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    Dorothea saiu de dentro de uma árvore e Volfizz a seguiu. Eles estavam bem no centro de um vilarejo de fadas.

    — Aqui deve ser o centro da ilha — disse Dorothea com as mãos na cintura — Agora vou indo.

    — Espera, o que faço com isso? — disse ele apontando para o cubo.

    — Quebre. A gente se vê, caído.

    Ela entrou na árvore e o tronco retorceu até murchar.

    Volfizz não confiava plenamente nas moiras do pântano, mas elas não eram conhecidas por serem traiçoeiras. Sem pensar mais nada, ele quebrou o cubo com uma das mãos.

    Um gigantesco círculo mágico da cor púrpura cobriu a ilha inteira num piscar de olhos. Velejadores conseguiam ver uma enorme luz roxa aparecer no meio do mar, uma luz forte e intensa.

    A ilha das fadas não era pequena, algo como aquilo chamaria atenção mesmo a quilômetros de distância.

    Assustadas, as fadas começaram a sair de suas casas e viram um humano parado. Correntes saíram do círculo abaixo de seus pés e seguraram todo habitante da ilha das fadas.

    Acorrentados, mãos demoníacas abriram suas bocas e espectros que se pareciam com diabretes colocaram um verme asqueroso em suas bocas, o empurrando para o fundo de suas goelas.

    Foi um processo rápido que assustou todos aqueles habitantes que se resumiam a dríades, fadas, faunos, pixies, ninfas, unicórnios, gnomos, duendes e todo ser místico ligado a natureza daquele lugar. Depois de alguns segundos o círculo desapareceu, e todo ser da ilha começou a golfar sem parar.

    — Quem é você e o que fez conosco?! — perguntou um dos guardas limpando a baba no canto dos lábios.

    Volfizz olhou para as próprias mãos, e sentiu que estava ficando realmente mais forte.

    Não havia se passado nem um minuto, mas ele sentiu que aquilo estava começando a fazer efeito.

    Os guardas o cercaram e partiram para cima dele, mas antes de o atacar suas cabeças explodiram.

    As fadas gritaram desesperadas e uma correria começou.

    — Vocês têm um novo rei, é só me obedecer e deixo que vocês vivam. — disse o caído se sentindo poderoso.

    Outras fadas tentaram atacá-lo e tiveram o mesmo fim.

    — Pelos deuses, o que está acontecendo? — indagou Yasael Wrinklebud ouvindo a correria.

    Barin Wrinklebud, o seu marido, pegou sua espada e se preparou para ir para fora, mas foi impedido por sua esposa.

    — Espera querido, parece perigoso dessa vez!

    — O que tá acontecendo? — indagou Brighid sentindo uma extrema dor no abdômen — O que foi aquela luz e aquela coisa que colocaram na gente?

    — Eu não sei, volta para dentro! — ordenou Barin.

    — Amor, não vá!

    Barin se afastou.

    — Vai ficar tudo bem, eu prometo!

    Depois de se despedir com um beijo na esposa, Barin deixou sua casa, voando até o intruso com uma espada em mãos.

    Yasael e Brighid encaravam aquela cena pela janela.

    — Quem é você? — indagou Barin pairando próximo ao caído.

    — Eu já disse, sou o rei desse lugar, e você?

    — Sou o líder da guarda!

    — Entendi…

    Volfizz estalou o dedo e os miolos de Barin se espalharam por todo lugar. Sua esposa e sua filha que espiavam pela janela entraram em pânico.

    Yasael pegou Brighid e a arrastou para os fundos.

    As fadas continuaram atacando, até que a maioria se tocou que era inútil continuar avançando.

    O mundo fora da ilha era hostil, mas algumas fadas não aceitaram ter uma maldição dentro de si e ainda terem parte de sua mana drenada.

    A ilha toda se escondeu em suas casas por medo, mas não aconteceu mais nenhuma morte já que ninguém mais resolveu atacar o intruso.

    Então, no dia seguinte, algumas fadas decidiram deixar a ilha, e Brighid foi uma delas.

    Ela tentou convencer sua mãe, mas ela recusou, dizendo que ali era o seu lar.

    Depois de se despedirem, a fada deixou a ilha com algumas amigas rumo ao continente. Sua mãe não a repreendeu, ela entendeu as escolhas da filha depois de tudo que aconteceu.

     



     

    Enquanto Celae viajava com Coen, ela ouviu o que aconteceu com a cidadela dos Elfos da Floresta. Ela ficou arrasada e insistiu para voltar naquele lugar para ver se sua irmã ainda estava viva, mas sua cidade estava tomada por salteadores e coletores.

    A despatriada concluiu que ela era a última de sua linhagem.

    Ficou arrasada por dias e Coen foi seu suporte neste período difícil.

    Aquela nova era pertencia aos humanos.

    Mesmo em números excessivamente reduzidos, eles ainda eram maioria e procriavam aceleradamente.

    O exército humano de várias províncias havia sido reduzido a nada. Mercenários próximos aproveitaram a chance e invadiram vilas que agora tinham um punhado de mulheres e crianças e com uma defesa chula.

    Fundaram ali pequenos vilarejos se intitulando reis e barões de pequenos condados.

    Os regentes, recém autodeclarados, começaram a aderir a haréns com centenas de mulheres.

    Os guerreiros mais fortes eram presenteados com dezenas de concubinas. A maioria delas se entregava por livre e espontânea vontade, já que muitas tinham filhos pequenos e faziam aquilo para conseguirem alimentar a própria família no dia seguinte.

    Durantes os séculos que se seguiram, vários reinos nasceram e foram engolidos por reinos mais fortes. Os regentes mais habilidosos fundaram famílias abastardas e de guerreiros excepcionais.

    Coen engravidou Celae neste meio tempo e eles tiveram duas meninas. Uma tinha a pele clara e cabelo dourado como os de Celae, a outra tinha a pele morena e cabelos escuros como os de Coen.

    Apesar de diferentes, elas eram gêmeas.

    A loira foi dada o nome de Saphiele, e a morena o nome de Ehocne.

    A fim de ficar longe da guerra dos humanos que desenrolava no meio do continente, a família, recém-formada, viveu afastada em uma vila no recém-país formado a no máximo uma década, um país chamado Brambéria, localizado no extremo oeste do continente.

    Elfos se refugiavam em Brambéria para fugir dos humanos e seus conflitos.

    Conforme o tempo passava, a condição de Celae se tornava cada vez mais e mais crítica, chegando ao ponto de ela ter desmaios do absoluto nada e acordando dias depois.

    Coen cuidou das garotas na maior parte do tempo, e antes de completar seis anos elas já eram habilidosas no uso de magia. O errante cuidou do treinamento delas, afinal, decidiu que as entregaria para as moiras do pântano dentro de alguns anos.

    As moiras tinham um conhecimento que ele não tinha. Se as meninas ficassem com elas poderiam aprender segredos e habilidades que Coen nem imaginava existir.

    Celae começou a participar cada vez menos das atividades em família e Coen ensinou suas filhas a valorizarem a força acima de tudo, por isso muitas das vezes elas evitavam a mãe por enxergá-la como fraca, e, consequentemente, a enxergavam como um ser inferior.

    Ambas eram habilidosas, e Coen percebeu que Ehocne era como Bledha e Volfizz.

    Ela havia sido abençoada pela árvore.

    Celae, passou a ficar mais tempo sozinha, vendo pela janela do quarto suas filhas crescerem, ficando cada vez mais lindas e saudáveis.

    Por um lado, ela ficou feliz, por outro se sentiu uma completa intrusa dentro da sua própria casa. Suas filhas a evitavam de propósito, e não havia dor maior para uma mãe do que ser rejeitada pelos próprios filhos que ela amava com todas as forças.

    Faltava pouco para que ambas completassem dez anos.

    Coen não poderia simplesmente entregá-las as moiras sem uma razão aparente. Sem Alucard, ele assumiu o posto de criatura mais poderosa viva. Simular sequestro seria inviável, assim como fingir uma derrota em combate. Então, ele começou a drogá-las em segredo, a fim de simular uma doença.

    Ameaçou e subornou diversos curandeiros e druidas para que ocultassem de Celae o que de fato estava acontecendo. Essa atitude lançou a Elfa num abismo infindável, uma depressão tão profunda que ela não tinha vontade de fazer absolutamente nada.

    A Elfa se culpava em demasia.

    Pensava que por a própria ter uma condição de enfermidade precária, as filhas acabaram herdando tais condições, porém, nas pequenas a enfermidade veio de maneira agressiva.

    Então Coen acabou as entregando para as moiras e disse a Celae que elas não resistiram a doença.

    Sentindo um vazio imensurável, a Elfa tentou tirar a própria vida inúmeras vezes, mas Coen não permitiu.

    Ela teria que continuar viva e definhando lentamente, já que ele não estava nem um pouco a fim de ser o portador do pingente.

    Mais algumas décadas se passaram e Coen decidiu ir para um lugar que ele havia esquecido da existência. Um lugar bem distante da raiz da árvore.

    Um planeta que ficava em um ramo isolado da árvore do mundo, um lugar que já foi o lar de alguns errantes antes de Coen quase os extinguir.

    Chamavam o lugar de terra.

    Ele conseguiu ir para lá, aprendeu sobre a cultura deles e se instaurou num país sul-americano.

    Aquele lugar era perfeito para se viver em paz por algum tempo. Assim como no outro mundo, os humanos travavam guerras por terras, religiões, etnias ou qualquer outro motivo fútil.

    Apesar de ter minúsculas manifestações mágicas, aquele mundo era escasso se tratando de magia, por isso uma pequena fração de humanos conseguia manifestar magia, mas não era nada surpreendente.

    Eles no máximo conseguiam fazer adivinhações ou curar algumas enfermidades usando certos conhecimentos alquímicos.

    Para Coen eles não passavam de primatas burros presos em sua própria ignorância, por isso ali seria um lugar perfeito para recomeçar e dar continuidade a seu plano de séculos atrás.

    Aquele planeta tinha um diâmetro nove vezes menor que o plano de onde vieram.

    Era um planeta minúsculo.

    Não foi difícil percorrê-lo e isolar aquele planeta com barreiras mágicas, mas colocar as barreiras era perigoso demais para o planeta, e isso acabou mudando um pouco o clima e causando alguns desastres naturais.

    Era impossível penetrar a barreira e só quem estivesse dentro poderia sair por certas fissuras impossíveis de fechar, já que eram fissuras causadas pela própria árvore a fim de alimentar aquele mundo tão distante de sua raiz.

     



     

    Depois de alguns anos, Celae ficou grávida mais uma vez e deu à luz a um menino de pele morena e cabelo bem escuro, um menino que se parecia bastante com o pai.

    Ela decidiu o criar longe de qualquer influência mágica, afastando o garoto de qualquer coisa que o ligasse ao mundo dela.

    Celae Bëoranar, esse era o seu nome real, e decidiu que esse seria o nome de seu filho, já que Coen disse que o próprio não tinha um sobrenome ou não queria contar.

    Apesar de despatriada, Celae tinha um sobrenome nobre de batismo. Um sobrenome que descendia diretamente da linhagem de Mane.

    Um folclore antigo cercava o nome de Mane, um folclore esquecido pelos próprios Elfos ao passar das eras.

    A lenda diz que a linhagem de Mane foi a primeira linhagem a surgir no cosmos, uma linhagem julgada pelos próprios Altmer como sendo a primordial.

    Os Altmer foram os primeiros a adorarem as estrelas, criando uma forte ligação com elas, verdadeiros eruditos e sábios, invejados por outras raças élficas e caçados como animais.

    Eles desapareceram no tempo, deixando em seus descendentes uma única característica, os olhos amarelos.

    Ela o chamou de Colin, o herói das histórias infantis que construiu junto aquelas crianças que ela sentia tanta falta.

    Colin Bëoranar, assim ficou o nome de seu filho batizado sob a luz da lua cheia, mas ficou Colin Silva na certidão de nascimento, já que ela queria se camuflar no novo mundo e aquele sobrenome era bem comum naquele país.

    Por um período, ela foi bastante feliz e sua doença regrediu um pouco. A fim de se livrar de tudo que era mágico, ela guardou o pingente que era lembrança da mãe em uma caixa e ali ficou.

    Coen não se importou com aquilo no momento, apenas continuou seguindo sua vida normalmente, já que Celae já havia “alimentado” por muito tempo o pingente.

    A doença de Celae agravou e Coen fingiu que se importava com sua esposa. Resolveu tentar métodos humanos de cura, apesar de ele saber que não adiantaria nada.

    Se mudaram para o exterior e ali começaram uma vida nova.

     



     

    Alguns anos se passaram e Celae veio a falecer.

    Colin era diferente de suas irmãs.

    O garoto foi criado nas regras dos terráqueos. Por ter a magia reprimida, Coen sentia nojo do próprio filho, ainda mais porque os dois se assemelhavam fisicamente e Coen não suportava olhar uma versão mirim de si mesmo tão insignificante.

    Seu filho era tão fácil de quebrar quanto um graveto seco.

    Coen só o tolerava por puro capricho.

    Seu filho não tinha amigos e sempre era excluído de tudo. O único laço de amizade que o garoto tinha era com uma garota da mesma laia que o filho.

    Para Coen, o filho e sua amiga inseparável eram dois pedaços de lixo, primatas ignorantes sem importância aparente.

    Ele até tentou fazer do filho alguém que fosse minimamente parecido com as irmãs, mas era inútil, ele não aprendia o que era ensinado.

    Apesar de odiá-lo, Coen tentava o tratar bem, mas frequentemente o incentivava a entrar em brigas e conflitos desnecessários. Quando Colin perdia uma briga, ele levava outra surra, dessa vez do próprio pai.

    Coen via Agatha se jogar para cima do seu filho com frequência, mas Colin era tapado demais para perceber alguma coisa, causando ainda mais desgosto ao pai.

    Coen estava começando a se cansar daquela vida monótona, até que seus olhos saltaram a vista. Ele viu o pingente de Celae no pescoço da menina.

    Haviam uma certa condição para portar o pingente.

    Aquele artefato era algo antigo criado pelos Altmer assim que o véu caiu, mas nenhum Altmer sabia ao certo o valor daquilo.

    O pingente nunca poderia ser “dado” de fato a alguém que não tivesse o sangue de um Altmer, e sim “emprestado”.

    Por isso, Coen só o usava quando Celae lhe emprestava, e pelo visto, Colin, um dos descendentes de Celae, havia “emprestado” a outra pessoa, e, o último Altmer a tocar o pingente se tornaria o seu “dono”.

    Apesar de poderoso, o pingente não poderia ser encontrado por alguém que não fosse o último Altmer portador.

    Agatha era uma não maga portando algo tão poderoso quanto aquilo. As consequências poderiam ser catastróficas não só para a garota, mas para aquele plano terráqueo como um todo.

    Porém, Coen não se importou.

    Ele já havia ficado quieto por séculos, estava na hora de voltar à ativa.

    Colin era um completo ignorante. Ele tentaria viver uma vida normal como qualquer terráqueo, e Coen contou com isso já que seu filho passou a ser um ponto-chave de seu plano.

    Era melhor deixar o pingente se “alimentar” mais um pouco da garota e daquele mundo antes de fazer Colin entregá-lo a uma de suas filhas, no qual ele não via a séculos.

    Em no máximo cinco anos, o plano terrestre deixaria de existir, e ele estava a fim de desaparecer e ajeitar as coisas até dar o tempo estimado.

    Depois de se preparar, Coen simulou um acidente de carro sendo dado como morto, mas a verdade é que ele partiu para outros mundos deixando seu filho sozinho e desamparado naquele plano que ele mesmo condenou a ruína.

    A mãe de Colin foi uma Elfa gentil até o fim. Teve a própria vida sabotada pelo homem que amava, e mesmo assim nunca desconfiou de nada.

    No fim, a vida de Celae se resumiu a rejeição.

    Rejeitada no berço pelo próprio pai e posteriormente pelo próprio povo. Rejeitada pelas próprias filhas e usada até o fim de seus dias pelo próprio marido, que rejeitava Colin, a criança que Celae mais amou em vida.

    Mesmo que seus últimos anos com Colin fossem curtos, ela nunca havia se sentido tão bem.

    Em seus momentos finais, ela só se arrependia de não poder vê-lo crescer, se tornar um homem, um pai e quem sabe um avô.

     


    Cabrum!


    Colin despertou no susto e olhou para a janela.

    Estava caindo um verdadeiro pé d’água do lado de fora.

    Olhou para o lado e viu Brighid dormindo profundamente. A cabeça dela estava encostada no peito dele.

    Colin coçou o olho e sentiu lágrimas nas suas bochechas.

    “Parece que sonhei com minha mãe de novo…”.

    Ele ajeitou as cobertas fazendo o mínimo de movimento possível para não acordar Brighid. Cobriu os dois e tentou voltar a dormir.

    Colin não era supersticioso, mas mesmo que tudo estivesse indo bem em sua vida, ele sentiu que uma tempestade estava se aproximando, uma tempestade bem mais avassaladora e mortal do que aquela que caia do outro lado da janela.

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