O avião decolou.

    Se alguém dissesse que um dia ele viajaria de avião, ele daria risada. Seus pais não tinham dinheiro para isso.

    Mas lá estava ele, num vôo de primeira classe e com cinco mil reais no pix. Estava sonhando? Não, não estava.

    Não sabia quem era esse tal Black Novice, mas tinha que admitir. Se ele queria desafiá-lo, ele realmente fez por onde.

    Mesmo se perdesse o duelo, ainda teria cinco mil reais na conta. Isso por si só já valia tudo. Enquanto sonhava, seu irmão fazia algumas contas, escolhendo o que seria mais barato em Porto Alegre — queria que sobrasse alguma grana quando voltassem.

    Ele se virou para o mais novo.

    — Tu consegue viver só de x-salada?

    — Tá perguntando isso, mesmo? — riu Kadu.

    — Certo. Lá deve ter Tuchaua, se pá.

    — Deve ter. Mas uma coquinha seria bacana, também…

    — Na volta… na volta.

    Passaram o vôo terminando de ver a quarta temporada de Stranger Things. Foi uma surpresa saber que ambos eram fãs da série. Estavam ansiosos para ver a quinta e última season dessa obra.

    Não demorou muito, e logo estavam em POA. A capital dos gaúchos era linda. Ao desembarcarem, foram recebidos com sorrisos radiantes e conversas animadas.

    Era engraçado.

    — Nem se compara com Manaus… — murmurou João Pedro, apertando a mão de uma moça. — Loira natural…

    — Todo mundo parece feliz. Realmente, nem se compara a Manaus. Lá todo mundo vive de carranca e má vontade…

    E foram abrindo caminho pela multidão. Estavam ansiosos. Será que o duelo aconteceria assim que avisassem Yuki? Ou será Black Novice daria um jeito de saber?

    Mas isso ficou para depois. Assim que saíram do aeroporto, uma coletiva de imprensa os recebeu. No centro, uma mulher de terno e cabelos castanhos quase acertou Kadu com um celular.

    Ela parecia muito séria.

    — Você é o White Master?

    Como ela sabia?

    — Me diga, você é o White Master? 

    — Eu sou — disse Kadu.

    O burburinho cresceu, e diversos flashes invadiram os olhos do rapaz. Isso era ser famoso?

    — Vocês são de algum portal?

    — Sim. Sou repórter da Fritada TV — Ela apertou a mão dele, olhando-o nos olhos. — Suzana Vieira. Prazer em conhecê-lo, White Master.

    O nome flutuou na mente de Kadu. Fritada TV? O veículo de imprensa de e-sports mais famoso do Brasil?!

    — Qual é a sua expectativa para o duelo, White Master?

    — Acho que grande… — falou ele. Notou, de relance, que alguns começaram a anotar. — Não tenho a vitória garantida, mas prometo fazer uma boa performance. Preciso cumprir as expectativas que o Black Novice tem em mim.

    — Entendo. Mas você…

    — Acho que ele precisa se preparar — disse João Pedro, intervindo. — Você pode falar com ele o quanto quiser, depois do duelo.

    Ele virou para o garoto.

    — Vamos?

    E saíram da multidão, com uma única dúvida na cabeça: Como sabiam que ele era o White Master?

    Para assustá-lo ainda mais, uma limusine parou diante deles. Pensavam em pegar Uber, mas aquilo também serviria.

    O vidro baixou, e um rosto conhecido apareceu.

    — Alexa Bianca, representante da Velva no Brasil — murmurou Kadu para o irmão, que não sabia quem era.

    Ela empurrou os óculos escuro, estalando os dedos.

    — Vamos. A chefia tá com pressa.

    Eles obedeceram e entraram. Com fitadas rápidas, os estudava pelo retrovisor.

    — Você é mais jovem do que pensei, White Master — falou Alexa, terminando de passar maquiagem.

    — Você também… 

    — Brigada — Ela acenou para o motorista, que deu partida e iniciou a corrida. — De qualquer forma, Porto Alegre é muito linda, sabia? Mas me desculpa, não vai dar pra turistar. O seu oponente está ansioso. Tipo, ansioso demais pra te ver.

    — Eu sei que ele está…

    — E você precisa tomar cuidado. Ele está muito confiante — riu ela, analisando a reação dele. — Quase como se estivesse com a vitória ganha.

    — Ele vai é levar um sacode do meu irmão — disse João Pedro, orgulhoso. 

    Kadu não tinha tanta certeza. Ele não sabia qual era o estilo de jogo de Black Novice. Nunca vira uma partida sua, nem se importou de pesquisar sobre ele. Ao contrário dele, Black Novice parecia conhecê-lo. 

    Talvez ele tivesse visto reprises de partidas suas, ou mesmo conversado com quem já o enfrentou. As possibilidades eram muitas. O que importava, em todo caso, era que Kadu lutaria com um desconhecido.

    Toda cautela seria pouca. 

    “Eu preciso vencê-lo.”

    Não só pelo título, mas por Yuki. Ainda queria saber o que esse cara era pra ela, mesmo que não quisesse admitir. 

    Ele apertou os punhos. Se Black Novice estava tão certo de que venceria, Kadu tinha uma chance. Afinal, era assim que ele ganhava. Ele era inteligente, focava sempre nas fraquezas, mesmo nos oponentes mais forte.

    Se até a Estrela da Morte tinha um ponto fraco, quem não teria?

    Ele jogou CARD por muito tempo. Conhecia seu baralho de cabo a rabo. Perder não era uma opção. Ele sabia disso. Sabia que a única chance de ser derrotado, no pior dos cenários, seria num duelo em que o oponente fosse preparado para negar suas manhas

    Somente um veterano, como ele, seria capaz disso. Jogadores comuns se focavam tanto em si mesmos, que nem pensavam em negar invocações ou rituais. Sequer iam atrás de cartas que banissem magias e armadilhas inimigas.

    Yu-gi-oh tinha ficado no passado, pelo menos no Brasil.

    “Eu não seria o top um, se as pessoas ainda assistissem esse anime.”

    CARD veio numa era em que animes de jogos de tabuleiro, como o dito acima, ficaram para trás. Esse jogo teve o feito de enterrá-los. Conseguiu fingir, enganar e convencer o público de tal forma que os outros nem eram citados.

    White Master era único. Era de um lugar perdido no tempo. Tudo demorava dois ou quatro anos para chegar ao Amazonas, inclusive tendências da moda e da cultura pop. Mesmo por pouco tempo, ele pôde consumir a mídia que seus pais viram quando eram adolescentes.

    Yu-gi-oh era quase um senso comum, para ele. E isso o tornava único no CARD.

    “Se Black Novice vai me subestimar, tudo bem.”

    Era isso que ele esperava.

    — — — 

    Pôr do sol.

    A limusine parou diante do portão de um casarão. Era enorme, quase uma universidade. Um muro cercava toda a propriedade, nele havia uma placa com um nome.

    “Le Blanc…”

    Estranho. Bonito demais para uma caverna oculta.

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