Índice de Capítulo

    Stedd seguiu o seu caminho de manhã após se despedir de seus amigos e, após mais alguns dias, Colin e o restante do pessoal se despediram dos cocheiros que haviam deixado-os no vilarejo. Para um vilarejo isolado e longe da jurisdição de Ultan, ele era muito belo. As casas eram belas, se assemelhando a arquitetura gótica da terra e as pessoas se vestiam decentemente.

    O chão era bem ladrilhado e as pessoas pareciam felizes. O vilarejo se destacava por suas inúmeras lojas de roupas, joalherias, boticários e perfumarias. Não havia soldados no vilarejo. O castelo dos vampiros era uma lenda local que afastava salteadores e bandidos, deixando a cidade extremamente segura somente pelos boatos que iam de boca em boca viajando por todo continente.

    Dali já se dava para ver o grande castelo dos vampiros ao longe, localizado na beirada de um precipício.

    Escolheram não pegar nenhum cavalo, já que os cocheiros haviam recebido bastante moeda para os trazerem até este vilarejo, deixando-os quase completamente zerados.

    Sem demora, escolheram seguir caminho a pé até o castelo. Pegaram uma estrada de terra onde alguns amantes de caça se aventuravam nas matas portando suas bestas a fim de caçar javalis, já que era bem comum javalis naquela região. Alguns caçadores também se arriscavam com ursos e tigres. A pele desses animais valia um bom preço quando oferecida a alfaiates de vilarejos vizinhos.

    Caminharam mais um pouco até estar perto do castelo. A vegetação começou a mudar drasticamente. O amarelo do outono das folhas desaparecia, dando lugar a árvores mortas e ouvia-se o som constante do uivo de lobos.

    Assim que estavam próximos do castelo, olharam um jardim que estava bem vivo. Havia um mar de rosas-vermelhas como sangue enfeitando uma extensa área que mais parecia um campo de futebol. Na escadaria viram duas enormes gárgulas de pedra enfeitando a entrada.

    Aquilo espantava qualquer tipo de curioso que tentasse se aproximar.

    — Caramba, esse lugar me dá calafrio — disse Wiben.

    O castelo tinha uma arquitetura gótica bem semelhante às casas do vilarejo. Colin olhou a maçaneta da enorme porta de madeira. A maçaneta, era duas argolas ornadas que lembravam em muito a cabeça de um demônio.

    Colin pegou a argola e bateu três vezes na enorme porta.

    Toc! Toc! Toc!

    Colin deu um passo para trás e não obteve nenhuma resposta do outro lado por um tempo. Instantes depois a porta se abriu sozinha em um rangido agudo.

    Eles se entreolharam se perguntando para si mesmos quem teria coragem para dar o próximo passo. Colin entrou e os outros o seguiram. O interior era bem escuro, vendo somente o mínimo devido à luz do sol que vinha da porta aberta.

    Lentamente, a porta atrás deles começou a fechar em um rangido ainda mais agudo.

    Vush, Vush, Vush, Vush!

    Vários castiçais se ascenderam de uma única vez, iluminando todo hall de entrada. Eles olharam para cima, ficando encantados com o que viram. De fato, parecia um palácio, e Colin se recordou das igrejas que eram enfeitadas de pinturas do chão ao teto, mas em vez de imagens de anjos, eles viram vampiros se alimentando de todo tipo de pessoa. Viram guerras milenares travadas por vampiros e outras raças, e viram demônios massacrando cidades inteiras.

    Escutaram passos lentos que vinham do fundo de um corretor escuro que ficava à direita. Assim que se viraram, viram olhos vermelhos no escuro e logo depois viram um sorriso de dentes pontiagudos.

    — Colin! — disse Graff saindo da penumbra — Então você veio mesmo e trouxe seus amigos.

    — Pensei que estaria tudo bem se treinássemos juntos.

    Graff fez que sim.

    — O castelo é grande, tem espaço para todo mundo.

    Mesmo vendo a imagem de uma criança, eles não ousaram perguntar, muito menos fazer piada. Eles sentiram que estavam na presença de um ser poderoso, talvez mais poderoso que o imperador de Ultan.

    — Veja o que temos aqui… — disse Graff se aproximando do grupo com as mãos no bolso — Um grupo bem interessante. Elfos, uma oriental e… — Graff ergueu levemente as sobrancelhas ao botar os olhos em Brighid — Uma fada…

    Ele sentia uma forte energia vindo de Brighid, a mesma energia que o abismo exalava. Reparou no cabelo e nos olhos verdes dela e abriu um sorriso que não conseguiu disfarçar.

    Ele apoiou a mão na cintura e fez que sim com a cabeça.

    — Morgana e os outros estão cochilando no momento. Como senti a presença de vocês de longe, eu decidi levantar mais cedo e acompanhá-los. Venham, mostrarei seus aposentos.

    Caminharam por um corredor extenso onde a parede de mármore tinha quadros pitorescos sinistros e uma tapeçaria avermelhada com a borda foliada a ouro. Passaram por pequenas estátuas, por jarros tão antigos que já beiravam os milhares de anos. Os corredores pareciam labirintos, tão grandes que depois de três viradas, Colin se esqueceu completamente do caminho.

    Chegaram a um quarto bem escuro de teto alto com quatro camas que tinham dosséis de madeira e lençóis pretos. No fundo, havia uma enorme janela redonda tampada por uma cortina escura. Havia dois armários no fundo, e como todo castelo, o quarto era bastante frio.

    — Os rapazes podem ficar aqui e as moças no quarto em frente. As coisas aqui começam a acontecer de noite, então peço que acompanhem nossa rotina durante sua estadia aqui.

    — Trocar o dia pela noite? — perguntou Colin.

    Graff fez que sim com a cabeça.

    As meninas se aprontaram no quarto da frente que era a mesma coisa dos meninos. Nada de cores chamativas, apenas preto e tons escuros em todo canto. Somente o vermelho sangue saltava a vista entre uma tapeçaria e outra.

    — Se acomodem aqui por enquanto, quando o sol se pôr apresentarei vocês a minha família.

    Wiben não pensou duas vezes e se jogou na cama tirando o sapato com os pés.

    — Esse lugar fede a mofo — disse Kurth olhando pela janela, observando em enorme vale verde e logo mais ao lado estava o vilarejo.

    Elhad se jogou na cama e apoiou as mãos atrás da cabeça.

    Colin se deitou na cama e abriu os braços depois de um longo suspiro.

    Ele havia cruzado boa parte do continente com sua viagem que lhe custou muitas moedas. Fechou os olhos lentamente e deu um longo bocejo.

    No quarto a frente, as garotas haviam se aconchegado. Sashri se jogou totalmente largada na cama e já fechou os olhos, não querendo papo com ninguém.

    Liena abriu os dois guarda roupas e viu roupas de linho e seda. Ela conhecia aquele material fino, afinal, ela era uma princesa.

    — Isso é oriental? — perguntou Liena a Lei Song.

    Lei Song pegou o vestido e sentiu a seda.

    — Sim, é. É estranho… vampiros parecem tão… reservados.

    A princesa da dinastia ainda estava se acostumando a seu grupo de amigos, se acostumando com cada um. De todos ali, ela havia se aproximado mais de Brighid, Samantha e Sashri, por serem mais velhas.

    Safira encarou Alunys olhando uma estante de livros e virou a cara emburrada, preparando-se para dormir.







    Não demorou para que todos adormecessem e acordassem anoite.

    A porta do quarto dos rapazes se abriu de repente, fazendo um barulho estrondoso.

    — Cooolin!

    Ele abriu os olhos ao ouvir aquela voz familiar.

    — Morgana…

    Ela adentrou o quarto pulando e chegou com a cara próxima ao rosto de Colin, que afastou um pouco.

    — Eu sabia que você viria! A gente vai lutar muito, não vai?

    Morgana ignorou todo mundo que estava no quarto, sendo escandalosa e incômoda.

    — Vim aqui para isso…

    — É! Eu sei! Graff me pediu para avisar que o banquete está pronto — Ela se aproximou do ouvido dele para cochichar algo — Era para só você ter vindo, a gente ia fazer um montão de coisa — Afastando-se ela deu dois tapinhas no ombro de Colin exibindo aquele sorriso sinistro. — Vou indo nessa, então é só seguir o corredor a esquerda e descer as escadas. Tchauzinho!

    Do mesmo jeito que entrou, Morgana saiu, saltitando e fazendo barulho.

    Wiben se sentou na cama coçando o olho.

    — Cara, você atrai mesmo as velhas em — zombou Wiben ficando de pé — Devia falar para ela sobre Brighid antes de ela descobrir, ou continua se fazendo de bobo. Ela é mais forte que você, um ataque de ciúmes dela pode acabar te matando.

    Colin o ignorou completamente. Encontraram com as garotas do lado de fora do quarto e foram para onde Morgana instruiu, com Colin assumindo a dianteira. Os corredores eram pouco iluminados com um incômodo cheiro de incenso rodeando o local.

    Haviam dezenas de quartos ao longo do corredor e, vez ou outra, as portas se abriam deixando pequenas frestas chamando a atenção do grupo que via olhos vermelhos os observarem do escuro. Aquilo os causava calafrios. Perambular por aí sozinho poderia ser um problema.

    Assim que desceram as escadas, viram uma mesa enorme, de uma riqueza gastronômica que nem mesmo os gêmeos haviam visto no palácio imperial.

    Desceram mais alguns degraus e viram pessoas de pele acinzentada e olhar morto segurarem instrumentos musicais. Graff bateu com a colher de prata na taça de vinho e eles começaram a tocar uma música baixinho.

    Um deles tocava piano, o outro um violino estranho. A canção era uma música clássica que soava bastante melancólica.

    Eles se entreolharam e Graff lhes estendeu a mão, oferecendo-lhes um assento a mesa.

    — Sempre amei esse som que essas coisas faziam. — disse Graff acompanhando a música com os dedos.

    A mesa de madeira era bem envernizada e não continha nenhuma poeira, nem mesmo um inseto sequer. Já dava para sentir o gosto dos porcos assados na boca. Então, Graff se sentou em uma cadeira para criança, colocou um babador branco no pescoço, pegou seu garfo e faca feitos da mais pura prata e começou a se servir em seu prato de vidro temperado.

    O que ele comia não parecia de origem animal, e sim humana.

    Empregadas com pele acinzentada se aproximaram e começaram a servi-los. Colin se sentiu dentro de um jantar da realeza do século XIX, porém, com uma pegada mais gótica. Os quadros na parede deixavam tudo mais assustador.

    Ouviram passos ao fundo e o restante da família de Graff se aproximou. Carmilla, Morgana, Orlok e Lestat se sentaram a mesa com uma etiqueta digna de reis. Porém, o prato deles foi algo mais visceral. A primeira coisa que viram foi um braço assado sendo partido por Orlok.

    — Como foi a viagem? — perguntou Graff

    — Foi bem tranquila. — respondeu Colin tentando não olhar para o prato dos vampiros — Achei que bandidos nos atacariam, mas acabou sendo uma viagem bem tranquila.

    Graff fez que sim.

    — Você parece ter amigos interessantes aí, tem até os gêmeos, filhos do imperador e irmãos daquele cara, Lumur, certo?

    — Conhece o nosso irmão? — perguntou Loaus.

    — Já ouvi falar dele. E veja só, uma fada com um corpo transmutado. — Graff deu uma garfada no fígado que comia — Parece que tem ficado comum fadas fazerem isso.

    — Como assim? — perguntou Brighid.

    Graff deu de ombros e partiu outro pedaço.

    — Aquele homem ainda está na sua ilha, e eu soube que ele não é nada gentil. E como as fadas são vistas com maus olhos, a maioria transmuta em corpos humanos. Você é de qual era?

    — Sou da geração de Plume Honeycurl, o mártir dos ossos.

    Graff ergueu as sobrancelhas.

    — Interessante, soube que não sobrou muito dessa geração.

    Brighid fez que sim com a cabeça.

    — Não havia sobrado muita coisa depois da guerra contra os gigantes, e nossos números eram bem baixos. Foi então que aquele homem apareceu e nos fez servi-lo como escravos…

    — Interessante, qual o seu nome?

    — Brighid, do clã Wrinklebud.

    Todos os membros da guilda focaram naquela conversa, até mesmo os vampiros. Brighid estava revelando coisas que nem mesmo Colin tinha conhecimento, algo de antes dela ser enviada a ilha de Drez’gan.

    Graff parou de comer imediatamente e abriu um sorriso, devolvendo seu garfo ao prato.

    — Ora, ora, uma Wrinklebud em carne e osso bem aqui na minha frente. — Graff subiu na cadeira e fez uma reverência. — É uma honra recebê-la em meu castelo.

    — Brighid é famosa? — perguntou Safira.

    Todos na mesa viraram o rosto para encarar Brighid e ela abanou uma das mãos envergonhada.

    — Não sou famosa, é que meu pai serviu ao rei das fadas eras atrás. Meu sobrenome desapareceu com o tempo junto da antiga era… Me surpreenda que o senhor conheça…

    — Como não poderia conhecer… Barin Wrinklebud, o penitente, era um querido amigo.

    Brighid arregalou os olhos e apontou para Graff. Quando ela não tinha nem ao menos um século de existência, seu pai fazia reuniões regulares com um vampiro que ele chamava de amigo. O vampiro, tentava convencer as fadas a entrarem na guerra contra os caídos, mas Barin não queria convencer seu rei e seu povo a travarem mais uma guerra. O confronto contra os gigantes deixou uma cicatriz no modo de viver das fadas e quase as levou a beira da extinção.

    Fadas demoravam séculos para procriar e sem soldados para se defender do caído, elas ficaram vulneráveis. As fadas que nasceram depois do caído tomar a ilha foram amaldiçoados, não os permitindo ferir humanos, tornando-os escravos daquele homem mesmo um milênio e meio depois.

    — Nosferatu Graff? Pelos deuses, eu não o reconheci nessa forma. Mil perdões!

    Graff abriu um sorriso de canto de boca.

    — Tudo bem. Soube que Barin morreu, foi quando aquele homem atacou a ilha?

    Brighid franziu os lábios e fez que sim.

    — Meio século depois que nasci, meu pai tentou lutar contra aquele caído, mas foi… trucidado… E então fugi depois da luta… Foram outras fadas comigo, mas o continente não foi nada generoso com nossa espécie. No fim… dei um pouco de sorte…

    Graff fez que sim com a cabeça.

    — Entendi, mesmo ferido, aquele caído ainda é poderoso.

    Brighid olhou para Colin ao seu lado e abriu um sorriso meigo.

    — Aquele dia em que você me libertou, foi a primeira vez em muito tempo em que alguém me tratou bem, que resolveu me ajudar sem esperar nada em troca.

    Morgana manteve o olhar firme em Brighid e começou a mastigar a coxa com mais ferocidade.

    — Que ótimo que estão todos bem e felizes — disse Graff — Quando terminarem o jantar, vamos lá para fora, Morgana tem uma surpresa para você, Colin.

    — Surpresa para mim?

    O semblante carrancudo de Morgana desapareceu completamente e ela engoliu a coxa o mais rápido que conseguiu.

    — Sim! — disse ela empolgada — Você vai adorar! Então termina bem rápido, tá bom?

    Wiben olhou de canto de olho para Colin e ele engoliu o seco se sentindo incomodado com aquele olhar zombeteiro.

    A conversa fluiu entre eles desconsertadamente. Carmilla se aproximou de Alunys e a própria Elfa ficou ainda mais surpresa após descobrir que Carmilla era uma monarca da árvore do pélago. Sashri falou um pouco com Lestat e Orlok manteve uma conversa centrada em Lei Song, já que ele queria saber como era o outro lado do continente.

    Depois de todos eles conversarem bastante, estava na hora da surpresa de Colin. Eles se moveram lá para fora e foram para o jardim de rosas.

    A lua minguante iluminava o caminho para um lugar aberto e amplo.

    Morgana caminhou para frente, cortou o pulso e deixou que sangue caísse na grama. Um círculo mágico apareceu abaixo dela e um tremor se iniciou.

    Do chão, apareceu um enorme altar de pedra com outras pedras enormes em volta. As pedras lembraram em muito as Stonehenge da terra. Morgana subiu até um altar e chamou Colin com a cabeça. Ele foi até o altar.

    Todos se perguntaram o que diabos era aquilo.

    — Consegue sentir isso? — perguntou Morgana fechando os olhos e inspirando fundo. — A magia aqui é bastante forte, por isso aqui é o lugar perfeito.

    — Perfeito para quê?

    — Fazer um pacto com seu pandoriano. Espere aqui, eu já volto.

    Colin engoliu o seco, então finalmente estava na hora de ele dividir a alma com um animal.

    Morgana entrou na floresta a frente e retornou instantes depois segurando não um felino, mas sim um canídeo que se parecia com uma raposa da lua.

    Sua pelagem era escura, mas suas orelhas tinham a cor acinzentada, assim como parte da sua cauda que era enorme. Mesmo para um animal de grande porte, não passava de um filhote.

    Subindo até o altar, Morgana entregou o animal a Colin, que encarou os olhos esverdeados do canídeo. Não era um filhote comum, aquele canídeo era tão grande que se parecia com um cão adulto de grande porte.

    — Uma Huliki? — balbuciou Lei Song.

    — Uma, o quê? — perguntou Samantha ao seu lado.

    — Hulikis… são pandorianos bem comuns de reis e imperadores na minha terra, principalmente por trazerem boa sorte e por serem bem poderosas e perigosas. São bem requisitados; por isso, são bem difíceis de achar, ainda mais um filhote de Huliki da lua como aquele.

    Samantha olhou para a raposa e depois olhou para Lei Song.

    — Aquilo ali não parece tão perigoso para mim.

    — É porque ainda é um filhote, e filhotes ainda são bem fracos e passivos. Quando ela ganhar mais caudas isso mudará…

    Samantha ergueu uma das sobrancelhas.

    — Mais caudas?

    — Quanto mais poderosa ela fica, mais caudas ela ganha.

    — E isso tem um limite?

    — A lenda diz que o ápice dela é quando ela consegue nove.

    — Lenda?

    — Sim, uma lenda. O único registro que isso aconteceu foram nos contos e romances do meu país. Ninguém nunca viu uma raposa de nove caudas em carne e osso.

    — Demorou — disse Morgana — Mas comprei esse filhote de raposa de um contrabandista amigo do Graff. Essa é uma fêmea. Normalmente são mais dóceis que os machos, porém ficam mais fortes conforme crescem. É um animal raro, com uma magia bem mais poderosa que uma pantera goggan, então deve conseguir atingir o estágio três sem problemas. Como a árvore da pujança é a que você mais está avançado, o filhote será tão forte quanto o meu pandoriano Hati.

    Colin ergueu aquele animal e o encarou nos olhos. Ele lambeu a mão de Colin.

    — Vamos começar o ritual. Pode ser um pouco doloroso, afinal, sua alma será dividida, mas depois dos primeiros cinco minutos você se acostuma.

    Colin arregalou os olhos.

    — Cinco minutos? Quanto tempo isso dura?

    — Meia hora.

    — O quê?!

    — Não seja um covarde. Coloque o filhote em cima do altar.

    E assim Colin o fez. Morgana pegou a palma da mão de Colin e com a unha pontiaguda do indicador fez um corte. Deixou o sangue cair no chão lentamente e, conforme o sangue caia, ele formava algumas runas.

    Todas as pedras ao redor começaram a brilhar em azul, e partículas começaram a rodeá-los, subindo até os céus.

    Colin engoliu o seco e encarou o felino, que só ganiu.

    Morgana iniciou o encantamento.

    — Oh! Benevolente Senhora Brumília, convoco e clamo pela ajuda de suas filhas, para que ajude este, seu filho, fruto de sua árvore, a mais bondosa dentre todas, onde somente dela é possível que suas sementes se tornem frutos e deem ainda mais frutos se transformando em árvores robustas e resilientes. Evoco sua filha guia, para que ajude um irmão!

    Um espírito em sua forma etérea ganhou forma ante a eles, Colin sentiu seu corpo inteiro formigar, era uma presença poderosa, capaz de fazer iniciar uma intensa ventania ao redor deles. Era uma mulher nua, tão alta que parecia um colosso e de cachos que eram bem maiores do que ela. Seus cachos longos se estendiam até os céus, e desaparecia em meio as nuvens.

    Até mesmo o pessoal do vilarejo pôde ver aquela mulher enorme de forma etérea saindo das redondezas do castelo.

    O espírito, sorriu gentilmente, estendendo suas mãos.

    Mesmo sendo a primeira vez que fazia aquilo, Colin sabia exatamente o que deveria ser feito. Foi quando ele entregou o felino, que praticamente desapareceu nas enormes mãos do espírito.

    — Colin, meu irmão! — disse o espírito, uma voz ribombante, capaz de fazer todo corpo de Colin vibrar. — Nossa mãe Brumília zela por você do outro lado.

    — Brumília sabe quem eu sou? — perguntou Colin.

    Ela fez que sim e sorriu. O canídeo se envolveu em uma espécie de ovo que emitia uma poderosa luz.

    — Colin! — disse o espírito. — Este pequeno animal aceita ser parte de você, um pequeno fruto de sua árvore, e você, aceita ser parte deste animal?

    Engolindo o seco, ele fez que sim.

    Uma corrente etérea deixou o coração de Colin e se entrelaçou no ovo brilhante. Colin sentiu uma forte batida de coração tremer todo seu corpo, como se seu peito segurasse um intenso terremoto. Seus joelhos tocaram ao chão e ele tornou a arfar, sentindo como se sua força fosse drenada de uma única vez.

    — Ele vai ficar bem? — perguntou Brighid a Graff ao seu lado.

    — Não se preocupe, o garoto vai sobreviver. — Graff olhou para cima encarando o semblante apreensivo de Brighid e abriu um sorriso. — Me diga, filha de Barin, quer ter sua maldição retirada?

    Brighid engoliu o seco e franziu os lábios.

    — A maldição do caído?

    — Sim. Consigo retirá-la para você, mas é um processo bem doloroso.

    Brighid ficou em silêncio um tempo, mantendo os olhos em Colin ajoelhado no altar.

    — Não sei se devo-

    — O Errante, você não o ama?

    — … onde quer chegar?

    — Você sabe que muita gente poderosa virá atrás dele, não sabe? Quem não gostaria de um errante como escravo? Afinal, eles podem atravessar dimensões, quebrar pactos e evocar seres de planos superiores. — Graff colocou as mãos no queixo e olhou para cima pensativo — Huum… e se os caídos o atacassem, o que faria? Afinal, eles têm muitos humanos como subordinados. Vai simplesmente deixar o garoto ser levado sem lutar?

    Mesmo não querendo, Brighid concordou com Graff. Colin ainda era um embrião em termo de forças se comparado a ela. O futuro que ela viu pesou em suas decisões. Ela tinha que fazer qualquer coisa que estivesse a seu alcance para tentar evitar o destino que esperava as pessoas que ela mais amava.

    — Tá, e como isso funciona? — Perguntou.

    Graff enfiou as mãos no bolso e caminhou para longe.

    — Me siga.






    Depois de quase meia hora o ovo chocou, e dele, saiu uma criança.

    Seu rosto era humano, seus cabelos eram longos, negros e atrapalhados, sua pele era morena como a de Colin, suas mãos e pés lembravam as de uma raposa. Sua cauda era longa e escura, assim como suas orelhas. Parte de seu corpo era peludo, e mesmo para uma criança, emanava um poder arcano incrivelmente alto.

    — Você é parte dela, e ela é parte de você — disse o espírito. — Adeus, irmão Colin. Nossa mãe zela por você em nosso reino.

    O espírito sorriu e desapareceu em pequenas partículas celestes. Era como se nevasse, e logo depois toda a luz desapareceu. Foi algo magnífico, de uma beleza indescritível.

    Pandoriano adquirido.

     + 10% de Força.

    +10% de Agilidade.

     Nova árvore liberada.

     Novas habilidades adquiridas.


    Depois do incrível espetáculo de luzes, Morgana se aproximou de Colin.

    — Tudo bem?

    Ele fez que sim e se levantou apoiando as mãos no joelho.

    Caminhou até seu pandoriano a passos lentos e observou aquela criaturinha que abria lentamente seus olhos. A pequena parecia ter por volta de seis anos. Em cócoras, Colin estendeu sua mão para ela.

    — Sou Colin, dividimos a alma a partir de agora.

    — Colin… — disse ela com uma voz sonolenta.

    Depois de um bocejo, a pandoriana coçou a bochecha e começou a cochilar. Colin esticou as mãos e a pegou no colo. A sensação que sentiu foi bem estranha. Sentia como se pegasse ele mesmo. Sentiu como se a conhece-se desde que se entendia por gente.

    — Qual o meu nome? — perguntou a pandoriana com a voz sonolenta.

    “Uma raposa… não sei qual nome escolher… Que tal Ahri? hmm, acho que não… tem que ser um nome mais forte… Já sei!”

    — Leona! — A cauda dela começou a balançar de um lado para o outro — Seu nome é Leona.

    — Leona… gostei…

    Como se tomasse uma dose repentina de adrenalina, a pandoriana acordou e abriu um sorriso semelhante ao de Stedd, caricato de caninos expostos. Arregalou aqueles grandes olhos que ficaram amarelos ao se fundir com a alma de Colin e inclinou a cabeça observando os amigos de seu mestre por cima de seu ombro.

    — Aqueles são seus amigos, né? — Ela apontou o indicador para eles — Eu me lembro deles, estão todos aqui — Apontou para sua própria cabeça. — Ainda está um pouco embaralhado, mas vou me lembrar.

    Ela ergueu os dois braços.

    — Leona! Leona! Leona! Leona! Leona! — Repetiu inúmeras vezes.

    “Parando para pensar… ela não é uma leoa, mas tudo bem, a pirralha parece ter gostado”.

    A pandoriana diminuiu o ritmo até que o sono a atingiu por completo. Encostando a cabeça no ombro de Colin, Leona começou a roncar baixinho.

    — E agora? — perguntou Colin a Morgana.

    — Agora você descansa.

    Sem cerimônia, eles retornaram para onde os outros estavam. Samantha e Liena acharam a garota bem fofa, Wiben a olhou com um olhar estranho. Era como ver uma versão feminina de Colin, só que uma versão fofa e menos irritante.

    Depois de um suspiro, Morgana coçou a nuca.

    — Seu pandoriano é bem forte, e animais fortes são difíceis de controlar. Ela crescerá conforme você fica mais forte, e o que você é ou pensa, a afetará de maneira bem agressiva. Não se esqueça que ela é uma esponja. Absorverá tudo de você, tanto coisas boas quanto ruins, mas ela terá sua personalidade própria.

    “Esponja…”

    — Bom! — exclamou Morgana apoiando as mãos na anca. — Creio que seu treinamento de verdade irá começar. Pronto para morrer, Colinzinho?

    Colin abriu um sorriso de canto.

    — Já morri algumas vezes, acho que estou me acostumando.

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