Enquanto o vento balançava os galhos das árvores, fazendo as folhas dançarem pelas trilhas do bosque. A canção suave, oriunda dessa combinação, criava uma atmosfera aconchegante.

    E, em meio a esse cenário, era possível observar uma jovem garota, de cabelos negros e pele pálida, trajada com um belo vestido e um pano que cobria a sua cabeça, como se estivesse lá para proteger a sua pele dos raios de sol que conseguiam se esgueirar entre as folhas.

    Era possível visualizar em suas mãos magras e sujas de terra, algumas flores silvestres que ela segurava com todo o carinho, e seus olhos vermelho carmesim, vagavam pelas redondezas do bosque como se estivesse à procura de algo, enquanto seus pés descalços deslizavam suavemente pelo solo coberto de folhas caídas.

    Ela se abaixou, pegando mais algumas flores e examinou-as com cuidado, com seus dedos frágeis passando por cada pétala como se estivesse manuseando algo precioso.

    Seu rosto esboçou um pequeno e breve sorriso.

    Foi quando de repente, uma voz suave e familiar a chamou:

    — Amaya, está ficando tarde. Vamos voltar para casa.

    Era seu pai, surgindo de entre as árvores.

    Sua figura esguia e abatida carregava uma expressão cansada, e seu rosto era manchado por olheiras profundas. Mesmo sendo um homem jovem, as marcas da exaustão o faziam parecer muito mais velho. Mas ainda assim, ele conseguia expressar um sorriso sincero.

    Amaya olhou para ele, apertando as flores contra o peito e correndo em sua direção.

    — Já vou! — respondeu com um sorriso discreto, mas algo em seus olhos sugeria preocupação.

    Ele pegou sua mão delicadamente enquanto ela ajeitava o seu buquê para conseguir segurá-lo em sua outra mão.

    Enquanto eles caminhavam de volta para casa, ao sair do bosque, eles já podiam avistar uma humilde cabana, decorada com um belo canteiro das mais variadas flores. E em frente à residência, havia uma mulher, tão branca quanto a lua, que parecia estar à sua espera.

    Era Zahara, que parecia manter seus olhos fixos na jovem garota.

    Ao notar a sua presença, a pequena moça fez cair o seu semblante, apertando com mais firmeza a mão de seu pai.

    Assim que chegaram à porta da casa, Amaya correu sorrateiramente para dentro, evitando contato visual com a mulher.

    Seu pai achou um pouco de graça na situação, dando outro leve sorriso, mas depois voltou seu olhar para Zahara, que se posicionava ao lado da entrada, de braços cruzados, enquanto lhe encarava com um rosto sério.

    — Você não precisava buscar ela — disse Zahara.

    — Na verdade… eu prefiro deixar ela por perto. Vamos entrar?

    Em resposta, ela apenas acenou com a cabeça e acompanhou o homem para dentro da cabana.

    Enquanto Zahara entrava na cabana, seu olhar vagava pela sala, fazendo uma breve análise do lugar.

    O seu interior era bastante modesto, contendo apenas alguns poucos móveis de madeira, portando algumas bugigangas, e um pequeno corredor que levava para duas únicas portas.

    Mas, esticado sobre a parede lateral da sala, uma grande bandeira, com um brasão dourado adornando-a, chamava a atenção. O tecido da bandeira estava desbotado, mas ainda mantinha o brilho do bordado, indicando que foi preservada com grande cuidado.

    E sob ela, uma lareira apagada, com marcas de fuligem, que parecia ter sido acesa inúmeras vezes para aquecer o ambiente durante as noites frias.

    Zahara observou a bandeira por alguns instantes, e Edrik percebeu o seu olhar, mas evitou comentar sobre ela. E então puxou uma cadeira para Zahara se sentar e, em seguida, sentou-se à mesa, de frente para ela. 

    Foi quando ela começou a falar:

    — Agora, você pode me explicar o que aconteceu?

    — Eu sei que fiz merda… — respondeu, com uma expressão frustrada em seu rosto.

    — Edrik… — Zahara solta um suspiro — você está lamentável. De onde você tirou a ideia de usar o gado?

    — Foi uma medida desesperada. Eu ando… um pouco exausto, ela não conseguiria tirar nada de mim.

    — Então… — falou, o interrompendo — você preferiu apostar nos pobres animais inocentes e tentar fazer parecer que foram aparições?

    — huh~ — gemeu, como se tivesse sentido uma pontada no estômago. — Você falando dessa forma… faz parecer bem mais ridículo do que pareceu no momento.

    Enquanto os dois conversavam, uma das portas do corredor se abriu, apenas o suficiente para que um pequeno olhinho conseguisse ver pela sua fresta. E Zahara, que viu a cena por cima do ombro de Edrik, começou a observar melhor a casa.

    Ela conseguia ver, flutuando no ambiente, várias pequenas criaturas, similares a moscas.

    Seus olhos se voltaram para Edrik, que, por mais que estivesse visivelmente cansado, mantinha um sorriso em seu rosto. 

    — Até quando isso vai durar, Edrik?

    Sua pergunta fez o sorriso dele tremer, como se vacilasse. No entanto, ela continuou:

    — Eu não me importo nem um pouco se o gado de outra pessoa morre. Na verdade, eu até dei boas risadas quando ouvi sobre o caso. E também não é do meu feitio me meter em questões pessoais, mas…

    — Eu estou bem! — respondeu, a interrompendo, enquanto seu rosto mostrava uma expressão amarga pela primeira vez.

    Zahara, em resposta, suspirou, abrindo um sorriso, voltando a falar enquanto começava a mexer em sua bolsa, removendo alguns frascos de dentro dela, e os enfileirando na mesa.

    — Pois bem… vou lhe dar alguns remédios. Mas fique ciente, isso pode acelerar a sua recuperação, mas não substituirá uma boa alimentação e um período de descanso adequado.

    — O… obrigado! — disse Edrik, enquanto se curvava em agradecimento.

    Ele apertava fortemente suas mãos sobre suas coxas, como se tivesse acabado de se safar de um grande problema. E Zahara, ao observar sua atitude, lhe deu mais uma prescrição.

    — Eu também lhe indico reduzir a quantidade de vezes que você alimenta ela.

    Seu rosto levantou-se em questão de instantes, ao ouvir a sua sugestão.

    — M… mas… — gaguejou em resposta, receoso.

    Porém, Zahara continuou seu raciocínio.

    — Você pode achar que ela vai ficar melhor se você morrer, mas eu duvido — disse, enquanto seus olhos saiam sinuosamente de Edrik e se voltavam para a pessoinha que os espiava, brechando pela porta.

    E ele, ao acompanhar os olhos de Zahara, deu de encontro com os olhos de sua filha.

    — Ah… Amaya — suspirou, como se sentisse um fardo pesado sobre suas costas.

    — Senhor Valenfort… não estou dizendo para simplesmente deixá-la definhar — disse Zahara, tirando mais um frasco de dentro de sua bolsa e o pondo na mesa com o restante dos medicamentos. — Você pode achar que as crianças são ingênuas demais para perceber algumas coisas, mas isso não as torna ignorantes. Quando você começar a sentir que está muito cansado, apenas dê esse medicamento para ela.

    — O que é isso? — indagou, desconfiado.

    — Não é nada demais, apenas diga que é para fazê-la dormir.

    Após Zahara terminar sua conversa com Edrick, ela espalhou pela casa algumas pedras que continham alguns escritos rúnicos, dando outras duas para ele, para que ele os pusesse nos cômodos restantes.

    Assim que terminou sua consulta, Edrik hesitou por um momento antes de falar:

    — Zahara… Eu sinto muito, mas desta vez eu realmente não vou conseguir pagar…

    Zahara levantou a mão, interrompendo-o com um sorriso de canto de boca.

    — Você não precisa se preocupar, Edrik. A visita de hoje será custeada por outra pessoa.

    — Outra? — Edrik franziu a sobrancelha, confuso. — Quem?

    Zahara deu uma risada baixa, quase inaudível.

    — O que você acha? Quem solicitou o serviço, claro!

    Edrik ficou em silêncio por um momento encarando-a com uma pitada de ceticismo, mas a expressão de Zahara não entregava nada além de um misto de sarcasmo e despreocupação.

    Edrik soltou um suspiro, mas não pôde evitar dar um sorriso cansado.

    — Você é sempre assim… Eu devia saber.

    Zahara deu uma última olhada ao redor da cabana, antes de voltar seu olhar para a bandeira pendurada.

    — Você deveria pensar em tirar isso da parede. Se alguém ver isso por acaso, vai levantar perguntas que você não quer responder.

    Ele desviou o olhar, como se a lembrança lhe trouxesse dor.

    — Talvez seja hora de deixá-la descansar, não é? — disse ele, com uma expressão melancólica.

    Zahara apenas assentiu levemente.

    — Bom, eu me despeço por agora. Cuide bem da garota e siga minhas orientações.

    Edrik acompanhou Zahara até a saída, e assim que ela cruzou a porta, ele a chamou uma última vez:

    — Zahara…

    Ela virou o rosto, apenas o suficiente para mostrar que estava ouvindo.

    — Obrigado. Por tudo.

    Ela deu um leve aceno de cabeça, deixando escapar um sorriso sutil antes de desaparecer pela trilha da floresta.

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