Capítulo 151 – A Masmorra
Após abrir os olhos lentamente, a visão de Brighid ficou turva, até finalmente avistar Colin na saída da caverna assando algo. O cheiro estava bom, provavelmente era de coelho.
A blusa de Colin estava sob o corpo dela a protegendo do frio, enquanto o próprio Colin estava de regata, recebendo a lufada gélida que soprava vez ou outra.
Brighid bocejou e se ergueu. Foi até Colin e entregou a blusa a ele.
— Não tá com frio? — indagou Colin a encarando de canto.
Ela cruzou os braços e se sentou no chão ao lado dele, mantendo os olhos nas chamas.
— Não está fazendo tanto frio assim. Por quanto tempo dormi?
— Umas três horas.
Brighid assentiu e encostou a cabeça no ombro de Colin.
— Desculpa…
Ele ergueu uma das sobrancelhas.
— Por que está se desculpando?
— Se não fosse por culpa minha, a gente não teria perdido tanto tempo.
Após cutucar o coelho com um graveto, Colin abriu um sorriso de canto.
— Você sempre se culpa por tudo, não é?! Não precisa se desculpar comigo, não tem como ficar nervoso com você.
Brighid abriu um sorriso de canto e se concentrou no coelho. Ele parecia delicioso.
— Conseguiu ficar três horas aqui sentado sem se manter em confusão?
Colin fez que sim com a cabeça.
— Acredite se quiser… — Ele esticou a mão e apanhou o espeto com o coelho — Acredito que está pronto.
Ele arrancou uma das coxas do coelho e entregou para Brighid. Ela assoprou algumas vezes e começou a mastigar.
— Isso tá ótimo! — disse de boca cheia — Andou praticando?
Ele fez que não com a cabeça.
— Não precisa me bajular desse jeito.
— É sério!
Colin arrancou a outra pata e começou a mastigar. O coelho do espelho realmente tinha um gosto peculiar, deixando aquilo bem apetitoso.
Talvez fosse o coelho de outra raça, ou aquele gosto era exclusivo dos coelhos do espelho.
Momentos como aquele que Colin passava a sós com Brighid, eram os únicos que ele descontraía e se sentia confortável para conversar sobre qualquer coisa.
— O cara que enfrentamos é da guilda de Loafe. — disse ele — Ele não estava sozinho. Tinha mais gente poderosa com ele — Colin tornou a encarar o fogo — Se eles tivessem aparecido enquanto você estava dormindo, não sei o que teria acontecido com você… Um deles conseguiu rebater minha espada com energia para destruir uma torre de concreto.
Colin não temia por ele, mas por Brighid e seus companheiros.
Não era seu costume falar sobre si mesmo nem que tipo de preocupação ocupava sua mente, mas Brighid conseguia o ler com clareza. A fada sabia que ele estava preocupado, preocupado principalmente com ela.
Brighid apoiou a mão no rosto dele e o encarou nos olhos.
— Ei! Você conseguiu sobreviver a um errante que conseguiu evocar seres poderosos e ainda era um monarca. Conseguiu sobreviver sem nenhum arranhão a um poder como aquele, não precisa ficar em dúvida sobre si mesmo, nem se preocupar tanto assim comigo.
Colin assentiu.
— Tem mais uma coisa que quero contar, aquele errante mencionou algo relacionado ao meu sangue. Ele parecia conhecer Saphielle.
Ela tornou a mastigar a coxa do coelho.
— Aquela mulher que você viu em um sonho? — indagou de boca cheia.
— Isso. Ele mencionou algo sobre meu sangue ser nobre. Acredita que isso está relacionado com os Altmer?
Brighid terminou de mastigar e engoliu.
— É possível. Se ele está na guilda de Loafe, então a gente se encontrará com ele novamente. Ele ficará debilitado por um tempo. Quando dois seres tem um contrato e um deles morre, o sobrevivente acaba ficando bastante debilitado. A mana dele continuará baixa e ele não deve conseguir mais lutar por alguns dias.
Colin assentiu.
— Acontece o mesmo com contratos de casamento? — indagou.
Brighid fez que sim e pegou a mão de Colin, abrindo a palma de sua mão e entrelaçando seus dedos aos dedos dele.
— Imagine como se uma corrente estivesse atrelada tanto a mim quanto a você. Quanto mais tempo essa corrente existir, mais forte ela fica. — Ela deixou escapar um sorriso — Sou sua esposa, sua consorte. Estou disposta a partilhar o mesmo destino que você, e segui-lo durante o resto da minha vida e quem sabe, além dela. É isso que significa um contrato de casamento.
Colin olhou no fundo dos olhos de Brighid e balançou a cabeça enquanto sorria.
— Isso foi uma declaração de amor?
Ela deu uma ombrada nele e não conseguiu segurar o riso.
— Quem sabe! Agora termina de comer pra gente procurar o pessoal, e vê se veste a camisa, não quero que pegue um resfriado.
— Sou quase um monarca da pujança, não vou me resfriar.
Ela apoiou o indicador na testa de Colin, um gesto típico do marido.
— Não discuta comigo e veste logo.
Colin a encarou nos olhos e deu um suspiro.
— Que tal acabarmos de comer primeiro?
— Humpf! Tá bom.
Depois do círculo mágico de Leidvard iluminar todo o céu, alguns grupos curiosos foram atraídos pela luz do círculo como mariposas.
O grupo de Colin foi um deles.
Eles estavam parados na borda de um buraco que parecia não ter fim. De dentro, ainda saía um pouco de fumaça.
Stedd ficou em cócoras e apoiou a mão no queixo.
Um buraco enorme como aquele era bastante atrativo para pessoas como Stedd. Poderia haver algo lá em baixo, como também poderia haver nada além de poeira, mas ele era curioso demais para ficar somente na especulação.
— Darei uma olhada.
Elhad e Sashri cruzaram olhares.
— Vai mesmo descer? — indagou Elhad coçando a bochecha com o indicador. Stedd era mais impulsivo que Colin quando se tratava de tomar decisões — Parece perigoso, e também há outras equipes por perto, o que faremos se eles resolverem atacar?
Stedd se ergueu e enfiou as mãos nos bolsos.
— Vocês são fortes pra caralho, não precisam da minha ajuda pra bater em um bando de estudantes. Volto logo.
— Você não vai sozinho! — advertiu Samantha — É perigoso, podem ter outras equipes lá em baixo, ao menos leve alguém com você.
Controlar aquele grupo era bem difícil. Colin normalmente não tinha muita dificuldade, já que a maioria era tão insana quanto ele, e o restante apenas fazia o que mandavam fazer.
Samantha e Brighid eram as vozes da razão daquela guilda, mas sem Brighid, Samantha não conseguia fazer sua voz alcançar todos eles, principalmente problemáticos de natureza como Stedd.
O Ubiytsy fez muxoxo. Ele encarou Samantha nos olhos e percebeu que ela não mudaria de ideia facilmente, e ele não estava a fim de entrar em uma discussão.
— Tudo bem, chifruda e a quatro olhos, vamos.
— E-Eu? — indagou Alunys surpresa.
— Claro que é você, quem mais usa óculos nessa guilda?
— Você também usa! — retrucou Safira.
— Isso não é óculos de grau, chifruda idiota, isso é moda, sabia? Alguém como você nunca entenderia.
Safira abriu um sorriso de deboche.
— Você usa óculos escuros a noite, que tipo de moda é essa, a dos imbecis?
Stedd ajeitou os óculos com o indicador.
— Eu disse que você não entenderia, vamos logo!
Flexionando os joelhos, Stedd saltou sem ao menos saber a profundidade do buraco ou enxergar o que se encontrava no fundo.
— Vamos, Alunys! — Safira pegou o pulso dela.
— A-A gente vai pular?
Safira respondeu aquela pergunta com um sorriso e correu até a beirada arrastando Alunys junto.
Os três desapareceram na escuridão com o grito de Alunys sumindo lentamente.
— Esse idiota… — Wiben entrelaçou os dedos atrás da cabeça e se afastou do buraco — Ficarei bem aqui, tirando uma soneca até eles voltarem. Já temos um pingente, só temos que matar uma criatura, certo?
Elhad pigarreou.
— Procurarei a criatura — disse ele dando as costas — Volto daqui a uma hora.
Samantha ficou preocupada ao ver todos eles se afastarem daquela forma, mas a verdade, era que o espelho não estava sendo o desafio que eles acreditaram que seria.
Para aquela guilda, o torneio estava mais para uma colônia de férias.
— Não devíamos nos separar assim — disse Samantha preocupada — Estamos atrás do Colin e de Brighid, seria melhor se continuássemos todos juntos…
Sashri deu duas tapinhas no ombro de Samantha.
— Fica tranquila, loirinha, nós temos um cão farejador bem ali — Apontou com o queixo para Leona que estava sentada como um cão enquanto coçava a orelha com os pés.
Por ser um canídeo, Leona era frequentemente chamada de cão, mesmo que suas caudas fossem bem aparentes, e isso era algo que a deixava bem irritada.
— Eu não sou um cachorro! Repete isso e racharei seu crânio, sua anã!
Mesmo sabendo disso, a preocupação de Samantha não cessou. Colin parecia ser o único que conseguia manter aquele bando de maluco sob controle, mesmo que o líder fosse o pior deles.
— Bom… — disse Samantha baixinho, quase sussurrando — Leona disse que a mana de Colin está por perto, então acho melhor continuarmos procurando… E se tiver acontecido algo grave com eles?
Sashri acharia a preocupação válida há alguns meses, mas agora Colin sabia se virar, sem falar que Brighid estava com ele. Não havia motivos para tanta preocupação.
— Estamos falando do Colin — respondeu Sashri — E aquele idiota está com Brighid. Não aconteceu nada com eles.
Samantha franziu os lábios e assentiu.
— Você razão, mas Stedd e Elhad, eles-
— Ei! Loirinha, relaxa. Stedd é forte, aquelas duas pirralhas também. Viu a tímida Alunys acabar com aquele meio-dragão, não viu? Sem falar que Safira também é habilidosa. Quanto a Elhad, ele pegava trabalhos com guildas do império antigamente. Ele é bem forte, não precisa se preocupar.
Samantha parou por um momento e pensou em tudo que Sashri lhe disse. Seus companheiros de equipe eram fortes, até mesmo Lei Song conseguia se virar com o que tinha.
Apesar de serem uma guilda, ninguém dependia exatamente do outro. Mesmo se ficassem sozinhos, eles sabiam se virar, foi assim que Colin manteve a dinâmica da equipe.
Eram poucas vezes que eles se reuniam ou discutiam algo para executar determinadas tarefas. A guilda era bastante autônoma, com seus membros espalhados fazendo o que dessem na telha, e aquilo não era de todo mal.
Em conjunto, eles eram formidáveis, mas era individualmente que mostravam sua verdadeira força.
— Acho que estou me preocupando atoa…
— Claro que está, agora sentaremos ali perto de Lei Song, conversaremos um pouco.
Samantha olhou para o buraco, olhou para a floresta e olhou para Wiben deitado na grama.
— Anda, loirinha! — Sashri pegou no pulso de Samantha — Você também, cadelinha!
Irritada, Leona começou a rosnar.
— O que eu ia fazer com uma mulher irritante como você?
Sashri deu de ombros.
— Conversaremos como amigas fariam, falaremos de missões da guilda e de garotos.
Leona revirou os olhos.
— Parece bem entediante pra mim…
— Em cinco minutos de conversa mudo sua opinião.
Sem muita resistência, Leona resolveu aceitar. Ela não faria nada ali além de esperar.
— Tudo bem, mulher irritante.
Sashri esboçou um sorriso e se afastou do buraco, indo em direção a Lei Song.
Stedd caiu por quase quinze segundos até sentir que o chão firme estava próximo.
— Ei! Pirralhas! — Vociferou — Concentrem mana nas pernas!
Elas fizeram o que Stedd disse.
Boom! Boom! Boom!
Os olhos vermelhos de Stedd se destacavam naquela escuridão sem fim, mesmo que estivessem cobertos por óculos.
Safira abriu a palma da mão, conjurando uma chama que não parava de queimar.
— Pensei que fosse morrer! — Alunys tirou a poeira da roupa com bofetes e ajeitou os óculos.
— E eu pensei que machucaríamos nossas pernas caindo de tão alto — disse Safira olhando para os dois lados.
“É, chifruda, eu também achei!”
Enquanto caía, Stedd reparou algo que chamou bastante sua atenção. O cheiro de carvão desapareceu por completo na metade do caminho. O chão em que estavam não parecia queimado e muito menos destruído.
Ele se abaixou e afastou a poeira com uma das mãos, revelando um chão de ladrilhos ornados.
“Isso é parte de uma tumba?” Ele se ergueu e olhou para cima “Parece que o poder que veio lá de cima só fez destruir a camada de terra que cobria o lugar. Aqui era provavelmente uma câmara? Se for, a gente consegue achar a entrada ou saída desse lugar.”
— Chifruda! Lance uma chama nessa direção! — Stedd apontou para o Norte.
Safira conjurou outra chama com a mão esquerda, levou o braço lá atrás e a jogou.
Vush!
O buraco era tão grande, que a chama poderosa de Safira se tornou só uma fagulha de luz naquela vastidão escura.
“Nada…” Stedd apoiou a mão no queixo “É sério que somos os primeiros aqui?” Ele fungou o ar duas vezes “Sinto cheiro de poeira, quinquilharia e roupa velha… uma masmorra!”
Stedd arregaçou as mangas e crispou os dedos, fazendo suas unhas afiadas crescerem.
— S-Senhor Stedd! — chamou Alunys se afastando um passo — O-O que está fazendo?
— Criando uma entrada!
— Entrada? — indagou Safira se aproximando — O que quer que tenha atingido esse lugar, não conseguiu destruir esse chão, e você acredita que conseguirá?
— Olhe a aprenda, chifruda!
Bam! Bam! Bam!
As unhas de Stedd se chocaram contra aquele chão de pedra ornado repetidas vezes. Suas mãos se moviam velozmente, e o som que se ouvia era bem semelhante ao de uma britadeira.
Boom!
Finalmente ele fizera um buraco na pedra bruta.
— Chifruda! — Stedd se afastou — Jogue uma chama lá dentro.
A passos lentos, Safira se aproximou da beirada e fez o que lhe pediram.
Eles viram teias de aranhas e crânios empoeirados.
Para Stedd, aquilo era um convite de boas-vindas.
— Vamos lá, pirralhas, vamos ver o que escondem lá em baixo!
Vush!
Ele saltou para dentro do buraco.
Safira e Alunys cruzaram olhares e ficaram em dúvida se o seguiriam ou não, mas Stedd sabia como convencê-las.
— O que foi? Imagina quando eu contar para Wiben que as duas pirralhas estavam com medo do escuro hehehe aquele idiota adorará saber disso.
Safira não pensou duas vezes e saltou para dentro do buraco, enquanto Alunys permaneceu lá em cima, ainda relutante.
— Ande logo com isso, quatro-olhos, quanto antes acabarmos, mais rápido você volta pros braços da sua querida Liena.
— O-O que o senhor, quis dizer com isso?
Stedd abriu um sorriso malicioso.
— Vem logo, qualquer coisa protejo você com a minha vida. Sou tão forte quanto Brighid.
— Mentiroso! — retrucou Safira.
— Mentiroso por quê? Já me viu lutar por acaso? Meu pai na minha idade matou 100 monarcas, eu estou próximo disso.
Safira revirou os olhos.
— Quanta mentira, nem senhor Colin matou isso.
Stedd apoiou as mãos na anca e franziu o cenho.
— E desde quando Colin é parâmetro de comparação pra algo? Espero que tenha um monte de criatura forte pra caralho nessa masmorra pra eu mostrar a você o que é força de verdade!
— Humpf! — Safira cruzou os braços e empinou o nariz.
Alunys olhou para um e depois para o outro.
— Por favor, não briguem, já estou descendo…
Após Alunys saltar para dentro, Stedd abriu um sorriso de canto.
— Vamos lá, pirralhas, mostrarei a vocês como um tubarão caça!
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