Índice de Capítulo

    A névoa cerrada, como um véu de sombras, se enroscava em torno de Ryan, abraçando-o com seus dedos invisíveis. Cada passo sobre a estrada de pedra, antes majestosa e agora despedaçada pelo inexorável passar dos séculos, ressoava como um lamento mórbido.

    A vegetação morta, retorcida como almas penadas, estendia-se em busca de algo que já não mais existia.

    Os olhos do sacerdote, inquietos e alerta, sondam o nevoeiro. Ele sentia presenças ocultas, os olhares famintos que o seguiam. Olhos que o observam com intenções que não podiam ser decifradas, mas que certamente não eram anda benevolentes.

    Suor escorreu pela testa de Ryan, e seus instintos sussurravam: “Volte, fuja deste lugar amaldiçoado.” Mas ele não podia.

    Algo o impulsionava adiante, uma força cruel que o arrastava para o coração da escuridão.

    E lá, emergindo das brumas como um pesadelo esculpido em ossos, estava o castelo.

    Suas torres retorcidas perfuravam o céu anuviado como garras de um dragão ancião. As muralhas, feitas de ossos empilhados, pareciam sussurrar liturgias diabólicas.

    Os soldados, vestidos em armaduras negras, moviam-se como espectros, seus olhos esmeralda brilhando com uma luz sobrenatural.

    Ryan avança, seus passos ecoando na entrada aberta.

    Um salão se revela à sua frente, uma câmara de pesadelos esculpida em pedra e ossos. As paredes eram adornadas com tapeçarias desbotadas e retratos rasgados.

    À medida que Ryan adentrava, o ar se tornava mais denso, como se os próprios mortos sussurrassem em sua orelha.

    No centro do salão, o trono repousava como um altar profano.

    Era feito de ossos humanos, entrelaçados com crânios e costelas. O assento, forrado com pele ressequida, e o encosto exibia espinhas vertebrais que se entrelaçam como cipó.

    O trono parecia ter sido moldado pelas mãos de algum deus insano, um artesão da morte.

    E lá estava ela, Thaz’geth, deitada despreocupadamente no trono, como uma aranha em sua teia.

    Uma maçã podre repousava em sua mão coberta por uma manopla, e ela a mordeu com dentes afiados como punhais. O suco escorreu por seus lábios, manchando-os de vermelho-escuro.

    — O que um dos seguidores de Braz’gallan está fazendo aqui? — indagou Thaz’geth, seus olhos esmeralda perfurando a alma de Ryan.

    Ele gaguejou, suor escorrendo por sua testa.

    — Eu… não estou conseguindo entrar em contato com meu mestre, senhora Thaz’geth — murmurou ele, quase inaudível.

    A maçã podre que ela mordiscava parecia mais apetitosa do que qualquer coisa que Ryan já vira.

    Thaz’geth assentiu, jogando o caroço da fruta ao chão com desdém.

    — Faz semanas que não tenho contato com o abismo. Ficar aqui, nesta ilha isolada do mundo, está ficando entediante — disse ela, como se a eternidade fosse apenas um incômodo passageiro.

    Ryan, desesperado para não ser esquecido, ousou sugerir:

    — Eu posso ajudar…

    A Senhora dos Ossos se sentou no trono de ossos entrelaçados, suas longas pernas cruzadas com graça sob o manto negro. Seus olhos permaneciam fixos em Ryan, como se o estivessem avaliando.

    — E como você faria isso? — perguntou ela, sua voz tão afiada quanto as lâminas que adornavam o trono.

    Ryan reuniu coragem, engolindo em seco.

    — O homem que derrotou meu mestre tem sido um empecilho em meu caminho. Kag’thuzir não é sua única aliada poderosa. Existem outros — explicou, tentando soar confiante.

    Thaz’geth inclinou a cabeça, um sorriso sutil curvando seus lábios pálidos.

    — Consigo sentir o poder de Kag’thuzir daqui. Entendo por que Drez’gan a escolheu para ser sua consorte. — Ela riu, um som que ecoou como ossos se chocando. — Isso até me deixa com um pouco de inveja.

    Ryan prosseguiu, escolhendo cada palavra com cuidado.

    — Há um homem poderoso que no momento é inimigo de Kag’thuzir e seu marido. Um homem que poderíamos ter como aliado. Ele é Milveg, o rei dos Elfos Negros.

    A apóstola arqueou uma sobrancelha, interessada.

    — E o que ele tem de especial?

    Ryan respirou fundo, sabendo que estava prestes a selar seu destino.

    — Ele é provavelmente o usuário da pujança mais poderoso vivo — respondeu, sua voz mais firme agora.

    Thaz’geth ergueu-se de seu trono de espinhas e crânios, e o salão pareceu encolher sob sua presença.

    Seus passos eram pesados, como se cada um deles deixasse uma marca indelével na própria essência do castelo. Ryan, ajoelhado diante dela, sentiu a pressão do mundo sobre seus ombros.

    Era como se um colosso ancestral tivesse despertado e agora o observasse com olhos famintos.

    Thaz’geth estendeu a mão, e seus dedos longos acariciaram a cabeça de Ryan. Ele tremeu, sentindo-se minúsculo e insignificante.

    A apóstola não era mais uma figura distante; ela era a personificação da morte.

    — Você não é mais o cachorro de Braz’gallan — declarou ela, sua voz reverberando pelo salão vazio. — Agora, você é meu cãozinho. Tudo o que digo é uma ordem, e você obedece.

    Ryan se levantou, suas pernas trêmulas.

    Thaz’geth, com um sorriso cruel nos lábios, lançou-lhe uma tarefa.

    — Crie um portal até o lar desse homem, Milveg. Quero ver se ele é realmente tudo isso.

    O desafio estava lançado.

    Ryan estendeu o braço, concentrando-se em sua mana.

    Thaz’geth, por sua vez, ergueu o braço, e sua espada veio voando dos recônditos sombrios do salão até sua mão.

    A lâmina era negra como a noite sem estrelas, e seu fio parecia cortar não apenas a carne, mas também a alma.

    — Finalmente, vou esticar um pouco as pernas — murmurou ela, como se a imortalidade a tivesse deixado entediada.

    O portal se abriu com um brilho sinistro, uma fenda na realidade que levava a algum lugar além das estrelas. Thaz’geth, com sua espada em punho, deu um passo à frente. 

    Ryan e Thaz’geth emergiram do portal, suas formas obscurecidas pelas nuvens densas que os envolviam.

    Abaixo, a cidade se estendia como um mosaico de luzes cintilantes, um oásis de vida e energia em meio ao desolado éter que haviam deixado para trás. Thaz’geth, com seus olhos esmeralda, observou a cena com um olhar de aprovação.

    — Nada mal a mana dele — murmurou ela, como se estivesse avaliando um tesouro recém-descoberto. Ryan, ainda atordoado pela transição entre mundos, concordou com um aceno.

    A habilidade dela em perceber a essência mágica de outro ser era impressionante.

    — É incrível que você consiga sentir a mana dele de tão longe… — comentou Ryan.

    Thaz’geth sorriu enigmaticamente, como se guardasse mistérios em suas entranhas.

    — Esse é apenas um dos meus muitos talentos — respondeu ela, e o sorriso se alargou. — Mas agora, meu cãozinho Ryan, temos um propósito. E esse propósito nos leva à cidade lá embaixo.

    Thaz’geth avaliava o cenário urbano. As torres se erguiam como dedos de pedra, e os sons da vida Élfica chegavam até eles como murmúrios distantes.

    — Dessa distância será perfeito — disse ela, quase para si mesma. — O usuário mais forte da pujança, não é?

    Ryan assentiu. Milveg, o rei dos Elfos Negros, era uma lenda entre os praticantes da pujança. Seus feitos eram cantados em tavernas e sussurrados nas câmaras secretas dos magos.

    Thaz’geth ergueu sua espada, e raios esverdeados dançaram ao longo da lâmina. Uma esfera de energia começou a se formar na ponta, pulsando com um poder aterrorizante. Mas antes que pudesse liberá-la, uma voz cortou o ar.

    — O que vocês estão fazendo aqui? — A voz de Milveg soou clara e imponente, e ele surgiu no céu, flutuando sobre um círculo mágico brilhante.

    Thaz’geth o observou com interesse, admirando sua velocidade.

    — Bem na hora… — disse ela. — Estamos aqui para negociar. Ou talvez para lutar. Depende de como você verá nossas intenções, Elfo.

    — Quem são vocês? — ecoou a voz de Milveg, olhos estreitados, avaliando os recém-chegados.

    Thaz’geth respondeu com um sorriso desdenhoso, como se a própria arrogância fosse sua armadura.

    — Eu sou sua senhora — declarou ela —, e você será meu cãozinho.

    A mana ao redor de Milveg era palpável, uma força que rivalizava com a dela.

    — Foi enviada pela Rainha Ayla? — indagou Milveg, cerrando os punhos. Thaz’geth soltou uma gargalhada sombria, como se o próprio abismo risse através dela.

    — Não, eu “trabalho” para o deus morto — respondeu, e o céu ao redor deles começou a se transformar. As nuvens se agitaram, raios verdes serpenteando entre eles, anunciando a iminente batalha.

    A pressão no ar aumentava, como se os próprios deuses prendessem a respiração.

    Ryan, o observador atônito, mal conseguia respirar. A energia ao seu redor era densa, quase tangível. Ele viu Thaz’geth levantar sua espada, a lâmina crepitando com energia acumulada.

    — Milveg, né? Você será meu primeiro presente para o deus morto — declarou ela, sua voz ressoando com uma confiança absoluta.

    O rei dos Elfos Negros ergueu a mão, um círculo mágico brilhante formando-se ao seu redor.

    — Vocês cometeram um erro ao virem aqui — proclamou Milveg. — E agora pagarão por isso.

    Os raios verdes intensificaram-se, cruzando o céu como serpentes de luz, enquanto as duas forças colossais se preparavam para a batalha.

    A cidade abaixo, alheia ao confronto iminente, continuava a brilhar, um testemunho mudo da violência que estava prestes a irromper nos céus.

    Thaz’geth, com um sorriso predatório, lançou-se na direção de Milveg, sua espada crepitando com energia. O rei dos Elfos Negros respondeu em igual medida, avançando com uma velocidade surpreendente.

    CABRUM!

    O impacto de suas energias fez o ar vibrar, uma onda de choque que ressoou pela atmosfera.

    — Não precisa se segurar, Elfo, porque eu não vou!

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