Os portões de ferro de Fiamoria se ergueram com um ranger pesado, revelando a fortaleza protegida pela robusta muralha. Hiroshi, liderando a cavalaria de vinte homens, avançou com passos firmes. Seus olhos veteranos, treinados em observar o menor detalhe, logo notaram a agitação incomum na cidade.

      A avenida principal que levava à praça diante do castelo estava cheia de vida e tensão. As defesas nas muralhas haviam sido triplicadas; arqueiros e sentinelas se moviam com disciplina, enquanto catapultas eram ajustadas por engenheiros de guerra. Mais adiante, o som inconfundível de martelos contra metal ecoava pelos becos.

    – Capitão Vence – Hiroshi falou, olhando ao redor. – Isso não é normal.

    – Não mesmo, senhor – respondeu Vence, franzindo o cenho. – Parece que estão se preparando para um cerco.

      Os ferreiros trabalhavam sem descanso, forjando espadas, escudos, armaduras e até itens mágicos. Ao longo das ruas, soldados circulavam em formação, mas algo chamou particularmente a atenção de Hiroshi: muitos desses soldados não eram de Fiamoria. Ele reconheceu os brasões em suas armaduras – famílias nobres de outras regiões do território de Imperion, todas vassalas da Casa Ignivor.

    – Por que tantas tropas aqui? – Hiroshi murmurou para si mesmo. – Hizuke, o que você está planejando?

      Ao chegarem à praça diante do castelo, Hiroshi e sua comitiva desmontaram dos cavalos. A movimentação chamou a atenção de um plebeu que, curioso, aproximou-se para observar melhor. Quando seus olhos pousaram em Hiroshi, ele congelou por um momento, antes de cair de joelhos.

    – É ele… É o Herói das Chamas!

      Sua exclamação ecoou como uma onda pela praça. Outros transeuntes ouviram e se aproximaram, rapidamente reconhecendo Hiroshi. O burburinho logo se transformou em uma aclamação:

    – O Herói das Chamas voltou! – gritavam.

      Homens, mulheres, crianças e idosos se reuniram ao redor dele. Alguns se ajoelhavam, outros erguiam as mãos em saudação, e as crianças olhavam para ele com admiração quase mística. Uma lenda viva tinha descido do campo de batalha para andar entre eles.

    – Milord Ignivor! – disse uma mulher idosa, com lágrimas nos olhos. – Graças às suas vitórias, meu neto voltou para casa são e salvo!

    Uma criança segurou uma flor e a ofereceu timidamente, enquanto dizia: – Eu quero ser tão forte quanto o senhor um dia!

      Hiroshi sorriu, ajoelhando-se para aceitar a flor. Apesar de estar acostumado com o respeito e a reverência, momentos como esse ainda o tocavam profundamente.

      Do castelo, passos apressados ecoaram nas escadas de pedra. A multidão abriu espaço quando um homem de porte imponente desceu correndo. Hizuke, o filho do meio de Hiroshi, vestia uma armadura leve, com o brasão da Casa Ignivor em destaque. Sua expressão, normalmente estoica, estava iluminada por um raro sorriso.

    – Pai! – Hizuke gritou enquanto corria, ignorando qualquer formalidade.

      Hiroshi abriu os braços, e os dois se abraçaram com força, como se a ausência de anos estivesse sendo apagada naquele momento.

    – Hizuke, meu filho! – Hiroshi disse, segurando os ombros do filho e avaliando-o com um olhar orgulhoso. – Você cresceu, garoto.

    – E você ainda é o mesmo, pai – respondeu Hizuke, rindo. – Mas, pelo visto, ainda sabe como causar alvoroço.

      O povo observava o reencontro com sorrisos, respeitando o momento familiar. Após o abraço, Hizuke afastou-se um pouco e apontou para o castelo.

    – Precisamos conversar, pai. Há muito o que explicar, e o tempo não está a nosso favor.

      Hiroshi assentiu, mas antes, virou-se para a multidão, levantando a mão para acalmá-los.

    – Obrigado por me receberem assim. Vocês são a força e o coração de Fiamoria. Não importa o que venha a acontecer, a Casa Ignivor sempre estará com vocês.

      Os aplausos e as aclamações ressoaram pela praça enquanto Hiroshi, acompanhado por Hizuke, começou a subir as escadas em direção ao castelo. Embora estivesse feliz por estar de volta ao lar, uma preocupação silenciosa crescia em sua mente. Hizuke claramente sabia algo importante, algo que não poderia esperar.

      As portas do salão principal do castelo de Fiamoria se abriram com um ranger imponente. Hiroshi e Hizuke entraram, e o peso da tensão no ar parecia maior dentro das paredes fortificadas. Hiroshi não perdeu tempo.

    – Hizuke, o que está acontecendo? – perguntou, a ansiedade evidente em sua voz. – Sei que Fiamoria tem enfrentado problemas com ladrões nas redondezas, mas isso… – Ele fez um gesto amplo, referindo-se à agitação da cidade. – Isso não é apenas por causa de bandidos.

      Hizuke respirou fundo, indicando com um movimento para que seu pai o acompanhasse até uma mesa no centro do salão. Lá, um mapa da região estava espalhado, com marcas detalhadas em vermelho.

    – Pai, você está certo. A cidade não está apenas lidando com ladrões comuns. Há muito mais acontecendo. Deixe-me explicar desde o início.

    Hizuke começou a relatar:

    – Há cerca de três meses, surgiram relatos de um grande grupo de ladrões nas redondezas. Eles começaram com ataques a viajantes, mas logo passaram a sequestrar pessoas, roubar mercadorias de comerciantes e até incendiar vilarejos inteiros. Plantações foram destruídas, e muitas famílias abandonaram suas fazendas com medo.

      Hiroshi ouviu atentamente, cerrando os punhos enquanto imaginava o sofrimento das pessoas.

    – A Casa Ignivor não podia ficar de braços cruzados. Sabíamos que precisávamos entender quem eram esses ladrões e o que realmente estava acontecendo. Então, organizamos uma operação de espionagem.

    – Enviamos quinze espiões disfarçados de pedintes, para que pudessem circular livremente sem levantar suspeitas – continuou Hizuke. – Eles se infiltraram nas áreas mais afetadas, mas apenas um deles teve sucesso significativo em descobrir algo concreto.

      Hizuke apontou para uma marca no mapa, próximo à fronteira com Drakmor.

    – Este espião percebeu que a maioria dos ataques ocorria perto da fronteira com Drakmor. Ele se instalou em um vilarejo próximo e começou a vigiar a área. Durante duas semanas, ele observou grupos de homens estranhos atravessando a fronteira no horário da madrugada, sempre carregando mercadorias.

    Hiroshi franziu o cenho.

    – Mercadorias roubadas?

    – Esse era o ponto, pai. Não havia como saber. O que chamou a atenção do espião foi que esses homens sempre atravessavam sob a vigilância de guardas de Drakmor. Os guardas nunca os detinham ou questionavam, como se houvesse um acordo entre eles.

    – Precisávamos de uma prova – Hizuke continuou. – Algo que confirmasse que aquelas mercadorias eram roubadas. O espião elaborou um plano e nos enviou uma mensagem através de um corvo. Ele sugeriu que criássemos uma carga “isca”, algo que fosse roubado de propósito, mas que carregasse uma marca inconfundível implantada por nós.

      Hiroshi cruzou os braços, impressionado com a engenhosidade do espião.

    – E o que vocês fizeram?

    Hizuke sorriu levemente.

    – Enviamos uma carga de suprimentos em uma caravana mal protegida, exatamente como o espião sugeriu. Marcamos as caixas, com um tipo de tinta que era refletida com magia que emitiam um brilho específico apenas quando expostos a uma luz mágica que só nós temos em Fiamoria. Isso nos garantiria a identificação da mercadoria caso ela fosse roubada e atravessasse a fronteira.

    Hiroshi assentiu, claramente satisfeito com a estratégia.

    – E funcionou?

    – Sim – Hizuke respondeu com firmeza. – Após a carga ser “roubada”, o espião conseguiu interceptar o grupo de homens que a transportava para Drakmor. Usando a luz mágica, ele confirmou que as mercadorias eram as que havíamos enviado. Isso provou que os ladrões estavam diretamente conectados aos guardas da fronteira de Drakmor.

      Hiroshi estreitou os olhos, sua mente já começando a considerar as implicações.

    – Então os ladrões são…

    – De Drakmor, sim – Hizuke afirmou. – Mas isso não é tudo.

      Hizuke apontou para outro ponto no mapa, do outro lado da fronteira.

    – Nosso espião acredita que há uma base de operações dentro do território de Drakmor. Ele está elaborando um plano para entrar no país sem ser descoberto, mas isso será extremamente arriscado.

      Hiroshi ficou em silêncio por um momento, absorvendo as informações. Finalmente, ele falou, sua voz carregada de determinação.

    – Se Drakmor está envolvido nisso, pode significar algo muito maior do que um simples grupo de ladrões. Hizuke, precisamos de respostas, e rápido.

    Hizuke concordou.

    – E as teremos, pai. Mas isso é apenas o começo.

      O silêncio que se seguiu parecia pesar tanto quanto a ameaça iminente que pairava sobre Fiamoria e a Casa Ignivor.

      Hiroshi estava sentado à mesa no salão principal do castelo de Fiamoria, com Hizuke ao seu lado, ambos analisando o mapa que delineava a fronteira com Drakmor. A expressão de Hiroshi era de determinação, e ele sabia que o sucesso de qualquer estratégia dependia de conhecer bem os seus aliados.

    – Tenho uma ideia para lidar com esses ladrões e entender o que está acontecendo em Drakmor – disse Hiroshi, cruzando os braços. – Mas, primeiro, quero conhecer o espião que conseguiu essas informações. Ele fez um trabalho notável.

    Hizuke acenou, chamando um soldado que estava próximo à porta. – Traga o espião, imediatamente.

      Poucos minutos depois, o jovem soldado entrou no salão. Ele aparentava ter cerca de 25 anos e possuía uma postura firme, mas humilde. Hiroshi notou imediatamente que sua aparência era diferente da maioria dos soldados de Imperion. Seu cabelo era escuro e liso, seus olhos puxados e igualmente escuros, características raras na população do reino.

    Hizuke se levantou, apresentando-o com um gesto de respeito. – Este é Akihiro Takeda, o homem que executou a missão com excelência.

      Hiroshi olhou para o jovem e fez um gesto para que ele se aproximasse. Ele analisou Akihiro por um momento antes de falar.

    – Você tem um nome que não parece ser de Imperion – comentou Hiroshi, intrigado.

    Akihiro inclinou levemente a cabeça em sinal de respeito. – Isso porque meu pai era um mercador de Luminára. Ele veio para Imperion há muitos anos e conheceu minha mãe aqui. Eles se casaram, e eu nasci. Sou mestiço.

    Hiroshi sorriu, impressionado pela mistura de culturas. – Essa diversidade é o que enriquece Imperion. Você tem orgulho de sua herança?

    – Sim, senhor. Minha família me ensinou a honrar ambas as partes de quem eu sou.

    Hiroshi assentiu, satisfeito com a resposta. 
    – Você fez um excelente trabalho na missão, Akihiro. A Casa Ignivor não ignora os esforços de seus homens. Gostaria de saber: há algo que você deseja como recompensa?

    Akihiro hesitou por um momento, claramente desconfortável com a pergunta. – Senhor, não fiz mais do que o meu dever. Não preciso de recompensa.

    Hiroshi deu uma risada leve. – Não seja tão modesto. Você desempenhou um papel crucial para a segurança do reino.

    Akihiro finalmente cedeu, embora relutante.
     – Bem… me casei recentemente, mas ainda moro na casa dos meus pais. Não conseguimos encontrar uma casa própria para morar, devido a alta população em Fiamoria.

      Hiroshi sorriu, pensando em seu neto Edward , que também estava começando uma nova etapa em sua vida com o noivado. – O amor jovem é algo incrível, meu jovem. Sua lealdade e bravura merecem reconhecimento. A Casa Ignivor lhe dará uma casa em Fiamoria como recompensa. Não será uma mansão, mas será um lar digno para você e sua esposa. Além disso, como presente pessoal, você receberá vinte mil moedas de Éldros.

    Hizuke, que estava anotando tudo, ergueu os olhos. – Considerare isso resolvido dentro dos próximos cinco dias.

    Akihiro ficou visivelmente emocionado, inclinando-se em uma reverência profunda.
    – Obrigado, senhor. Minha esposa e eu seremos eternamente gratos.

    Hiroshi colocou a mão no ombro do jovem, indicando que sua humildade era admirável.
    – Agora, preciso saber: você está disposto a participar de uma nova missão?

    – Sim, senhor – respondeu Akihiro sem hesitação. – Servirei ao reino com tudo o que tenho.

      Hiroshi indicou o mapa sobre a mesa. – Como você sabe, fui enviado pelo Rei Ryoma para escoltar o Imperador Magnus von August de Drakmor até Pyronia. Ele está vindo pela fronteira que você investigou, a mesma onde os ladrões operam. Essa será nossa oportunidade de infiltrar você em Drakmor.

    Akihiro inclinou-se sobre o mapa, ouvindo atentamente enquanto Hiroshi explicava.

    – Aqui está o plano: quando o imperador estiver cruzando a fronteira, o foco estará completamente nele. Os guardas drakmorianos estarão ocupados garantindo sua passagem segura. Durante esse momento, você e um pequeno grupo de soldados disfarçados de comerciantes vão atravessar a fronteira.

    Hizuke interrompeu. – E como garantimos que eles não sejam revistados?

    Hiroshi apontou para a área ao redor da fronteira. – Eu, como representante do rei, estarei lá para escoltar o imperador. Durante a escolta, faremos questão de monopolizar a atenção dos guardas de Drakmor. Enquanto isso, Akihiro e seu grupo passarão com mercadorias legítimas e não levantarão suspeitas.

    Akihiro concordou, absorvendo os detalhes. – E depois que atravessarmos?

    – Assim que estiverem dentro de Drakmor – continuou Hiroshi –, vocês seguirão para a vila onde os ladrões operam. Lá, você deve encontrar provas concretas que conectem os guardas drakmorianos aos roubos e à destruição nas terras de Fiamoria.

    Hizuke acrescentou: – É crucial que ninguém saiba que vocês são de Imperion. Vocês devem agir como mercadores, sem chamar atenção.

      Hiroshi olhou diretamente para Akihiro, sua voz cheia de gravidade. – Essa missão será perigosa. Se forem descobertos, estarão por conta própria. Está preparado para isso?

      Akihiro concordou novamente, sua determinação evidente. – Estou pronto, senhor.

    Hiroshi deu um leve sorriso, satisfeito com a resposta. – Então comece a se preparar. Temos pouco tempo.

    Hizuke acenou para os guardas próximos. 
    – Reúna os homens que irão com Akihiro. Certifiquem-se de que eles sejam confiáveis e discretos.

      Enquanto o plano começava a tomar forma, Hiroshi sentiu um leve peso no peito. Sabia que esta missão era arriscada, mas também entendia que o futuro de Fiamoria e de Imperion poderia depender do sucesso de Akihiro e de sua coragem.

      Hiroshi olhou para Akihiro com atenção enquanto o jovem cavaleiro parecia ponderar algo. Após alguns instantes de silêncio, Akihiro finalmente falou:

    – Senhor, com sua permissão, gostaria de sugerir os homens que irão comigo nessa missão. São soldados com quem já trabalhei antes, pessoas de confiança, que têm experiência em operar sob disfarce.

    Hiroshi ergueu uma sobrancelha, interessado.
    – Conhece esses homens pessoalmente?

    – Sim, senhor – respondeu Akihiro, com firmeza. – Lutamos lado a lado em missões anteriores. Eles são leais e sabem agir com cautela. Não trariam riscos desnecessários para a operação.

      Hiroshi concordou lentamente, avaliando a proposta. Ele sabia que a confiança entre os membros de uma equipe era essencial em uma missão tão perigosa.

    – Muito bem, Akihiro. Confio no seu julgamento. Quero que os chame ao castelo hoje à noite. Preciso conhecê-los pessoalmente e explicar os detalhes da missão.

    – Sim, senhor – respondeu Akihiro, curvando-se em sinal de respeito.

      Hizuke, que estava ao lado do pai, tomou nota rapidamente. – Vou providenciar que a sala de reuniões esteja pronta para esta noite.

      Hiroshi olhou para o jovem soldado novamente, a expressão séria. – Lembre-se, Akihiro, essa missão exige o máximo de cada um de vocês. Se algum deles não estiver preparado ou tiver dúvidas, deve ser substituído antes de partirmos. A segurança do reino depende do sucesso dessa operação.

    – Entendido, senhor. Eles estarão no castelo antes do anoitecer.

      Com isso, Akihiro se retirou para reunir sua equipe, enquanto Hiroshi e Hizuke permaneceram no salão, discutindo os últimos preparativos para a noite. 

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