Índice de Capítulo

    Guardas anões, figuras troncudas envoltas em aço polido que cintilava à luz bruxuleante das tochas presas às paredes rochosas, patrulhavam de um lado para o outro, seus rostos barbudos tensos sob os elmos.

    Mais ao fundo, onde as sombras eram mais densas, uma forja colossal rugia como uma besta enjaulada, seu sopro incandescente dando forma às armas demoníacas do exército de Rogdruth.

    E ali, acorrentado diante da fornalha ardente, estava um imenso dragão vermelho.

    Cicatrizes profundas, como ravinas escuras, marcavam suas escamas escarlates. Estacas de ferro maciço, grossas como troncos de árvores jovens, estavam cravadas cruelmente em seus membros e asas, prendendo-o ao chão de pedra.

    Seus olhos, fendas reptilianas, ardiam com um ódio tão antigo e quente quanto as chamas que era forçado a cuspir.

    Com um suspiro relutante e estremecido que pareceu vir das profundezas da terra, o dragão inflou seus pulmões poderosos e vomitou um rio de fogo líquido no coração da forja, transformando o metal frio em brasas.

    O clarão súbito lançou a caverna em um jogo de luz e sombras, revelando dezenas de ferreiros anões, o suor brilhando em suas testas largas, martelando o aço incandescente sem descanso, moldando a morte para as legiões do abismo.

    Escondido nas sombras perto da entrada, Ardan agarrou o braço de Colin.

    — É aqui, senhor… a forja.

    Colin deu um aceno curto. — Fica aí escondido, garoto. Não sai por nada. — Antes que Ardan pudesse sequer piscar, Colin tornou-se um borrão.

    Moveu-se com uma velocidade que desmentia seu tamanho. Os dois guardas anões mal tiveram tempo de registrar o vulto antes que seu mundo se apagasse.

    Um estalo doentio, um borrifo escuro no ar, e dois corpos sem cabeça baquearam pesadamente no chão de pedra.

    A martelada cessou.

    As bigornas silenciaram.

    Dezenas de rostos anões viraram-se, olhos arregalados de pavor. Ferramentas caíram de dedos trêmulos, retinindo no chão.

    Então, veio o arquejo coletivo, seguido por pânico puro. Gritos ressoaram enquanto os ferreiros se atropelavam, tropeçando uns nos outros em sua fuga desesperada, abandonando a forja.

    Colin caminhou calmamente em direção ao leviatã acorrentado, ignorando os cadáveres.

    Parou a uma distância respeitosa da cabeça maciça do dragão, o calor que irradiava de suas escamas formigando em sua pele.

    — Tenho uma proposta pra você — declarou Colin.

    O dragão abaixou lentamente a cabeça, o movimento acompanhado por um som de pedras rangendo.

    Uma onda de ar superaquecido, com cheiro de enxofre, atingiu Colin, agitando seus cabelos e roupas.

    — E quem seria você a voz retumbou, profunda e ressonante, fazendo o próprio ar vibrar, — para se dirigir a mim, inseto?

    — Meu nome é Colin. Sou o rei lá de cima, da superfície — respondeu ele, sustentando o olhar impiedoso do dragão sem vacilar.

    Uma risada baixa começou no fundo do peito do dragão, rapidamente se transformando em uma gargalhada retumbante, que sacudiu a terra e ecoou pelas paredes da caverna, fazendo pedrinhas soltas rolarem no chão.

    — Um rei? — rugiu, o som tingido de amargo divertimento. — Um reizinho da superfície! Vocês… sempre achando que são donos de tudo… E o que um verme coroado como você quer com um dragão acorrentado, me diga?

    — Posso te soltar daqui — disse Colin. — Mas vou precisar da sua ajuda em troca.

    O divertimento do dragão desapareceu, substituído por um rosnado que revelou fileiras de dentes assustadoramente pontiagudos.

    — Me libertar?! Para quê? Para trocar um mestre por outro?! Prefiro apodrecer acorrentado aqui do que servir a mais alguém!

    “Errei na abordagem”, pensou, percebendo que mencionar sua realeza só alimentara o desprezo da criatura.

    Um dragão acorrentado, humilhado, não se renderia a outro símbolo de domínio.

    Ele respirou fundo, ajustando a postura.

    Se queria negociar, teria que falar a língua do dragão, não como um rei, mas como alguém que entendia o sabor amargo da servidão. 

    “Preciso apelar para o orgulho dele, não para a submissão”, concluiu.

    — Não vim te obrigar a nada — disse Colin, dando outro passo cauteloso, ignorando o rosnado de aviso. — Pensa um pouco. Você não quer sentir o vento nas suas asas de novo? Ver o céu de verdade? Não tô pedindo pra você me seguir ou me servir. Só preciso que você cause um… estrago. Uma distração bem grande. Depois disso, você tá livre. Vai pra onde quiser, faz o que quiser.

    O dragão silenciou, suas pupilas fendidas se estreitando enquanto estudava Colin.

    — Só um idiota completo acreditaria numa palavra sua, mestiço — retumbou finalmente. — Você fede à mentira.

    “Tsc… essa lagartixa de merda…”

    — Não tô pedindo pra acreditar — retrucou Colin. — Eu vou te soltar. Agora. Se você vai me ajudar ou só sair voando por aí, a decisão é sua.

    O dragão permaneceu imóvel, ponderando.

    Colin não esperou por uma resposta.

    “Espero que ele não me cause problemas.”

    Aproximou-se da estaca de ferro maciço mais próxima, que prendia a pata dianteira do dragão, agarrou o metal frio e puxou com toda a força.

    Swin!

    “Entendi… isso não é ferro comum… tem minério de ante-magia nisso.”

    Colin a arremessou para o lado, o ferro pesado retumbando ruidosamente no chão.

    Ele passou para a próxima e para a seguinte. De seu esconderijo, Ardan observava, o coração martelando no peito.

    Ele ouvira as histórias, claro — toda criança do subterrâneo conhecia o Dragão da Forja — mas vê-lo ali, tão perto, sentir o calor e o poder bruto… era avassalador.

    Clang!

    A última estaca atingiu o chão.

    Colin recuou enquanto o dragão, lenta e cautelosamente, flexionava seus membros.

    Ergueu sua cabeça colossal, e uma pequena nuvem de fumaça e brasas escapou de suas narinas.

    Então, sacudiu seu corpo imenso violentamente, como um cão molhado se livrando da água, escamas chacoalhando, poeira voando.

    — Você é um completo imbecil, sabia? — retumbou o dragão, virando seu olhar ardente de volta para Colin. — Soltar uma criatura como eu sem nenhuma garantia?

    — Você tá livre — repetiu Colin simplesmente, já se virando para sair.

    — Espere! — o rugido do dragão o deteve. — Qual o seu nome, mestiço?

    Colin olhou para trás por cima do ombro. — Colin.

    O dragão inclinou a cabeça, uma expressão pensativa, quase curiosa, em seus olhos.

    Suas vastas asas começaram a se desdobrar lentamente, majestosamente, preenchendo parte da caverna.

    — Muito bem… Colin, rei mestiço da superfície — retumbou, o nome soando estranho em sua língua antiga. — Você me deu minha liberdade. Vou te dar sua ‘confusão’. Considere um… agradecimento.

    Com um bater ensurdecedor de suas asas colossais, o dragão se lançou ao ar.

    O vendaval resultante varreu parte da caverna, arremessando ferramentas, faíscas e detritos soltos. Andaimes de madeira estalaram e desabaram.

    Ardan quase foi arrancado de seus pés, agarrando-se desesperadamente a uma saliência rochosa. Enquanto o dragão subia em direção à saída da caverna, Ardan correu até Colin, os olhos arregalados de excitação.

    — Você conseguiu!

    Colin assentiu. — Vamos voltar, Ardan. A coisa vai ficar feia agora.

    — C-certo! — gaguejou o garoto, virando-se e correndo.

    “Merda…”, pensou Colin. “Essa palpitação… tô ficando excitado!”


    A câmara pulsava com o baixo zumbido do medo.

    Centenas de almas se amontoavam no vasto espaço mal iluminado, um mar de rostos pálidos buscando consolo nos outros.

    Sussurros percorriam a multidão, preces, garantias, soluços.

    Crianças agarravam-se firmemente às pernas de suas mães. Anões idosos trocavam olhares preocupados. Adolescentes tentavam projetar bravura, mas suas mãos trêmulas denunciavam seu terror.

    Colin e Ardan deslizaram pela entrada, os últimos a chegar.

    Samantha imediatamente abriu caminho pela multidão em direção a eles, seu rosto marcado pela ansiedade.

    — E então? Deu certo?

    Colin deu um aceno curto. — Sim. O dragão vai ajudar. Agora… a última parte. — Ele olhou para Morwyna.

    — Tá! Minha vez!

    Ela fechou os olhos, a testa franzida em concentração.

    Runas, brilhando com uma suave luz esmeralda, floresceram em sua pele. A luz fluiu para fora, banhando as paredes da caverna.

    Com um gemido baixo, a própria caverna começou a se mover e a mudar.

    As paredes se esticaram para cima, engrossando, sua superfície áspera alisando-se em cristal multifacetado e translúcido, como diamante.

    Do centro do chão da câmara, um pilar de pedra bruta começou a se erguer, crescendo firmemente, alcançando o recém-formado teto cristalino.

    — Senhor Colin, o resto é com você!

    — Certo.

    Colin caminhou até o totem de pedra recém-formado e pousou a mão direita espalmada em sua superfície fria. Instantaneamente, as intrincadas tatuagens rúnicas que cobriam seu braço irromperam, brilhando com uma luz alva feroz que baniu as sombras e preencheu a câmara de cristal.

    A luz pulsou para fora, fluindo para o chão.

    Onde o cristal encontrava a luz, ele amolecia, transformando-se. Facetas lisas e duras derreteram, substituídas por grama macia e verde vibrante que se espalhou rapidamente por todo o chão.

    Uma brisa suave, com um cheiro impossível de sol e flores silvestres, os açoitou, e uma luz dourada e quente, como a de uma tarde de verão perfeita, banhou os rostos atônitos dos refugiados.

    Arquejos de espanto e soluços sufocados de alegria ondularam pela multidão.

    — É quente… — sussurrou uma mulher, lágrimas escorrendo pelo rosto, enquanto inclinava a cabeça para trás, absorvendo a luz solar artificial. — O sol… eu nem lembrava mais como era…

    Colin observou suas reações — a maravilha, o alívio, a emoção crua.

    Então, sua voz cortou os murmúrios, firme e clara.

    — Isso aqui é um plano simulado. Um refúgio. Enquanto essas paredes de cristal e esse totem aguentarem, vocês estão seguros aqui dentro. Ancorei com a minha própria mana. Mesmo que eu não esteja por perto, isso aqui vai se manter.

    Ele varreu a multidão com o olhar, vendo o medo substituído, pelo menos por enquanto, por uma esperança frágil.

    — Certo. Agora a gente tem que ir. — Ele se virou para sair, mas antes que pudesse dar um passo, os irmãos mais novos de Ardan correram para frente, envolvendo suas pernas magras em torno das dele, agarrando-se com força.

    — Por favor… toma cuidado, senhor Colin… — implorou a menina mais velha, a voz tremendo.

    Colin sentiu as mãozinhas dos irmãos de Ardan se agarrando a ele, os dedos finos tremendo de medo.

    Por um instante, o mundo ao redor pareceu desbotar-se, e ele os viu, os rostos de seus próprios filhos, borrados pelo tempo, mas ainda nítidos na memória.

    A garganta apertou.

    Quanto tempo já havia passado? Semanas? Meses? As feições deles começavam a se desfazer em sua mente, como tinta lavada pela chuva.

    Lembrava do riso de Brey, da voz de Tobi tentando soar corajoso.

    “Já tem tempo desde que os vi…”

    Colin agachou-se, colocando o rosto no nível do deles, então abriu um sorriso gentil.

    Ele levou a mão ao pescoço, desprendendo o medalhão de metal simples e desgastado, e cuidadosamente o colocou sobre a cabeça do menino.

    — Isso aqui é importante pra mim — disse ele. — Quero que vocês cuidem dele até eu voltar pra buscar, tá bom?

    Os olhos das crianças se arregalaram. Assentiram vigorosamente, seus rostinhos subitamente preenchidos por um propósito solene.

    — Vamos cuidar sim! Prometemos!

    Ardan deu um passo à frente. — Vamos rezar por você, senhor.

    Colin sorriu outra vez, batendo levemente no ombro de Ardan.

    — Valeu, garoto. A gente se vê depois. — Ele olhou para Wenrik e Thrain, que estavam perto da borda da multidão. — Vocês dois ficam. Se a coisa apertar aqui, eles vão precisar de vocês. — O velho e o anão assentiram.

    As runas dos braços de Colin brilharam novamente.

    Ele olhou para Morwyna, Samantha e Yllastina. — Tá na hora. — Ele encontrou os olhos delas, um por um. — Lembrem-se do plano. Se a coisa ficar feia lá fora, se parecer que não vai dar… vocês fogem. Caiam fora. Sem heroísmo idiota. Isso não é um pedido, é uma ordem.

    As três assentiram. Com um último olhar aos refugiados, o grupo atravessou a barreira cintilante.

    O contraste foi brutal.

    Do paraíso artificial, voltaram aos túneis subterrâneos, escuros, úmidos e frios. Mofo substituiu o aroma de grama, silêncio engoliu as risadas das crianças.


    No alto da torre negra sobre a cidade devastada, Kuz’geg permanecia em seu círculo mágico, runas sangrentas pulsando ao redor. Seus olhos esverdeados vasculhavam Gheskou.

    “Tem algo errado… a magia no ar está oscilando.”

    Um movimento nas sombras captou sua atenção, seguido por um rugido que fez a torre vibrar.

    Um dragão vermelho colossal, escamas brilhando como rubis, alçava voo livre das correntes que o prendiam.

    — Como diabos aquela lagartixa se soltou? — rosnou Kuz’geg, irritado.

    Ig’drolluuth murmurou um nome que ambos conheciam bem:

    — Colin…

    Kuz’geg ergueu seu cetro, formando uma esfera de sangue vivo, pronta para ser lançada. Estava prestes a disparar quando um estrondo ensurdecedor sacudiu a cidade.

    BOOOOM!

    Um clarão iluminou a escuridão da caverna. Da fumaça emergiu um dragão feito de eletricidade pura, raios dançando por suas asas translúcidas. Sobre sua cabeça, estava Colin — casaco esvoaçando, postura confiante beirando a arrogância.

    — Ora, ora, interessante… — murmurou Kuz’geg com um sorriso torto.

    Rogdruth, em seu trono de ossos, inclinou-se animada.

    — Eu sabia que ele viria! — exclamou como criança empolgada. — Chamem a horda! Quero ver o que ele faz!

    Colin saltou do dragão elétrico, que se desfez em faíscas azuladas, iluminando brevemente as ruínas. Suspenso no ar, abriu os braços, liberando uma aura elétrica avermelhada que fez a torre tremer.

    Em queda livre, seus dedos traçaram selos no ar. Um círculo mágico gigantesco rasgou o céu sobre Gheskou, e os horrores invocados de Colin começaram a chover.

    Centenas de lobos gigantes com dentes do tamanho de espadas, mantícoras aladas, ursos do tamanho de casas, dragões e dezenas de Terrasques, as lendárias máquinas de destruição, despencaram em direção à terra, com impactos obliterando edifícios e enviando tremores pelo chão.

    Kuz’geg franziu a testa, todos os seis olhos se estreitando.

    — Será que ele já sabia…? — murmurou Kuz’geg, desconfiado.

    Com um estalar de dedo casual, Colin desapareceu e reapareceu instantaneamente diante deles. Antes que seus inimigos reagissem, envolveu o punho com raios vermelhos e atingiu o rosto de Kuz’geg.

    CABRUM!

    O som foi como um trovão.

    Kuz’geg foi levantado do chão e arremessado para trás, atravessando a parede do palácio com força suficiente para fazer a estrutura de pedra antiga gemer e desabar parcialmente em uma nuvem de poeira e detritos.

    Colin pousou levemente próximo à sacada agora danificada, um pequeno círculo de invocação brilhando sob seus pés, um sorriso convencido estampado no rosto.

    Do outro lado, Rogdruth e Ig’drolluuth estavam correspondendo ao seu sorriso com sorrisos predatórios.

    Dos escombros emergiu Kuz’geg, destroços levitando ao seu redor como satélites. Seu corpo perfeito não tinha arranhões — apenas uma pequena rachadura na armadura de sangue onde o punho de Colin havia conectado.

    — Eu estava com saudade de encarar gente que sabe brigar de verdade — comentou Colin, estalando os dedos.

    Kuz’geg ergueu seu cetro e, com um gesto imperioso, convocou seu exército. De todos os cantos da cidade em ruínas brotaram milhares de criaturas demoníacas — seres deformados com garras, presas e tentáculos, infestando Gheskou como praga.

    “Interessante”, pensou Kuz’geg. “À primeira vista, parece só um mestiço comum… quanto de mana ele tem? E quão forte é para rachar minha armadura de sangue? Um monarca talvez? Não consigo ler seus status… A ligação com Kag’thuzir deve estar interferindo nisso. Esse homem… é perigoso!”

    — Temos que acabar com ele, agora! — ordenou aos outros. — É nosso dever, como as três criaturas mais poderosas do abismo abaixo dos apóstolos.

    Os três se posicionaram, auras de poder distorcendo o ar. Kuz’geg ergueu seu cetro, runas brilhando enquanto canalizava mana quase infinita.

    Ig’drolluuth desembainhou sua espada serpenteante, a lâmina contorcendo-se como se ansiasse por sangue.

    Rogdruth girou sua espada colossal com assustadora facilidade.

    Abaixo, com um rugido que sacudiu quase toda Gheskou, o dragão vermelho recém-libertado desceu em voo rasante, banhando a horda demoníaca em fogo.

    Chssssss!

    As invocações de Colin se juntaram a carnificina.

    “Príncipes do abismo, certo? Se eu conseguir derrubá-los, isso significa que estou cada vez mais perto de derrotar Drez’gan. Essa excitação… espero que me deem uma luta incrível!”

    — Não me decepcionem!

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