recarreguei o Demônio Moretti com a mão esquerda, naquele momento, quase senti a arma como uma extensão do corpo e do exoesqueleto.
“Não posso vacilar agora.”
Noah ainda estava lá em algum lugar, e cada segundo perdido podia custar caro.
O homem avançou novamente, desferindo socos e chutes intensos, entremeados por movimentos imprevisíveis.
Usei a marca de cavalheirismo para redirecionar ataques, mantive o equilíbrio e absorvi energia sempre que pude.
Não podia deixar minha energia se esvaziar.
Os contatos com sua força bruta me ensinaram mais sobre a cadência do encantamento.
Ele tinha padrões, mesmo que sutis, e consequentemente falhas, que poderiam ser exploradas.
Intensifiquei os ataques às pernas, disparei com o Demônio Moretti em sequência, acertando tendões e músculos.
A cada impacto percebia a redução da mobilidade, e a ansiedade dele se refletia em movimentos mais erráticos.
Aproveitei uma abertura, avancei com uma sequência de golpes calculados, usando parte da energia do Diamante para impulsionar meus socos e chutes.
Ele recuou, mas não desistiu.
Um soco poderoso veio em minha direção, e eu usei o exoesqueleto para absorver parte da força, desviando o restante com um movimento giratório que lembrava a postura de um cavaleiro enfrentando uma montaria maior.
A Clarividência de Lispector me guiava, interpretando microvariações na energia e indicando sinais de cansaço, desequilíbrio e pressão física.
De repente, senti a oportunidade de finalizar. O Demônio Moretti estava carregado, os disparos precisos mirados nas pernas dele.
Cada tiro explodiu contra a carne e a magia, gerando fissuras e manobras de desequilíbrio.
Ele cambaleava, tentando reagir, mas sua base estava enfraquecida.
Avancei para desferir o golpe final, concentrando energia do Diamante no impacto que poderia derrubá-lo e incapacitar a locomoção permanentemente.
Antes que pudesse concluir, ele surpreendeu-me novamente.
Dessa vez, uma esfera energética surgiu da sua boca, e explodiu quando me aproximei.
Um clarão se formou, senti meus reflexos desacelerarem por algumas frações de segundo perigosas.
A energia do exoesqueleto vacilou.
— Não agora… — murmurei, conforme reforçava a energia ao redor do braço ferido.
O músculo parecia gritar, mesmo assim, meu foco permaneceu no alvo.
Eu não podia recuar.
Este combate não podia ter outro desfecho que não fosse a vitória.
Recuperei o equilíbrio, reposicionei o Demônio Moretti e reiniciei a ofensiva.
Todos os micro-movimentos indicavam o momento de atacar, desequilibrar e minar sua fonte de poder.
Finalmente, uma brecha real apareceu.
Ele tropeçou nos próprios pés ao tentar recuperar a estabilidade, a sequência de disparos havia tido efeito.
E seu joelho esquerdo, praticamente quebrado depois de tantas feridas, finalmente cedeu.
Avancei com a mão direita, me apoiei na força do exoesqueleto e preparei o golpe final.
A respiração dele era pesada; cada músculo exigia mais do que podia suportar. A pressão sobre mim só aumentava, pelo calor do ferimento e pelo esforço de controlar o Diamante de Minas.
Com o corpo inteiro concentrado no impacto decisivo, larguei o Demônio Moretti.
O Diamante de Minas pulsava como uma extensão de cada fibra do meu ser.
A batalha estava prestes a terminar, mas a queimadura no braço esquerdo me lembrava que nada seria fácil.
Não podia desperdiçar um segundo e o último movimento precisava ser perfeito.
Dei um salto sobre o pedaço de concreto que nos separava e carreguei uma esfera de energia para nocauteá-lo de uma vez por todas.
O ar pesado, o cheiro de fumaça e o ruído das vigas gemendo sob o peso da destruição conspiravam para transformar cada instante numa luta de vida ou morte.
Mas eu estava pronto.

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