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    [20 anos atrás.]

    O lugar era sereno e majestoso. Um grande castelo de pedra erguia-se imponente sob o céu azul, com suas torres altas e janelas ornamentadas.

    Pessoas de todas as classes sociais movimentavam-se pelo pátio, algumas trajando roupas pesadas e outras vestindo trapos, cada uma ocupada com suas próprias tarefas e responsabilidades.

    No pé da escada que levava ao grande portão do castelo, uma garota solitária atraía olhares e cochichos. Ela não deveria ter mais do que oito anos e estava vestida com trapos surrados.

    As línguas se soltavam com maldades e fofocas, especulando sobre a origem da menina e a história de sua família. Alguns sussurravam que sua mãe era uma meretriz, enquanto outros espalhavam rumores sombrios sobre a morte dela em consequência de dívidas de um cliente.

    A menina ouvia tudo em silêncio, seus olhos baixos e expressão cabisbaixa, até que uma sombra cobriu seu rosto.

    Ela levantou o olhar e encontrou os olhos de um menino em vestes nobres, seu cabelo escuro dividido ao meio realçando sua beleza.

    — Oi! — cumprimentou. — Papai disse que você é da família agora. Não deveria ficar aqui.

    Ela não respondeu, desviando o olhar.

    — Qual o seu nome?

    Com uma voz suave e tímida, ela respondeu:

    — Lina…

     Lumur sorriu para ela com gentileza.

    — Não precisa se preocupar com essas pessoas, eu também não gosto de nenhum deles. — Ele estendeu a mão em um gesto amigável — Vem! Vou te mostrar todo o castelo, agora é sua casa também, né?

    Os olhos da menina se iluminaram com uma mistura de surpresa e esperança. Desde que chegara ao castelo, ninguém havia mostrado a ela qualquer tipo de bondade ou afeto.

    Lumur segurou a mão dela suavemente e correu, puxando-a com entusiasmo. Através dos corredores do castelo, ele a guiou, apresentando-a aos salões grandiosos, aos jardins floridos e às maravilhas ocultas do imenso castelo.

    Para Lina, aquele momento foi um lampejo de luz em meio à escuridão, uma experiência que ela guardaria em seu coração por toda a vida.


    Lumur sempre fora um irmão carinhoso e atencioso para Lina. Ele lhe apresentou uma espada de madeira e, com paciência e dedicação, introduziu-a ao mundo da esgrima.

    Sob o olhar amoroso e orientador de Lumur, Lina encontrou sua paixão pela arte da espada. Ela o admirava imensamente e aspirava a seguir seus passos, buscando se tornar uma esgrimista habilidosa como ele.

    Em uma sala suntuosa do castelo, Lumur encontrava-se diante de seu pai, Ultan, o grande imperador. A tensão no ar era sufocante.

    — Está na hora de você ir para a guerra, Lumur — disse Ultan com uma voz firme e autoritária. — Se você quer ser meu sucessor, deve começar a aprender as responsabilidades desde cedo.

    Sua mãe, a rainha Althea, interveio com preocupação em seus olhos. — Ainda é cedo demais, Ultan. Ele só tem treze anos!

    Ultan cortou sua esposa com um gesto impaciente. — Fique em silêncio, Althea. É melhor se preparar, Lumur. Em uma semana, você partirá com a guarnição.

    Naquela noite, Lina tentou se aproximar de Lumur para confortá-lo, mesmo temendo pela reação dele. O garoto, embora visivelmente assustado, não deixou de sorrir para ela. Eles conversaram até tarde, compartilhando palavras de conforto.


    Seis meses se passaram desde que Lumur partiu para a guerra. Quando ele retornou, Lina correu para recebê-lo com alegria e saudade. No entanto, o irmão a tratou com frieza e indiferença.

    Ele se isolou em seu quarto, recusando-se a falar ou interagir com alguém.

    Foi então, que vagando pelo castelo, ela escondeu-se atrás de uma porta, ouvindo uma conversa entre Ultan e um de seus oficiais.

    O oficial revelou que forçaram Lumur a matar meninos da idade de Lina, ameaçando usar a menina como punição caso ele não obedecesse.

    A reação de Ultan foi de aprovação, sorrindo e elogiando a ideia.

    O amor fraternal entre os irmãos foi destruído naquele momento.

    O príncipe se tornou distante e amargo, sua relação com Lina deteriorando-se rapidamente.

    A notícia de que a imperatriz estava grávida chegou aos ouvidos de Lumur. Ainda que fosse uma informação sigilosa para o público, ele havia escutado Ultan confessar a um conselheiro sua esperança de que o filho que estava por vir fosse um menino.

    Ele expressou o desejo de que, se o reino fosse colocado nas mãos de Lumur, seria o seu fim.

    Aquilo foi a gota d’água para o príncipe.

    Consumido pela raiva e frustração, ele se entregou totalmente ao treinamento, dedicando-se intensamente para provar seu valor.

    Seus esforços foram reconhecidos quando ele foi selecionado para se tornar um membro do Lótus, uma honra inigualável. Ainda assim, Ultan insistiu em menosprezá-lo, afirmando que seu irmão recém-nascido, Loaus, seria moldado para ser o verdadeiro herdeiro e um rei digno.

    Desiludido e ferido pelas constantes rejeições e traições de seu pai, Lumur tornou-se determinado a provar seu valor e reivindicar seu lugar como um líder digno, independentemente das expectativas e preconceitos de seu progenitor.


    Na noite em que a capital de Ultan ardia em chamas, Lumur permanecia em pé, orgulhosamente posicionado no topo de um morro, observando o espetáculo de destruição diante de seus olhos.

    Para ele, se aquele império não pudesse ser seu, então não seria de mais ninguém. Lumur havia almejado elevar a grande cidade de Ultan a um novo patamar de grandiosidade, mas agora, tudo aquilo parecia irrelevante. Ele acreditava que conseguiria alcançar seus objetivos ambiciosos em outro lugar, sob outras circunstâncias.


    Foi assim, sendo sagaz e ardiloso que ele havia traído e enganado o imperador do sul. Assim que assumiu o comando do exército, Lumur deu um golpe audacioso, destituindo o imperador e tomando o controle do vasto território para si.

    Ele conseguiu forjar alianças poderosas, uma das quais se revelou ser com um dos apóstolos do deus dos mortos.

    No entanto, apesar de todos os desafios, Lumur emergiu como o único sobrevivente. Todos os que o desafiaram ou que tentaram manipulá-lo foram aniquilados, mas ele permaneceu de pé, inabalável em sua resiliência.

    Em sua mente, ele havia finalmente superado seu pai. Afinal, ele ainda estava vivo, enquanto Ultan jazia derrotado e em breve seria esquecido pelo tempo.

    Agora, o imperador Lumur havia provado a si e ao mundo que tinha o poder de enfrentar qualquer adversidade, manipular as circunstâncias a seu favor e emergir como o verdadeiro líder e guerreiro que ele sempre soube que poderia ser.

    Ao menos era nisso que ele acreditava.

    [Atualmente.]

    Através de uma grande janela adornada com vitrais coloridos que lançavam reflexos rubros e dourados por toda a sala, Lumur contemplava seu vasto império estendendo-se até onde a vista podia alcançar.

    Vestido com roupas grossas vermelhas que contrastavam com sua pele pálida, ele ostentava uma coroa que reluzia com a luz do entardecer.

    A cidade abaixo dele era um emaranhado de construções imponentes e torres altaneiras, com rios serpenteando e florestas densas ao longe.

    Um dos conselheiros adentrou a sala com um semblante sério e respeitoso. — Majestade, Elnan está aqui — anunciou ele com uma reverência.

    Dos fundos da sala, surgiram Saeliel e Elnan.

    Elnan, com sua postura altiva, disse — Miogve aceitou o trato, Majestade.

    Lumur assentiu lentamente, um sorriso astuto e calculista brincando em seus lábios. — Excelente — disse ele. — Seus olhos faiscando com a antecipação do que estava por vir.

    Saeliel tomou a palavra.

    — Abriremos um portal para que uma parte do exército dos Elfos possa marchar diretamente até Runyra.

    Lumur inclinou a cabeça, pensativo. — Por que não abrir o portal diretamente em Runyra? — questionou ele.

    Elnan avançou um passo, seu olhar penetrante encontrando o de Lumur.

    — A capital é indestrutível, Majestade. Há muitas manas poderosas concentradas lá. Precisamos minar a força de Runyra primeiro, antes de um ataque direto.

    O imperador soltou uma risada suave e sombria. — Vencer Runyra nunca foi a minha intenção — disse ele com um brilho malicioso nos olhos. — Quero que Runyra e os Elfos Negros se destruam mutuamente. Assim, poderei ficar com os despojos.

    Saeliel franziu o cenho, visivelmente preocupado.

    — Majestade, esteja ciente dos riscos. Você está pensando grande demais e isso pode se voltar contra nós.

    Lumur olhou para eles com um ar de superioridade. — Vocês estão dispensados.

    Sem hesitar, Saeliel começou a entoar palavras antigas e poderosas, e um portal arcano começou a se formar diante deles.

    Com um último olhar para Lumur, Saeliel e Elnan atravessaram o portal, deixando Lumur sozinho em sua sala, imerso em seus planos ambiciosos.

    No canto mais escuro da sala, um pequeno ratinho de pelagem acinzentada observava atentamente a conversa entre Lumur, Saeliel e Elnan. Suas pequenas orelhas tremiam, captando cada palavra sussurrada e cada risada silenciosa. Quando a conversa terminou e os dois conselheiros partiram através do portal, o ratinho rapidamente se deslocou em direção a um pequeno buraco na parede. Ao entrar no buraco, o ratinho se desfez em uma nuvem de energia mágica.

    Longe dali, em uma taverna iluminada apenas pela luz fraca de uma vela, Lina estava sentada na cama, meticulosamente limpando sua espada.

    A pequena Eilika se agitou, seus olhos brilhando com urgência.

    — Mestra Lina — sussurrou Eilika com uma voz aguda. — Lumur se aliou aos Elfos Negros. Eles planejam criar portais para minar as defesas de Runyra!

    Lina parou o que estava fazendo, seus olhos se estreitaram com determinação. — Então ele vai mesmo tentar forçar isso… — respondeu ela, colocando sua espada cuidadosamente ao lado. — Celeste já está se preparando para a batalha. Você deveria fazer o mesmo.

    Eilika assentiu com a cabeça, seu pequeno rosto sério.

    — Tem mais uma coisa, mestra… Aquele homem que você feriu quando salvou os filhos do senhor Colin, ele está ajudando Lumur…

    Lina assentiu.

     — Amanhã mataremos o imperador do sul, o meu irmão — disse ela com determinação.

    Lina pegou sua espada novamente e continuou a limpá-la. — Amanhã, daremos o primeiro passo para limpar o nome dos Ultan.

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