Capítulo 16: Recompensa
O cavalo estava exausto após descer a montanha puxando a cabeça enorme do Bakurak.
Os aldeões estavam todos esperando pelo retorno deles. As crianças os viam como heróis e os adultos passaram a enxergá-los como companheiros. A maioria dos camponeses não esperava rever aqueles três, mas ficaram felizes ao vê-los se aproximando no horizonte.
Colin resolveu levar a cabeça como prêmio para pechinchar em outro lugar, já que trazer o corpo inteiro do monstro seria praticamente impossível.
A magia de Brighid havia os forçado ao limite de seus corpos.
Colin andava arrastando seus pés, Safira praticamente caminhava dormindo. Brighid era a mais normal dos três, mesmo executando três funções ao mesmo tempo, ela não se sentiu tão pressionada.
Ao chegar ao vilarejo, Colin pensou em sentar-se no chão para descansar, mas ele desistiu da ideia assim que pousou os olhos no ancião se aproximando.
A marca em seu braço direito ainda continuava ali, percorrendo todo seu antebraço. Apressando o passo, Colin pegou o ancião pela gola e o ergueu.
As pessoas do vilarejo se afastaram um passo. Eles haviam matado um demônio, que chance eles teriam se decidissem contrariá-lo?
— Que merda é essa no meu braço?
Colin levantou o ancião um pouco mais alto e ele começou a tossir.
Cof! Cof!
— Não se finja de coitado, estou ficando sem paciência!
— É-Espere, e-eu posso explicar!
— Estou esperando.
— Quando fiz o contrato com você, coloquei uma condição que você fosse capaz de repelir um poder mortal… essa é uma condição forte, porém dependendo do nível de poder repelido ela só funciona uma vez, e quando se esgota, ela deixa marcas permanentes no lugar do contrato. A pedra mágica era um tipo de amplificador deste contrato — O ancião olhou para o pescoço de Colin. — Parece que funcionou, não é?
Colin ficou furioso. Seu antebraço inteiro estava tatuado com símbolos e letras estranhas que ele não conseguia identificar. Ele largou o velho com certa agressividade e o velho caiu no chão com tudo.
— Devia ter me contado, velho, agora ficarei com essa merda no meu braço.
— Eu não tive escolha… — disse o velho se erguendo com a ajuda dos moradores. — Eu não poderia deixar você morrer… você era nossa última esperança.
Colin desviou o olhar e abanou uma das mãos, sentindo uma pontada e tanto no peito. O efeito colateral da magia de Brighid havia alcançado-o de maneira agressiva. Exausto, ele sentou-se no chão novamente.
— Vocês conseguiram mesmo… — disse o ancião enxergando a cabeça do Bakurak amarrada ao cavalo.
— É claro que conseguimos, velho, quem pensa que somos?
Safira se jogou na grama esponjosa. Ela arfava enquanto sentia bastante sono.
Ela lutava conta seus olhos pesados que se esforçavam para não se fecharem, mas eles pesavam toneladas, então, ela foi a primeira a dormir.
Os aldeões se aproximaram de Colin e o ajudaram a se levantar.
— Obrigado… — agradeceu um homem, mal conseguindo segurar o choro.
Algumas crianças devoraram as maças das macieiras, outros bebiam com gosto a água do riacho que ficava ao lado da estrada. Logo seria temporada de colheita, e eles se esforçariam para reerguer novamente a vila da estrada. Porém, isso não aconteceria hoje, hoje seria noite de comemoração.
Colin dormiu tanto que só foi acordado pelo som das festividades. Uma cantoria invadiu aquele quarto escuro, junto com algumas luzes que vinham de fora. As luzes iluminavam uma muda de roupas em cima da mesa de cabeceira ao lado da cama.
Ele as apanhou e as vestiu.
Ao despir a blusa, ele direcionou o olhar para o próprio corpo e se surpreendeu com a transformação. Seus músculos se destacavam de maneira bem definida, contrastando com a magreza que carregava antes de adentrar o novo mundo.
Seus olhos percorreram a tatuagem rúnica que, ao invés de ser preta, apresentava-se totalmente esbranquiçada, parecendo mais uma obra de arte em seu antebraço.
“Até que essa tatuagem não ficou ruim… e caramba… nunca tive este corpo antes.”
Nome: Colin
Idade: 23
Árvore primária: Céu. Nível: 01
Árvore secundária: Pujança. Nível: 01
Árvore secundária: Caos. Nível: Bloqueada.
HP: 2000.
MP: 580.
Habilidades:
Força: 30
Destreza: 35
Agilidade: 31
Inteligência: 27
Estamina: 33
110 pontos em pujança, pontos necessários para o nível 2: 2 pontos.
130 pontos primária, pontos necessários para o nível 2: 70 pontos
“Então consegui upar tanto só matando um Bakurak!? O mais incrível é que eu tenha conseguido subir tanto em minhas habilidades, é quase inacreditável. Parece que quando subo de nível, tenho que conseguir o dobro de pontos para alcançar o próximo. Por ser pouco, acho que consigo subir os primeiros níveis rapidinho se eu treinar.”
Caminhando para frente de um espelho grande, Colin se encarou. Fez diversas poses e acariciou sua pequena barba cerrada junto a seu cabelo grande e bagunçado.
“Estou horrível… e essas minhas olheiras não vão sair tão cedo”.
Ele olhou para a mesa de cabeceira ao lado e apanhou uma tesoura da gaveta, cortando ele mesmo o seu cabelo.
Mesmo sem cortar o cabelo há meses, ele se esforçou para deixá-lo parecido com o corte que usava na adolescência. Cortou as pontas e deixou uma pequena franja cobrindo a testa. Depois, passou a mão pelo queixo e, com uma de suas adagas, retirou toda a barba que havia crescido em seu rosto.
Aquele novo visual o deixou anos mais jovem.
Após se trocar, Colin deixou o quarto e caminhou pela casa até sair dela.
Pessoas dançavam em volta de uma enorme fogueira. Brighid estava do outro lado, sentada em uma mesa bebendo vinho de um copo minúsculo.
Era difícil de se acreditar que eles tinham um copo daquele tamanho.
Safira estava no meio de uma roda de pessoas sorrindo como se estivesse em um show de comédia. Colin esboçou um sorriso de canto, logo depois sentiu um tapinha nas costas. Ao virar a cabeça viu o velho ancião oferecendo-lhe um copo de vinho.
Sem dizer nada, ele o apanhou.
— Fazia tempo que as pessoas não ficavam tão felizes — disse o velho.
Colin deu de ombros e bebeu todo o vinho numa só golada.
Ele estava acostumado a ficar bêbado, fazia isso com frequência para escapar de sua realidade decepcionante do outro mundo.
Colin limpou a boca com as costas da mão e pigarreou.
— Esse vinho é um pouco forte.
— É uma das nossas especialidades — disse o velho sorrindo por debaixo daquela longa barba grisalha.
— Não sabia que vocês faziam vinhos.
— Essas terras podem produzir de tudo.
Colin fez que sim e observou mais uma vez a alegria de suas companheiras. Sua mente precisava pensar em um outro lugar para ir, um lugar novo que pudessem novamente testar suas habilidades.
Ele sentia que havia ficado forte e Safira parecia mais confiante. Em partes, ele estava satisfeito.
Pensando no futuro, Colin sentiu que não poderia depender tanto de suas companheiras, ele teria que ficar mais forte. Este era um mundo mágico, então deveria ter lugares pacatos para se ir, quem sabe ele conseguisse entrar em uma guilda e levar a vida como mercenário, já que esse também parecia ser o caminho mais fácil para conseguir dinheiro.
— Onde encontro uma guilda a partir daqui? — ele indagou.
— Hm, não vai conseguir nada pelas redondezas. Você deve ir até capital. A universidade lá recruta todo tipo de aluno, mesmo se eles forem Elfos Negros. A universidade financia algumas guildas com o aval do império. Não será difícil para você e suas amigas entrarem em alguma guilda já que são bem fortes.
Colin assentiu.
— E como chego na capital daqui?
O velho apoiou a mão no queixo e olhou para o horizonte. Apontou com o indicador para além das Montanhas no Norte.
— Vales virgens dormem depois daquelas montanhas. Você deve conseguir encontrar o caminho por lá. Daquele ponto em diante tudo é comandado pelo Império de Ultan. A guerra ainda não alcançou seus portões, mas tome cuidado, o caminho até lá é bastante tortuoso.
“Império de Ultan… Os desgraçados que me capturaram”.
Mesmo que seu poder atual não fosse grande coisa, ele acabou de vencer um ser lendário. Enfrentar bandidos de estradas ou pequenas guarnições não seria um desafio para ele.
Colin coçou a bochecha com o indicador e deu de ombros.
Correndo o olho ao redor, observou duas garotas cochichando enquanto o encaravam. Assim que Colin botou o olho nelas, ambas sorriram gentilmente.
Fazia tempo que ele não falava com mulheres. Safira e Brighid não contavam, pois, uma era uma garotinha, e a outra era um ser mágico. Incomodado com os olhares, Colin engoliu em seco e virou o rosto, sentindo desconforto.
“Será que devo tentar uma investida? Acho que tudo bem se eu fizer. Relaxa, Colin, você já fez isso antes, é fácil.”
Assim que ele começou a se aproximar das garotas, a Fada apareceu de repente em sua frente e Colin quase caiu para trás de susto.
— Colin! Finalmente você acordou! — disse empolgada — Eu não sabia que os humanos faziam festas tão divertidas! Você viu quanta comida eles têm? Me segue, guardei um pão de doce delicioso pra você experimentar!
— Agora não, Brighid.
— Por que não? Não está com fome?
— Não. Depois a gente se fala.
Colin passou por Brighid sem lhe dar atenção e ela sentiu-se desconfortável com a forma como foi ignorada, especialmente depois de vê-lo conversando animadamente com duas garotas.
Um aperto doloroso se instalou em seu peito e, em seguida, a raiva tomou conta dela, fazendo com que virasse as costas.
— Colin idiota! Se ele não está nem aí pra mim, então não estou nem aí pra esse ingrato! Treinei ele, o fortaleci com minha magia, enfrentei aquele Bakurak por ele e mesmo assim ele me trata desse jeito — ela ficou cabisbaixa. — Eu só queria que ele comesse o pão doce que guardei…
— Algum problema? — perguntou o velho atrás dela.
Brighid cruzou os braços e fez beicinho.
— O problema é que Colin é um idiota! — irritada, ela bateu asas e voou para longe.
Enquanto as companheiras de Colin se afastavam, ele se aproximou das garotas. Depois de mais um pouco de conversa, uma das amigas saiu, deixando Colin a sós com uma delas. A garota com quem conversava era loira, olhos azuis e lábios grossos.
A garota dizia a ele a quão impressionada ficou de Colin ter vencido o Bakurak. Grande parte do mérito era da Fada, mas ele nada disse, deixou seu ego ser massageado e deixou a garota se iludir com as ideias sobre ele.
Era a primeira vez que uma mulher o elogiava tanto com Colin dizendo apenas meia dúzia de palavras.
Ele se sentiu como uma celebridade conversando com uma fã.
— Você gostaria de dançar, senhor Elfo? — perguntou ela bem próxima a ele. A garota jogou uma mecha de cabelo para trás da orelha e colocou as mãos para trás, sorrindo de maneira gentil.
Fazia muito tempo que uma garota não olhava assim para ele.
Colin engoliu em seco e manteve o olhar firme.
— Eu não sei dançar — ele mentiu. Colin sabia dançar, e muito bem por sinal.
A garota ofereceu a mão direita para ele.
— Quer que eu te ensine?
Ele encarou a mão dela e logo depois pousou seus olhos sobre seu sorriso doce, mas seus olhos desceram um pouco mais, vendo uma mulher formosa com um belo corpo curvilíneo.
— Tudo bem!
O alaúde, a batida de pés e o som de flautas trouxeram uma balada agitada para aquele dia festivo. Colada a ele, a loira ensinou a Colin como se fazia, e ele pegou os passos bem rápido, já que o próprio sabia dançar.
Depois dos primeiros segundos, foi ele quem a conduziu, girando-a enquanto ia de um lado para o outro em uma coreografia que ambos sincronizaram sem muito esforço.
Assim que a balada chegou ao fim, os dois permaneceram juntinhos, olhando para o outro como dois adolescentes.
— Senhor Elfo… — sussurrou no ouvido dele. — O meu pai está bêbado — apontou com o queixo para um homem loiro robusto segurando uma caneca de cerveja. — Ele não gosta que eu mostre a coleção de espadas dele, quer ir lá em casa? Acho que dá tempo de eu mostrar a você a coleção toda, já que ele provavelmente vai desmaiar de bêbado aqui…
Colin tentou decifrar o que ela queria dizer, mas entendeu instantes depois que ela estava o convidando para algo a mais do que ver simples espadas.
— Tudo bem, estou curioso para ver essa “coleção”.
A loira encarou Colin e mordeu os lábios. Depois, agarrou o pulso de Colin e atravessou a festa com ele.
— Onde senhor Colin está indo com aquela moça? — indagou Safira a Brighid.
A Fada virou outro copo minúsculo de vinho e encarou aquela cena completamente irritada.
Depois da cortada de Colin, ela virou um copo atrás do outro sem parar, mas ela não era do tipo que ficava bêbada facilmente, mesmo que ela fosse minúscula.
— Colin é um idiota! — disse a Fada furiosa. — Deixe esse idiota pra lá!
Safira sentiu que a fada estava irritada e realmente deixou aquilo para lá. Ela continuou bebendo seu suco e comendo seu pão doce sossegada. Aquele admirável mundo novo estava começando a ficar interessante, e Colin aproveitaria cada segundo, afinal, ele tinha ciência que a calmaria naquele mundo era tão passageira quanto uma paixonite adolescente.
Regras dos Comentários:
Para receber notificações por e-mail quando seu comentário for respondido, ative o sininho ao lado do botão de Publicar Comentário.