Capítulo 254: Devore (1)

*Baaang!*

A lança colidiu com o escudo.

— Argh!

Cale agarrou seu estômago.

Ele se sentiu tonto.

Parecia que suas entranhas iriam se revirar.

Era diferente da sensação que ele sentia as vezes quando usava a Vitalidade do Coração.

O prato de vidro que havia ficado o mais fraco possível estava causando dor em Cale.

“Merda.”

Sangue vermelho.

Uma gota de sangue pingou da boca de Cale até seu queixo e depois para o chão.

A cor daquela gota de sangue era vermelha.

Era diferente do sangue preto e morto que normalmente cuspia.

O cheiro forte de sangue começou a tomar conta da área ao redor do lago, que parecia um olho cinza.

*Fush-* *Sshhh*

Beacrox viu dessa vez.

As patas dianteiras do Dragão Negro se moviam. Elas tremiam e se moviam visivelmente, aos poucos.

O cheiro forte de sangue estava fazendo o coração do jovem Dragão Negro bater ainda mais rápido.

*Bum* *Bum*

Ele tinha certeza de que era o sangue de Cale.

Raon queria se apressar e abrir os olhos para ver o que estava acontecendo. No entanto, o jovem Dragão estava olhando para um mundo diferente naquele momento.

O jovem Dragão teve que se movimentar em seus sonhos desde que sua primeira fase de crescimento começou.

Não, ele precisava enfrentar uma provação que imitava um sonho. Seus instintos lhe diziam que precisava passar por essa provação para lutar ao lado de Cale, mas era difícil superá-la rapidamente.

Raon olhou para o seu corpo.

Patas dianteiras curtas, corpo curto e asas pequenas.

Todos eles estavam cheios de ferimentos.

Ele lutava sem descanso, porém, não conseguia usar mana nem magia neste sonho. Um dragão que não havia passado pela primeira fase de crescimento e não conseguia usar magia era extremamente fraco.

Raon olhou para baixo, sob seus pés.

Ele tinha visto isso desde que o julgamento onírico começou. O jovem Dragão conseguia ver pessoas agarrando seus tornozelos.

Cale, On e Hong, vovô Ourinho, Choi Han, Rosalyn, Ron, Lock, Mary, Beacrox, etc.

Muitas pessoas estavam segurando os tornozelos de Raon.

Raon teve que lutar com essas pessoas o segurando.

Ele podia ver um dragão no céu quando olhou para cima.

Era um dragão grande e incomparável ao seu tamanho reduzido.

Embora a maioria dos dragões adultos tivesse 20 metros de comprimento, este grande dragão tinha perto de 30 metros de comprimento.

O dragão era preto e seus olhos eram azul-escuros.

Os instintos de Raon lhe diziam algo.

“Esse dragão sou eu. Aquele dragão sou eu quando adulto.”

Era um dragão que voava sozinho e livremente no céu, sem ninguém segurando seus tornozelos.

“Preciso lutar e vencer aquele Dragão.”

Seus instintos de Dragão lhe diziam que derrotar seu eu futuro era a única maneira de superar essa provação. Era por isso que Raon lutava contra aquele grande Dragão Negro.

No entanto, ele não teve chance de vitória.

Ele estava fraco demais para vencer um Dragão forte.

Entretanto, Raon não podia simplesmente desistir, mesmo sabendo que esse era o caso.

Era porque ele conseguia ouvir e sentir o cheiro do que estava acontecendo no mundo real.

— Porra!

Ele podia ouvir a fraca voz de seu humano no mundo fora deste julgamento.

Era o jeito como ele falava sempre que se sentia frustrado ou irritado. Raon abaixou a cabeça. Não era a voz da pessoa que o segurava pelos tornozelos neste teste, mas a voz do seu humano no mundo real.

O humano disse que tinha apenas 3 dias.

“Esse cheiro de sangue é o cheiro do meu humano. Preciso salvá-lo.”

Raon voou de volta para o céu. Era meio, não, extremamente difícil voar por causa das pessoas segurando seus tornozelos, mas ele não parava de bater as asas.

Era porque ele não desprezava as pessoas que seguravam seus tornozelos.

Raon avançou mais uma vez em direção ao grande Dragão Negro que o observava.

Raon não estava assustado. Ele só tinha medo de que fosse tarde demais para retornar à realidade.

Enquanto isso, a pessoa que estava lidando com coisas do mundo real, e que Raon estava desesperado para salvar, não pôde deixar de xingar.

— Argh, filho da puta!

A expressão de Cale era a mais terrível possível enquanto ele tossia sangue e continuava a xingar. Suas entranhas roncavam e parecia que iam virar.

Além disso, ele estava ficando louco depois de ver todo aquele sangue vermelho que ele continuava tossindo.

*Baaang!*

A lança de água cinza e o escudo prateado colidiram novamente.

Embora tenha havido um barulho alto, o escudo prateado estava bem e nem tremeu um pouco.

O problema era que a lança d’água que estava mirando em Cale também estava em boas condições.

*Chhhhhhhh*

O formato da lança se desfez logo após atingir o escudo, mas ela rapidamente retornou à sua forma original e disparou em direção a Cale mais uma vez.

*Bang!* *Bang!* *Bang!*

O escudo prateado e a lança de água continuaram a se chocar como se quisessem engolir um ao outro.

Cale limpou o sangue da boca enquanto olhava para a lança de água cinza.

O prato do seu corpo atingiu seu limite.

Suas entranhas rugiam de uma forma incomparável à tontura que ele sentia quando usava o Som do Vento para viajar.

Foi por isso que ele não pôde usar o Escudo Indestrutível nem o Super Rocha tanto quanto queria.

{Ele sempre perdia para a glutona e o teimoso Super Rocha.}

Foi isso que o Fogo da Destruição lhe disse, entretanto, a oportunidade de usar completamente esses poderes não estava disponível para ele.

Entretanto, os olhos de Cale estavam calmamente olhando para o lago e para a lança d’água.

“Uma chance.”

Ele só podia usar o Super Rocha uma vez com o escudo ativado.

“Uma chance.”

Cale repetiu isso para si mesmo enquanto bloqueava a lança de água com o escudo novamente.

*Baaaaaang!*

Ruídos altos ecoaram por toda a área mais uma vez. O dragão ancestral Eruhaben franziu a testa enquanto observava a luta.

A Água do Julgamento. 

Era fria e implacável.

Ele sentiu um poder inacreditável vindo da lança d’água. Era um poder que parecia pronto para executar um pecador imediatamente.

— Algo está estranho.

Algo realmente estava estranho.

Os poderes ancestrais que Eruhaben conhecia deixavam a desejar em ser a principal fonte de poder.

Entretanto, alguns dos poderes ancestrais que este azarado Cale Henituse possuía eram tão fortes, se não mais fortes, do que a força da maioria dos indivíduos fortes.

— …Isso…

Eruhaben começou a franzir a testa.

Ele sentia as entranhas de Cale Henituse roncando. Seu prato estava prestes a quebrar.

Dizia-se que esse poder ancestral era um poder arrogante, quase como um deus.

Mas a condição atual de Cale Henituse não era das melhores para conseguir vencer tal poder ancestral.

Ele pode vencer?

Seria mesmo possível com sua condição atual?

Era difícil até mesmo para este sábio e ancestral Dragão determinar.

Contudo, havia algo que ele sabia.

“É difícil usando métodos padrões.”

Os olhos do dragão ancestral Eruhaben se arregalaram naquele momento.

*Ooooooo-*

O lago rugiu mais uma vez.

O Dragão ancestral tocou seu braço.

Ele estava sentindo arrepios.

Eruhaben ouviu a voz de Cale naquele momento.

— Isso está me deixando louco. São todos loucos, todos lunáticos! Droga!

Cale não conseguiu se conter e gritou.

*Chhhhhhhhh-*

Algo estava surgindo do fundo do lago.

Eram correntes feitas de água.

Correntes brotavam do fundo do lago, como se estivessem prontas para algemar as mãos e os pés de um pecador. Uma lança d’água e agora correntes. Cale começou a franzir a testa.

Ele se sentiu frustrado.

Eles ficaram quietos.

Todas aquelas vozes altas dos poderes ancestrais estavam se calando.

Agora que ele pensava nisso, as outras vozes dos poderes ancestrais ficavam em silêncio sempre que ele tentava ganhar outro poder.

*Chhhhhh-* *chhhhhhhhh-*

Várias correntes dispararam da água. Elas então tilintaram ao se prenderem à lança d’água. Pareciam prestes a atacar Cale junto com a lança d’água.

— Droga. Por ser a Água do Julgamento, ela usa uma porcaria estranha.

Foi quando Cale subconscientemente expressou sua frustração.

{Não sou eu.}

Era a voz de uma mulher.

Uma voz clara que parecia ecoar dentro de uma caverna preencheu a mente de Cale.

Era a Água do Julgamento.

Ele tinha certeza disso.

Ele sempre ouvia a voz do dono do poder ancestral sempre que estava prestes a terminar as provas.¹

{Não, não sou eu!}

— Argh.

Cale levou a mão aos ouvidos. A voz calma em sua mente de repente se transformou num grito.

*Chhhhhh-* *chhhhh!*

Ao mesmo tempo, as correntes e a lança se uniram, formando uma lança extremamente grande. Além disso, a superfície do lago começou a tremer.

{Este não é o meu poder! Este não sou eu! Eu, eu não sou uma juíza!}

“Não é uma juíza?”

O olhar de Cale mudou rapidamente.

{Eu, eu sou!}

{Eu sou! Eu…!}

Era tudo o que o poder ancestral dizia. Aquela voz lhe dava dor de cabeça. Foi por isso que ele comentou inconscientemente.

— Então quem é você?

Se você não é a Água do Julgamento, então quem é você?

Todos a chamam de Água do Julgamento.

Foi naquele momento.

Ele ouviu uma voz baixa.

{Eu…Sou alguém que não tem liberdade.}

*Scrum* *Crrun*

O barulho estranho fez Cale levantar a cabeça.

A grande lança d’água cercada por correntes mirava em Cale. Só de olhar para ela, era difícil respirar.

O Dragão ancestral que estava observando isso disse o que lhe veio à mente.

— …Você está acorrentada por um deus.

{Estou acorrentada.}

Cale conseguia ouvir a dona do poder ancestral em sua mente.

Ela foi acorrentada por um deus com algemas chamadas responsabilidade e dever. Ela teve que ser reprimida por uma identidade com a qual não nasceu.

Ela foi acorrentada no momento em que nasceu, e então o deus lhe deu um nome assim que a encontrou. Então, ele a entregou ao povo.

{Eu queria me livrar deles. Escapei e fugi para um canto do continente oriental, mas já havia me esquecido de quem eu realmente era.}

{Liberte-me.}

Ela queria retornar à sua identidade original.

O poder que um deus estimava, mas não tinha escolha a não ser acorrentar, queria ser usado livremente pelo menos uma vez.

{O deus me deu o nome de ‘Água do Julgamento’. No entanto, tenho um nome que dei a mim mesmo.}

Um nome que ela mesma deu. Ela queria usar esse nome.

{Poderes ancestrais sempre se dão nomes. Perdi a chance de me dar um nome. Quero uma nova chance de me dar um nome.}

E ela encontrou alguém que poderia me dar essa chance.

Ela podia sentir os poderes das pessoas que a ajudaram a escapar para o continente oriental há muito tempo.

Eles a ajudaram a escrever uma carta de demissão, provocaram um incêndio para criar uma distração e então se defenderam das cobras brancas com um escudo.

Eles também lhe deram uma carona no vento para ajudá-la a se mover e, finalmente, lhe deram um corpo tão forte quanto a própria pedra. Havia também uma pessoa simpática que a consolava e era sua companheira de conversa.

No final, eles se sacrificaram pelo mundo.

Ela conseguia sentir o cheiro deles.

Estava vindo dessa pessoa.

{Eu não sou uma juíza.}

O lago cinzento começou a tremer.

Água é algo que flui naturalmente de cima para baixo.

As leis da natureza indicavam que a água fluiria de cima para baixo. Era assim que deveria ser.

No entanto, ela era alguém que ia contra as leis da natureza.

Foi por isso que um deus a admirou, mas teve que acorrentá-la, forçando-a a ficar com os humanos.

A dona do poder ancestral apenas disse o nome que ela mesma se deu quando chegou ao continente oriental e conquistou sua liberdade.

{Eu sou a Água Retrogressiva.}

Retrogressiva.

Aquela que desafia e vai contra as leis da natureza.

A voz dela na mente de Cale foi se acalmando aos poucos. A voz que parecia vir de uma caverna distante começou a desaparecer, mas ele ainda conseguia ouvi-la claramente.

Ele pôde ouvir suas últimas palavras.

{Eu sou a Água Devoradora de Céus.}

Foi o primeiro nome que ela deu a si mesma depois de descartar o nome ‘Água do Julgamento’.

A Água Devoradora de Céus

*SCRUUUUN*

Cale levantou a cabeça.

As correntes viraram a ponta da lança d’água em direção a Cale quando sua voz desapareceu.

— …São os vestígios de um deus.

Ninguém conseguia ouvir o que Eruhaben acabou de dizer.

Era porque a água abafava o barulho.

*Chhhhhhhh-*

Uma grande lança cinza foi atirada em direção a Cale.

Ao mesmo tempo, as correntes dispararam enquanto tentavam amarrar os membros de Cale.

— …Não.

“Isso não está certo. Ele não consegue fazer isso.”

Eruhaben sentiu um poder que ia contra as leis da natureza nas correntes e na lança d’água.

Isso era algo que Cale não conseguia lidar.

— Cale Henituse!

Eruhaben não teve escolha a não ser atirar um pouco de mana de ouro branco em Cale e começar a correr em sua direção.

Entretanto, Eruhaben não conseguiu ficar ao lado de Cale.

*Chhhhhhhh*

Cale sorriu enquanto olhava para as correntes e a lança d’água que vinham em sua direção.

— A Água Retrogressiva.

Ele gostou bastante desse nome.

Era muito melhor que a ‘Água do Julgamento”.

Cale não conseguia ouvir as vozes dos donos dos poderes ancestrais. No entanto, conseguia sentir a presença dos outros poderes ancestrais ao redor de seu corpo.

Cale olhou diretamente para a lança d’água e começou a falar.

— Então eu também irei contra a corrente também.

O corpo de Cale disparou para frente.

O Som do Vento se tornou os pés de Cale.

Cale virou a cabeça e sorriu para o grupo. Eles pareciam ansiosos.

Os pés de Cale deixaram o chão. Seus pés caminhavam por onde ele não deveria conseguir caminhar, como se ele fosse a água mirando o céu que não conseguia alcançar. Os resultados disso logo chegaram aos ouvidos de Cale.

*Chhhhhhhhhhhhh-*

O Lago do Olho Cinza.

Cale pulou no lago.

Ele tinha certeza.

A água não podia tocá-lo.

Cale escolheu afundar no lago.

1. Nos capítulos passados usaram “ele”(he) para descrever a “criança louca” que era dona do poder, agora aparece uma mulher, estou muito confuso.[↩]