Capítulo 27 - Desespero
— Eu preciso me recuperar — minha mente estava tonta, meus olhos piscavam devagar em desgaste — Ele está desacordado… eu… eu devo ter alguns minutos pra descansar… — me rendi ao cansaço e me joguei de costas para o chão.
Respirei profundamente, sentindo toda a mana circular pelo meu corpo. De repente, meu corpo se arrepiou por completo, naquele momento percebi que não deveria ter baixado a guarda.
Meus olhos se abriram rapidamente, encontrando no mesmo instante a figura selvagem e esquelética do homem que eu acabara de derrubar. Eu rolei me esquivando de um soco fortalecido por mana, o mesmo que fez o chão se quebrar. Juntei o pouco de força que me restava e saltei para longe, tomando uma grande distância.
— Como ele ainda está consciente? — para ser sincera, sua sede de sangue lembrava a sua outra personalidade, dessa forma, meu trabalho ainda não havia terminado — tá de brincadeira, não é? Eu não tenho mana suficiente pra derrotar esse cara duas vezes!
Minha mente fervia enquanto pensava no que podia fazer, minhas opções estavam limitadas.
Ponto de Vista de Elena:
— Mas que merda é essa? — perguntei a mim mesma olhando para o céu, vendo uma nuvem mais escura do que o comum surgindo no horizonte.
— Parece uma nuvem carregada, mas ela é densa demais para ser uma Cumulonimbus comum — disse Galliard se aproximando da janela.
— Tem cara de conjuração das trevas, o problema é que algo dessa magnitude…
— Não é qualquer um que faz isso. Eu preciso investigar.
Quando olhei para o lado, Galliard já havia desaparecido.
“Raven está naquela direção… será que…”
Eu não duvidava nem por um segundo dos treinamentos em que eu, Galliard e Elliot demos, mas todos nós sabíamos que havia coisas maiores do que eles poderiam lidar naquele momento.
Pacientemente, caminhei até o andar de cima e entrei no laboratório de Galliard, repleto de máquinas e computadores com a mais alta tecnologia alcançada no Éden. Chegando ao seu lado e me apoiando em seu ombro, perguntei.
— E aí? Descobriu alguma coisa?
— Realmente não é uma nuvem convencional. É uma nuvem carregada com escuridão, mais precisamente uma invocação.
— Então é esse o nível de poder que estamos lidando aqui.
— Já enviei “Eco” para fazer uma análise detalhada, deve chegar em 40 minutos.
— Não temos notícias de Raven há 17 anos, mas tudo dizia que não havia mais vida naquela ilha, seja lá o que for, é suspeito.
— Nenhuma forma de vida entra ou sai de lá, tenho uma ideia de como Saki conseguiu entrar, mas não dá pra saber porque ele a mandou para lá.
Ansiosa, tudo que eu podia fazer era esperar.
Ponto de Vista de Noelle:
Como uma besta descontrolada, o homem que eu já havia derrotado correu com sede de sangue em minha direção.
Quase sem mana e sem energia, em extremo desgaste, tentei mover meu corpo para desviar de seu ataque, mas não para minha surpresa, meus músculos não moveram nem mesmo um centímetro.
“Droga, o que eu faço? O que eu faço?” eu pensava em agonia “Eu não consigo me mover, esse cara vai me matar!” A pessoa com que eu lidava não parecia mais se importar com o que fosse acontecer com meu corpo, a personalidade que agora habitava ali já havia perdido completamente sua sanidade.
Seu corpo disparava faíscas constantemente enquanto corria de forma desajeitada. Eu não tinha mais como fugir, pensei que ali mesmo seria meu fim até que de repente, dos céus, uma sombra atravessou o ombro esquelético do meu inimigo.
— Mas o que… — Karayan pousou logo ao meu lado.
— Você tá um estrago — disse se agachando a minha altura.
— Tsc! Eu não fui forte o bastan-
— Você foi ótima — respondeu colocando a mão em meu ombro.
Meu corpo se encheu de energia novamente, senti a mana correr por minhas veias assim como antes.
— O-O que você fez? — perguntei sem tirar os olhos do homem grunhindo enquanto seu braço arrancado sangrava.
— Eu te dei um pouco da minha mana — ele se levantou e saltou para cima de uma parede, olhando para frente como se estivesse com pressa — não vai durar muito tempo, termine com isso rápido e siga o meu rastro.
— Certo! — sem questionar, consenti imediatamente, antes que ele corresse para longe.
Em poucos segundos, Karayan foi capaz de decepar o braço do homem cadavérico e ainda restaurou completamente minha energia, sem fazer uma única pergunta sequer.
“Toda essa energia… e foi só um pouco?” eu sentia a mana transbordar para fora do meu corpo, como se tivesse acabado de tirar um longo cochilo.
“Termine com isso rápido, é?” Lembrando o que ele acabara de me dizer, pude também sentir a confiança que foi depositada em mim, eu não podia falhar dessa vez.
— Vamos acabar logo com isso! — disse sorrindo enquanto acumulava mana em meus braços e pernas.
A eletricidade corria por minhas veias, marcas azuis gravavam com linhas curvadas o meu corpo inteiro, brilhando em um tom radiante. Em segundos, me movi em alta velocidade com um único ataque em direção ao meu oponente. Minhas garras trovejantes fizeram um grande corte em sua costela, o enfurecendo profundamente.
Sua ira voltou em uma rajada de ar que me levantou para os céus rapidamente. Acompanhando seu ataque, ele surgiu em minha frente desferindo um soco em meu estômago. Como reflexo, disparei uma esfera de raio para sua retaguarda e em um instante me transportei para o lugar da esfera.
— Então eu consigo fazer isso nesta forma? Ótimo! — reagi surpresa.
Eu caí bruscamente, mal conseguindo conter a mana em meu corpo. Usando uma parede de ar como apoio, a carcaça podre pulou em direção ao chão com sua lâmina translúcida apontada para o meu peito. Um ataque direto que foi facilmente esquivado, e foi em meio a poeira levantada que me surgiu um plano.
Mais uma vez, desviei de seus ataques, mas agora, correndo por pontos estratégicos onde eu deixava para trás pequenas runas marcadas nas paredes e no chão. Os golpes bloqueados soltavam grandes faíscas e quanto mais tempo se passava, chamas saíam de seus braços e pernas involuntariamente.
“Ele mal consegue controlar seu corpo, eu tenho que me apressar!”
Em um último ataque, minhas garras cortaram suas pernas, o deixando imóvel temporariamente. Saltei para longe, canalizando a mana na palma das mãos.
— Isso acaba agora! — juntando a face das mãos, fiz com que as runas que marquei brilhassem.
Todas as runas estavam viradas uma de frente para outra, formando pares de runas iguais.
— Feitiço de número 7: Paralisia — Ao conjurar o feitiço, fios de raios se ligaram a cada par de runa, perfurando os braços, pernas e torso do cadáver ambulante, evitando todos os pontos vitais.
Ele grunhiu com a dor, mas não conseguia se mexer, eu me aproximei de seus pescoço e ali mesmo o nocauteei. Mesmo que ele acordasse, não conseguiria se mexer, então apenas o deixei e segui o rastro de mana que Karayan deixou para trás.
“Eu ainda tenho muito o que perguntar, mas não posso perder mais tempo aqui” Pensei enquanto corria.
No caminho notei que as marcas ainda estavam brilhando nos meus braços, pernas e rosto. Seu brilho oscilava, com isso percebi que a mana e energia que recebi poderia sumir a qualquer instante.
“Mesmo usando um feitiço como aquele, parece que eu não perdi nem uma gota de mana, é realmente incrível o quanto de energia que ele tem”
Eu me apressei o máximo que pude, chegando cada vez mais próximo do centro da nuvem escura no céu. De repente, bem na minha frente, caiu algo semelhante a um espinho, perfurando o chão agressivamente. A cor preta do espinho me fez questionar quem teria o arremessado até ali, mas a poucos metros de mim, uma grande quantidade desses mesmos espinhos voavam de um lado para o outro, atacando Saki e os outros.
De longe pude ver que havia uma grande cratera onde todos lutavam, árvores mortas e ossos estavam espalhados por todo o chão. O som da espada de Karayan refletindo os ataques não cessava e em um grito enfurecido, soltou.
— Merda! Essa espada vagabunda não vai durar por muito tempo! — eu cheguei mais perto, vendo a lâmina de sua espada desgastada.
— E ele só tá brincando com a gente! Fala sério! — Saki reclamou segurando seu braço esquerdo imobilizado.
Akira e Shosuke evitavam os espinhos com dificuldade, ambos já estavam machucados e pareciam exaustos. Samaell, levitando seu corpo um pouco acima do chão, fazia com que os espinhos surgissem da sua sombra, rindo e se divertindo, como se tudo aquilo não passasse de uma brincadeira para ele.
— Vamos! Tentem me acertar! Isso está ficando cada vez mais entediante! — riu em diversão, olhando todos como vermes. Minha presença foi notada rapidamente por ele, que desviou seu olhar para mim em instantes — Mas veja só quem temos aqui, uma pequena cachorrinha abandonada… — parando seus ataques.
Sua provocação me acertou em cheio, eu cerrei meus punhos tentando controlar minha fúria, torcendo para que mais nenhuma palavra saísse de sua boca.
— Noelle? — Saki olhou para trás.
— Já era hora, seu tempo está quase acabando — disse Karayan.
Em um único salto, Saki chegou ao meu lado.
— O que são essas marcas? Você conseguiu derrotar aquele cara? — perguntou preocupada com meus machucados.
Eu mal consegui compreender suas perguntas, tentando evitar ao máximo olhar para os olhos perversos de Samaell.
— O que ele tá fazendo? — perguntei respirando profundamente.
Saki entendeu minhas emoções no momento, e apenas me respondeu rapidamente.
— Certo. Esse é o jogo que ele propôs, 4 contra 1, basicamente uma batalha até a morte. O primeiro que matar um do time adversário vence.
— Entendi… — olhando para os outros, todos já estavam em seu limite — E o seu braço? Aconteceu com ele?
— Isso não importa agora — respondeu friamente.
Eu rangi meus dentes em raiva, tentando encontrar uma forma de acabar com tudo isso. Quando me dei conta da calmaria que estava após a minha chegada, senti o ar a minha volta desaparecer repentinamente, eu tentava puxar oxigênio para meus pulmões, mas não adiantava e antes mesmo que eu percebesse, Samaell estava bem a minha frente, sorrindo como um demônio.
A atmosfera ao redor se tornou completamente escura, tudo que eu enxergava era a expressão perversa de uma criatura maligna. Suas mãos envoltas em luvas brancas se aproximaram de meu rosto, exalando uma fumaça negra que invadia minha cabeça. Ao abrir os olhos, me vi em um outro dia, em uma praça repleta de pessoas em plena luz do sol.
As crianças, juntamente com seus pais, sorriam alegremente, brincando e se divertindo pelas ruas. As casas ao redor eram extremamente bem cuidadas, todas elas com um aspecto novo e harmônico, todos ali viviam em paz. Eu assisti essas pessoas por alguns minutos sem conseguir me mexer ou olhar para os lados, como se estivesse olhando por uma televisão.
— O que… O que é isso? — eu me perguntava.
— Essa é Raven, há alguns anos — a voz de Samaell surgiu subitamente em meus ouvidos.
— Você! Seu desgraçado! — gritei em um susto — O que você tá fazendo? — perguntei tentando me mover.
— Apenas… te mostrando a verdade. Observe.
De repente, o céu escureceu e uma figura envolta à escuridão apareceu. Ela destruiu as casas e as vidas de centenas ou milhares de pessoas em instantes, fazendo o desespero correr pelas ruas. A voz da figura, idêntica à voz divertida e perversa de Samaell ria em meio ao caos. Removendo a sombra de seu corpo, revelou seu corpo, com as mesmas roupas que ele estava usando recentemente.
— Então foi você…
— Shhhh — pressionando o dedo indicador em meus lábios — aprecie o show em silêncio.
Em um breve clarão, uma mulher de cabelos brancos surgiu em meio a praça. Tudo que eu conseguia ver era seu manto preto com uma estrela gravada em suas costas. Jogando seu manto para trás, deixando-o pendurado em seus ombros, ela gritou:
— O que pensa que está fazendo aqui? Quem é você?
— Como assim? Não se lembra de mim? Não consegue se lembrar de que dia é hoje? — ele respondeu em tom irônico.
— Não me diga que… — ela se surpreendia ao ver Samaell retirar sua máscara pouco a pouco.
— Isso mesmo, minha querida irmã! Eu voltei! EU FINALMENTE VOLTEI! — gritou em alegria.
— Samaell… não… — incrédula, mal conseguia formular uma frase — Você só pode tá de brincadeira — suspirou desapontada.
— Vim pôr um fim nisso, Viollet! E dessa vez, você não vai me parar!
Ali mesmo, ambos lutaram por horas, dando tudo que tinham para derrotar um ao outro. Depois de tanto tempo, Samaell enfim conseguiu acertar seu punho coberto por escuridão no peito da Bruxa Celestial, a atravessando. Achando que tudo estava acabado, nem mesmo havia percebido que caiu em uma armadilha, onde Viollet, a maior bruxa de toda a história, deu sua vida para selar um demônio, um demônio que era o seu próprio irmão.
Após o golpe, ela caiu sem forças no chão e se rastejou com um buraco em seu peito em direção ao grande castelo em que morava. Antes que se rastejasse por alguns metros, uma criança de cabelos negros apareceu com um bebê de cabelos prateados em seus braços.
Tudo à minha volta mais uma vez se tornou escuridão, eu apenas conseguia ver as lágrimas caírem de meu rosto e logo Samaell apareceu sorrindo na minha frente.
Ali eu pude ver meu corpo preso em sombras, sem marcas, sem machucados, apenas eu.
— Por que está me mostrando isso? — meu corpo se libertou da escuridão, podendo me mover mais uma vez.
— Bom… pensei que talvez fosse divertido.
Em raiva, meu corpo se moveu sozinho, tentando acertar a cabeça de Samaell, mas tudo que fiz foi o atravessar, deixando um rastro de fumaça para trás.
— Você não percebe? Nem mesmo a porra da Bruxa Celestial foi capaz de me matar! O que diabos você conseguiria fazer? — perguntou aparecendo nas sombras atrás de mim.
— CALA A BOCA! — tentei acertá-lo mais uma vez.
— Você é fraca!
— EU MANDEI CALAR A MERDA DESSA BOCA!
Mergulhando nas sombras, Samaell ressurgiu em minha frente, lançando sua fumaça em meus olhos. Eu recuei instintivamente jogando a fumaça para longe.
— Eu vou te dizer uma única coisa — seus olhos e sorriso malignos grudaram em meu rosto, fazendo com que tudo que eu enxergasse fosse sua expressão diabólica — Desista dos seus sonhos e morra de uma vez. Você nunca chegará aos pés de sua mãe, mesmo as duas sendo fracas e patét— sua voz foi cortada de repente.
Eu estava de volta ao mundo real, com lágrimas descendo dos meus olhos.
— Noelle! — Saki pôs as mãos em meus ombros, me impedindo de cair cratera abaixo.
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