Capítulo 1 - Desabrochar

No coração do pântano, onde a neblina turvava a visão e a luz do sol não passava de um sussurro distante, uma grande árvore se erguia até os céus.
Mas, ao invés de frutos comuns, aquela árvore dava à luz algo hediondo.
Como fruto do pecado, dela brotava uma serpente com crânio de dragão, que escorregava lentamente pelo seu tronco retorcido.
Seu corpo era composto de vértebras, formando uma coluna vertebral grotesca, que emitia um som seco a cada movimento.
Assim que ele chegou no solo, a vegetação rasteira murchou e o seu corpo começou a mudar de forma.
Primeiro, surgiram braços que o ergueram do chão e, em seguida, como se estivesse se formando a partir de um monte de lama, surgiram pernas e ele se pôs de pé.
O pântano, já um lugar de medo e silêncio, parecia curvar-se sob o peso daquela presença maldita.
Era como se a própria natureza gemesse de horror diante da criatura que ela mesma havia trazido ao mundo.
Não! Aquilo definitivamente não havia sido concebido. Era mais como os restos abortados de um filho indesejado, uma abominação que não deveria existir.
•
Dentro dos muros de Noin, capital do reino de Helgrath, Elise, uma jovem de cabelos dourados e mais nova membro do esquadrão de extermínio, estava prestes a embarcar em sua primeira missão.
Ela mexia nervosamente nas placas de sua armadura para distrair sua mente enquanto aguardava os seus outros três veteranos de equipe terminarem seus preparativos.
Foi quando Liam, um de seus colegas, se aproximou e deu um tapa em seu ombro.
— Relaxa, novata. É só o de sempre, você vai tirar de letra — disse, com um sorriso confiante.
— O Liam tem razão — acrescentou Darius, enquanto parecia procurar por algo —, desde que você preste atenção, vai ficar tudo bem. Eu vou deixar você na retaguarda até pegar o jeito.
Acenou de forma encorajadora.
— Hmm. Obrigada, pessoal! — agradeceu-lhes, com um sorriso.
Os dois homens engoliram seco, surpresos com a luz que parecia emanar dela.
— Cof~Cof~ — tossiu Darius, disfarçando. — Vai Nord, tu tá atrasado. Segura aí!
Arremessou um elmo em direção a Nord, que o segurou com facilidade.
— Pera lá… o senhor também ainda nem achou a sua insígnia — retrucou, enquanto colocava o elmo de lado.
— Eu tô começando a achar que deixei na base — resmungou enquanto voltava a revirar o armário de armas.
— O senhor vai buscar sozinho. Eu que não vou dar essa pernada de novo. Hahaha… — disse Liam, enquanto ria discretamente.
— Mas ei, Liam. Você não acha estranho? — sussurrou Nord.
— Hm? O que exatamente? — perguntou, franzindo as sobrancelhas.
— Achei! — grita Darius, levantando o cordão para o alto ao fundo.
Nord continuou:
— Normalmente, os esquadrões de extermínio são mandados semanalmente, alternando entre as quatro equipes responsáveis pelo muro leste. Mas, já vai ser a terceira só nessa quinzena.
— Humm, eu também observei isso — assentiu Darius, chegando mais perto —, mas o que você acha que pode ser?
Nord coçou o queixo, pensativo.
— Não sei, mas ouvi dizer que a vila de Solun tem relatado que o gado é atacado durante a noite. Tem alguns que chegam a dizer que viram a imagem de uma jovem vagando pela noite.
— Uma menina? Isso não parece uma aparição… — interrompe Liam, com um sorriso frouxo — será que não é sua culpa de novo?
— Tsc! — rosnou, Nord.
Elise, com uma expressão de confusão, olhou para Darius, que abria um sorriso malicioso.
— Ah! Essa é uma boa história…
— Ei?! — Nord o repreendeu.
— Você não vai querer deixar a novata de fora, vai?
Nord largou rapidamente a cota de malha e tentou atacá-lo enquanto ele divagava. Mas Darius imediatamente o pegou pelo braço e o imobilizou contra a mesa, continuando a história.
— Uma coitada passou uma noite inteira caçando o galã aqui. O mentiroso inventou que era membro da nobreza para iludir a garota. Ainda namorou ela por quanto tempo, Nord?
Darius forçou a junta do ombro de Nord, forçando-o a falar. E ele respondeu aos berros:
— Três! Três meses!
— Assim que ela descobriu, ela correu em meio à noite, de quartel em quartel, procurando o gênio com uma faca na mão.
— Ouvi dizer que ela tá atrás dele até hoje. Hahahahaha! — acrescentou Liam, enquanto caia na gargalhada.
Após Nord conseguir se soltar, ele terminou de equipar sua armadura em questão de segundos. A vermelhidão de seu rosto parecia fazer até seu elmo corar.
— De qualquer forma — continuou Darius — sendo uma dama frustrada ou uma aparição, o fato de não haver vítimas é uma boa notícia. Vamos garantir que as coisas continuem dessa forma.
Ao cessar da conversa, Darius observou o tempo a sua volta e fez as últimas inspeções em seu equipamento, e após averiguar que estava tudo em seu devido lugar, ele se voltou novamente para o grupo e fez a chamada:
Já está quase na hora, estão todos prontos?
— Sim! — responderam em uníssono.
***
O sol já se inclinava no horizonte do vale, quando o esquadrão de extermínio chegou diante do pântano de Noin.
A atmosfera fúnebre parecia fluir da floresta de árvores retorcidas, em forma de neblina, dando um arrepio na espinha de qualquer desavisado que se aventurasse por ali.
E Elise, Darius, Liam e Nord esperavam os últimos minutos para o anoitecer.
— Ah~~, só essa caminhada já deveria contar como metade da missão — exclamou Liam.
— O cálculo não fecha, idiota. Ainda tem o caminho de volta — retrucou Nord.
— Ah, é verdade. Mas o fato de a viagem de volta ser para casa faz parecer menos cansativo. Então seria… um quinto? — murmurou, pensativo.
Elise riu enquanto observava a discussão dos dois, mas logo mudou seu foco para o Capitão Darius.
Ele estava posicionado na entrada do pântano, olhando fixamente para o interior como se estivesse em transe.
— Relaxa, ele é assim mesmo — disse Liam, abanando as mãos, despreocupado.
— Hm? Não! Tá tudo bem. Eu só fiquei impressionada.
— Impressionada?
— Quando fiz o exame para a guarda, os examinadores sempre diziam que minha habilidade só me renderia um lugar no esquadrão de extermínio. Fazia parecer que era um posto problemático.
— Eles só se acham porque têm influência — resmungou Nord —, são um bando de idiotas que não servem para nada além de coçar o saco e gastar o salário no distrito da luz vermelha. A guarda interna deveria ser composta pelos mais notáveis, mas quando o dinheiro fala…
— Mas também não é como se não fosse um pouco problemático — retrucou Liam. — Honestamente, eu preferiria fazer parte da guarda real e lidar com um bando de nobres bundões do que sentir o cheiro podre dessas aparições.
— Hm… Mas fico mais tranquila, vendo vocês tão confortáveis. Espero poder contar com vocês daqui para frente.
Seus cabelos loiros brilharam sob a luz do sol poente, e seu sorriso suave os hipnotizou por um momento.
Quando Darius encerrou sua meditação e se aproximou do trio, ele notou a distração dos dois companheiros.
— Os corvos estão inquietos, precisamos redobrar a atenção. Alguma novidade que eu tenha perdido? — indagou ao perceber a expressão confusa dos outros.
Nord disfarçou, ajustando rapidamente o capacete, enquanto Liam se aproximava de Darius e tocava em seu ombro.
— Sua habilidade para descobrir talentos é impressionante, senhor…
Darius franziu a sobrancelha, demonstrando confusão.
— O que foi?
— Ah, nada, nada… Vamos nessa?
— Sim! Estamos prontos para avançar — confirmou Darius.
Elise assentiu e colocou o elmo em sua cabeça.
Ela estava nervosa e seu coração parecia bater com tanta força contra o seu peito que ela sentia que ele ia pular para fora, mas sua determinação a manteve firme.
Ao acender sua tocha, as preparações estavam concluídas e eles adentraram o pântano.
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