Capítulo 145 – Rivalidade
O coliseu ficava aberto enquanto a prova ainda acontecia. Três dias haviam se passado, inúmeros alunos desistiram e outra grande parte foi morta.
Colin e sua guilda passaram pelo oitavo nível sem dificuldade alguma. Enfrentaram um monte de golens e derrotaram o líder de uma guilda sem muita importância que desafiou Colin para o combate direto.
Os níveis sete e seis seguiram praticamente o mesmo ritual. No sete, eles enfrentaram Ogros portando tacapes do tamanho de toras de madeira. Eram oponentes difíceis de se enfrentar, mas não para alguém como Colin que era fisicamente superior.
A sorte de Colin foi que ele não precisou ir muito longe para encontrar o pingente. Toda uma guilda havia virado comida de ogro, e ele achou um pingente ali, em meio a uma pilha de corpos.
Já no seis, enfrentaram um bando de Manticoras.
Manticoras eram monstros em todos os sentidos da palavra, uma manticora possui uma cabeça vagamente humanoide, o corpo de um leão e as asas de um dragão. Uma juba eriçada se estende até as costas da criatura e sua longa cauda termina em um emaranhado de espinhos mortais que podem empalar presas a uma distância impressionante.
Colin decidiu fazer uma das manticoras que matou sua evocação, principalmente porque elas eram eximias caçadoras e podiam voar.
Elhad e Sashri conseguiram arrumar um pingente abatendo uma guilda que recusaram se render.
Sem muito esforço, eles haviam alcançado o nível cinco sem nenhuma baixa. A guilda de Colin era uma das menores em números, mas uma das maiores em poder.
A plateia torcia para um encontro entre as três melhores guildas da competição, a guilda de Colin, Anton e Loafe.
Sentados debaixo de uma árvore, a guilda de Colin almoçava, comendo uma das dezenas de marmitas que Samantha havia preparado momentos antes de adentrarem o portal.
O nível em que estavam agora se assemelhava a um reino desolado. Haviam casas aos pedaços e um grande palácio desolado ao fundo.
Ainda havia sol naquele lugar, porém, ele estava baixo, semelhante ao sol de fim de tarde, que deixava todo aquele nível com tons alaranjados.
— Estou achando essa prova bem entediante — disse Stedd de boca cheia — Não encontramos nenhuma guilda realmente forte, e todos os monstros foram fáceis de matar.
Wiben franziu o cenho e encarou o amigo.
— Talvez você não estivesse entediado se você movesse um dedo para ajudar.
Stedd não ajudaria com inimigos fúteis.
— Eu disse que ajudo se a bonitinha ali tiver dificuldade com algum inimigo.
Elhad se levantou.
— Vou checar o perímetro — disse o Elfo alisando o cabelo longo para trás — Se eu encontrar algo aviso a vocês.
Colin jogou um talismã comunicador para ele.
— Vou é dormir — disse Stedd entrelaçando os dedos atrás da cabeça e deitando na grama esponjosa — Se precisarem da minha ajuda, me acordem — Stedd enfiou uma das mãos no bolso e jogou o talismã comunicador para Colin — Pensando bem, julgo que vocês conseguem resolver esses problemas sem mim.
Colin deu um suspiro e se ergueu.
— Eu também darei uma olhada por aí, o resto de vocês fique e descanse.
— Me espera!
Leona se ergueu e foi para o lado de Colin.
Ela deu uma cotovelada no braço dele.
— Você sempre se mete em problemas, é bem provável que você precise de mim, né? Colinzinho?
Ele deu de ombros.
— Toma cuidado! — disse Brighid encarando Colin com olhos de preocupação.
— Não se preocupe! — Leona deu duas tapinhas no ombro de Colin — Ficarei de olho nele, mamãe Brighid, não se preocupa.
Brighid abriu um sorriso de canto.
— Então vou deixá-lo em suas mãos.
Leona abriu o sorriso de caninos pontiagudos e fez o sinal de positivo com o polegar direito.
Há alguns quilômetros dali o ruivo estava no pico de uma torre desolada encarando Colin e seu grupo.
— Parece que Colin se separou deles — disse o ruivo saltando graciosamente para onde seus companheiros estavam.
Os homens do ruivo estavam descansando ao redor de uma fogueira.
— Nosso alvo não é o Elfo — disse Leidvard deitado com os olhos fechados — O Elfo é alvo do brutamontes ali.
Vrumud estava mais afastado, encostado na parede da torre. Ele ouviu o que o errante disse, mas ele continuou em silêncio.
— Não entendo porque temos que ficar escondidos aqui — continuou Leidvard — A gostosa de cabelo esverdeado está logo ali, basta atacar e a capturar. O brutamontes pode ficar à vontade para matar o Elfo se ele quiser. Estamos perdendo tempo esperando até chegarmos ao nível três. Temos só quatro dias até as poções de polimorfia perderem o efeito.
Algo acima deles formou sombra e caiu no chão em um estrondo que estremeceu todo ao redor.
Baaam!
A torre só não cedeu por sorte.
Metros à frente, jazia um Wyvern ancião. Ele era do tamanho de um dragão adulto, beirando os cinquenta metros de cumprimento da cabeça a cauda e sessenta metros de asa a asa.
Coberto de sangue, o Wyvern de cor cobre ainda respirava.
Raudal saiu de trás de algumas árvores com alguém desmaiado sob seu ombro.
— Você quase nos matou! — berrou Leidvard furioso — Mais alguns metros e eu teria sido esmagado!
Paft!
Raudal jogou um homem de armadura preta no chão.
— Mirei certo — Ele olhou para o ruivo enquanto massageava o ombro — o garoto tem um pingente e se matarmos o Wyvern conseguiremos ir para o próximo nível.
O ruivo olhou para Loafe.
— E então, chefinho, o que quer fazer?
Loafe se ergueu e caminhou até o rapaz no chão.
Crash!
O garoto desmaiado acordou ao ter uma espada atravessando o seu peito. Loafe se abaixou e arrancou o pingente do pescoço dele, depois se afastou do garoto que engasgava com o próprio sangue e sua lâmina ficou rubra.
Ele ficou ante ao Wyvern.
Vush!
Labaredas acompanharam o corte limpo.
A cabeça do Wyvern foi arrancada e um portal apareceu atrás dele.
— Não vamos perder tempo, vamos depressa. A guilda de Colin é rápida, eles chegarão ao terceiro nível tão rápido quanto nós.
Ruivo abriu um sorriso de canto.
— Como queira, chefinho.
Elhad havia seguido para um lado e Colin para o outro. Leona era bem elétrica, principalmente quando estava sozinha com Colin. Ela não falou muito nas últimas horas, e decidiu descontar tudo ali com Colin, pois, com ele, ela não arriscava parecer uma mulher chata que não cala a boca por nada.
— E depois de vencer aquele ogro, eu fiquei tão empolgada que fui de um lado para o outro em zigue-zague, derrubando um por um com um único soco! — Ela ficou frente a Colin com os olhos brilhando de empolgação — A gente não lutou mais junto desde que enfrentamos aquele apóstolo. Você está mais forte, e eu também, suponho que se trabalharmos juntos podemos vencer até Brighid!
Colin achou aquela afirmação um tanto exagerada.
— Acredito que ainda não…
— Por que não? A gente sobreviveu contra um apóstolo!
Colin afagou o cabelo dela.
— Thaz’geth era a mais fraca dos apóstolos, e a gente perderia se a luta tivesse durado mais cinco minutos.
Leona cruzou os braços e fez beicinho.
— Você sempre tem que estragar as coisas…
— Fica tranquila, a gente ficará ainda mais fort-
Ting! Ting!
Leona rebateu com as garras duas facas que vieram na direção de Colin.
“As lâminas vieram de repente” pensou Leona “Usuários do silêncio?”
Leona olhou para os dois lados com sua análise apurada e se abaixou.
Vush!
Uma lâmina passou acima de sua cabeça.
“São usuários do silêncio! Consegui sentir a lâmina, mas não consigo sentir quem a empunha.”
— Mestre Colin!
— Eu entendi!
Os dois partiram para lados opostos, atraindo quem quer que fosse os seus inimigos.
“O pingente está comigo” pensou Colin “Então o alvo deve ser eu!” Colin concentrou mana em sua análise e enxergou rastros de mana, mas era impossível rastrear com precisão a mana de usuários do silêncio “Minha pele é dura, assim que eu sentir algo atacarei o mais rápido que conseguir!”
Crash!
Algo atingiu o abdômen de Colin, e ele prontamente se moveu, decapitando quem quer que fosse. O usuário do silêncio, antes invisível, apareceu sem a cabeça. Colin olhou para baixo e viu uma adaga negra enfiada em seu abdômen.
Colin sentiu seu corpo estranho. Tentou retirar a adaga, mas ela desmanchou em um líquido negro viscoso.
Runa saíram do corte no abdômen de Colin e começaram a percorrer seu corpo. Ele tocou o abdômen para absorver o que quer que fosse, mas não funcionou.
“Não funcionou? Não é isso, eu não consigo usar mana!”
Rumble! Rumble! Rumble!
Algo devastador vinha do fundo da floresta.
O chão estremecia, as aves fugiam desesperadas e Colin sentia que aquilo não era nada bom.
— Leona! — Ela estava mais a fundo e Colin correu até ela.
Uma avalanche de destroços engolia a floresta e ficava maior conforme avançava. Colin abraçou Leona e deu as costas para o poder avassalador que ia em sua direção.
Booom!
Árvores, rochas, poeira e terra atingiram Colin em cheio e o fez desaparecer em meio aos destroços que causaram uma enorme cicatriz na floresta.
Poeira subia aos céus, e na origem daquele poder estava Anton. Seu sorriso ia de orelha a orelha e ele arfava como nunca.
— Da primeira vez que nos encontramos — disse Anton limpando o suor da testa — Você fez aquele pirralho me atingir com o canhão Galick, agora eu me vinguei, e julgo que você se machucou para valer dessa vez, Colin. O troco foi dado!
— A mana dele foi selada por um instante — disse a pandoriana coelho ao lado dele — Mas já deve voltar em breve. O usuário do silêncio que você contratou está morto.
— Não importa, só espero que esse cretino do Colin não esteja morto, não ainda!
Bam!
Colin empurrou uma pedra enorme e saiu de dentro de um buraco. Embora não usasse magia, seus atributos físicos continuavam os mesmos.
Ele limpou sangue que escorria do nariz com as costas da mão.
Já tinha algum tempo que Colin não via o próprio sangue.
— Tudo bem? — Ele esticou a mão erguendo Leona.
— Porque fez isso? — indagou furiosa — Suas costas estão…
— Eu tô bem, já me machuquei mais sério que isso.
Não era só as costas de Colin, o corpo inteiro dele estava coberto por cortes, escoriações e machucados sérios.
— Minha magia acabou durante um tempo, mas parece que está retornando.
Leona usou a análise e viu que eles estavam dentro de uma redoma.
— Colin, acho que a gente tá preso.
“Não estamos tão longe assim do acampamento” pensou ele “Já era para o pessoal da guilda estar aqui depois de todo esse barulho e essa explosão de mana repentina… A redoma deve inibir o som e esconder a magia em um lugar específico… Isso pode ser problemático.”
Colin viu alguém se aproximar devagar, foi quando ele reconheceu quem de fato era aquele homem. Anton estava bastante contente, assim como Colin.
Anton foi o único oponente que conseguiu derrotar Colin no, um contra um, e vê-lo aparecer assim do nada o deixou excitado.
— E então, Colin, finalmente te encontrei! Desculpe pela recepção nada amigável, mas eu precisava fazer você sentir o gostinho de ser atacado de surpresa!
Anton tirou a camisa, braceletes e todo acessório que usava.
Também retirou sua espada e jogou para sua pandoriana coelho. Retirou até os calçados, ficando apenas de calça.
— Sou um nobre, Colin, ganhar esse torneio não mudará em nada na minha vida — Ele apontou o indicador para Colin — Entrei aqui só para lutar contra você e te derrotar na frente de toda elite do império! — A pandoriana coelho jogou um frasco na direção de Colin — Beba isso e cure suas feridas. Não sou um covarde, Colin, quero te enfrentar de igual para igual!
Colin olhou para a poção de cura e olhou para Anton.
— Tudo isso para me enfrentar… então tá! — Ele abriu a poção e bebeu. As feridas dele se curaram lentamente.
— Vamos lá, Colin, lutaremos como dois homens de verdade lutariam!
Colin entregou a lâmina dançarina para Leona, assim como Claymore, o medalhão que Brey havia lhe dado de presente e até a aliança de casamento. Ele fez como Anton, tirou a camisa, os sapatos, ficando somente de calça.
— Sem armas físicas, Colin, sem equipamentos de reforço, sem truques! Apenas eu, você e o choque de nossas magias!
— Como queira, Anton! — Colin olhou para Leona por cima do ombro — Não se meta nisso.
— Você também! — disse Anton a sua pandoriana coelho — Fique quieta e observe!
Elas deram de ombros e se afastaram de seus mestres. Não importa o que saísse da boca de qualquer uma delas, nada faria seus mestres mudarem de ideia.
A relação que Colin tinha com Anton era um misto de admiração com pitadas de rivalidade. Mesmo depois de tudo, das fofocas que circulavam sobre ele e todo o mito que se construía sob a imagem de Colin, Anton ainda o desafiava para uma luta direta.
O nobre tinha culhões para tentar algo assim.
Já Anton, via Colin como alguém a ser superado. Ele sentia inveja do que as pessoas falavam de Colin, e, ao mesmo tempo, se sentia feliz, isso o motivava a ficar mais forte a cada dia para derrotar Colin num próximo confronto, e este dia havia chegado.
Leona e a pandoriana coelho de Anton se afastaram e foram para perto uma da outra.
O clima entre elas era estranho, seus respectivos mestres estavam a ponto de se digladiarem, mas elas não se odiavam, talvez fosse porque o sentimento que Colin e Anton sentiam pelo outro não fosse ódio.
— Oi! — disse Leona um pouco tímida.
— Ah! Olá!
Leona coçou a bochecha.
— Desculpa por meu mestre… — disse a pandoriana coelho — Mas ele queria muito enfrentar o seu mestre…
Leona abanou uma das mãos.
— Não precisa se desculpar, acho que mestre Colin também queria isso.
As duas ficaram em silêncio e Leona deu um suspiro.
— Me chamo Leona… e você?
— Lumia! Prazer em conhecê-la, Leona.
— O prazer é todo meu. Ei! Lumia, quer ouvir da vez que fui para o abismo?
Lumia cruzou os braços e ergueu a sobrancelha.
— Isso é possível? — Indagou um pouco cética.
Leona abriu um sorriso e fez que sim.
— Você é uma pandoriana como eu, sabe que não estou mentindo…
Depois de assentir, Lumia se sentou na grama e Leona se sentou de frente para ela.
— E como foi?
— Você não vai acreditar! Tudo começou com…
Enquanto uma amizade nascia entre as duas pandorianas, a rivalidade entre seus mestres chegava a seu ápice.
— Não me decepcione, Colin! — Anton reforçava todo o seu corpo com mana, enrijecendo seus músculos e aumentando bruscamente sua aptidão física.
Anton sabia que o forte de Colin era o corpo a corpo, por isso ele arriscaria isso num primeiro momento. Vencer Colin no que ele era bom, era uma das formas de humilhá-lo.
Colin percebeu a artimanha, mas ficou em silêncio. Se Anton queria uma briga de punhos nus contra ele, então era o que teria.
A mana de Colin também se condensou a seu corpo, aumentando seus atributos físicos.
— Quero ver o quanto evoluiu! — disse Colin flexionando os joelhos.
Eles partiram na direção um do outro, chocando seus punhos.
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