Capítulo 8, Recortes.
—Mentiroso—
―嘘―
—Mentirosa—
Ah…
Eu quase me esqueci.
Boa noite, para você que é humano.
Também para você, que é Vampiro.
Ghouls, Yuki-onna, Górgonas, Jiangshi, Diabos.
Uma noite maravilhosa para qualquer criatura quer ela seja.
Exceto para…
“Mazou.” Chamei.
“Você se esqueceu do ‘san’.” Ela corrigiu.
“Não, não esqueci.”
“Esqueceu sim, você sempre usa.”
“Por algum motivo, eu não me sinto bem em ser respeitoso com você.”
“Ora… Todo ser merece o devido respeito, isso é me rebaixar para depois de qualquer coisa que possua consciência de individualidade.”
É tarde para dizer que esta frase foi dita com a expressão estóica de quem está apenas atestando ‘água não tem gosto nem cheiro’?
Cruzei os braços e senti uma carranca dominar minha face.
“De certo, me pergunto frequentemente se você a possui.”
“Ei, isso foi desrespeitoso, não é mais sobre respeito de sobra, é sobre a falta dele. Por favor, se desculpe.”
Suspirei.
“Mazou, você precisa vestir uma roupa.” Ela girou os indicadores em sentido horário, com as bochechas infladas como um hamster. Estava dizendo ‘depois’ com as mãos. “Imediatamente.”
“Chomp—. Hung… Mas o que é isso, você é meu pai?”
“Basicamente.”
Heh, o feitiço contra o feiti—.
“Hung… Recuso.”
Encarei a fantasma — nua —, rolar pela minha cama com um pacote de salgadinhos. Meu corpo se contorceu, como se eu fosse liberar um ser maligno interior e arrastá-la pelas orelhas. Me contive.
“Eu já disse, vamos sair, isso não é algo que você pode escolher.”
“Quem em sã consciência sai de casa às onze horas?”
“Alguém que trabalha à noite.”
“Isso vai contra a OFS.”
“OFS?”
“Organização Federal do Sono, pelo amor.” Ah sim, como se eu conhecesse todas as organizações federais fictícias. “E o trabalho não é só seu?”
“Preciso que você se vista, você vai me acompanhar hoje.”
“Hmm, minhas coxas doem, não poderei caminhar mais que cem metros.”
“É o suficiente, você só vai andar até a moto.” Disse, ela ignorou. Eu repensei um pouco… “Ei, fantasmas não sentem dor.”
“Você realmente quer fazer de inimigos todos os fantasmas do mundo?”
“Isso não interessa, eu posso te carregar.”
“Oh!”
De repente, o olhar tedioso se desfez, ela lambeu os dedos e então, levantou com um salto.
“Como uma noiva?” Enquanto batia as mãos nas coxas para limpar. Era mentira.
“Se você se apressar…”
Num instante, Mazou estava vestida.
Com roupas minhas, infelizmente. Mas vestida.
Chamado.
Um Yōkai desordeiro nas proximidades, oportunidade perfeita para pôr em ação o projeto talismã. Ao menos, foi o que disse Namae-nai.
Eu discordo. Ah, e como. Isso soa mais como um experimento que uma patrulha. Se fosse qualquer outro agente eu negaria, de qualquer maneira.
Mas Namae-nai estará lá caso dê tudo errado, talvez essa seja realmente a melhor situação para isto.
Atravessei o corredor até a sala, Mazou foi para cozinha, buscar mais doces, suponho. Eu sentei no sofá, percebi que meus pés batiam no carpete sob um ritmo que eu acabava de inventar. Levantei e comecei a circular o kotatsu em passos curtos, sem pisar nas linhas do piso.
Estava ansioso.
Senti minhas orelhas levantarem, era o ronco da Kawasaki.
Ele chegou.
Vi meu mentor entrar pela porta aberta, a que não tranca mais. Ele carregava um blackpower, de domingo para terça havia desfeito o trançado e seu cabelo seco parecia bem firme, com algumas pontas afiadas. Eu não sabia se era estilo ou ele apenas teve preguiça de fazer um black uniforme, fato é, ainda estava estiloso.
Hakama preta, haori negro, luvas brancas, pele azeviche e pés descalços. O homem que carrega o luto na pele, a morte sem nome, a odachi invencível.
Eu não canso de repetir seus apelidos, mesmo que nenhum deles tenha fixado, são circunstanciais, ele não é chamado o tempo todo por estes. Meros pronomes.
Exceto por, o único que ele não recusou. ‘O melhor espadachim da era moderna’.
Nomes são importantes, reduzem um indivíduo a um conceito, sua nomenclatura pode te enclausurar a ser exatamente o que seu vulgo representa. Namae-nai viveu seus últimos quarenta anos fazendo jus ao vulgo que lhe deram.
Na cintura, um coldre e uma bainha. A Taurus e a Odachi.
“Aposentou a cargo?”
“Estava suja.”
“Você tem dinheiro pra comprar uma para cada dia do ano.”
“Não tem graça se não for a minha.” Ele sorriu.
Levantei do sofá, com os cabelos de gel. Usando uma calça moletom preta e uma regata branca, com a machete na cintura e uma luva preta com as costas metálicas.
“Chomp chomp—, Namaueuchi, temos visita?” Mazou veio da cozinha, ela estava vestida com um conjunto moletom cinza e um chinelo branco, ambos meus. “E-e. Gya—!” Seus desgrenhados cabelos que caiam espalhados se tornaram afiados comicamente.
Instintivamente deu alguns passos para trás.
“Mazougaharachou-san, esse é um colega de trabalho.”
Namae não se apresentou, sequer olhou para ela. Era como se não a visse.
Não.
Era como se desejasse não a ver.
“É aqui perto da reserva florestal… Namaueuchi.” Me chamou pelo nome estúpido, como se dissesse ‘Vamos’.
Eu acabei de discursar sobre como nomes são importantes e você me descredibiliza chamando por um erro de leitura? Eu sou um erro para você?
“Si-Hm?” Mazou agarrou a parte detrás da minha blusa e deu um puxão. Olhei parecia um gato ouriçado.
Oh, é mesmo.
O quanto ela se recorda do dia passado? Difícil saber quando eu mesmo não compareci, mas ela deveria lembrar de nada.
Memória muscular talvez?
Bom, é uma verdade, Mazou não é o fantasma de um humano.
Ela nunca soube na vida o que é ser humano, não exatamente né? É difícil martelar uma verdade absoluta sobre yokais, mas por padrão, é considerado um fato que onis são correlacionados com os conceitos, portanto deve ter nascido quando o seu conceito nasceu.
Onis são a classe de yokai mais ameaçada por um motivo, eles são muito poderosos a depender do que agregam a si. Por exemplo, um oni que devora medo deve ser o próprio diabo em pessoa.
E por isso, caçamos.
Em vida, ela foi caçada pela firma, e tudo culminou naquele dia. Sempre lobo, sempre ameaçador, porém sempre caçado. Não atoa que um dia os lobos tornaram-se cachorros, a diferença é que os cães tiveram uma escolha, acho. Mesmo assim, os instintos não falham, principalmente perante—.
“Você está esperando que eu te acompanhe até a sua própria garagem?” Namae-nai voltou, impaciente.
“Eu vou já.” Retornei para a garota e coloquei minhas mãos sobre seus ombros, ela parou de olhar para Namae-nai com medo e focou em mim. “Mazou, só me siga, se comporte e tudo dará certo, tudo bem?”
“Eu… Acho que sim?” Ela acenou positivamente, mas suas mãos trêmulas derrubaram o pacote de balas.
Eu abaixei e as peguei, segurei em seu pulso. Queria dar uma sensação de segurança, mas sua mão parecia romântica demais para tal. Ela pareceu mais tranquila com o toque e, contrariando minhas expectativas, subiu seus dedos até os meus.
Entrelaçou as mãos com as minhas e me seguiu. Cada dia que passa, menos eu entendo.
Mas eu gosto mais dessa Mazou.
—Corte—
―切―
—Corte—
“Sugoi1…! É sua?”
Aspirei o ar orgulhoso.
“Mil e trezentas cilindradas, diretamente de noventa e nove passa dos trezentos quilômetros.”
Não, eu não sabia, mas ouvi tantas vezes que memorizei e passei a recitar com perfeição. Seria uma declaração mais precisa se dita por Namae-nai. Ninguém seria mais capacitado que ele, foi um presente dele por ter destruído minha velha CB300.
Azul ciano, ‘スピード’2 E ‘スズキハヤブサ’ 3 estilizados da customização em branco rasgando a lateral, além do ‘隼’4, logo da comemorativa que vinham espalhados por todos os cantos dela. Era uma bela moto.
“Parece de brinquedo.”
“Heh… É um lindo brinquedo.”
“Haya… o quê?” Mazou traçou o indicador sobre as letras, mas parecia indecisa sobre as sílabas.
“Hayabusa. só diz que ela é muito maneira e estamos entendidos.” Falei, já subindo a moto, quando lembrei de não ter dois capacetes… “Mazou, vem.”
Ela, mesmo impressionada, permaneceu acuada. Caminhou até mim devagar e subiu na moto.
“Namae-nai, pode ir na frente, estarei logo após.” O vi voltar para sua própria moto, ao lado dela agachada, a mesma garotinha de cabelos brancos, com uma yukata branca e um capacete preto sob o colo. “Certo, eu preciso que você trave bem as pernas em mim e na moto, permaneça colada e segure no quadril. Você deve manter o rosto atrás das minhas costas, okay?”
Mazou arqueou a sobrancelha.
“Você está pensando em malícia de novo.”
“Apenas faça.”
Ela não o fez.
Girei a chave.
Talvez pela falta de confiança em mim, ou meramente por desconhecer artifícios modernos mais específicos, houve um engano.
Não meu, dela. Geralmente, ao subir numa moto, a onomatopeia esperada é ‘vrum-vrum’.
Para a surpresa de Mazou, o ronco do estoura-tímpanos — vulgo motor —, soou muito mais como…
Brum—!RRRROOOOOOONNNNNN!
Automaticamente suas mãos envolveram minha cintura com medo, ela nunca esteve tão fixa em algo em toda sua vida.
Sorri, seguimos viagem.
—Corte—
―切―
—Corte—
Aliás.
Lembra quando disse, boa noite para você, vampiro?
Eu mudei de ideia.
Vampiros são, geralmente associados à aristocratas, elite. Ah sim, e principalmente, educados, cordiais.
Eu sempre gostei de vampiros, e nunca havia visto um vampiro.
Poderia ficar aqui por algum tempo falando o que acho interessante em suas lendas, é realmente algo que eu gosto sabe? A ideia de como eles são sérios e racionais.
Civilizados.
Há um ditado na firma, diz que se um dia uma criatura bater em sua porta, torça para que seja um vampiro. Eles não podem entrar sem um convite e então devem usar de sua boa lábia para tentar te convencer.
Sempre pensei comigo mesmo que seria uma conversa refrescante.
Mas então… Que maldição é essa em minha frente?
“Tipo, você entende né? Essa é a hora do ‘Kyaa!’ e aí eu faço ‘Capu…chuu—’, ne, ne?”
Gyaru. Kogal gyaru. 5
Desrespeito.
Um descaso, não só com os bons modos, ou com a ética moral japonesa.
“Ei, juro não foi por querer, é que tipo, meu dente escorregou no pescoço dele, saca’?”
É um descaso com todos os vampiros que já existiram.
Só histórias, lendas do meu mentor ou de outros agentes que diziam já ter encontrado.
Imponentes. Grandiosos. Elegantes.
A sabedoria de setecentos anos, num corpo de quarenta.
Mas… Que diabos poderia ser isso?
“Ei! Seu porra, você só vai ficar me encarando como um estúpido? Faça algo seu idiota, babaca, palerm-!”
Tap—!
“Você me bateu…? Você deu um tapa na boca de Suzamine Carnivor Von Zinfandel!?”
Situação atual, eu estou sozinho com uma vampira imobilizada, com cabelos coloridos, unhas de esmalte e roupa de colegial japonesa.
Há algo mais estúpido nessa situação que a própria situação?
Suspirei.
“Você não tem idade para chamar palavrões, pirralha.” Segurei ela pela algema no pulso, como um saco de lixo. Espere… “Por que diabos o seu nome de nobre é só um vinho aleatório?”
“Pirralha? Tenho duzentos anos, saco’? Duzentos e trinta e sete!” Ela ergueu dois dedos, apontando as mãos com orgulho e ignorando a pergunta sobre seu nome, como se fosse irrelevante.
“Me surpreende você saber contar a partir dos duzentos… Mas a cara de criança não te permite chamar palavrão.”
Por uma ironia porca do destino, acabei separado do grupo. Sozinho, com essa ofensa ao conde drácula em forma de loli dentuça.
Ei entidade cósmica, acho que já rompemos essa barreira, você me odeia?
Notas do autor:
Bruh, o diálogo no começo é um dos meus favoritos. Eu gosto da moto e amo a Suzu.
Mas esse capítulo é ruim viu bicho. Ou, eu mecho, remexo e não consigo gostar do conjunto da obra.
enfim, o próximo é melhor.
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