Capítulo 3 - Shryne
Após Saki cair no chão desacordada, Noelle com sua impecável audição, escutou o barulho do seu corpo caindo no chão e se virou rapidamente.
— Espera! — bradou assustada enquanto segurava forte o braço de Akira — escutei algo caindo, pode ser que seja a Saki.
— O quê? Onde?
— Naquela direção.
Akira não perdeu tempo e correu junto a Noelle em direção ao som.
Eles clamaram por Saki diversas vezes até que conseguem finalmente encontrá-la largada na terra gelada.
Era possível ver diversas vinhas negras em seu braço direito como se fossem uma espécie de tatuagem.
Antes que notassem, as vinhas desapareceram gradativamente.
— Saki! — Akira correu em sua direção para ver o que tinha acontecido.
— Será que ela tá bem? — perguntou Noelle desesperada.
Akira se aproximou e checou os sinais vitais de Saki, como alguém que já tivesse experiência nisso.
— Ela tá bem, mas não sabemos o que aconteceu pra ela ficar desse jeito.
— Então o que vamos fazer?
— Não podemos ficar parados aqui. Deixa que eu levo ela — respondeu colocando Saki em suas costas.
— Certo.
Akira e Noelle voltaram para a trilha e continuaram seu caminho. Ambos estavam ansiosos e com medo do que poderia acontecer, mas se ficassem parados, as coisas poderiam piorar.
Depois de andarem por mais alguns minutos, Saki acordou, desnorteada e sem noção do que havia acontecido, logo perguntou.
— Hã? O que aconteceu? Que calor é esse?
— Ainda bem que você acordou — disse em um suspiro aliviado.
— Saki? Você está bem? — questionou preocupada.
— Eu… Eu tô bem, eu acho… Alguém vai me dizer o que rolou?
— Estávamos esperando você acordar pra perguntar — respondeu Akira — A gente te achou dormindo no chão.
— Eu não sei ao certo… Sinto que falta algo em minha memória, tudo que me lembro foi que te ouvi falando para virar à direita e então eu me perdi. Também escutei seus gritos me chamando, mas quando tava chegando perto eu… — por um momento, Saki percebeu que algo faltava em sua memória — eu não lembro de mais nada.
— Pera aí! — parou repentinamente — Eu nunca falei pra virar à direita, a trilha agora é só um caminho reto.
— Cê tá dizendo que eu tô ouvindo coisas? — perguntou Saki irritada.
— Exatame…
— Não! — Interrompeu — Eu tenho certeza que te ouvi!
— Então talvez tenha sido algum bicho da floresta?
— Até onde eu sei, não existe esse tipo de bicho aqui — afirmou convicto de seus conhecimentos.
Um silêncio perpetuou por alguns segundos. Os três se olharam completamente constrangidos e Saki diz:
— Pelo menos tá todo mundo bem.
— Pois é. Agora, se já melhorou, poderia fazer o favor de descer das minhas costas?
— Ah é mesmo.
Ao descer das costas do jovem, Saki voltou a caminhar.
— Vocês não estão com calor não? — O calor infernal que a incomodava, fez com que se sentisse obrigada a tirar sua jaqueta.
— Não… — respondeu Noelle com suas orelhas abaixadas.
— Na verdade, tá bem fresquinho aqui, com sereno e tal.
“Que coisa, eu acho que vou assar aqui…”
Os três continuaram andando com muito sono até o nascer do sol.
Quando os primeiros raios solares começaram a aparecer no horizonte, eles enxergaram a silhueta de uma enorme cidade.
— Vocês tão vendo o que eu tô vendo? — a empolgação fez com que os olhos de Saki brilhassem ao ver a sombra da cidade.
— Finalmente!
— É… É ela mesmo — disse Noelle espantada apenas por ver quão grande era aquele lugar.
Eles saíram da floresta e se deparam com um enorme campo de terra até a cidade.
— Vamo logo! Eu tô começando a ficar ansiosa.
Atravessando o campo de terra, eles chegaram aos portões da cidade.
Dois guardas, ambos acima do peso, protegiam a entrada da cidade com lanças afiadas. Acima dos portões havia um painel holográfico escrito: “Bem Vindo a Shryne, A Cidade do Conhecimento!”.
— Shryne… — Saki tentou buscar esse nome em suas memórias, ela lembrou vagamente de já ter o visto antes — Espera um pouco!
Em sua mochila começou a revirar tudo à procura de um dos mapas.
— Aqui! — gritou Saki com o mapa da cidade em mãos.
— Você tem o mapa da cidade? — perguntou Akira extremamente confuso.
— Eu tenho vários mapas!
De repente, os portões de Shryne começaram a abrir.
O silêncio seguido de um caminhar calmo e gentil perpetuou por suas cabeças até um homem com cerca de 1,92m aparecer.
Ele vestia um terno branco e dourado, usava luvas brancas e portava uma insígnia com o brasão dourado com uma joia vermelha no centro.
O rapaz possuía uma cor de pele clara, olhos azuis e um cabelo bem avermelhado.
— Oh! Parece que temos viajantes — disse o cavalheiro com sua voz elegante e suave — sejam bem vindos a nossa linda cidade, Shryne — os reverenciou abaixando sua cabeça.
— VOSSA ALTEZA! — gritaram os guardas.
— Tudo bem, rapazes. É o nosso dever como cidadãos, dar boas-vindas adequadas aos nossos visitantes.
— Obrigada! — agradeceu Saki.
Ao levantar sua cabeça, o rapaz cruzou seus olhos com o colar de Saki.
“É ela mesmo!” pensou subitamente.
— Meu nome é Elliot, sou o Capitão da Guarda Imperial — com a mão estendida, ele os saudou.
Ela o cumprimentou de volta.
— O meu é Saki. É um prazer! Por que o capitão está nos recebendo pessoalmente?
— Eu estava saindo da cidade para tratar de alguns assuntos, mas não custa nada dar as boas-vindas a viajantes como vocês.
— Espero que a cidade tenha mais pessoas como você — disse em um tom amigável.
— Hahahahaha! — Sua breve risada fez com que Saki acreditasse nas palavras de seu pai e deixou de se preocupar — Se andarem pelos lugares certos, certamente acharão.
Elliot soltou a mão de Saki e ajeitou seu terno dizendo:
— Bom, se me dão licença, devo ir imediatamente.
— Obrigado pela recepção, capitão — todos responderam
Elliot seguiu seu caminho, mas ao passar ao lado de Akira sentiu algo estranho. Uma sensação de dejá vu com uma figura que antes havia sido seu companheiro.
Ele o encarou por alguns poucos segundos e foi embora.
— Certo, agora que vocês estão aqui, eu vou voltar para a floresta — disse Akira.
— Você não quer ver a cidade? — perguntou Saki.
— Na verdade, não. Eu preciso voltar para a floresta.
— Tem certeza?
— Tenho. Afinal, não posso sair de lá assim do nada.
— Se você diz… — Saki estendeu seu punho — a gente se vê por aí! Obrigada!
— É! — respondeu com um soquinho — A gente se vê!
Assim, Akira voltou para a floresta.
Saki e Noelle atravessaram os portões e ao entrar na cidade, se deparam com algo muito além do que imaginavam.
A cidade era composta por uma mistura de épocas. Ao mesmo tempo que se via prédios super tecnológicos e gigantescos, também era possível ver casas modernas ou até mesmo medievais; carros, carruagens, dirigíveis e até mesmo linhas de trem aéreas e a maior variedade de estilos possíveis.
— Uau… Quanta coisa! — exclamou Noelle espantada com a estrutura da cidade.
— Esse lugar é enorme! Como eu vou achar essa bendita casa?
Perdida, Saki olhou em seu mapa e procurou a localização da casa em que os amigos do seu pai estariam.
— Está circulado em vermelho, mas eu não faço ideia de como chegar lá — Enquanto Saki tentava achar um caminho para seguir, Noelle continuava maravilhada com as coisas ao seu redor — Achei! E não fica tão longe daqui… Eu acho…
Ao ver que Saki em breve iria se despedir, Noelle segura sua jaqueta firmemente. Saki olhou para trás e viu Noelle com suas orelhas abaixadas perguntando:
— Você… já está indo… Não é?
— Isso, tenho que me encontrar com algumas pessoas agora.
— Entendi…
Saki se afasta um pouco e diz.
— Se cuida! Espero que encontre o que está procurando — Saki foi se distanciando à medida que se despedia, deixando Noelle para trás.
— O- Obrigada…
Noelle se viu sozinha novamente. O barulho alto das pessoas na cidade tomou conta de seus ouvidos, sem ter para onde ir começou a olhar ao seu redor com os olhos repletos de lágrimas.
Dentro da cidade que tanto procurou, ela não soube o que fazer, nunca havia passado por sua cabeça o que faria quando chegasse.
Sem rumo, o desespero começou a consumir sua mente. Tudo que conseguia pensar, era nas pessoas de sua vila:
— HAHAHAHA! Como você é idiota! Fugiu de casa e ainda voltou com o rabo entre as pernas!
— Uma inútil como você nunca iria conseguir algo fora deste lugar!
— Você não serve nem para varrer o chão! Era melhor que morresse no meio do mato!
As lágrimas escorreram em seu rosto.
Ela esfregava as mãos em seu nariz, chorando cada vez mais em silêncio, até que de repente, uma mão surge em sua visão.
— Aí! — disse a pessoa que estendeu a mão.
Noelle levantou sua cabeça rapidamente e viu Saki agachada em sua frente.
— Você não tem pra onde ir, não é?
— Eu… Não sei…
— Vem, levanta daí — disse sorrindo e segurando sua mão.
Ao sentir o toque gentil de Saki, memórias desagradáveis passaram em sua mente.
Sempre que estendiam a mão para ela, era agredida ou empurrada. Sempre que falavam com ela, era para dar ordens ou ofendê-la.
Quando Saki a ajudou a levantar, ela sentiu uma sensação que há anos não sentia, o sentimento de estar segura a confortou e então, veio outra lembrança a sua mente.
Ainda quando bebê, antes mesmo de conseguir engatinhar, uma mulher de cabelo prateado e com um chapéu de bruxa a segurava no colo enquanto sua criança chorava e ela cantava uma canção com sua voz leve e gentil.
Noelle, com seus olhos transbordando de lágrimas, olhou para Saki e perguntou:
— Por que você voltou?
— Não me entenda mal, eu só vi alguém que parecia muito perdida…
— Mesmo assim… Obrigada!
— E então? Vai vir comigo? — perguntou com um sorriso.
— Sim! — Suas lágrimas foram limpas pelos dedos de Saki, que a ajudou a levantar.
Enquanto Noelle e Saki seguiram adiante, Akira ainda voltava para a floresta.
Ele pulou em cima de uma das árvores e seguiu de galho em galho em direção à sua casa.
“Aquele cara desapareceu bem atrás de mim, como ele atravessou tudo aquilo tão rápido?”
No caminho, ele escutou passos de alguma pessoa perambulando pela floresta, o que não era comum.
Ao seguir o som dos passos, ele encontrou Elliot, com sua espada dourada na mão e uma pilha de corpos de macacos no chão.
— O que foi que aconteceu aqui? — perguntou com uma voz enfurecida
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