Um silêncio pesado pareceu permear a sala por um instante. E Zahara permaneceu parada com os olhos fixos em Zarek, como se o desafiasse.

    Em resposta, seus tentáculos congelaram por uns instantes, mas logo voltaram a se contorcer.

    “Matá-la?”, questionou-se em pensamento, estranhando a forma tão casual de se fazer tal pedido.

    — Você quer morrer? — Seu tom quase apático deixou transparecer uma fagulha de confusão.

    — Claramente não. Eu já lhe disse, estamos apenas estudando — respondeu Zahara, encarando-o fixamente.

    As brasas de Zarek pareciam vagar em suas órbitas oculares, e ele inclinou levemente a sua cabeça, ponderando sobre a situação.

    — Mas e se você morrer de verdade? — lançou outra pergunta.

    — Se eu morrer… você estará livre para fazer o que bem entender. O que importa? Pense nisso como um teste. Você sabe o que é um teste, certo?

    Ele assentiu lentamente, acenando com a cabeça e ela continuou, como se tentasse barganhar com uma criança.

    — Porém, nesse teste, você passa apenas por participar. Eu apenas quero ver do que é capaz.

    “O produto das consequências me preocupo, eu”, acrescentou, em pensamentos.

    Ele encarou Zahara nos olhos mais uma vez, e ela permanecia firme, sem qualquer sinal de cautela, o fazendo estreitar os olhos ligeiramente e refletir por alguns segundos.

    “De que serve um resultado se quem o quer obter morrer? Parece um pouco extremo. Mas ainda assim ela continua insistindo…”, enquanto ele tentava entender o motivo pelo qual aquilo estava sendo solicitado, uma epifania lhe veio à mente, lhe dando uma possibilidade.

    — Você realmente quer que eu tente, ou isso já é um teste?

    A pergunta pairou no ar, e em resposta, Zahara franziu uma de suas sobrancelhas, com uma mistura de curiosidade e impaciência em seu olhar, fazendo-a pousar uma de suas mãos sobre a testa e respirando fundo, como se estivesse tentando dissipar a tensão.

    “Nunca pensei que teria que convencer uma aparição a me atacar”, pensou com uma expressão cada vez mais exausta.

    — Não complique as coisas, Zarek… — disse enquanto começava a se aproximar novamente — Eu só preciso que você siga o ordenado.

    Ao chegar diante dele, ela se inclinou para frente para olhá-lo face à face. Seus olhos pareciam perfurar os dele, mas agora havia algo mais… um brilho sutil que parecia vir de uma profunda determinação.

    — Você sabe por que as pessoas temem o que não entendem? — perguntou com uma voz mansa.

    Ele não respondeu de imediato, apenas mantendo seus olhos vidrados nos dela.

    — Porque o incompreensível não é previsível. E o imprevisível não pode ser controlado.

    Zarek inclinou sua cabeça novamente, ainda confuso com seu discurso.
     
    — Você parece forte… tem medo de mim? — perguntou com uma dúvida sincera em sua voz.

    E Zahara esboçou um sorriso discreto, quase imperceptível, enquanto seus olhos ficavam mais intensos.

    — Não… — respondeu, deixando as palavras ecoarem por um breve instante — de você não. Mas há coisas no escuro que me fazem tremer e preferir a morte, a ter que lidar com elas. Contudo, você pode ter a chave que preciso, para que eu não precise mais ter medo.

    Ela inclinou-se um pouco mais sobre ele, com sua presença se tornando mais opressiva. Os olhos dela, que resplandeciam uma cor alaranjada similar à do outono, pareciam queimar como chamas vivas, rivalizando aos dele.

    — Pode cooperar comigo?

    Zarek permaneceu em silêncio por um instante, sentindo como se estivesse sendo consumido por ela.

    “Um medo tão profundo que a faria preferir a morte…”, o peso das palavras de Zahara parecia começar a corroer lentamente seu ceticismo.

    Para alguém como ela, que parecia tão próxima dele em humanidade, admitir tal fragilidade era desconcertante, quase surreal.

    Por fim, Zarek quebrou o silêncio:

    — Apenas um ataque? — questionou mais uma vez.

    — Sim! — ela reafirmou enfaticamente.

    Por fim, Zahara se ergueu e voltou a andar até a sua posição inicial, distanciando-se alguns metros e voltando-se para ele.

    “Acho que agora vai… vamos pôr a marca à prova.”

    Os seus dedos começaram a se movimentar discretamente com as mãos ao lado de seu corpo, como uma aranha tecendo as suas teias. E enquanto isso, o brilho de diversos pequenos fios, quase imperceptíveis no ambiente, começavam a formar uma espécie de barreira entre ela e Zarek.

    Em contrapartida, Zarek manteve-se imóvel, com seus tentáculos balançando lentamente, como se acompanhassem seus pensamentos que calculavam o seu próximo movimento.

    “Apenas um ataque, com tudo que eu tenho…”

    Ela esperou alguma atitude por alguns segundos, todavia, ele parecia estar preso em algum tipo de transe. Foi então que, pela quarta vez, a sua paciência se esvaiu e ela decidiu chamar a sua atenção.

    — Zarek, você…!

    Porém, antes que ela pudesse terminar sua frase, ele pareceu responder instintivamente à sua voz, e a atacou com um golpe rápido.

    Com um único braço, Zarek lançou um ataque direto. Seu corpo se moldou instantaneamente, utilizando parte de sua massa para criar um apoio firme em suas costas, enquanto o braço avançava como uma lança. O golpe cortava o ar com uma velocidade impressionante, rumando diretamente para Zahara.

    “Muito rápido”, pensou Zahara, dando mais um passo para trás, com um olhar de surpresa.

    Mas antes que pudesse atravessar o seu escudo de fios, ele travou no lugar. Seu corpo congelou abruptamente, enquanto uma sensação de queimação agonizante começou a pulsar da marca, irradiando por todo o seu corpo.

    — Ah~… — um gemido rouco escapou dele.

    Seu ataque parou a pouco menos de um metro de Zahara. E ela encarou a farpa, que parou em frente ao seu rosto, com uma expressão mista de surpresa e alívio, mas que rapidamente deu lugar a um sorriso.

    — Funcionou — sussurrou, com seus olhos fixos na criatura.

    Zahara afrouxou sua postura, deixando escapar um suspiro profundo, enquanto observava o corpo de Zarek murchar de volta para o seu estado natural.

    Ela deu alguns passos em direção à sua pobre cobaia, agora imóvel, passando pela barreira de fios, desmanchando-os como se nunca tivessem estado lá.

    — Isso… está… certo? — balbuciou, com a chama em seus olhos, vacilando.

    Zahara não conteve o sorriso, apesar do desgaste.

    — Sim! Definitivamente — respondeu, enquanto pegava o crânio em seu colo.

    Antes que Zarek voltasse a hibernar, ele fixou os seus olhos na expressão que Zahara carregava em seu rosto mais uma vez.

    Apesar do sorriso que adornava os seus lábios, em seus olhos, além do brilho alaranjado, havia algo que parecia destoar. 

    Assim que sua luz se apagou, a atmosfera da sala em instantes mergulhou em uma estranha serenidade.

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