Índice de Capítulo

    Duas semanas haviam se passado desde que o ducado de Colin e alguns pontos estratégicos foram atacados. Neste tempo, o errante treinou com os carniceiros. Com o território limpo, seus principais capitães, Dusken, Lettini e Falone, escolheram tenentes para seus esquadrões, e os tenentes escolheram os sargentos e os cabos.

    Era uma hierarquia militar que funcionava perfeitamente sem Colin, e ele preferia assim. Os homens enviados por Ayla foram bons em atualizar os carniceiros no uso de táticas militares sofisticadas, já que o grupo funcionava mais como uma pequena milícia organizada do que um exército.

    Assim que o território foi limpo, as notícias sobre os carniceiros começaram a se espalhar como fogo em feno seco. Duques de terras vizinhas morriam de medo de serem atacados pelos carniceiros do centro-leste, já que após o fim de Ultan, reinos pequenos que mantinham relações comerciais com outros reinos pequenos sentiram-se ameaçados por uma força maior.

    Os nobres e pequenos senhores de terras que faziam fronteira com os carniceiros se viram em um impasse, principalmente aqueles que residiam no império do Sul e estavam a poucos quilômetros do ducado do carniceiro, que crescia de maneira acelerada.

    Cogitaram um plano de assassinato, mas circulavam boatos que o carniceiro assassinou o submundo do império do sul em uma noite, a única noite em que todos aqueles figurões se reuniram.

    Com medo, escreveram para Colin.

    Suas intenções eram a de chegar a um acordo com o tirânico rei dos carniceiros do centro-leste. Colin os respondeu, dizendo que aceitaria a reunião, mas ela aconteceria no ducado, com todos os donos de terra.

    Primeiro, pensaram que seria um plano do carniceiro para assassinar todos eles e assumirem suas terras, porém, aquilo compraria uma briga direta com o império do Sul, e descartaram que o carniceiro fosse insano a esse ponto.

    Eram dez senhores ao todo, vestindo túnicas pomposas que valiam uma fortuna. Ao chegarem na fronteira, carniceiros os acompanharam a cavalo enquanto os mesmos estavam confortáveis em suas diligências, observando pequenas vilas serem erguidas, estradas serem feitas e torres de vigia ganhando ainda mais imponência.

    Vestindo armadura preta e portando expressões fechadas, os carniceiros eram o suficiente para causar pânico aos nobres. Cavalgaram por mais algumas horas até chegarem ao ducado que estava ganhando o toque dos arquitetos de Ayla. Construções góticas imponentes estavam sendo erguidas. As ruas estavam começando a se encher de comerciantes, tavernas estavam cheias, assim como os bordeis.

    Não importava para qual carniceiro olhassem, todos pareciam encarar a diligência com ódio ou desprezo, e isso deixou os nobres angustiados.

    Enfim, chegaram ao palácio real do carniceiro.

    Os nobres, que chegaram em três diligências, desceram cuidadosamente vendo a entrada vislumbrante do palácio. O toque da arquitetura gótica deixava tudo imponente e assustador ao mesmo tempo.

    O chão, era de mármore branco reluzente, as paredes eram ornadas, com detalhe único, o teto ficava a metros do chão, e era pintado como nas catedrais, porém, a pintura estava incompleta, contando somente a queda de Ultan.

    — Oi! — gracejou Alunys — Vocês devem ser do império do Sul, certo? Senhor Colin está esperando por vocês.

    A Elfa trajava um terno feminino com o colete preto. Seu cabelo estava solto e já passava dos ombros. Debaixo do braço direito ia um livro grosso, e suas botas cobriam toda canela.

    — Por favor, me sigam!

    Ela começou a caminhar.

    Eles acharam estranho ter uma Elfa da floresta em posição de poder, já que eles estavam acostumados a ver Elfos serem escravos ou trabalhando em atividades insalubres. Subiram a escada de madeira que parecia ter sido envernizada recentemente e vagaram por um corredor até ficarem próximos a uma porta de madeira.

    — Alunys! — Leona veio empolgada do fundo, acompanhada de um homem e uma mulher que estavam visivelmente cansados. Todos eles usavam preto, mesmo que suas roupas fossem casuais. — Acabei de desenvolver outra técnica, vêm! Você tem que ver, juro, é melhor que a última!

    A Elfa suspirou.

    — Não dá, estou trabalhando.

    Leona segurou uma das mãos da amiga.

    — Trabalhando? Mas o mestre Colin nem paga você, ande logo, vêm!

    — Senhorita Leona — Chamou a mulher de cabelo curto que a acompanhava — Senhora Alunys parece mesmo ocupada…

    A pandoriana olhou para todos aqueles nobres.

    — E quem são esses? São nobres ou algo assim?

    Coçando a nuca, Alunys assentiu.

    — São… prometo que mais tarde verei o seu golpe novo, está bem?

    Após cruzar os braços, Leona fez beicinho.

    — Sei… — Ela pegou no pulso dos dois que vieram com ela — Já sei, nós três vamos aprender técnicas novas! Como já consegui, é a vez de vocês!

    O rapaz olhou para Alunys enquanto Leona o puxava. Seus olhos pediam socorro, assim como os da garota.

    — D-Desculpem por isso — disse Alunys aos nobres — Aquela é Leona, pandoriana do senhor Colin. Depois dele, ela é o ser com a maior autoridade no exército dos carniceiros. Bem, hora de entrar.

    Os nobres se entreolharam, se perguntando como alguém sem disciplina ou etiqueta de uma líder estava acima de todos os capitães, tenentes e soldados do temido exército de quem ouviram falar.

    Para eles, era simplesmente inacreditável.

    A Elfa empurrou a grande porta com uma das mãos, revelando o grande salão de reuniões. Ele tinha uma atmosfera sombria, com a baixa luz de velas que ficava em um lustre, acima de uma extensa mesa de madeira ornada. As paredes de pedra lascada e o piso de granito negro só deixava tudo mais assustador.

    Havia uma única veneziana no fundo, e ela estava fechada.

    Colin estava no fundo, na ponta da mesa. O líder dos carniceiros estava gangorreando na cadeira enquanto seus pés estavam em cima da mesa. Vestia como uma pessoa comum, bem diferente do que os nobres imaginavam.

    O futuro rei de Runyra vestia uma camisa preta justa, calça-moletom da mesma cor e chinelos de couro e borracha.

    — Senhor, eles estão aqui.

    Colin passou o olho por cada um deles e parou de gangorrear. Tirou os pés da mesa e assentiu.

    — Obrigado, Alunys, pode nos deixar agora.

    Ela assentiu e deixou a sala, fechando a porta.

    Os nobres continuaram parados, assustados com a atmosfera do ambiente e com o próprio Colin.

    — Sentem-se.

    Aquilo não soou como pedido, mas como ordem. Todos eles encontraram seus lugares e se sentaram. Colin deixou apenas o braço direito em cima da mesa, enquanto mesmo estava sentado um pouco de lado, desalinhado com seus convidados.

    — Os senhores da fronteira do Sul — disse Colin apontando o indicador para eles — Querem chegar a um acordo, certo?

    Um dos nobres de barba rala e cabelo grisalho resolveu ser o primeiro a falar.

    — Sim, senhor, sou Yurint, trabalho com a produção de leite — A voz dele hesitava, alterando do tom médio para o baixo — S-Senhor, minha produção alimenta vilarejos inteiros, há dezenas de crianças, e se uma guerra começasse, seria ruim para mim, mas seria pior para essas pessoas. — Ele passou o olho pelos nobres — Vendemos barato as vilas próximas, empregamos pessoas, praticamente nos viramos sem a ajuda do império do sul, que foca seus esforços entorno da capital…

    Colin continuou em silêncio, um silêncio incômodo.

    — Senhor — disse outro nobre de barba longa — N-Nós não temos escravos, ouvimos o que o senhor fez com o submundo do império do Sul, c-confiamos que o senhor seria compreensivo conosco, por isso todos viemos até aqui como pediu…

    O carniceiro continuou em silêncio, olhando um por um. Colin estava alerta em relação ao sul, mas nunca foi sua intenção atacá-los primeiro. Seu foco era o norte e Alexander.

    — O império do sul é bem grande, não é? — Ele indagou — Sei que a capital de vocês fica próxima ao mar, e é um caminho muito longo até chegarem onde estão. Também sei que estão reorganizando seu exército, não sei se estão pensando em me atacar, mas se fizerem, uma guerra iniciará, e eu não poderei considerar nada do que estão me pedindo. Será meu povo contra o seu povo. Porém, tenho uma condição para o acordo.

    Os nobres engoliram o seco.

    — Vocês me enviarão relatórios contínuos do império do sul, certamente devem ter contatos que os ligam diretamente ao exército, certo? Afinal, vocês são homens importantes.

    Era um pedido relativamente simples, e isso fez os nobres terem inúmeras perguntas.

    — É… apenas isso que o senhor deseja?

    — Não. Vocês são donos de terra, certo? Empresários bem sucedidos em suas áreas de atuação. Quero que ensinem seus processos aos meus habitantes. Podemos comercializar algo no futuro, quem sabe nasça uma grande parceria entre nós. — Os nobres se entreolharam novamente e Colin levantou o indicador da mão apoiada sobre a mesa — Caso o Sul descida avançar sobre minhas terras, quero que fiquem ao meu lado. Mantenham-me informado, e quando o Sul decidir agir, meus soldados irão até as terras de vocês, e para ficarem seguros, vocês e todos os vilarejos próximos se refugiarão no Centro-leste.

    Era um pedido inusitado, mas eles não tinham escolha. O Sul provavelmente colocaria uma espada e lança na mão de qualquer homem ou garoto que conseguisse andar e os obrigaria a morrer pela nação. O carniceiro não parecia estar mentindo, e os nobres ficaram inclinados a aceitar. Seria mais benéfico ter a proteção de um rei, do que a dúvida de ser protegido por outro.

    — Se o Sul resolver entrar em guerra com o senhor — Disse um homem careca — Você pretende…

    — Destruí-lo — respondeu Colin — Alexander resolveu me atacar porque me casarei com a rainha Ayla. Ele se sente ameaçado por mim, e acredito que o império do sul também sinta — Colin franziu o cenho — Alexander começou essa guerra quando resolveu atacar a minha casa, por isso ele terá o que merece. Se o imperador de vocês fizer o mesmo, então ele também sofrerá as consequências. O que ouvem sobre mim, as histórias de crueldade e atos desumanos, só faço com meus inimigos, nunca com um aliado. A escolha é de vocês. Se decidirem não aceitar, não os atacarei, mas se o Sul resolver me atacar, então não terei escolha. E então, como será?

    Após cruzarem rapidamente os olhares, os nobres engoliram o seco e assentiram.

    — N-Nós aceitamos! — Foi unânime.

    Colin bateu o indicador na mesa e se ergueu.

    — Ótimo! Acertem com Alunys, eu tenho que ir até Runyra. Da próxima vez que nos vermos, senhores, eu serei rei. — Ele passou por eles, indo até a porta — Aproveitem a cidade, até logo.

    Ele deixou o cômodo, indo para o lado de fora. Alunys estava encostada na parede o esperando.

    — Como foi? — Ela perguntou.

    — Correu tudo bem, acerte os detalhes com eles e faça as malas.

    — Fazer as malas?

    — Meu casamento é em três dias, e você vai.

    — E-Eu?

    — É, você, Leona, Dusken, Lettini e Falone. Vocês são os mais importantes do ducado, meus companheiros mais fiéis. Cronius e Belani podem manter as coisas funcionando por aqui.

    Alunys desviou o olhar envergonhada. Era o primeiro evento que iam em meses, e seria um casamento real. Algo assim costumava ser bem luxuoso. Ela nem sabia o que iria vestir, que penteado faria, qual perfume usaria, mas era uma ideia que a deixava empolgada. Seria uma folga no meio de tanto trabalho.

    — Tá! — disse empolgada — Vou terminar com os nobres do Sul e já vou me arrumar! — Ela empurrou a porta e adentrou.

    Colin apoiou as mãos na anca, olhou para cima e deu um longo suspiro. A cada dia que passava, ele ficava responsável por mais e mais vidas, consequentemente ganhava ainda mais poder, alimentando o Colin entediado por não conseguir um oponente que desse a ele uma luta desafiadora.

    Ele não contava com o ataque do Sul, mas torcia em silêncio por isso. Só de pensar em enfrentar o Norte, Alexander e o Sul, Colin sentia demasiada excitação. Nos quase oito meses que passaram, Colin sentia estar diferente. Ele transparecia ser uma pessoa mais calma no dia a dia, mas isso mudava quando resolvia lutar.

    Sua sede de sangue havia escalado a níveis que ele não conseguia controlar. O seu sangue de errante estava ficando mais forte, mas a mudança que sofria era sutil, algo que suas companheiras notariam.

    Até mesmo o casamento com Ayla era algo que ele não dava tanta importância. O importante era adquirir as terras, expandir seu pequeno império e ter o combate brutal que buscava a meses, afinal, essa era a razão de tudo isso. Colin não mais se preocupava com Brighid como antes, pensava que se ela estivesse viva, eles eventualmente se encontrariam, assim como as crianças do ducado.

    Ele estava mudando.

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