Capítulo 12 - Parte 2
As duas figuras se encararam por alguns segundos, enquanto um silêncio pesado e inquietante pairava entre eles, como se o próprio ar estivesse suspenso.
Zarek permaneceu imóvel. Não por medo ou hesitação, mas pela simples necessidade de processar. O mundo à sua volta havia mudado abruptamente, e sua mente ainda corria para acompanhar.
Enquanto isso, aquela sensação sutil, mas aguda… uma pulsação densa, quase viva, continuava a percorrer o seu interior como uma febre constante.
Discretamente, lançou um olhar para Zahara, caída ao chão, completamente inerte.
“Zahara… será que ela morreu?”, a pergunta surgiu quase automática, sem peso… apenas como uma curiosidade seca.
Seu olhar retornou à criatura, ainda ali… imóvel, observando-o em silêncio, com sua cabeça inchada levemente inclinada em direção a ele.
“Provavelmente é culpa dele. O que eu faço agora…? Quer dizer… eu deveria fazer alguma coisa…?”
Zarek piscou, tentando dissipar o latejar incômodo que descia de sua nuca até a base de seus tentáculos. Ao mesmo tempo, sua mente começou a trabalhar, correndo por registros recentes, analisando fragmentos de instruções dadas por Zahara.
Ela havia mencionado contingências.
Coisas como:
“Se minha memória começar a falhar, blá-blá-blá…”
Zarek processou a informação e então encarou Zahara.
“Eh… não acho que algo assim vá funcionar dessa vez.”
Era um plano simples e precavido…
Entretanto, agora, olhando para o corpo imóvel no chão… ela não havia dito nada sobre o que fazer se ela simplesmente não estivesse mais ali. Nenhuma instrução, nenhum plano de contingência para o caso de sua total ausência.
“Você não pensou que algo assim fosse acontecer, né?”, Zarek simulou um suspiro.
Por um instante, seus olhos permaneceram ali, contemplando Zahara, totalmente indefesa. E então, sem motivo claro, algo em seu interior pareceu ranger… um incômodo sutil, difícil de definir.
Ele deu um passo à frente, como em um reflexo… mas hesitou, parando no meio do gesto. E então, voltou a encarar novamente a criatura, analisando-a com um olhar mais metódico.
Zarek estreitou a chama de seus olhos.
“E qual é a dele…?”, ponderou por alguns segundos enquanto a sala permanecia em um silêncio ligeiramente desconfortável.
Por que ele ainda estava parado…?
Será que estava o analisando?
Será que ele também iria o atacar…?
As perguntas se formavam lentamente, como ecos reverberando dentro dele, até que uma pequena epifania veio à sua mente, como uma fagulha.
Ele também era uma aparição…
“Será que ele não me vê como uma ameaça? Pode ser que ele me enxergue como um igual… é por isso que não me atacou?”
“E se eu…”
Uma ideia se formou em seu interior.
Ele deu um passo tímido em direção a criatura.
— Eh… olá? — disse, com sua voz saindo baixa, quase inaudível.
Mas… em resposta, a criatura permaneceu imóvel por mais alguns segundos, até que, como se Zarek simplesmente não estivesse ali, voltou-se novamente para Zahara.
“Por que eu ainda tento?” pensou, com a frustração vazando em um suspiro silencioso.
Foi nesse instante que algo se quebrou no ambiente. Um som viscoso, entremeado por estalos curtos, preencheu o cômodo. A junta de um dos braços da criatura começou a se distorcer e o ombro se desfez lentamente, desmontando-se por vontade própria, até que o membro se soltou e caiu ao chão.
Zarek observou atentamente.
E então… de forma autônoma, a mão começou a escalar lentamente o corpo inanimado de Zahara.
— Ei! — Zarek chamou, elevando o tom instintivamente.
Entretanto, continuou sendo ignorado.
“Certo… você não está interessado”, pensou, enquanto sentia o desconforto de antes se reacender novamente, mais vivo, mais incômodo, ao passo que a criatura voltava sua atenção para Zahara.
Sem perceber, ele deu mais um passo à frente…
Se agachou levemente, firmando seus pequenos tentáculos ao chão, e em um impulso curto e brusco se lançou para frente.
Seu corpo disparou, atravessando o espaço entre eles até colidir com o parasita que escalava Zahara. O som do crânio oco de Zarek se chocando com o pequeno membro ecoou levemente pela sala, como um estalo abafado.
O parasita foi lançado a alguns metros e, por sua vez, Zarek aterrissou logo acima de Zahara, embora cuidadosamente evitasse tocá-la. Seus tentáculos se cravaram ao redor de seu dorso como pilares, formando uma espécie de jaula viva.
Ao erguer os olhos, deparou-se com o “olhar” fixo da criatura môr, que já o observava novamente.
— Você deveria ao menos tentar ouvir de vez em quando — sussurrou ele, com a voz baixa e desafiadora. — Se soubesse o quão assustadora ela consegue ser… provavelmente não estaria fazendo isso.
Sem esperar que qualquer reação viesse, Zarek desviou os olhos por um instante, voltando-os para o corpo sob si. O peito de Zahara movia-se com extrema suavidade, quase imperceptível, mas inegável. Ela ainda respirava.
Naquele instante, outra coisa em seu interior pareceu se mover… dessa vez, como se algo apertado e enrijecido por dentro cedesse. Uma tensão sutil escoou por seu corpo.
Entretanto, durante sua distração, a criatura se moveu.
Sem emitir som, um de seus braços ergueu-se devagar, com os dedos longos e retorcidos envolvendo o crânio de Zarek.
E então, sem qualquer esforço aparente, ela o ergueu do chão.
Zarek se viu suspenso no ar, com os tentáculos pendendo ao redor do corpo, enquanto aquele tumor sem rosto o encarava — ou ao menos parecia fazê-lo — mais uma vez.
“Ah… parece que consegui ganhar sua atenção.”
A criatura trouxe o crânio de Zarek mais para perto, reduzindo a distância entre os dois.
Foi então que os outros braços se ergueram, se estendendo ao redor de Zarek. Um a um, eles começaram a envolver os tentáculos de Zarek, puxando-os para os lados, enquanto outros mais envolveram o seu crânio.
“Hên…?”
Ele o esticou.
Mas não com força. Ainda não. Era como se quisesse compreender o que estava segurando. Como se Zarek fosse uma peça de algo quebrado, algo fora do lugar.
Ele apertou e esticou os seus tentáculos, minuciosamente.
E Zarek também não resistiu. Na verdade… ele sequer entendia direito o que estava acontecendo. Ele apenas cedeu a inspeção.
Foi então que a criatura parou mais uma vez, e aproximando-o ainda mais. Dessa vez, quase encostando-o em seu rosto.
E, de repente, um chiado surgiu.
Surgiu dentro da cabeça de Zarek .Uma estática estranha, como se alguém sintonizasse algo dentro de sua mente.
“Han? O que?”, Zarek piscou, olhando para a “face” da criatura.
Alguma coisa havia acontecido. Mas ele não sabia o quê. E ele ficou apenas ali pendurado… processando.
Foi aí que algo finalmente mudou.
A cabeça da criatura torceu-se em um movimento grotesco e, como se alguma coisa houvesse lhe instigado, a apatia anterior deu lugar a um movimento brusco.
Os braços que seguravam os tentáculos se abriram num estalo. Apenas o braço que envolvia seu crânio permaneceu. E então, num gesto súbito e animalesco, ela o ergueu… e o lançou contra o chão.
O mundo virou uma espiral.
O impacto veio seco, brutal.
O crânio de Zarek quicou no piso da sala, rachando com o impacto.
Ele sentiu a dor, mas não uma dor física, mas algo mais profundo…
O seu núcleo sofreu um dano pesado mais uma vez. Porém, dessa vez… algo a mais cedeu.
Aquela presença externa… aquele sentimento que vinha batendo à porta… entrou como se aproveitasse a brecha. Como se o golpe tivesse quebrado uma represa. E a atmosfera do lugar pareceu fluir para dentro dele num único suspiro.
Zarek não pensou. Seu corpo reagiu.
Seu tentáculo chicoteou para o lado, impulsionado por algo maior do que ele, e o golpe acertou em cheio o flanco da criatura, abrindo um rombo em sua lateral e a arremessando para longe com uma força absurda.
Zarek também foi jogado com o impacto, rolando alguns metros até parar no canto da parede.
O som foi alto, quase uma explosao.
A criatura… se ergueu como pôde, e rastejou pela brecha na parede que havia sido gerada pelo choque, escapando. Seus movimentos eram erráticos, quase desesperados.
Zarek também se ergueu com dificuldade.
— Ei! Espera! — gritou, instintivamente, mas suas pernas pararam antes de seguir.
Seu olhar recaiu novamente sobre Zahara, caída.
“Ah… isso foi… sem querer? A Zahara fai ficar zangada…”

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