— Passemos então para as notícias de hoje! — disse o âncora principal, um bem trajado jornalista, branco, corpulento e de cabelos grisalhos, ainda que brilhantes, ostentando um sorriso encantador. — Uma casa foi arrombada e sua família feita refém ontem à tarde no distrito periférico de San Juan. Uma quadrilha de assaltantes roubou todos os pertences duma família, que se encontra desolada agora.

    — Em seguida — continuou a âncora secundária, também branca, morena, de cabelos soltos, os quais desciam por sobre seu ombro, o qual era coberto com um terno amarelo —, no mesmo horário, no distrito adjacente, uma briga de traficantes levou a morte de um dos envolvidos no crime anterior. Não se sabe o motivo do crime, mas a polícia suspeita com evidências plausíveis que seja por conta do aumento repentino da nova droga K45, que é altamente viciante.

    O âncora depois se levantou, dirigiu-se à direita do estúdio, onde se encontrava uma grande televisão, o qual mostrava as gravações de câmera sobre as quais haveria de comentar, apontando para a tela:

    — Além disso… Meu Deus… — falava como se perdesse o fôlego — Regina Cosmon, idosa de 67 anos, moradora de rua, foi morta nessa mesma região ontem à noite. As câmeras de segurança, conforme mostram as imagens na tela, mostram claramente um dos suspeitos do crime anterior empurrando a pobre coitada e… Oh, meu Deus… E ela bate a cabeça no hidrante. Depois disso ele pega e corre com o carrinho de compras dela, cheio de latinhas, que provavelmente ela catou para comprar algo para comer. Agora esse marginal vai vender tudo para comprar essa porcaria de droga.

    — E dá claramente para ouvir o som das sirenes da polícia de fundo!

    — Sim, e o pior é que ela ainda poderia ter sido salva, se a polícia não estivesse preocupada em prender os suspeitos.

    — Os legistas afirmam que a morte foi causada por traumatismo craniano e hemorragia cerebral.

    Após isso, a câmera corta para uma imagem centrada da âncora.

    — Vejam ainda: nessa semana, North Henrich foi declarada pela revista The New Times a cidade mais perigosa do ano de 2070. “Sozinha, North Henrich registra quase 120 homicídios por cem mil habitantes no ano presente, o que é mais do que muitas das recentes guerras civis que estão ocorrendo ao redor de todo o globo”, apontou a revista. Questionado sobre, o prefeito Johnson Meynard fez a seguinte declaração em entrevista coletiva.

    Os jornalistas saem de cena e dão lugar a uma gravação da dita entrevista, na qual mostrava o prefeito atual desta cidade, o qual concorria em acirrada campanha eleitoral. No centro duma grande mesa, com microfones apontados para a sua boa, cada um de um jornal local diferente, tendo seus secretários sentados à sua esquerda e seus ministros à sua direita. Possuía aparência jovem, de por volta de seus 34 anos, com cabelo penteado a gel, brilhando com os holofotes apontados sobre ele.

    — A minha família governou essa cidade desde 2030, mas infelizmente ela foi muito negligente com a alta criminalidade que acontecia. Eu não vou permitir que o meu povo, a quem amo tanto, a quem tanto servi durante toda a minha vida, sofra com esses terríveis criminosos que destroem a nossa cidade! Por isso, em cooperação com a Private Policial Corporations, PPC, a cidade investiu um projeto milionário para o combate das facções criminosas: a utilização duma nova tecnologia aliada aos policiais, o que os permitirá eliminar esses assassinos de uma vez por todas da nossa cidade, e, prometo eu, até o dia das eleições!

    — Mas senhor prefeito — um dos jornalistas perguntou — como funcionará essa nova tecnologia? Donde veio o dinheiro para esse investimento, sabendo que a cidade está em dívida com o Estado?

    — Por que eu precisaria falar, se os meus feitos já falarão por mim no futuro? A única coisa que preciso dizer é: votem em mim! Isso aí! Johnson Meynard por uma cidade mais segura.

    Após isso, o prefeito se levantou rapidamente da entrevista coletiva, ajeitando seu terno, enquanto um turbilhão de jornalistas avançava sobre eles o seu microfone pedindo mais informações sobre o projeto. Antes de sair de cena, olhou para trás, deu um sorriso, fez o sinal de mão da sua campanha, e entrou na porta à retaguarda, seguido de seus ministros.

    — Em seguida — continuou um dos repórteres —, qual o melhor tipo de arma para se levar quando for comprar pão de manhã cedo? Fique ligado, para depois dos comerciais!

    Finalizando com um sorriso, a câmera se afasta ao som duma orquestra sinfônica, e o símbolo azul escuro que estampava o nome do jornal aparecia com efeitos especiais: “THE NEW LOCAL JORNAL”.

    O projeto de que Johnson Meynard falou encontrava-se no topo do maior prédio do centro da cidade. Este centro recebia o nome de Elysium, dado a ele em contraste à periferia, que era como um inferno.

    Residindo no último andar da PPC, o projeto encarava a grande janela da morada onde vivia. Esta morada se encontrava tão acima do solo que chegava a superar as nuvens. Por esta razão, ele nunca conseguiu, desde que fora construído, enxergar as ruas, as avenidas, os carros, mas apenas os outros grandes arranha-céus que tiveram a sorte de também superar as nuvens. Ele via que os outros prédios eram similares à sua casa: brancos por fora e por dentro, resplandeciam a luz do sol, imitando as iluminadas nuvens que os cercavam. A arquitetura que cada edifício seguia imitava o padrão de um prédio com bases poderosas e quadriculadas, mas que, ao passar dos andares, afinava-se, quase como uma agulha que furava o céu.

    Este, a esperança da prefeitura, intercalava olhares entre os outros prédios adjacentes ao da sua corporação com o seu próprio reflexo na janela, na qual era refletido o seu rosto, branco, angelical, delicado, de cabelos um tanto longos, chegando ao pescoço, lisos, também brancos, com franjas que cobriam seus prateados olhos. Seu rosto não era humano, mas era artificialmente construído para imitar o de um adolescente na faixa dos dezessete anos. Era possível ver as dobradiças que dividiam as bochechas dos olhos, e estes, das sobrancelhas, e de qualquer correspondente aos músculos faciais de um rosto natural, o que, no seu, permitiria o movimento das expressões faciais. Seu corpo era alto e esguio, por volta de um metro e noventa, construído mecanicamente e revestido duma armadura robótica de cor preta e azul-escura. Cada membro seu continuava-se ao outro com articulações metálicas, similares as de um boneco, mas funcionais. No peito ostentava uma insígnia da própria corporação que o construíra, no centro residindo o seu nome: ETERNUS.

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