Índice de Capítulo

    As estradas estavam cheias de soldados humanos fazendo a tão temida travessia para o Oeste. Celae passou por caravanas quilométricas cheias de soldados e levando também equipamentos e armas.

    Ela havia escutado que os humanos estavam recuando, mas seus olhos estavam vendo justamente o oposto. Qualquer homem entre doze até sessenta anos era obrigado a se juntar ao exército dos humanos em sua marcha.

    Isso deixou muitas cidades desprotegidas, alvo perfeito para mercenários e salteadores, que podiam fazer o que quisessem, já que havia sobrado somente mulheres e crianças em sua maioria.

    Os crimes violentos aumentaram, assim como teve uma elevação significativa no número de roubos e crimes sexuais.

    Celae estava se virando bem para uma aventureira de primeira viagem. O tempo que passou com Coen foi essencial para que ela amadurecesse e aprendesse mais do mundo como um todo.

    Eles haviam visitado povos com culturas vastas, viram cidades colossais que se ergueram sob o mar, viram cidades submersas e raças que ela sequer sabia que existia.

    Sem esse conhecimento ela estaria provavelmente morta.

    Seguiu para um vilarejo que estava vazio, já que sem guardas ou homens, as mulheres se trancavam em casa com suas crianças.

    Por sorte, havia uma taverna aberta e Celae subiu as escadas de madeira e empurrou as portas, dando de cara com um estabelecimento completamente vazio.

    Somente a taverneira de meia-idade estava atrás da bancada limpando copos. Celae continuou com o capuz sobre a cabeça para tapar suas orelhas pontudas.

    Ela se sentou na bancada e a mulher de feição grosseira ficou esperando-a pedir algo, mas Celae não tinha dinheiro.

    — Avistei as caravanas mais cedo, para onde eles estão indo? — perguntou Celae num tom de voz meigo e gentil.

    A despatriada estava acostumada a agir daquele jeito perto de soldados e nobres. Sempre diziam a ela como ela era bonita, então ela sempre tentava ser a mulher mais gentil do mundo quando tentava fazer amizade ou conseguir algo de alguém.

    A Elfa tinha pleno conhecimento de como se desarmava um homem só pelo jeito meigo e voz doce, mas não tinha certeza se isso iria funcionar com mulheres.

    A mulher franziu o cenho e bateu com o copo na bancada.

    — E você é o quê? Uma aventureira?

    — É… mais ou menos.

    — Hum… Se quer informações, então pague por elas.

    Celae enfiou as mãos nos bolsos e os puxou para fora.

    — Eu não tenho dinheiro…

    A taverneira apontou para a porta.

    — Então dê o fora!

    A barriga de Celae roncou e ela abriu um sorriso sem graça.

    Suspirando, a taverneira coçou a nuca meio sem jeito.

    — São tempos difíceis por aqui, então o que posso oferecer a você no momento são pães dormidos e água.

    — I-Isso é o suficiente!

    — Espere aqui.

    — Tá…

    Depois de se retirar para os fundos, a mulher voltou com dois pães duros e um copo d’água. Celae não reclamou, começou a comer tudo em silêncio.

    A taverneira a encarou de cima a baixo. O rosto de Celae era delicado demais, sem falar naquelas mãos lisas sem calo nenhum. Ela não tinha o perfil de uma aventureira, muito menos de uma mulher comum, parecia mais alguém da realeza.

    — De onde você é? — perguntou a mulher.

    Celae engoliu e depois bebeu água.

    — Vim do Oeste… estava resolvendo algumas coisas por lá.

    A taverneira assentiu.

    — Pode me dizer a verdade, garota, você é filha de algum nobre, não é?

    — E-Eu? Claro que não!

    — Também é uma péssima mentirosa. Sua pele é macia, sem queimaduras de sol por trabalhar no campo. Seu cabelo não está nem um pouco ressecado, sem falar que é muito bonita. Plebeias bonitas como você costumam ter maridos ricos e por último, você parece ter um corpo bem cuidado, provavelmente é o resultado de uma boa alimentação.

    Celae ficou em completo silêncio.

    Ela havia sido lida perfeitamente.

    — E-Eu…

    A taverneira abanou as mãos.

    — Não precisa se preocupar, não contarei nada para ninguém, senhorita Elfa.

    — … Como você…

    A mulher apontou para os olhos de Celae.

    — Meu bisavô contava histórias sobre vocês, uma vez ele me disse que viajou com um Elfo, mas vocês o chamavam por outro nome… qual é mesmo? — Ela estalou o dedo tentando lembrar — Altmer, não é?

    Celae ficou surpresa ao ouvir aquilo.

    Os Elfos conhecidos como Altmer, ou Altos Elfos, foram caçados e mortos pelos próprios Elfos da floresta. Por terem predisposição natural a magia, vários clãs de Elfos se reuniram para caçá-los e exterminá-los, mas eles nunca sumiram de fato.

    Havia um boato de que os descendentes dos Altmer nasciam com olhos amarelados, mas com o passar do tempo até os próprios Elfos haviam esquecido essa história.

    A mãe de Celae tinha olhos amarelos, assim como sua irmã mais nova e outros Elfos de castas inferiores. Também haviam humanos e outros seres com essa característica, por isso, parte desse boato havia sido descartado, já que Elfos da floresta eram tão supremacistas quanto Elfos Negros.

    A ideia de pensar que espécies que não fossem Elfos carregavam o sangue dos Altmer não os descia bem, então tudo passou a ser boato.

    — Por isso ficou claro assim que bati o olho em você — disse a taverneira — Uma Elfa ou uma Altmer, do que chamo você?

    — Me chame de Celae… Só… Celae…

    A mulher assentiu.

    — Certo, Celae, por que não tira essa touca para que eu dê uma olhada melhor em você?

    Celae jogou a touca para trás.

    — Vocês são mesmo bonitos como dizem os boatos, é a primeira vez que vejo um de vocês de perto — Ela estendeu a mão para um aperto — Me chamam de Birna, muito prazer!

    — Muito Prazer…

    — Então, garota, o que faz em um lugar como esse?

    Celae enxergou seu reflexo no copo d’água.

    — Estou procurando um amigo, mas ele é do tipo misterioso que nunca fala o que está fazendo e nem me diz para onde vai.

    — Amigo, hein… se está tão desesperada assim a ponto de chegar até esse fim de mundo atrás desse “amigo”, então esse rapaz deve ser mesmo importante para você.

    Celae assentiu.

    — Ele é, mas eu nem sei por onde começar a procurar…

    — Bom, ele é do tipo que gosta de se meter em problemas?

    — Hum… não sei dizer ao certo, mas acho que sim…

    — Não sei se vai ajudar, mas a caravana que viu mais cedo estava indo em direção ao território dos vampiros. Parece que pretendem dar um fim a eles de uma vez por todas. Seu amigo deve estar indo para lá também.

    Conhecendo Coen e em como ele era cheio de segredos, talvez houvesse uma pequena chance de ele estar mesmo indo para lá. Ele era um errante, uma das frentes principais da guerra.

    Celae não aceitava a ideia do homem que amava ter índole perversa, então seguiu acreditando que ele era um homem bom, e que ele explicaria tudo em breve, uma história que fizesse sentido.

    — Certo… — disse depois de terminar o copo d’água — Acho que tenho que partir então.

    — Espere, vou pegar um pouco de comida para você levar.

    — Não precisa, eu estou bem, é sério.

    — Deixa de modéstia garota, você está partindo em direção a uma guerra desse nível e nem sequer ponderou em não ir. Esse rapaz deve ter sorte mesmo. Ao menos me deixe fazer uma última coisa por você, certo? Se for morrer, ao menos morra de barriga cheia, era o que meu avô sempre dizia.

    Celae deu um sorriso de canto e aguardou Birna retornar com uma mochila de couro surrada em mãos. Dentro, haviam frutas, mais pães dormidos e um cantil com água. Celae colocou a mochila nas costas e se preparou para partir.

    — Celae! — chamou Birna — Parece que esse é o último golpe dos humanos contra os vampiros, se falhar, então significa que estaremos todos mortos antes do inverno chegar. Você está indo pro verdadeiro inferno, então acho que isso é um adeus.

    Celae colocou a touca e ajeitou a mochila.

    — Adeus Birna, foi um prazer.

    — Digo o mesmo.

    Birna foi a primeira humana que Celae conversou na vida. Ela não a achou tão hostil como contam as histórias. Talvez humanos, Elfos e vampiros não fossem tão diferentes no fim das contas. Ambos tentavam sobreviver à sua maneira em um mundo inerte no caos.

     



     
    Ao longe, Volfizz e Bledha observavam a grande marcha rumo ao oeste. Os humanos estavam depositando suas forças em um homem e uma pirralha, já que Coen atuava nos bastidores e ninguém sabia de sua existência.

    Assustada, Bledha segurou a mão de Volfizz, já que ficaria com ela a tarefa mais difícil de todas. Era responsabilidade demais para uma criança de 10 anos, mas não havia outra pessoa apta para tal tarefa.

    — Tanta gente… — sussurrou Bledha — Será que vai ser o suficiente?

    — Não. É por isso que ajudaremos.

    — Mestre Coen vai ajudar também?

    — Coen está fazendo coisas mais importantes agora, mas não se preocupe, ele vai aparecer, ainda temos três dias antes do ataque. — Ele virou as costas — Vamos Bledha, vamos nos preparar até o dia chegar.

    — Sim senhor.

     


     
     

    No deserto do oriente, localizado em terras inóspitas, um grupo de magos estava reunido fazia décadas, preparando algo sob constante ameaça.

    Aquele era um trabalho que já durava a quase meio século.

    O trabalho se resumia em criar uma prisão de vários níveis, uma prisão com várias camadas que se conectava a vários mundos distintos, mundos cheios de perigo e seres hostis. Aquela era o tipo de construção que somente foi possível com a ajuda de um errante.

    O objetivo daquela prisão era bem simples, encarcerar a criatura mais perigosa viva.

    Coen estava ao longe observando tudo aquilo bem ao lado do arquiteto e idealizador do projeto.

    — Acredito que está tudo pronto, senhor Coen, meus homens estão ajeitando só alguns detalhes.

    — Perfeito, tudo feito no tempo perfeito. Você é mesmo bem competente, Righ Zhao.

    O oriental, usando roupas pomposas mesmo em um calor escaldante, apenas curvou o corpo em um cumprimento.

    — Senhor Coen, tem mesmo certeza de que isso consegue prender Tiamat?

    — Tenho, afinal, você fez com os “fragmentos” do fruto da árvore. Deve ser mais que o suficiente. — Coen esticou o braço e abriu um portal — Prepare seus homens, vou trazer o dragão até aqui.

    Righ Zhao engoliu o seco.

    — A-Agora senhor?

    Coen assentiu.

    — Devo chegar em um dia, é melhor que esteja pronto.

    — O senhor vai lutar com Tiamat por um dia inteiro? Isso é loucura!

    Coen deu um sorriso de canto.

    — Se concentre no seu trabalho, Righ Zhao, o resto você deixa comigo.

    — C-Certo senhor, mil perdões.

    Sem dizer mais nada, Coen atravessou o portal, indo direto para as terras vulcânicas e, ao mesmo tempo, gelados, localizadas em ilhas do extremo norte.

    Ao longe, o imponente Tiamat adormecia calmamente.

    Pela mistura de frio e calor extremo, as terras vulcânicas eram perfeitas para marinheiros, pois correntes de ventos sopravam sem parar por aqueles mares que só não ficavam congelados devido ao calor das ilhas.

    Coen retirou sua capa e deixou com que o vento forte levasse, ficando somente com sua túnica preta que não parava de sacudir.

    “Certo, vamos brincar de pega-pega pelo continente, somente eu e você.”

    Abaixo de Coen surgiu um círculo mágico de raios carmesim e instantes depois ele estava de pé em um Wyverns feito de raios vermelhos.

    Coen esticou a mão, conjurando uma lança de relâmpagos. Levou a mão lá atrás e lançou direto no dragão que despertou com aquele golpe que pareceu uma picada de mosquito.

    O errante riu de nervoso.

    Aquele mesmo golpe já havia derrubado tantos outros dragões anteriormente.

    Em tremores que abalavam toda ilha, causando erupções vulcânicas e quebrando geleiras, Tiamat, o dragão, se ergueu e abriu aquelas enormes asas negras, capaz de causar sombra a uma cidade inteira.

    — Quem é você? — perguntou o dragão num tom de voz rasgado e agressivo.

    Coen engoliu o seco e abriu um sorriso.

    — Estou aqui para capturar você, lagarto de merda!

    — Então é você que está capturando meus irmãos e irmãs. Fiquei me perguntando quando teria coragem de vir até aqui me enfrentar.

    Coen deu de ombros.

    — Esse ego gigante é bem típico dos dragões, não é? Todas as lagartixas que capturei eram bem parecidas com você.

    Tiamat bateu asas e uma ventania intensa conseguiu causar desmoronamento e afastar as grossas fumaças dos vulcões em volta dele.

    Coen conjurou uma alabarda carmesim na mão direita e outra na esquerda.

    “Então vamos lá!”

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