Capítulo 143 – O Segredo do Nono nível
Colin foi com os outros até a entrada da caverna e ficou encostado na parede de braços cruzados aguardando Brighid e os outros chegarem.
— E então — Colin encarou o humanoide-peixe no fundo daqueles olhos sem pálpebras — Aparentemente vocês daqui do espelho já estão aqui faz algum tempo, certo?
— I-Isso!
Colin assentiu.
— A quantos anos estão aqui? — indagou Liena sentada em uma pedra.
— B-Bem… a-acho que a mais ou menos 300 anos… Alguns foram colocados aqui, outros nasceram aqui.
— Vocês já foram para os outros níveis? — indagou Colin.
— N-Não senhor! Somos amaldiçoados e impedidos de avançarmos as portas de outros níveis.
Colin apoiou uma das mãos no queixo.
“É semelhante ao abismo, mas os seres daqui são bem mais fracos.”
— O escorpião é mais forte que vocês, certo? Por que existe essa grande diferença de nível?
— B-Bem… do mesmo jeito que humanos ficam mais fortes ao matar monstros, nós também ficamos mais fortes quando matamos pessoas que não são do espelho. O escorpião já havia matado mais de 300 intrusos ao longo dos anos, então…
“Se isso for verdade, então é possível existirem inimigos fortes até mesmo em níveis mais baixos”.
— Você deve ter guardado armas, armaduras, grimórios, acessórios e moedas de todos os outros humanos que matou, estou certo?
O humanoide-peixe engoliu o seco.
— T-Temos sim, senhor…
Aquelas palavras fizeram Colin abrir um sorriso de orelha a orelha.
— Vamos lá buscar, ficarei com tudo.
— Isso é roubo! — o humanoide levantou a voz — Maldito Elfo negro, sabe quanto tempo levamos para reunir tudo?
Colin deu de ombros.
— Vocês não vão precisar, já que nunca vão sair daqui.
— Seu filho da mãe…
Colin desvencilhou da parede e o humanoide deu um passo para trás, tremendo de medo.
— Eu posso vasculhar essa caverna inteira em segundos — Colin encarou o humanoide com um olhar frio — Não preciso de você.
Com a mão no cabo, Colin desembainhou sua Lâmina dançarina.
Sentindo um arrepio na espinha, o humanoide se virou de costas e começou a correr para o fundo da caverna. Seu instinto animal tomou conta de suas ações, e ele não se concentrou em mais nada além da fuga, mas, num momento de lucidez, ele parou de correr e se ajoelhou.
— M-Me desculpe senhor, eu levo você onde quiser!
Colin guardou a espada e caminhou até o humanoide, passando por ele.
— Então vamos.
— S-Sim!
— Eu vou dar uma olhada na caverna — Colin desapareceu na penumbra — Se Brighid e os outros aparecerem, diga para me esperarem aqui.
A caverna era maior do que Colin esperava.
Eles passaram por criptas, salas vazias, inúmeras tumbas e pararam ao encontrar uma porta redonda enorme.
Era uma porta de pedra enfeitada de cipós e musgos. Parecia que ela não era aberta a eras.
— S-Senhor! — chamou o humanoide — O que procura está mais ao fundo…
Colin continuou parado olhando para porta.
— O que tem do outro lado?
— E-Eu não sei senhor, isso está aí desde antes de chegarmos ao espelho.
Dando um passo à frente, Colin tocou a porta com a mão direita e usou a análise, sentindo uma mana poderosa do outro lado.
“Será outro inimigo?” pensou ele “Essa mana… me parece familiar… é bem grande, me lembra a mana de Brighid”.
Colin cerrou o punho e levou a mão lá atrás.
O humanoide se desesperou.
— S-Senhor, não acho que seja uma boa ideia!
— Só quero ver o que tem do outro lado.
Baaaam!
Um estrondo quase deixou o humanoide surdo, e Colin ficou surpreso ao ver que a porta não havia sequer arranhado.
“Um selo tão forte que pôde resistir a um soco meu… talvez eu deva tentar outra coisa” Colin apoiou a mão direita na porta “Selos também têm resquícios de magia, talvez se eu conseguir absorver a magia do selo eu consiga abrir a porta”.
Ele suspirou, fechou os olhos e se concentrou.
Aos poucos, a magia começou a ser absorvida e a porta de pedra começou a rachar, até que se quebrou por inteira.
Bam!
Assim que a porta caiu, Colin sentiu mana transbordar de dentro daquele lugar.
Até mesmo Loaus e os outros que estavam longe sentiram aquilo os açoitar, e a mana foi além, se dissipando na floresta.
Árvores chacoalharam e os poucos animais que tinham naquela fauna profana se esconderem de medo.
Mesmo distante, Brighid foi a única a sentir aquela mana.
“Colin!”
Urina escorreu pelas pernas trêmulas do humanoide e ele caiu de bunda no chão.
Aquela mana não se comparava com a do escorpião e muito menos com a de Colin. Era algo bem mais denso.
Colin foi atingido em cheio pela mana, mas ele não se intimidou. Enfiou as mãos nos bolsos e deu um passo à frente.
Ele se viu em uma câmara ampla com flores vívidas cercando um altar, onde estava um homem aprisionado por correntes que vinham do teto.
O homem, de pele levemente azulada e com os cabelos brancos tapando o rosto, parecia não oferecer perigo algum.
Diversas espadas estavam cravadas em suas costas, além de correntes que prendiam os seus braços.
Ele também tinha dois chifres, um deles estava inteiro enquanto o outro estava partido ao meio.
Colin deu mais dois passos à frente.
— Você está vivo? — indagou Colin.
— Quem é você? — perguntou o homem. Seu tom de voz era jovial e, ao mesmo tempo, imponente.
Colin parou de se aproximar.
— Sou Colin, e você?
O homem ergueu a cabeça encarando Colin nos olhos. Os olhos dele brilhavam em um amarelo mais intenso que o amarelo dos olhos de Colin. Os lábios e o nariz dele eram finos, lembravam os traços de um Elfo da neve.
— O que um Altmer faz aqui?
Colin ergueu uma das sobrancelhas.
— Um, o quê?
— Seu tom de pele me faz lembrar dos Elfos Negros, mas você não é um deles. De qual clã você veio? Dos Ronash, Tridwen, Dildur ou… Bëoranar?
Colin suspirou e tirou uma das mãos do bolso para coçar a bochecha.
— De nenhum desses — respondeu Colin — Já me chamaram de muita coisa desde que cheguei aqui, mas Altmer é a primeira vez.
— Isso não importa, me chamo Valargon do clã dos Elfos do mar Dileären. Sabe me dizer em que era estamos, Altmer Colin?
Ele não sabia.
— Na verdade, eu não sei…
— Tsc!
Apesar da mana tenebrosa que vazou quando ele abriu a porta, Colin se sentiu seguro a dar mais alguns passos e ficar cara a cara com Valargon.
— Como acabou preso aí? — indagou Colin.
— Esse é o espelho do diabo, certo? — Colin assentiu — Eu ajudei a construí-lo.
Aquela informação era sim uma surpresa e tanto, mas o que o fundador estaria fazendo em um lugar como aquele, e justo em um nível tão baixo quanto o nono?
— Olha, senhor Valargon, estou cheio de perguntas, mas vou deixá-lo responder com calma…
O Elfo do mar abriu um sorriso de canto.
— Resumindo, ajudei os humanos a projetarem o lugar e dei vida a tudo que existe aqui, porém, para o espelho funcionar, precisa de uma poderosa fonte de magia, e como pode ver, essa fonte sou eu.
— Uma fonte em um nível tão baixo quanto o nono? — indagou Colin.
O Elfo retribuiu com um sorriso.
— Esse não é o nível nove, é o zero… Na verdade, é o zero, só aqui dentro — O Elfo apontou com o queixo para a porta atrás de Colin — Por que não dá uma olhada?
Colin se virou e não viu a porta de onde veio. Havia estrelas e a imagem de galáxias em movimento onde era a porta.
— Eu estou preso aqui? — indagou Colin.
O Elfo fez que não.
— Se voltar pela porta, você sairá desse lugar. Eu diria que só aquele que quebrar o selo poderá ter o prazer de ter uma conversa comigo, uma brincadeira sádica daqueles que me prenderam aqui, já que sabiam que é impossível que eu escape. Deve ter uma entrada dessa em cada nível do espelho. Seu amigo peixe lá fora também está aqui dentro, mas eu diria que ele se encontra em um plano paralelo a esse.
Colin assentiu.
— Entendi… e como tiro você daqui?
— Não ouviu o que eu disse? É impossível que eu saia daqui. Projetei o lugar especialmente para que ninguém escapasse. Iriamos prender uma criatura do abismo nesse lugar, mas o rei que nos contratou exigiu certa agilidade no processo, e infelizmente acabei sendo o escolhido para ficar no lugar da criatura, mas ninguém me avisou que seria eu a sustentar o espelho háháhá.
Colin agachou fitando o Elfo na altura dos olhos.
— Eu consigo tirar você daqui.
O Elfo franziu o cenho.
— Você ao menos estava me ouvindo?
Colin fez que sim.
— Ouvi! — Colin mostrou a tatuagem de aranha nas costas da mão esquerda.
O Elfo olhou para a tatuagem e depois olhou para Colin com os olhos arregalados de surpresa. Ele conhecia aquela marca. Aquela marca se tornou bem famosa entre os assassinos da antiga era.
— A entidade das mil faces… espera, isso não é a marca de um pacto — Ele fez uma pausa — Não me diga que…
— Isso aí! Fiz um contrato com Jane.
O Elfo pareceu atônito com a revelação.
— Colin… o que você é de fato?
— Um errante eu acho.
O Elfo ficou em silêncio por alguns segundos.
— Me desculpe, eu não sei o que é um “errante” …
Colin deu um suspiro. Seres milenares como Graff ou Jane sabiam exatamente o que era um errante e o que faziam. Valagorn desconhecer aquele nome que provocava sensações mistas a quem escutasse só podia significar uma coisa, ou ele estava preso há muito tempo, ou ele era um ser bem mais velho que Graff ou Jane.
— Errantes conseguem vagar por planos distintos usando portais. Também consigo evocar para o meu plano os seres que fizerem contrato comigo. Faz pouco tempo que aprendi sobre evocação, então ainda não sei como evocar Jane, mas acredito que com mais um pouco de treino eu vá conseguir.
“Não sei como uma entidade com tanto poder aceitou fazer contrato com esse garoto, mas ele é o primeiro que chega até aqui em séculos, talvez ele valha de algo… Se um errante consegue fazer algo assim, então talvez eu consiga tirar algum proveito disso…”
O Elfo suspirou.
— Você está sugerindo que eu faça um contrato com você, certo?
Colin abriu um sorriso largo.
— Para um arquiteto, você até que demorou bastante para processar a ideia.
A ideia de fazer contrato com alguém claramente inferior soava um pouco estranha. Quando havia pactos, os seres do pacto mantinham um determinado pé de igualdade. Já em contratos, havia uma parte que era submissa à parte dominante em algum grau.
— Quais suas cláusulas? — indagou o Elfo do mar.
— As mesmas cláusulas que sugeri a Jane — Colin ergueu o indicador fazendo o número 1 — O ser evocado estará proibido de mentir ou omitir informações ao evocador, caso contrário ele sentirá dor extrema — Ele fez o número dois com os dedos — Segundo, quero submissão total do ser evocado. Nada pessoal, mas não confio em você — Ele fez o número três — O evocador poderá retirar as duas clausulas quando bem entender e retorná-las quando bem entender. Porém, durante o período em que o evocador retirar as cláusulas, o ser evocado será impossibilitado de ferir o evocador ou quaisquer seres que tenham vínculo com ele. Você quer ser livre, certo? Esses são meus termos.
Valagorn era poderoso, mas ele não era ardiloso como Jane e nem alguém tão sádico quanto Colin. Já haviam se passado anos, e ele queria saber que fim teve sua família, seus amigos, a raça dos Elfos do mar e o grande reino de Atlan.
Não eram cláusulas tão danosas a ele.
— Você tem o olhar de um louco — disse Valagorn — Eu já vi esse mesmo olhar em reis sádicos e em dementes que perderam a sanidade. Normalmente eu relutaria em fazer um contrato com alguém assim, mas você fede a ser místico. Seres místicos não costumam se afeiçoar a pessoas de má índole, e pelo cheiro, você tem uma relação íntima com um deles…
— Vocês do espelho têm o olfato bem aguçado.
Colin mostrou a marca do sol na palma de sua mão direita e o Elfo balançou a cabeça enquanto sorria.
— Se casou com um ser místico?!… Deve ser o primeiro Altmer a fazer uma loucura dessa. Qual é o seu objetivo? Ser o rei de alguma terra de Agrestia? Gerar herdeiros poderosos? Um acordo de paz com Lordes Faéricos ou… — Valagorn fez silencio por um instante — Garoto, está fazendo isso para provocar o rei dos Altmer?
Colin não entendeu nada do que Valagorn disse.
Agrestia, Faérico, Altmer, eram palavras que ele não ouviu ninguém dizer desde que chegou a este mundo.
“Deve ter acontecido algo grave entre os Altmer e seres místicos no passado. De qualquer maneira, perguntaria a Brighid mais tarde.”
— Nenhuma dessas alternativas — disse Colin — Eu a amo, isso é tudo.
— A ama? — Valagorn ergueu a sobrancelha — Um Altmer disse que “ama” um ser místico… Você deve ser um Bëoranar, eu reconheceria essa insanidade de longe.
— O que tem de errado nisso?
Valagorn deu de ombros.
— Nada. Pensei que Altmers e seres místicos se odiavam, mas realmente deve ter passado muito tempo que estou preso aqui. As coisas devem ser diferentes agora. Tudo bem, eu aceito os seus termos, façamos o tal contrato.
Colin sorriu satisfeito e apontou para as mãos acorrentadas do Elfo.
— Você está de mãos atadas… então como faremos isso?
— Coloque a mão esquerda em meu peito. — Colin colocou — Eu, Valagorn do clã dos Elfos do mar Dileären, aceito as cláusulas deste homem na minha frente, Colin, o Altmer.
Correntes de mana saíram do peito do Elfo e do Braço de Colin, e em seguida desapareceram.
— Se aproxime, vamos selar o contrato.
— Me aproximar mais?
— Preciso beijar sua testa.
Colin ergueu uma das sobrancelhas.
— Como é?
— Ande logo, quanto mais rápido isso acabar, menos embaraçoso será.
Colin se abaixou e alisou o cabelo para trás, tirando a franja da testa. O elfo engoliu o seco e beijou a testa de Colin.
— Isso é um pouco humilhante… — disse o Elfo com uma expressão de nojo.
— Nem me fale… — retrucou Colin tirando as mechas de cabelo da testa do Elfo — É melhor não contar isso para ninguém, me ouviu?
— Acha que eu gostaria que alguém descobrisse que tive um momento assim com você? Me beije logo!
Colin franziu os lábios e olhou no fundo dos olhos do Elfo.
— Por Neturno, não fique me olhando nos olhos, só termina isso logo.
Mesmo relutante, Colin beijou a testa do Elfo.
O braço esquerdo de Colin queimou e uma tatuagem preta ganhou forma na altura do pulso dele.
Era a forma de uma hidra de três cabeças que circundava o pulso de Colin e terminavam mordendo as próprias caudas.
Você completou 92% da sua chave dimensional!
Você conseguiu fazer contrato com Valagorn, o Elfo Arquiteto de nível místico!
Todos os seus atributos subiram 20 pontos!
Bônus: Você consegue ficar até uma hora debaixo d’água!
Você alcançou o nível 9 na árvore da pujança!
— Acho que é melhor eu voltar antes que deem falta de mim… — disse Colin enfiando as mãos nos bolsos e se dirigindo para a saída.
— Garoto! — Colin se virou — Os cinco primeiros níveis se passam durante o dia, e os outros cinco durante a noite. Basta seguir o sol e a lua e você encontrará as criaturas que precisa para subir para o próximo nível.
Colin assentiu.
— Te vejo lá fora, Valagorn.
— Digo o mesmo!
“Beleza!” pensou Colin caminhando até a saída “Até o momento são dois contratos, um deles é um ser lendário e o outro um ser místico. Tenho Leona, que tem os mesmos atributos, e controlo os elementais que Brighid evoca porque me casei com ela. Também consigo tapar minha baixa mana com Claymore, e tenho um bom suporte com a lâmina dançarina e uma boa quantidade de moedas.”
A conversa que ele teve mais cedo com Valagorn começava a ressoar em sua mente, o fazendo pensar em diversas coisas ao mesmo tempo, a fim de decifrar o que o Elfo do mar havia dito.
“O que será que ele quis dizer com aquela conversa de Altmer? Do jeito que falou, meu casamento com Brighid pareceu um tabu. Ele disse algo sobre provocar o rei dos Altmer… Eu nem sabia que eles tinham rei. Enfim, se Brighid nunca se manifestou a respeito, então não deve ser nada. Se bem que ela escondeu de mim todo aquele envolvimento com Drez’gan e os seres do abismo. De qualquer maneira, é melhor perguntar a ela.”
Colin deixou escapar um sorriso.
“Certo, hora de dar uma olhada nos meus status!”.
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