Índice de Capítulo

    Yonolondor caminhava de um lado para o outro na sala com um ritmo frenético, seus passos inquietos ecoando contra as paredes de pedra.

    As mãos estavam firmemente entrelaçadas atrás das costas, a testa franzida sob o peso das preocupações que turvavam sua mente.

    As notícias da desaparição de seu primeiro exército de ataque haviam sido um golpe devastador para sua estratégia e moral. A morte de seu aliado, Alexander, deixou um vazio estratégico e emocional que parecia insuperável. E agora, Rontes, detentor de um exército outrora numeroso e orgulhoso, era assombrado pelo espectro de Runyra.

    Foi nesse momento de desespero que a porta da sala se abriu abruptamente, e um homem, visivelmente exausto e com a respiração ofegante, entrou correndo.

    Suas vestes estavam sujas e rasgadas.

    Yonolondor parou de andar, virando-se abruptamente para o recém-chegado.

    — O que aconteceu? Fale! — ordenou, a voz carregada de urgência e temor.

    O mensageiro, lutando para recuperar o fôlego, apoiou-se em seus joelhos por um momento antes de erguer a cabeça para encarar seu rei.

    — Meu senhor, — ele começou, a voz trêmula — as notícias são sombrias. O forte de Nutorenur… caiu.

    Um silêncio pesado tomou a sala.

    Yonolondor sentiu um aperto no coração, uma sensação de desolação se espalhando por seu ser.

    — Continue — disse ele, finalmente, a voz pouco mais que um sussurro.

    — Os soldados de Runyra não pouparam ninguém — o mensageiro prosseguiu, a dor e o horror, refletidos em seus olhos. — Sua brutalidade desumana… está espalhando terror entre nossos homens. Muitos desertaram, temendo enfrentá-los. Sem o forte de Nutorenur, nada mais impede as forças de Runyra de marchar diretamente para nossa capital.

    Yonolondor sentiu o peso do desespero esmagá-lo.

    A perda do forte de Nutorenur não era apenas uma derrota estratégica; era o fim de qualquer esperança de deter a maré avassaladora que era o exército de Runyra. Com os olhos fixos no mensageiro, Yonolondor compreendeu a magnitude do desafio que tinha pela frente.

    — Prepare nossas forças restantes — ordenou, a voz firme apesar do tumulto interno. — Não vamos nos render sem lutar. Se Runyra deseja nossa capital, que pague por ela com seu próprio sangue.

    O mensageiro assentiu, um novo fogo acendendo em seus olhos diante da determinação de seu rei.

    Enfiando as mãos nos bolsos, Yonolondor retirou o frasco que Alexander havia entregado, prometendo força e poder.

    — Melhor que isso sirva de alguma coisa…


    O forte de Nutorenur jazia em ruínas.

    As estruturas outrora imponentes agora eram não mais do que sombras de si mesmas, envoltas em camadas de fumaça que se erguiam lentamente em direção ao céu cinzento.

    O cheiro penetrante de sangue impregnava o ar, tão intenso que aqueles que caminhavam entre as ruínas podiam sentir o gosto metálico de ferro em suas bocas.

    Nas paredes do forte, Lettini fez questão de adicionar uma decoração macabra aos escombros. Crânios de soldados caídos pendiam em cordas, balançando suavemente com o vento. Cada crânio trazia um gancho cruelmente enfiado em seu nariz, lembrando peixes capturados em anzóis.

    Em um canto menos destruído do forte, em volta de uma mesa improvisada, encontravam-se Elhad, Sashri, Falone e Leona, indiferentes à devastação ao seu redor.

    Eles jogavam cartas.

    Risadas e provocações eram compartilhadas entre eles, criando uma atmosfera de camaradagem que parecia deslocada em meio ao caos.

    Enquanto isso, o restante de seus homens ocupava-se em pilhar o que restava de valor no forte. Armas, armaduras, objetos de arte e qualquer item de valor eram coletados com uma eficiência fria.

    Preparavam-se para retornar a Runyra, suas sacolas e carregamentos pesados com os espólios da vitória.

    A cena dentro do forte de Nutorenur era uma ilustração vívida da brutalidade da guerra. Enquanto uns se deleitavam com o sucesso e o ganho, outros pagavam o preço máximo, suas vidas reduzidas a meros adornos na parede ou a objetos de saque.

    Não era surpresa que muitos Rontinianos preferiam fugir a ter que enfrentá-los. Eles eram verdadeiros carniceiros, poupavam civis, mas qualquer soldado que apontasse espadas a eles era obliterado da forma mais cruel possível.

    — Mais dois dias e alcançamos Yonolondor — Elhad jogou sua carta. — Quem vai lutar contra ele?

    Entediada, foi a vez de Leona jogar a carta.

    — Tanto faz, ele não deve ser tão forte. Seria melhor ter ficado em Runyra treinando.

    — A gente podia estabelecer regras — disse Sashri. — Do tipo que ninguém pode interferir. Se um for derrotado, o outro entra.

    — Para mim, tudo bem se for assim — foi a vez de Falone jogar a carta. — Que tal se a gente tirasse nas cartas?

    — Por mim, tudo bem, e para vocês? — perguntou Elhad. — Ei, Heilee, vai participar?

    Heilee estava afastada, comendo uma maçã enquanto lia um livro.

    — Não sei do que estão falando, mas passo — respondeu.

    — Vamos chamar Lettini? — perguntou Falone jogando mais uma carta.

    — Claro que não! — respondeu Sashri. — Ela e esses malucos sob comando dela já se divertiram bastante, é a nossa vez.

    — Ganhei! — Leona jogou sua última carta e ergueu-se, mostrando os bíceps. — Vocês são horríveis! Passem o dinheiro para cá!

    Elhad começou a reorganizar as cartas. — Vamos fingir que não vimos você roubar.

    — Roubar? — Leona subiu o tom de voz. — Essa é sua desculpa de perdedor?

    — Vamos lá, espertinha, escolha uma carta, quem tirar a maior vai enfrentar Yonolondor.

    Todos eles tiraram suas cartas e as colocaram na mesa.

    — Ganhei? — disse Sashri. — Merda…

    Todos a encararam com a sobrancelha erguida.

    — O que foi? — perguntou Leona. — Não foi sua a ideia de colocar regras?

    — É… mas nunca fui muito sortuda, jurei que perderia isso.

    Falone deu dois tapinhas nas costas dela.

    — Finalmente veremos você em ação!

    — Tsc… saco… vamos outra rodada, preciso me distrair.


    Colin estava sentado confortavelmente em uma cadeira acolchoada, seu refúgio tranquilo dentro do caos alegre de seu jardim palaciano.

    Em suas mãos, um livro grosso sobre receitas que passou a ser uma paixão menos conhecida sua, mas uma que ele abraçava com o mesmo fervor com que se dedicava a todas as suas empreitadas.

    Ao seu redor, desenrolava-se em uma cena cheia de calor e risadas. Nailah e Brey estavam completamente absortas em seu mundo particular, brincando em uma casinha de bonecas feita de madeira.

    Seus risos e exclamações ocasionais enchiam o ar, trazendo um sorriso ao rosto do rei.

    Não muito longe delas, os três filhos pequenos que Colin teve com Brighid brincavam sob a vigilância atenta das irmãs mais velhas, completando o retrato de uma família unida e feliz.

    O cabelo de Colin, meticulosamente penteado para trás, mantinha a elegância habitual, embora uma mecha rebelde insistisse em cair diante de seu rosto.

    Mesmo em um momento de descontração, ele não abandonava sua túnica de couro escura, calças e botas, complementadas por um cinto grosso que circundava sua cintura.

    Essa passou a ser a assinatura de sua identidade.

    — Nailah! Nailah! — chamou Brey. — Vamos fazer um piquenique na casinha hoje?

    — Um piquenique? Isso soa maravilhoso! O que devemos preparar para comer?

    Elas passaram muito tempo com Ayla, por isso tentavam imitar seus trejeitos e sua etiqueta da maneira que conseguiam.

    — Hum, podemos fazer sanduíches de pasta de amendoim e geleia! E também suco de maçã. Eu vou buscar as folhas para usarmos como pratos!

    Nailah sorriu, observando a irmã mais nova correr para coletar folhas do jardim.

    — Vou preparar os sanduíches então. Vamos fingir que a geleia é de morangos selvagens que encontramos na floresta.

    Brey volta, com as mãos cheias de folhas grandes e verdes.

    — Olha, Nailah! Estas serão nossos pratos. E podemos usar essas pedrinhas como copos!

    — Perfeito! Agora, proponho sentarmos e desfrutarmos do nosso piquenique!

    As duas irmãs se sentam, distribuindo as “comidas” imaginárias sobre as folhas, brindando com pedrinhas. Elas riem, sua imaginação indo longe, típico para crianças de sua idade.

    Em meio à tranquila tarde que Colin desfrutava, mergulhado nas páginas do seu livro de receitas, uma pequena interrupção veio na forma mais doce possível.

    Sua filhinha, cujos cabelos eram de um verde tão vivo quanto a grama fresca sob o sol da primavera, aproximou-se dele silenciosamente. Com os olhos grandes e curiosos, fixados na figura do pai, ela começou a puxar suavemente a barra da calça dele, buscando atenção.

    Percebendo o gesto delicado, Colin baixou o olhar para encontrar os olhos brilhantes de sua filha, cheios de inocência e uma curiosidade que só as crianças possuem.

    Com um sorriso carinhoso, ele estendeu os braços, levantando-a suavemente para aconchegá-la em seu colo.

    — Quer ver o que estou lendo? — Colin perguntou, abrindo mais o livro para que ela pudesse ver as páginas.

    O livro, repleto de receitas variadas, tinha ilustrações vívidas de pratos que capturavam a imaginação.

    A menina olhou com admiração, seus dedinhos apontando curiosamente para as imagens coloridas de bolos, tortas e pães.

    — Este aqui é um bolo de chocolate, e aqui temos uma torta de maçã, sua mãe é especialista nesse — ele narrava, observando as reações de encanto e surpresa no rostinho dela.

    Mesmo na tenra idade, a menina, ouvindo atentamente, deixava escapar exclamações de maravilha, especialmente quando chegavam às receitas de doces.

    Uma voz os interrompeu.

    Tuly, o líder da guarda, apareceu na entrada da sala com uma expressão séria e apressada em seu rosto.

    — Mil perdões por interromper, Senhor, mas é urgente. Recebemos notícias do Norte.

    Colin colocou sua filha no chão novamente, que foi engatinhando até seus irmãos.

    O que é?

    Tuly entregou uma carta com o selo de um floco de neve onde havia diversas assinaturas de condes, marqueses e duques do noroeste. 

    “À Sua Majestade, o Rei Colin de Runyra,

    Com o mais profundo respeito e a maior das humildades, nós, os nobres de Yonolondor, condes, duques e marqueses, cujos nomes carregam o peso da nossa rica e longeva herança, encontramo-nos hoje diante de Vossa Majestade em uma situação sem precedentes.

    A penumbra das guerras e conflitos que têm envolto nossas terras têm, sob a sombra de ameaças, forçado nossa mão a uma aliança relutante com os poderes que agora reconhecemos como déspotas.

    Entretanto, é com olhos abertos e corações esperançosos que nos dirigimos a Vossa Majestade.

    Temos ouvido, por meio de relatos inegáveis de bondade e justiça, sobre o reino sob o seu comando. A prosperidade de Runyra, sob sua liderança, não é apenas um testemunho do seu direito divino ao trono, mas também da sua compaixão e sabedoria como governante.

    Tais histórias, que atravessaram fronteiras e chegaram até nós, acenderam uma chama de esperança em nossos corações, uma luz no fim de uma escura estrada que tem sido a nossa existência sob o jugo de Yonolondor.

    Com este espírito de renovação e em busca de um futuro mais promissor para nosso povo, estendemos nossa mão em sinal de paz e submissão ao seu império.

    Reconhecemos a superioridade de Runyra e a legitimidade de seu reinado. Estamos dispostos e ansiosos para dobrar nossos joelhos perante Vossa Majestade e aceitar os termos que considerar justos para esta transição.

    Imploramos, porém, em nome da humanidade e da decência que parecem tão intrínsecas ao seu reino, que ordene aos seus comandantes e aos seus valentes soldados que cessem imediatamente o derramamento de sangue e a destruição de nossas terras.

    Permita-nos curar e reconstruir sob a sua bandeira, sob sua benevolente orientação.

    Sabemos que a nossa rendição pode ser vista como ato de conveniência, talvez até de desespero. No entanto, asseguramos a Vossa Majestade que é, acima de tudo, um reconhecimento da superioridade moral e ética do seu reino.

    Desejamos ser parte desta grande nação, contribuir para a sua glória e prosperar sob a sua proteção. Deixe que este momento seja um marco na história, um testemunho da sua grandeza e da sua misericórdia.

    Aguardamos, com batedores corações, a sua resposta e as instruções para o próximo passo nesta jornada para a paz. Que este ato de submissão e pedido de clemência marque o início de uma nova era para o nosso povo sob o estandarte de Runyra.

    Com o mais alto respeito e lealdade,

    Condes Martuniano, Sereminus e Leprocy; Duques Morgot e respien, e o marques Gereminion.”

    Colin não podia se sentir mais satisfeito após ler a carta.

    — Tuly, mande um corvo a eles, dizendo que quero os encontrar aqui. Depois mande outro corvo para Elhad e os outros, dizendo para eles não avançarem nem mais um passo.

    — Claro, senhor.

    Era difícil para Tuly compreender o que se passava na mente do rei. Os carniceiros, mesmo com um contingente minúsculo, massacraram os soldados de Rontes.

    Corvos chegavam todos os dias relatando os avanços significativos, e pelas últimas notícias, eles estavam próximos de acabarem com a guerra, mas ele não questionava.

    Ele havia passado tempo demais com ele para reconhecer a grandeza do homem que servia, por isso o respeitava à medida que o temia. Uma coisa era certa na cabeça de Tuly, Colin poderia acabar com Yonolondor sozinho, mas ele parecia estar gostando de ficar nos bastidores

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