Índice de Capítulo

    Os lobos marcharam pela noite toda sem interrupções. Vislumbraram aquele túnel longo que se localizava na muralha quilométrica, porém, apesar de longo, ele era estreito.

    Não havia guardas naquele lugar, então eles resolveram entrar. Continuaram no túnel por cerca de meia hora e acabaram cruzando com outras pessoas que os encaravam de maneira hostil.

    Aquele lugar não era nada receptivo como o ancião havia descrito. Assim que passaram pelo túnel, perceberam que o cenário níveo desapareceu, dando lugar a capim-verde e flores coloridas.

    O céu limpo e o sol tocavam gentilmente a pele deles. Aquilo não parecia ser natural.

    “Uma redoma mágica aqui no Norte?”

    Eles pegaram suas coisas do trenó, alimentaram os lobos e instantes depois os animais retornaram por de onde vieram. Colin sentia algumas manas pequenas ao longe, e até mesmo ele ficou impressionado. Sua análise havia evoluído bastante, a ponto de ele conseguir sentir mana em um raio de dois quilômetros.

    Com a mochila no ombro, ele jogou o capuz para trás, ainda sentindo a brisa gelada daquele lugar. Safira abriu os braços, se sentindo extremamente bem. Ela e Leona estavam alguns centímetros maiores, com destaque em Leona, que havia não só ficado alguns centímetros maior, mas seu corpo também havia ganhado volume.

    Usuários da pujança eram conhecidos por seus corpos rígidos e, ao mesmo tempo, belos. Eram a excelência física dentre os usuários de árvores, sempre chamando atenção com seus corpos belos e esculturais.

    Leona conseguiu um corpo feminino e cheio de curvas, mas, ao mesmo tempo, era rígido e musculoso. Ela se parecia com uma mulher de vinte anos que treinava com certa moderação, não para ganhar músculos, mas para mantê-los.

    — Mestre — disse Leona — parece que tem bastante gente nesse lugar. Talvez eles possam nos dizer como alugamos o Wyvern.

    Colin a encarou de canto de olho, e ela o encarou de volta.

    — Alguma coisa errada? — ela indagou.

    — Não. Você cresceu um pouco.

    Leona deu de ombros.

    — Se o senhor acha.

    Seguiram pelo vilarejo que mais parecia uma cidade. A cidade tinha fortes traços neogóticos. Por abrigarem anões, Elfos da neve e algumas tribos de Orcs, a cidade respirava beleza e engenhosidade.

    Naquela cidade haviam lugares famosos por todo norte, lugares como as casas dos sábios, a grande abadia do Norte, o salão dos heróis e o templo de Tyr.

    Era possível ver essas três raças nas ruas, mas elas não se interagiam entre si. Mesmo que fosse uma cidade de raças mistas, a maioria se odiava.

    Colin tentou falar com algumas pessoas, mas todas o ignoraram, mesmo que aquela cidade falasse a mesma língua que ele. Eles resolveram adotar a língua do resto do ocidente, pois comercializavam muito com imperialistas e nobres.

    Era proibido entrar em lojas específicas se não fosse residente ou tivesse uma autorização da confederação do Norte.

    Colin se viu de mãos abanando e continuou andando pelos belíssimos ladrilhos, até que saiu de toda aquela muvuca e os cenários de arrancar elogios sumiram a sua vista.

    Seguiu a esmo até parar em uma parte miserável daquela enorme cidade.

    O pequeno vilarejo em que estavam era predominantemente humano, apesar de ter outras raças naquele lugar por terem residências baratas para se viver. Os humanos não costumavam confrontar os Orcs, muito menos anões e Elfos da neve, justamente por serem a raça mais fraca dentre as quatro.

    A criminalidade naquela parte da cidade era bem alta, sem falar no número de assassinatos e crimes violentos que aumentava a cada semana.

    A população mais carente acusava os governantes de negligenciarem os humanos, já que quem ocupava majoritariamente as cadeiras da confederação do Norte eram os nobres, que em sua maioria eram Elfos da neve.

    O grupo conhecido como confederação, era um grupo constituído pelos grandes líderes e heróis do Norte.

    O Norte era um lugar livre, mas dentre eles haviam pequenas vilas e grupos esmiuçados por todo aquele território. Nas partes mais afastadas e isoladas, a confederação erguia torres de ante-magia para que invasores ficassem encurralados em terras hostis.

    Não havia um rei no Norte, mas haviam pequenas cidades estado que autodeclaravam seu governante como rei.

    Era discutido na confederação se Rontes deveria ser considerada parte do Norte, já que culturalmente Rontes era como as outras tribos do Norte e o próprio rei de Rontes tinha um assento na confederação, mas por motivos próprios ele resolveu não adentrar o grupo.

    Colin e as garotas caminharam mais um pouco olhando ao redor.

    Esta parte da cidade parecia ser organizada em pequenos vilarejos que eram separados do outro por uma enorme distância. Florestas enormes e muito mato separava um vilarejo do outro.

    Nas regiões mais afastadas do grande centro, ficava mais nítido o ódio entre as raças.

    Os humanos, anões, Elfos da Neve e os poucos Orcs que viviam no local, tinham cada o seu canto. Normalmente esses grupos se odiavam, mas tentavam viver em harmonia.

    Elfos da neve consideravam anões e Orcs seres bárbaros, já os anões e Orcs consideravam os Elfos “almofadinhas demais”, com o seu culto a natureza, suas roupas finas e seu jeito delicado.

    Eles se dirigiram para uma taverna escura e quase vazia. Havia um homem dormindo no fundo, e um grupo de homens que riam despreocupados. Todos eles eram humanos tomando hidromel em seus longos chifres curvados.

    Os três eram loiros, altos, e vestiam túnicas grossas que iam até à altura do joelho e calças feitas de linho. Eles não eram grande coisa, mas aquele homem dormindo no fundo, tinha uma mana que se destoava dos demais.

    Colin e as garotas se sentaram em um canto e um dos homens encarou Colin de uma maneira nada gentil.

    — Boa tarde, pessoal! — disse uma garota de cabelo escuro usando um vestido de linho bordado — O que vão querer?

    — O que você me recomenda? — perguntou Colin.

    — Ah! Bem, nosso frango frito é nossa especialidade, e para acompanhar recomendo um vinho de Valéria. Temos uma safra deles que é excelente!

    Leona estava se segurando para não pedir rato frito. Embora tenha amadurecido, seu paladar continuava basicamente o mesmo.

    — Então, tudo bem. — disse Colin — Obrigado!

    A garota fez que sim com a cabeça e se retirou para os fundos.

    Colin esperava outro tipo de recepção, mas ela foi extremamente gentil com ele e suas companheiras.

    — Acham que o torneio de guildas começou? — perguntou Colin.

    Safira deu de ombros.

    — Acho que ainda não. — Ela deitou sobre os braços apoiados na mesa — Eu queria participar do torneio. Espero que o diretor revogue nossas suspensões.

    — É, eu também espero.

    Enquanto jogavam conversa fora, os três homens ao fundo cochichavam entre si.

    — É sério! — disse um deles — Aquela menina de chifres é uma Asmurg! Se a vendermos, poderemos ficar ricos!

    Um de seus amigos bebeu um gole do hidromel e olhou para o lado.

    — Aquela garota está com um Elfo negro e aquela outra mulher é o quê? Um pandoriano?

    O outro homem que até então estava quieto assentiu com a cabeça.

    — Diferente de vocês dois, eu consigo sentir magia. E posso afirmar que aquele trio está além de nossa alçada. Então continuem bebendo e esqueçam essa ideia estúpida.

    — Ouçam esse cara — disse o homem que antes estava dormindo na mesa do canto — Vocês conseguiriam perder a cabeça enfrentando qualquer um deles.

    Os três engoliram o seco.

    — Senhor Thane… se o senhor está dizendo algo assim, então quer dizer que…

    Thane assentiu.

    — Isso, esses três são fortes.

    Thane era um belo rapaz usando roupas finas de um nobre. Vestia uma túnica escura que ia até os joelhos, e por cima da túnica usava uma grossa pele de cordeiro, um legítimo símbolo da nobreza local.

    Em seu cinto grosso de couro ia sua espada ornada. Seu cabelo era loiro e brilhante e, seu porte atlético e queixo quadrado, atraia facilmente olhares. Principalmente os olhares das damas.

    Seus olhos azuis cristal hipnotizavam a qualquer um, então, era difícil dizer que a aparência de Thane não foi o principal motivo de sua vida fácil, já que ele não era um nobre de verdade, só se vestia como um.

    Com a mão apoiada no pomo de uma bela espada de prata, ele se aproximou de Colin portando um sorriso amigável.

    — Olá, estrangeiros, novos no vilarejo?

    Os três olharam para Thane sem interesse algum. Aquele foi um golpe em seu ego inflado. Nem mesmo as garotas demonstraram o menor interesse naquele homem considerado o mais belo da região.

    Ele pigarreou e abriu um sorriso de dentes brancos e perfeitos.

    — Sou Thane — se curvou — Protetor dos fracos, crianças e dos inocentes. O pessoal dessa parte da cidade me nominara de Thane, o justo. É um prazer!

    Sem ser convidado, ele puxou uma cadeira e se sentou.

    — Procurando trabalho? — indagou o Thane a Colin.

    — Não. — respondeu Colin de maneira sucinta — E você, o que quer?

    “Esse cara não tem modos?” pensou Thane enquanto encarava Colin nos olhos “Esses olhos… Esse elfo me deixa com raiva só de encará-lo!”

    Ahem! Já que não estão procurando um trabalho, eu venho sugerir um caso estejam interessados…

    — Não estamos. — respondeu Colin.

    “Esse cara… Tsc, que irritante.”

    — Senhor Elfo, me deixe ao menos dizer do que se trata o trabalho, sim?

    Colin deu de ombros.

    Se o interessasse, ele talvez ponderaria aceitar.

    — Você tem até meu almoço chegar.

    — Ah! Certo…

    “Elfo desgraçado!”

    — Bem, digamos que existem diversos problemas dentro dessa gigantesca redoma que nos cerca. Cada raça daqui à tenta se virar à sua maneira, mas para os humanos como eu isso é bem difícil. Elfos da neve são mais habilidosos com magias, Orcs são mais fortes e anões se dão bem com suas engenhocas estranhas. Resumindo, o meu povo fica à mercê da sorte aqui, se virando com o comércio de cabra, pele e Leite.

    Thane continuou.

    — Ao Leste daqui tem uma torre, localizada na floresta crepuscular. É sabido pelos habitantes do vilarejo que o senhor da torre era alguém cheio de dinheiro, e acabou enlouquecendo por causa disso. De tempos em tempos alguns voluntários organizam excursões. Até mesmo alguns mercenários participam, mas poucos voltam, os que voltam, voltam de mãos vazias — Thane cruzou os braços e suspirou — Por causa disso deixaram a torre para lá. E você sabe, a confederação também não se importa com mitos ou lendas. Deve ter ficado claro o que quero aqui, certo? Nossos equipamentos precisam de manutenção, e o povo dessa parte da cidade precisa viver. Por isso precisamos do dinheiro.

    Colin bocejou.

    Aquela não parecia uma missão perigosa. Ele já estava com um saco cheio de joias. Moedas não era um problema para ele, mas um pouco mais não iria fazer mal. Porém, algo nesse homem não lhe cheirava bem. Apesar de ser um usuário experiente de magia, o homem cheirava a problema.

    Além disso, Colin queria testar suas novas habilidades em algo menos perigoso. Outra questão era em como ele retornaria para casa, ele precisava de Wyverns.

    — Está bem, vamos lá, eu e você! — disse Colin.

    Thane arregalou os olhos.

    — E-eu?

    — Claro. Você pode estar preparando uma armadilha para mim. Safira, Leona, vocês ficarão aqui. Caso o Thane retorne sem mim, vocês podem fazer o que quiser com esse vilarejo.

    Engolindo o seco, Thane soou frio.

    A garota trouxe o frango assado e depois o vinho.

    — Depois que eu acabar de comer vamos partir, combinado?! E mais uma coisa, você vai me fornecer um Wyvern como adicional. Ele será por sua conta.

    “Elfo, filho de uma ogra!”

    — Wyvern são caros, ainda mais um domesticado. Não sei se terei dinheiro para algo assim.

    Colin puxou a coxa do frango e começou a mastigar.

    — Se essa torre tiver mesmo o dinheiro que você diz ter, então pode tirar da sua parte para me alugar um Wyvern.

    “Esse cara…”






    Assim que terminou o almoço, Thane reuniu alguns dos guardas e avisou estar indo se juntar ao Elfo na empreitada da torre. Como esperado, não só os guardas se comoveram, mas os habitantes daquela parte do vilarejo também.

    Thane protegeu aquele vilarejo contra inúmeros inimigos até agora. As pessoas temiam pela segurança dele, pois, sem ele, o vilarejo ficaria vulnerável, principalmente para os humanos.

    Ele não fazia aquilo por ser altruísta, seu objetivo era a fama, dinheiro e mulheres. Por ser belo e forte, ele conseguiu atrair as três coisas pouco a pouco.

    Sua sorte era que os poucos guardas que tinham não conseguiriam fazer frente contra um mercenário mais poderoso que quisesse fazer mal àquelas pessoas, nem mesmo conseguiriam os proteger contra um punhado de goblins.

    — Não se preocupem! — disse Thane batendo a mão no peito — Desbravaremos a torre e sairemos vivos! Tenho treinado arduamente todos os dias para esse momento — Ele tirou a espada da bainha e a ergueu no alto — Acreditem em mim! Acreditem no guardião do povo!

    Colin e as garotas encararam aquilo envergonhados.

    Thane poderia ser forte, mas seu discurso estava repleto de mentiras. Ele não treinava para entrar na torre, e tão pouco pretendia dividir o dinheiro com o povo.

    — Tem certeza que tá tudo bem você ir sozinho com ele? — perguntou Safira de braços cruzados. — E precisa mesmo ir em uma missão para alugarmos um Wyvern? A gente tem dinheiro, poderíamos comprar um sem problema.

    Colin abriu um sorriso de canto e afagou o cabelo dela.

    — Minha intuição diz que dessa vez vai dar tudo certo. Preocupada comigo?

    — Claro! Você tem uma facilidade enorme quando o assunto é se meter em problema, sem falar que quase toda vez que a gente se reencontra você está todo quebrado.

    — É verdade, mas isso foi antes. Agora estou mais forte.

    — Ela tem razão — disse Leona — A gente não vai estar com você, então tome cuidado, principalmente com esse cara.

    Colin assentiu.

    — Não se preocupem, Thane não vai ser um problema.

    Thane juntou uma mochila pequena com algumas poções de cura e suprimentos, enquanto Colin estava somente com a roupa do corpo.

    Após se despedir do pessoal, Thane se aproximou de Colin enquanto suava frio.

    — Estou pronto para ir, elfo…

    Colin deu dois tapinhas no ombro dele.

    — Não precisa se preocupar, qualquer coisa protejo você.

    — Consigo me proteger sozinho, senhor Elfo…

    — Claro, claro.

    Um grupo de garotas veio atrás deles. Elas abraçaram Thane como se estivessem perdidamente apaixonadas, tentando o segurar naquele lugar.

    — Por favor, senhor, não vá! — disse uma das moças.

    — Escuta ela, o senhor elfo negro pode dar conta disso sozinho!

    Thane adorava aquele assédio, principalmente porque já havia se deitado com cada uma delas e prometido o mundo a todas. As garotas não passavam de uma diversão momentânea.

    Ele abriu um sorriso e levantou a franja com as pontas dos dedos lançando o seu charme.

    — Senhoritas, sei que estão preocupadas comigo, mas este é meu dever como protetor do povo. Se for necessário, darei minha vida para dar uma melhor condição de vida a todas vocês.

    Em prantos, elas o abraçaram em conjunto.

    — Ei, Thane! — disse Colin levantando Thane pela gola da camisa — Chega de perder tempo e vamos logo.

    Foi a vez das garotas avançarem em direção a Colin.

    — Por favor, senhor Elfo, proteja lorde Thane!

    — Ele é o nosso herói, por favor, não deixe que nada aconteça com ele!

    Colin coçou a nuca e suspirou.
     

    — Não se preocupem — disse Colin — Protegerei “Lorde Thane” com minha vida e o entregarei são e salvo.

    Aquelas palavras tocaram-nas gentilmente. De um jeito estranho, a preocupação de todas elas se foi de uma hora para a outra.

    Elas curvaram o corpo.

    — Agradecemos profundamente, senhor Elfo.

    Colin abanou uma das mãos e colocou Thane no chão.

    — Agora vão para casa, já está ficando tarde.

    Elas olharam uma para a outra.

    — Ele tem razão, minha mãe deve estar precisando de mim.

    — É, tenho que cuidar do meu irmãozinho.

    Enfiando as mãos no bolso, Colin caminhou pela estrada, indo em direção a saída do vilarejo.

    Thane apressou o passo para alcançá-lo.

    — Ei, cara! O que você fez?

    — Nada, só falei o que seu fã clube queria ouvir.

    Thane franziu o cenho.

    — É melhor que fique longe das minhas garotas, me ouviu?

    Colin abriu um sorriso de canto e deu de ombros.

    — Relaxa, prefiro mulheres mais velhas, bem mais velhas.

    Thane espremeu a vista enquanto encarava Colin.

    — Hum… sei…

    — Acredite se quiser. Agora chega de falar de mulher, vamos logo para onde fica essa torre. Tenho que partir ainda hoje para capital.

    Com a habilidade oratória, Colin conseguia convencer aqueles de espírito fraco sem muito esforço. Era uma habilidade bastante útil. 

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